Informativo nº 783 do STJ COMENTADO saindo do forno (quentinho) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA
É possível a renegociação dos débitos de precatórios vencidos e dos que vencerão dentro do período previsto pela EC n. 109/2021.
RMS 69.711-SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 15/8/2023. (Info 783)
O município Pagonada impetrou mandado de segurança. Alega que é ilegal o indeferimento parcial do aditamento ao Plano Anual de Pagamento de Precatórios, seguido da determinação de sequestro valores das contas municipais. A decisão judicial atacada determinou o bloqueio dos valores para pagamento das insuficiências desde 2018 — o município vinha deixando de arcar com os pagamentos…
O município sustenta que o advento da Emenda Constitucional nº 109/2021 assegura aos Município o direito à apresentação de um novo Plano de Pagamento, contemplando todos os valores em aberto, a fim de formar um único montante global, a ser quitado até o prazo final determinado pela EC 109/2021.
R: Yeap!!!!
Acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal adotou a compreensão no sentido de que o plano de pagamentos apresentados pelo devedor de precatórios ao respectivo Tribunal deve contemplar todo o passivo, de modo a formar um único montante global de débitos de precatórios, ainda que se refiram a parcelas vencidas e não pagas em período anterior ao advento da Emenda Constitucional n. 109/2021.
Uma vez que o prazo de pagamento antes estabelecido pela EC n. 99/2017 (até 31/12/2024) foi estendido pela EC n. 109/2021 para 31/12/2029, sem ressalva alguma quanto aos anos a que se referem os débitos em questão, apresenta-se indevida a discriminação realizada pela autoridade impetrada, no sentido de não autorizar a renegociação proposta pelo ora recorrente quanto às dívidas anteriores a 2021.
Acolhida a pretensão do município impetrante, para fazer-se incluir na repactuação requerida à luz da EC n. 109/2021 também o passivo referente aos exercícios dos anos de 2018, 2019 e 2020. Tal solução importará em que a autoridade impetrada novamente avalie qual o percentual da receita corrente líquida da municipalidade será suficiente para a quitação dos débitos existentes quando da elaboração anual do plano de pagamentos, conforme a redação da EC n. 109/2021, tomando as medidas que entender necessárias para assegurar o adimplemento dessas obrigações.
É possível a renegociação dos débitos de precatórios vencidos e dos que vencerão dentro do período previsto pela EC n. 109/2021.
RECURSO ESPECIAL
Depois da entrada em vigor do art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, é quinquenal o prazo de prescrição da ação indenizatória decorrente de acidente de trânsito ocasionado por empresa particular prestadora de serviço público, cuja vítima é relativamente incapaz.
REsp 2.019.785-SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 15/8/2023, DJe 18/8/2023. (Info 783)
Creitinho, então com doze anos, sofreu acidente de trânsito provocado por empresa particular prestadora de serviço público, no ano de 1990. Eventualmente foi ajuizada ação indenizatória, mas então iniciou-se a discussão acerca do prazo prescricional aplicável diante das alterações trazidas pela Lei 9.494/1997 e pelo novo Código Civil.
CC/2002:
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I – contra os incapazes de que trata o art. 3 o ;
Art. 206. Prescreve:
§ 3 o Em três anos:
V – a pretensão de reparação civil;
Lei n. 9.494/1997:
Art. 1o-C. Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.
R: Quinquenal!!!!
No caso, tendo em vista que o acidente ocorreu em 24/12/1990, quando o autor tinha 12 anos, o curso do prazo prescricional só teve início em 16/12/1994, quando ele alcançou a capacidade civil relativa (16 anos), nos termos dos arts. 167, I, do CC/1916 e 198, I, do CC/2002.
Segundo entendimento do STJ, em respeito à proteção dos interesses do menor incapaz, caso a contagem do prazo prescricional sob a égide do Código Civil de 2002 vier a lhe ocasionar efetivo prejuízo, deve-se afastar o disposto no art. 169, I, do revogado Código Civil, para computar o prazo vintenário na íntegra, estabelecendo-se a data do evento danoso como termo inicial.
Com base nessa premissa jurisprudencial, deve ser avaliado o padrão mais vantajoso para o autor. De um lado, tem-se a possibilidade de aplicação da regra de transição estabelecida no art. 2.028 do CC, com o prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, V, situação em que o termo final para o ajuizamento da ação seria em 11/1/2003. De outro, existe a possibilidade de contagem do prazo vintenário a partir do evento danoso (24/12/1990), consolidando-se a prescrição no final de 2010.
