Este artigo se destina a explicar de forma genérica como funcionam o procedimento fiscalizatório, a administração tributária e jurisprudência.
O direito tributário é regido por normas e princípios gerais e sua principal razão de existir está relacionada ao poder de império que o estado possui a prerrogativa de impor a seus cidadãos que paguem tributos – tributos estes que financiam as atividades prestacionais da administração pública.
Tais atividades prestacionais podem envolver, por exemplo, o serviço de segurança pública, serviço que é usufruído de forma difusa, dispersa, pela população, serviço esse que só pode ser remunerado pelos fundos proporcionados pelos impostos. De outra forma, podem envolver a prestação de um serviço público, específico e divisível, ou o exercício do poder de polícia – dois fundamentos para a cobrança de taxas.
Além disso, podem envolver a cobrança sobre uma valorização imobiliária, como contrapartida de uma obra pública que tenha gerado essa mesma valorização imobiliária. Ou uma contribuição previdenciária para o Regime Geral da Previdência Social (RGPS) ou para o Regime Próprio da Previdência Social (RPPS) dos servidores públicos.
Ou esse poder de tributar pode alcançar contribuições sobre o serviço de iluminação pública (Cosip), ou outras contribuições especiais – tais como a CIDE Combustíveis, as contribuições do Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (SESC), ou o Adicional de Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM). Enfim, são diversas as expressões do poder de tributar do estado. O direito tributário trata de várias delas, mas como isso é realizado? Principalmente através de princípios expressos na Constituição Federal de 1988 (CF/88) e de normas gerais disseminadas pela lei n. 5.172/1964, o Código Tributário Nacional (CTN). O CTN possui uma área específica sobre a administração tributária, a qual será abordada neste artigo – que envolve o procedimento fiscalizatório, contendo as previsões do CTN. Os temas dívida ativa, certidão negativa serão tratados neste artigo.
O procedimento fiscalizatório é uma rotina da administração tributária que cuida de verificar e analisar o cumprimento das obrigações tributárias, sejam elas principais ou acessórias. São decorrentes das prerrogativas e poderes concedidos pela CF/88 aos entes federativos, pois quando a Constituição concedeu competência a estes entes para tributar, concedeu também os meios para fazer cumprir tais obrigações. Por esse motivo, não é propriamente um direito da pessoa política, mas um poder-dever.
Tais funções fiscalizatórias possuem previsão no CTN de serem reguladas pela legislação tributária em caráter geral ou específico a competência e os poderes das autoridades administrativas na função de fiscalizar. Nota-se a expressão “legislação” – bem mais abrangente que somente a lei, deixando claro que as normas atinentes à fiscalização não precisam ser definidas em lei. Sanções (punições), por outro lado, precisam ser previstas em lei.
Outro ponto fundamental do procedimento fiscalizatório é que a legislação fiscalizatória é aplicável às pessoas físicas e jurídicas, contribuintes ou não, inclusive as que gozem de imunidade tributária ou isenção de caráter pessoal.
Além desse fato, o art. 195 prevê que não possuem aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais e fiscais, dos comerciantes ou industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los. Desta forma, percebe-se o caráter fiscalizatório da fazenda pública acima de qualquer lei que tenha o intuito de retirar a prerrogativa de fiscalizar ou mesmo de limitar os poderes de fiscalização.
Tão importante que essa atividade seja exercida que o CTN inclusive determine que se documente o início do procedimento, de forma a fixar prazo máximo para a sua conclusão, sendo que os termos deverão ser lavrados (registrados) em qualquer dos livros fiscais apresentados e que, quando lavrados em separado, se entregue à pessoa sujeita ao procedimento cópia autenticada dos termos.
O CTN ainda estabelece que mediante intimação escrita (sem necessidade de ordem judicial), são obrigados a prestar informações sobre bens, negócios ou atividades de terceiros: i) os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício; ii) os bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas e demais instituições financeiras; iii) as empresas de administração de bens; iv) os corretores, leiloeiros e despachantes oficiais; v) os inventariantes; vi) os síndicos, comissários e liquidatários; vii) e quaisquer outras entidades e pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão.
Evidentemente, os poderes da fazenda pública não são infinitos. É vedada a divulgação, por parte do fisco, de informações obtidas por meio do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades. Pois o poder fiscalizatório da fazenda pública não poderia permitir abusos contra o contribuinte.
Entretanto, há algumas exceções a estas limitações. Elas não se aplicam no caso de requisições judiciais, ou solicitações de autoridades administrativas no interesse da administração pública – desde que comprovada a instauração de processo administrativo com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa.
Também não é vedada a divulgação de informações relativas a representações fiscais para fins penais, inscrições na Dívida Ativa da Fazenda Pública, bem como casos de parcelamento ou moratória.