No entanto, nas ações indenizatórias movidas em desfavor de pessoa jurídica de direito privado, na condição de prestadora de serviço público, a prescrição é regida pelo Código Civil, até a entrada em vigor do art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, em 28/8/2001.
Logo, independentemente da metodologia adotada, é inafastável que, com a entrada em vigor do art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, em 28/1/2001, o prazo passou a ser quinquenal, fazendo com que, na espécie, o termo final da prescrição ocorresse em 28/1/2006.
Depois da entrada em vigor do art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, é quinquenal o prazo de prescrição da ação indenizatória decorrente de acidente de trânsito ocasionado por empresa particular prestadora de serviço público, cuja vítima é relativamente incapaz.
RECURSO ESPECIAL
Em análise dos dispositivos da Medida Provisória n. 2.048/2000, reitera-se que a Gratificação de Desempenho de Atividade Jurídica – GDAJ tem caráter propter laborem e não é devida aos servidores inativos.
REsp 1.833.226-DF, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 15/8/2023, DJe 18/8/2023. (Info 783)
Tadeu, procurador federal, ajuizou ação por meio da qual pretendia ter reconhecido o direito ao recebimento da Gratificação de Desempenho de Atividade Jurídica – GDAJ, mesmo após sua aposentadoria.
Por sua vez, a União entende que a GDAJ estabelece caráter propter laborem, o que tornaria a gratificação inextensível aos inativos.
Medida Provisória n. 2.048/2000:
Art. 41. Fica instituída a Gratificação de Desempenho de Atividade Jurídica – GDAJ, devida aos integrantes das Carreiras de Advogado da União e de Assistente Jurídico da Advocacia-Geral da União, de Defensor Público da União e de Procurador Federal, no percentual de até trinta por cento, incidente sobre o vencimento básico do servidor, quando em exercício nas unidades jurídicas dos órgãos e das entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
§ 1o A GDAJ será atribuída em função do efetivo desempenho do servidor e dos resultados alcançados pelos órgãos jurídicos dos órgãos e das entidades, na forma estabelecida em ato do Advogado-Geral da União e, no caso do Defensor Público da União, em ato do Defensor-Geral da União.
R: Nooops!!!
A jurisprudência predominante do STJ orienta-se no sentido de que a discussão acerca da concessão da Gratificação de Desempenho de Atividade Jurídica – GDAJ demanda a análise prévia dos dispositivos da Medida Provisória n. 2.048/2000, atual MP n. 2.229-43/2001, de modo a definir a natureza da aludida vantagem.
Extrai-se dos art. 41, § 1º, e 54, I, da Medida Provisória n. 2.048/2000 que não há falar em extensão da GDAJ aos aposentados e pensionistas, pois a gratificação subordina-se ao desempenho individual e institucional, fatores não aferíveis em relação aos servidores inativos.
Segundo a compreensão firmada pelo STJ, “a GDAJ, instituída pelo art. 40 da Medida Provisória n. 2.048-26/2000, não é devida aos servidores inativos, em face de seu caráter propter laborem” (AgInt no AREsp 1.074.083/DF, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 19/10/2017, DJe 19/12/2017).
Em análise dos dispositivos da Medida Provisória n. 2.048/2000, reitera-se que a Gratificação de Desempenho de Atividade Jurídica – GDAJ tem caráter propter laborem enão é devida aos servidores inativos.
RECURSO ESPECIAL
O deferimento de processamento da recuperação judicial em consolidação processual não impede a posterior análise do preenchimento dos requisitos para o pedido de recuperação em relação a cada um dos litisconsortes.
REsp 2.068.263-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/8/2023. (Info 783)
A Construtora Quebradeira requereu recuperação judicial, tendo sido deferido o seu processamento pelo Juízo da Vara da Comarca de Itapecerica da Serra/SP. Com o ingresso de outras sociedades do grupo no feito requerendo a extensão da recuperação judicial, os autos foram redistribuídos ao Juízo da Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central de São Paulo, que entendeu não ser possível o processamento conjunto da recuperação, sendo determinada a extinção do processo em relação a várias sociedades.
Contra essa decisão, foi interposto agravo de instrumento, o qual foi provido para admitir a consolidação processual, deixando aos credores o exame da possibilidade de haver consolidação substancial. Devolvidos os autos ao primeiro grau, houve deliberação no sentido de que a recuperação não poderia seguir em consolidação substancial sem o prévio exame dos credores.