Por último, nas disposições sobre administração tributária, é prevista a cooperação mútua entre os entes federativos com o objetivo de fiscalizar seus tributos e permutar informações, em caráter geral ou específico, por lei ou convênio. E as autoridades administrativas poderão requisitar o auxílio de força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente – quando forem vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário na efetivação de medida prevista na lei, ainda que não se configure ato definido em lei como crime ou contravenção.
A jurisprudência dos tribunais superiores possui várias decisões na parte de administração tributária, tanto do Supremo Tribunal Federal (STF), como do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Existem várias súmulas e decisões, podendo subdividi-las nos temas procedimento fiscalizatório, execução fiscal e dívida ativa.
No tema do procedimento fiscalizatório, a jurisprudência dos tribunais superiores busca preservar os poderes de fiscalização do fisco, como se vê na Súmula STF-439: “Estão sujeitos à fiscalização tributária ou previdenciária quaisquer livros comerciais, limitado o exame aos pontos objeto da investigação.”
Também foi no Supremo o julgado que, ao contrapor as garantias ao sigilo individual dos contribuintes contra os poderes fiscalizatórios do fisco, deu preferência aos poderes da fiscalização tributária – desde que houvesse processo administrativo instaurado. Este assunto é tratado com mais detalhes no artigo sobre Garantias e Privilégios do Crédito Tributário e também no artigo sobre os Limites de Fiscalização da Administração Tributária.
No STF no tema fiscalização também existe a tese da sanção política, que, resumidamente, não admite que o fisco exerça coação sobre o contribuinte, para o exercício de suas atividades. Seguem nessa tese as súmulas STF-70: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo.”, STF-323: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.”, STF-547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.”.
No STJ, quando o assunto é execução fiscal, existem duas súmulas: a STJ-393: “A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.” e a STJ-394: “É admissível, em embargos à execução fiscal, compensar os valores de imposto de renda retidos indevidamente na fonte com os valores restituídos apurados na declaração anual. Normalmente, no bojo da ação fiscal, há uma resistência a aceitar embargos à execução, que muitas vezes são vistos como subterfúgios para atrasar o andamento da ação.
Entretanto, existem casos que são flagrantes e não necessitam da produção de provas, como a existência de um ex-sócio da empresa no polo passivo, sem nenhuma responsabilidade sobre as infrações tributárias. Isso pode ser admitido nos embargos, bem como compensar valores de imposto devido.
Ainda em execução fiscal, há a súmula STJ-409: “Em execução fiscal, a prescrição ocorrida antes da propositura da ação pode ser decretada de ofício.”, bem como a STJ-406: “A Fazenda Pública pode recusar a substituição do bem penhorado por precatório.”
Neste artigo o objetivo foi demonstrar a importância da administração tributária para o direito tributário como um todo. A administração tributária é a função central que exerce os poderes de tributar dos entes estatais.
A parte final do CTN dispõe como são as disposições finais da administração tributária, dividindo-as entre procedimento fiscalizatório tributário, dívida ativa e certidão negativa.
O procedimento fiscalizatório tem a função de examinar documentos e compará-los com a expressão do fato gerador, podendo ser realizada em geral ou específico, em todas as pessoas relacionadas à ocorrência do fato gerador. A função de fiscalização deriva do poder concedido constitucionalmente ao ente federativo, sendo que não se trata de uma faculdade: é na verdade um poder-dever.
Estão sujeitas à fiscalização todas as pessoas, independentemente de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão – inclusive as pessoas que gozem de imunidade ou de isenção em caráter pessoal.
Mesmo com essa ressalva, estão obrigados, mediante intimação por escrito a prestar esclarecimentos pessoas diversas, tais como: tabeliães, escrivães e demais serventuários, instituições financeiras, empresas de administração de bens, corretores, leiloeiros e despachantes oficiais, inventariantes, síndicos, comissários, liquidatários, e outras entidades e pessoas.
Mas a lei possui limites, não estando sujeitos à fiscalização as pessoas que a lei exija sigilo em função de seu cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão. Nestas circunstâncias, em um processo no qual o sujeito passivo esteja sendo investigado, não são obrigados a prestar esclarecimentos mediante intimação por escrito, por exemplo, padres (que possam ter acesso às informações via confissão), advogados e médicos (pelos códigos de ética inerentes ao exercício de suas respectivas profissões).
Com vistas aos princípios do contraditório e ampla defesa, os procedimentos de fiscalização deverão sempre ser documentados, sendo que nos livros fiscais deverão conter o termo de lavratura do procedimento, com início e prazo máximo para a sua respectiva conclusão.
Ricardo Pereira de Oliveira
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