Na subsequente assembleia geral de credores, foi aprovado o plano de recuperação das sociedades pertencentes ao grupo, com exceção da empresa Pet Energia, em relação à qual a assembleia foi suspensa. Em relação a esta, o Juízo de primeiro grau extinguiu o processo, pois havia somente 2 (dois) credores para deliberar a respeito do plano, o que, no seu entender, levaria à extinção do processo, uma vez que a recuperação judicial não se destina a solucionar crise econômico-financeira quando o devedor tem apenas um credor, ou, ainda, um único credor em cada classe.
LREF:
Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:
I – a exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira;
II – as demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável e compostas obrigatoriamente de:
a) balanço patrimonial;
b) demonstração de resultados acumulados;
c) demonstração do resultado desde o último exercício social;
d) relatório gerencial de fluxo de caixa e de sua projeção;
e) descrição das sociedades de grupo societário, de fato ou de direito;
III – a relação nominal completa dos credores, sujeitos ou não à recuperação judicial, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço físico e eletrônico de cada um, a natureza, conforme estabelecido nos arts. 83 e 84 desta Lei, e o valor atualizado do crédito, com a discriminação de sua origem, e o regime dos vencimentos;
IV – a relação integral dos empregados, em que constem as respectivas funções, salários, indenizações e outras parcelas a que têm direito, com o correspondente mês de competência, e a discriminação dos valores pendentes de pagamento;
V – certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores;
VI – a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores do devedor;
VII – os extratos atualizados das contas bancárias do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras;
VIII – certidões dos cartórios de protestos situados na comarca do domicílio ou sede do devedor e naquelas onde possui filial;
IX – a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais e procedimentos arbitrais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados;
X – o relatório detalhado do passivo fiscal; e
XI – a relação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante, incluídos aqueles não sujeitos à recuperação judicial, acompanhada dos negócios jurídicos celebrados com os credores de que trata o § 3º do art. 49 desta Lei.
R: Exatamente!!!!
O termo consolidação processual se refere apenas à possibilidade de apresentar o pedido de recuperação em litisconsórcio ativo. No entanto, cada um dos litisconsortes deve preencher os requisitos para o pedido de recuperação judicial individualmente, e seus ativos e passivos serão tratados em separado.
No caso, a parte alega que, em julgamento anterior, já havia sido deferido o processamento da recuperação judicial do Grupo Econômico em consolidação processual, reconhecendo-se o entrelaçamento societário e financeiro entre as 6 empresas que compõem o grupo, admitindo-se todas no polo ativo do processo de recuperação. Assim, a Corte de origem, ao permitir a extinção do processo em relação a um dos litisconsortes, acabou por decidir matéria acobertada pela preclusão.
Segundo a doutrina, “como litisconsorte ativo facultativo, portanto, exige-se na consolidação processual que todos os requisitos exigidos pela LREF sejam preenchidos por cada um dos autores, os quais, ademais, deverão apresentar individualmente a documentação exigida no art. 51 dessa lei para se permitir a análise individualizada da crise e dos meios para o seu soerguimento pelos seus respectivos credores”.
Nesse contexto, o acórdão recorrido não trata de matéria preclusa quando analisa se a recorrente individualmente preenche os requisitos para pleitear a recuperação judicial. De fato, o que foi decidido é que as requerentes compunham um grupo econômico, o que autorizava o pedido de recuperação judicial em litisconsórcio ativo, sem que tenha sido examinado se cada uma das recuperandas preenchia isoladamente os requisitos exigidos em lei.
O deferimento de processamento da recuperação judicial em consolidação processual não impede a posterior análise do preenchimento dos requisitos para o pedido de recuperação em relação a cada um dos litisconsortes.
EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
O recebimento de comissão sobre o valor total de precatório na hipótese em que não foi integralmente pago, em razão de negociação prévia do crédito com deságio, fere a boa-fé objetiva e gera enriquecimento sem causa.
EDcl no AgInt no AREsp 1.809.319-RJ, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/8/2023, DJe 17/8/2023. (Info 783)
Tadeu celebrou contrato com o escritório de advocacia Cobrotudo, o qual se incumbiu de cobrar valor de precatório. No contrato se previa, a título de comissão, o valor correspondente a 10% dos honorários advocatícios sobre o valor do precatório. Acontece que tal crédito (precatório) foi negociado com terceiro, tendo Tadeu recebido valor inferior ao nominal, considerando o deságio da negociação.
O escritório Cobrotudo não quis nem saber e continuou a cobrar 10% sobre o valor original do crédito, balizando-se na letra estrita (e fria) do contrato. Tadeu alega que é justo que pague apenas 10% sobre o valor efetivamente recebido.
Código Civil:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
R: Obviamente que NÃO!!!!
A controvérsia é quanto a serem, ou não, devidos ao autor da demanda a integralidade da comissão estabelecida em contrato de transação em que ficou estabelecido que o autor receberia uma comissão de 10% sobre o valor dos honorários recebidos em determinada ação judicial a título de indicação de cliente e sobre eventual legitimidade dos descontos realizados.
No caso, as partes assinaram contrato em que se previa, a título de comissão, o valor correspondente a 10% dos honorários advocatícios sucumbenciais, que resultou no pagamento de precatório judicial; e em seguida, foi negociado o crédito referente ao precatório judicial com terceiros, apurando-se valor diverso daquele originariamente estabelecido, tendo em vista o deságio da negociação.
Pelo princípio da obrigatoriedade, o contrato faz lei entre as partes e é formalizado para ser cumprido. No entanto, também esse princípio não é absoluto, podendo sofrer limitações devido à teoria da imprevisão (ou cláusula rebus sic stantibus), sendo certo que, nessas hipóteses, o próprio Código Civil, no art. 478, permite a resolução do contrato caso a obrigação tenha se tornado excessivamente onerosa para uma das partes.
Isso porque, sendo o objeto do contrato precatório, que, por natureza, apresenta dificuldades concretas no recebimento em curto ou médio prazo, já era possível e, em certa medida, até esperado que pudesse haver alguma modificação na condição do crédito com o decorrer do tempo.
Nessa linha de raciocínio, é plenamente passível de valoração e análise pelo STJ o fato incontroverso e reconhecido na origem de que, após o contrato, o precatório tenha sido negociado por seu proprietário, com deságio, ensejando, assim, uma alteração concreta no valor do crédito originário. Por consequência, não se poderia concluir pela obrigatoriedade do valor de origem quando, na realidade, não foi o valor efetivamente recebido pela parte.
Ainda, o princípio da boa-fé foi introduzido na teoria dos negócios jurídicos pelo Código Civil de 2002 e prevê que as partes devem agir de forma correta antes, durante e depois do contrato. Portanto, caracteriza-se pelo comportamento esperado dos contratantes consubstanciado no dever de lealdade, de cooperação, de transparência e clareza, que deve orientar as relações em todas as fases, inclusive na de execução do contrato.
Tal pretensão, vai de encontro à boa-fé objetiva, que deve amparar as relações, configurando deslealdade contratual, cuja manutenção, além de excessivamente onerosa para uma das partes, implicaria claro enriquecimento sem causa da outra parte.
Nessa ótica, seriam devidos à parte 10% (contratuais) do valor do precatório com deságio ou do valor total dos honorários efetivamente percebidos, pois foi ela a única contraparte no contrato em questão.
O recebimento de comissão sobre o valor total de precatório na hipótese em que não foi integralmente pago, em razão de negociação prévia do crédito com deságio, fere a boa-fé objetiva e gera enriquecimento sem causa.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL
O fato de a instituição financeira ser responsável pela correção monetária e pelos juros de mora após o depósito judicial não exime o devedor de pagar eventual diferença sobre os encargos, calculados de acordo com o título, que incidem até o efetivo pagamento.
AgInt no REsp 1.965.048-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/6/2023, DJe 15/6/2023. (Info 783)
Em uma ação judicial, o devedor Creosvaldo realizou depósito judicial da quantia integral do débito APENAS para fins de deferimento da suspensão cautelar. Ao final do feito, ele acabou condenado ao pagamento da quantia executada.
Ao se atualizar o valor devido, verificou-se diferença entre o valor do depósito judicial e o débito atualizado. Inconformado, Creosvaldo interpôs sucessivos recursos nos quais alega não ser responsável pelo pagamento das diferenças, sendo esta responsabilidade da instituição financeira que deveria ter atualizado os valores depositados para corresponder ao débito corrigido no tempo.
R: Com certeza!!!
O Superior Tribunal de Justiça tem o entendimento de que os encargos estabelecidos no título apenas cessam se não houve óbice ao levantamento do valor pelo credor, sendo que, do contrário, pode este pleitear as diferenças entre os encargos pagos pela instituição financeira depositária e aqueles resultantes da previsão no título.
No caso, o depósito foi realizado apenas para fins de deferimento do pedido cautelar.
E de acordo com a jurisprudência do STJ “a satisfação da obrigação creditícia somente ocorre quando o valor a ela correspondente ingressa no campo de disponibilidade do exequente; permanecendo o valor em conta judicial, ou mesmo indisponível ao credor, por opção do devedor, por evidente, mantém-se o inadimplemento da prestação de pagar quantia certa” (REsp 1.175.763/RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 21/6/2012, DJe 5/10/2012).
A responsabilidade pela correção monetária e pelos juros de mora, após feito o depósito judicial, é da instituição financeira onde o numerário foi depositado.
Nada obstante, tal exegese não significa que o devedor fica liberado dos consectários próprios de sua obrigação, pois, no momento em que a quantia se tornar disponível para o exequente (data do efetivo pagamento), os valores depositados judicialmente, com os acréscimos pagos pela instituição bancária, deverão ser deduzidos do montante da condenação calculado na forma do título judicial ou extrajudicial. Com isso, evitar-se-á a ocorrência de bis in idem e será corretamente imputada a responsabilidade pela mora (REsp 1.475.859/RJ, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 16/8/2016, DJe 25/8/2016).
O fato de a instituição financeira ser responsável pela correção monetária e pelos juros de mora após o depósito judicial não exime o devedor de pagar eventual diferença sobre os encargos, calculados de acordo com o título, que incidem até o efetivo pagamento.
PETIÇÃO
Não cabe recurso ordinário constitucional em sede de execução em mandado de segurança.
Pet 15.753-BA, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 15/8/2023. (Info 783)
Crementino ajuizou execução individual de cumprimento de sentença derivada de Mandado de Segurança Coletivo no qual foi reconhecido o direito de todos os associados da ASPRA a perceberem o auxílio transporte, com direito ao recebimento dos valores retroativos desde a data de impetração. O Tribunal local acolheu impugnação da parte executada para reduzir o débito exequendo. Em resposta, Crementino a interpôs recurso ordinário constitucional.
Constituição Federal:
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
II – julgar, em recurso ordinário:
a) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória;
b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão;
CPC:
Art. 1.027. Serão julgados em recurso ordinário:
II – pelo Superior Tribunal de Justiça:
R: Nooops!!!!
O art. 105, II, b, da Constituição Federal prevê o cabimento de recurso ordinário para o STJ, em “mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão”.
As hipóteses de cabimento de recurso ordinário para o STJ, delineadas no art. 105, II, da Constituição Federal, bem como no art. 1.027, II, do CPC – que reproduz fielmente o texto constitucional -, constituem rol TAXATIVO. A mesma orientação é adotada pelo STF, em relação ao recurso ordinário previsto no art. 102, II, da Constituição Federal (RMS 36.462 AgR, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe de 23/4/2020).
Como já decidiu o STF, em situação análoga à dos autos, o “rol de hipóteses de cabimento do recurso ordinário, do art. 102, II, a, CF, é taxativo”, razão pela qual deve-se reconhecer o “não cabimento de recurso ordinário constitucional em sede de execução em mandado de segurança” (STF, Pet 5.397 AgR, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 9/3/2015).
Por fim, tem-se entendido no STJ que o princípio da fungibilidade recursal não é aplicável à situação em que o recurso ordinário constitucional é manejado fora das hipóteses taxativamente enumeradas no art. 105, II, do texto constitucional.
Não cabe recurso ordinário constitucional em sede de execução em mandado de segurança.
RECURSO ESPECIAL
As ações de desapropriação observam na fase de cumprimento de sentença, no que couber, o regime do art. 27, § 1º, do Decreto-Lei n. 3.365/1941, o que inclui os seus limites percentuais na fixação de honorários arbitrados com base em proveito econômico.
REsp 2.075.692-SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 8/8/2023, DJe 17/8/2023. (Info 783)
Em uma ação de desapropriação em fase de cumprimento de sentença, Pechara Advogados teve arbitrado em seu favor honorários sucumbenciais com base em juízo de equidade. Inconformado, o escritório interpôs recurso no qual sustenta que deveriam ser aplicados os percentuais previstos no CPC.
Decreto-Lei n. 3.365/1941:
Art. 27. O juiz indicará na sentença os fatos que motivaram o seu convencimento e deverá atender, especialmente, à estimação dos bens para efeitos fiscais; ao preço de aquisição e interesse que deles aufere o proprietário; à sua situação, estado de conservação e segurança; ao valor venal dos da mesma espécie, nos últimos cinco anos, e à valorização ou depreciação de área remanescente, pertencente ao réu.
§ 1o A sentença que fixar o valor da indenização quando este for superior ao preço oferecido condenará o desapropriante a pagar honorários do advogado, que serão fixados entre meio e cinco por cento do valor da diferença, observado o disposto no § 4o do art. 20 do Código de Processo Civil, não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinqüenta e um mil reais).
CPC:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 1º São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I – o grau de zelo do profissional;
II – o lugar de prestação do serviço;
III – a natureza e a importância da causa;
IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
R: Nooops!!!!
A Corte Especial firmou entendimento, em regime de recurso repetitivo (Tema 1076/STJ), a respeito de afastar o juízo de equidade na fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais, no sentido de que o arbitramento de honorários advocatícios sucumbenciais por juízo de equidade ocorrerá quando, havendo ou não condenação, o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável (= de estimação inviável ou impossível) ou irrisório (= demasiadamente insignificante), ou o valor da causa for muito baixo.
Todavia, as ações de desapropriação por utilidade pública orientam-se especialmente pelas disposições do Decreto-Lei n. 3.365/1941 e, nesse particular, destaca-se o texto do art. 27, § 1º, que estabelece base de cálculo e percentuais próprios e distintos da ordenação geral do CPC.
O preceito contempla opção do legislador pela existência de ônus de sucumbência apenas quando o valor indenizatório for superior à oferta inicial. A base de cálculo dos honorários corresponderá à diferença entre ambos, o que aparentemente elege como critério não o valor condenatório propriamente, porque este seria o equivalente à própria indenização arbitrada, mas a um parâmetro ligado à condenação.
Apesar de o texto do dispositivo fazer remissão claramente à fase de conhecimento – tanto que remete à definição da indenização e à oferta inicial, que vem consignada na petição inicial -, o Decreto-Lei disciplina a sucumbência para as ações de desapropriação. Portanto, é devida a sua observância em todas as suas fases, no que for cabível.
Sendo cabível a sucumbência no caso da fase de cumprimento de sentença, a sua estipulação é regida com base na mesma diferença entre indenização e oferta inicial, tendo em vista que esses parâmetros já foram definidos na fase de conhecimento. Nesse sentido, afasta-se a utilização da equidade – porque ausentes as hipóteses autorizativas.
No caso, a pretensão recursal deduzida objetiva não apenas o afastamento da regra de fixação por juízo de equidade, mas desde logo a fixação dos honorários entre 10% e 20% desse proveito econômico. Contudo, neste ponto, o recurso não comporta provimento porque a regulação especial do Decreto-Lei n. 3.365/1941 deve prevalecer sobre as regras gerais do CPC e, nesse sentido, os percentuais aplicáveis são menores.
Por fim, dada a inexistência das hipóteses de aplicabilidade do juízo de equidade, considera-se que o proveito econômico deve servir de base de cálculo dos honorários devidos na fase de cumprimento de sentença, a teor do art. 85, §§ 1º e 2º, do CPC, uma vez inexistente a condenação propriamente dita.
As ações de desapropriação observam na fase de cumprimento de sentença, no que couber, o regime do art. 27, § 1º, do Decreto-Lei n. 3.365/1941, o que inclui os seus limites percentuais na fixação de honorários arbitrados com base em proveito econômico.
RECURSO ESPECIAL
A Súmula 652/STJ (“A responsabilidade civil da Administração Pública por danos ao meio ambiente, decorrente de sua omissão no dever de fiscalização, é de caráter solidário, mas de execução subsidiária”) são aplicáveis à tutela do patrimônio cultural.
REsp 1.991.456-SC, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 8/8/2023, DJe 14/8/2023. (Info 783)
Uma Ação Civil Pública foi ajuizada em litisconsórcio pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina contra a União, o Município de Criciúma e o Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, objetivando a determinação de medidas de proteção e restauração do imóvel que abriga o Centro Cultural Jorge Zanatta, pertencente à União e tombado, em 2007, como patrimônio histórico e cultural pelo Município de Criciúma, que detém a cessão de uso do bem.
O Juízo de 1º Grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, a fim de condenar o Município de Criciúma e a União solidariamente, à obrigação de fazer, consistente em proteger e restaurar o imóvel ‘Centro Cultural Jorge Zanatta’ na sua integralidade. Por sua vez, o DNPM deveria proceder com a retirada de todos os testemunhos de perfuração do imóvel, dando-lhes o acondicionamento devido.
Em recurso especial, a União sustenta a responsabilidade exclusiva do Município de Criciúma, ou, noutra hipótese, a responsabilidade subsidiária ou “a responsabilidade solidária de responsabilidade subsidiária” da União.
Súmula 652/STJ:
“A responsabilidade civil da Administração Pública por danos ao meio ambiente, decorrente de sua omissão no dever de fiscalização, é de caráter solidário, mas de execução subsidiária”
R: Com certeza!!!
Trata-se, na origem, de ação civil pública – objetivando a determinação de medidas de proteção e restauração de imóvel pertencente à União e tombado, em 2007, como patrimônio histórico e cultural pelo Município de Criciúma, que detém a cessão de uso do bem.
O Tribunal de origem reconheceu a responsabilidade solidária da União. O fato de ela celebrar convênios com demais entes não a exime da responsabilidade de cuidado com os seus bens – que, ao fim e ao cabo, são bens públicos. “Uma vez realizada a cessão de uso, permanece a União, proprietária do bem, com a incumbência de fiscalizar e zelar pela integridade física do seu patrimônio”.
O critério que, por identidade de razões, serve à solução da controvérsia em julgamento é aquele definido pela Súmula 652/STJ: “A responsabilidade civil da Administração Pública por danos ao meio ambiente, decorrente de sua omissão no dever de fiscalização, é de caráter solidário, mas de execução subsidiária“., Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 16/12/2010). Essa orientação é consolidada na jurisprudência do STJ: “No caso de omissão de dever de controle e fiscalização, a responsabilidade ambiental solidária da Administração é de execução subsidiária (ou com ordem de preferência)” (REsp 1.071.741/SP
Embora o caso dos autos verse sobre a tutela do patrimônio cultural, tem-se defendido, em doutrina, que “o meio ambiente é, assim, a interação do conjunto dos elementos naturais, artificiais e culturais, que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente, compreensiva dos recursos naturais e culturais“. Como afirmou o Ministro Celso de Mello, no voto condutor do acórdão proferido na ADI 3.540/MC (Tribunal Pleno, DJU de 3/2/2006), a defesa do meio ambiente “traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral”.
As razões subjacentes à Súmula 652/STJ recomendam a extensão do regime da obrigação solidária de execução subsidiária à tutela do patrimônio cultural. Isso por configurar um modelo que, além de assegurar mais de uma via para a reparação do direito difuso, chama à responsabilidade primária aquele que deu causa direta ao dano, evitando que a maior capacidade reparatória do ente fiscalizador acabe por isentar ou até mesmo estimular a conduta lesiva.
As razões que fundamentam a Súmula 652/STJ (“A responsabilidade civil da Administração Pública por danos ao meio ambiente, decorrente de sua omissão no dever de fiscalização, é de caráter solidário, mas de execução subsidiária”) são aplicáveis à tutela do patrimônio cultural.
HABEAS CORPUS
É cabível a remição da pena pela aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, ainda que o apenado já tenha concluído o ensino médio antes de dar início ao cumprimento da pena, ressalvado o acréscimo de 1/3, com fundamento no art. 126, § 5º, da Lei de Execução Penal.
HC 786.844-SP, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Rel. para acórdão Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por maioria, julgado em 8/8/2023. (Info 783)
Creiton, apenado, requereu a remição de pena em razão de aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, o que foi negado em razão do apenado já ter concluído o ensino médio antes de dar início ao cumprimento da pena. Inconformada, a defesa de Creiton impetrou HC no qual alega ser devida a remição integral em razão da aprovação no ENEM.
LEP:
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 5o O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
R: Sim, ressalvado o acréscimo de 1/3!!!
Cinge-se a controvérsia a definir se a aprovação no ENEM autoriza a remição de pena por estudo, mesmo que o apenado já tenha concluído o ensino médio antes de dar início ao cumprimento da pena.
A despeito de as matérias nas quais o estudante é examinado no ENCCEJA – ensino médio e no ENEM possuírem nomes semelhantes, não há como se deduzir que ambos os exames tenham o mesmo grau de complexidade. Pelo contrário, é muito mais plausível depreender-se que a avaliação efetuada no ENEM contém questões mais complexas dos que as formuladas no ENCCEJA – ensino médio, sobretudo tendo em conta que a finalidade do ENEM é possibilitar o ingresso no ensino superior, o que, por certo, demanda mais empenho do executado nos estudos.
Nessa linha de entendimento, o pedido de remição de pena por aprovação (total ou parcial) no ENCCEJA – ensino médio não possui o mesmo “fato gerador” do pleito de remição de pena em decorrência de aprovação (total ou parcial) no ENEM realizado a partir de 2017. Não fosse assim, a Resolução n. 391, de 10/05/2021, do CNJ, que revogou a Recomendação n. 44/2013, teria deixado de reiterar a possibilidade de remição de pena por aprovação no ENEM, mantendo apenas a remição de pena por aprovação no ENCCEJA. Mas não foi o que ocorreu. Com isso em mente, deixar de reconhecer o direito do apenado à remição de pena por aprovação total ou parcial no ENEM é negar vigência à Resolução n. 391 do CNJ.
Transposto esse raciocínio para a situação da conclusão do ensino médio antes do ingresso do apenado no sistema prisional, é forçoso concluir, também, que sua superveniente aprovação no ENEM durante o cumprimento da pena não corresponde ao mesmo nível de esforço e ao mesmo “fato gerador” correspondente à obtenção do grau do ensino médio, não havendo que falar em concessão do benefício (remição de pena) em duplicidade pelo mesmo fato.
Devo ressalvar, por cautela, que “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica sobre a impossibilidade de nova remição pela segunda aprovação nas mesmas matérias do ensino fundamental em outro exame, a qual não pode ser duplamente considerada, sob pena de bis in idem” (AgRg no HC 608.477/SC, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe 21/6/2021). Além disso, a jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal é assente no sentido de que as 1.200 horas, correspondentes ao ensino médio, divididas por 12 (1 dia de pena a cada 12 horas de estudo) resultam em 100 dias remidos.
Portanto, idêntica forma de parametrizar a contagem do tempo a ser remido é aplicável ao ENEM, com a exceção de que o apenado aprovado em todas as áreas do ENEM, a partir de 2017, não faz jus ao acréscimo de 1/3 (um terço) previsto no art. 126, § 5º, da LEP.
É cabível a remição da pena pela aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, ainda que o apenado já tenha concluído o ensino médio antes de dar início ao cumprimento da pena, ressalvado o acréscimo de 1/3, com fundamento no art. 126, § 5º, da Lei de Execução Penal.
RECURSO EM HABEAS CORPUS
A participação dos órgãos de persecução estatal na gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem prévia autorização judicial, acarreta a ilicitude da prova
RHC 150.343-GO, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Rel. para acórdão Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por maioria, julgado em 15/8/2023. (Info 783)
Em uma investigação criminal, um dos interlocutores de uma conversa potencialmente embaraçosa, resolveu realizar uma gravação ambiental. Para tanto, contou com a colaboração do MP, que, além da orientação, forneceu os equipamentos para tanto.
Inconformada, a defesa do investigado gravado impetrou HC no qual sustenta a ilegalidade da prova em razão da participação do MP na gravação ambiental.
Lei n. 9.034/1995:
Art. 2o Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de provas:
IV – a captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise, mediante circunstanciada autorização judicial;
Lei n. 9.296/1996:
Art. 8º-A. Para investigação ou instrução criminal, poderá ser autorizada pelo juiz, a requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, quando:
I – a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes; e
II – houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou em infrações penais conexas.
§ 4º A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação.
R: Nooops!!!
Cinge-se a controvérsia à validade da captação ambiental realizada por particular sem o conhecimento do interlocutor e com o auxílio do Ministério Público ou da polícia. O parâmetro normativo, no caso, deve ser a Lei n. 9.034/1995, tendo em vista que vigente à época da produção da prova em questão.
A gravação realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, não protegida por um sigilo legal (QO no Inq. 2116, Supremo Tribunal Federal) é prova válida. Trata-se de hipótese pacífica na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, pois se considera que os interlocutores podem, em depoimento pessoal ou em testemunho, revelar o teor dos diálogos.
No entanto, a produção da prova obtida com colaboração de órgãos de persecução penal deve observar as fórmulas legais, tendo em conta a contenção da atuação estatal, cingindo-o, por princípio, às fórmulas do devido processo legal. Ao permitir a cooperação de órgão de persecução, a jurisprudência pode encorajar atuação abusiva, violadora de direitos e garantias do cidadão, até porque sempre vai pairar a dúvida se a iniciativa da gravação partiu da própria parte envolvida ou do órgão estatal.
A norma vigente à época, Lei n. 9.034/1995, com redação dada pela Lei n. 10.217/2011, exigia, expressamente, para captação ambiental, “circunstanciada autorização judicial” (art. 2º, IV).
A participação do Ministério Público na produção da prova, fornecendo equipamento, aproxima o agente particular de um agente colaborador ou de um agente infiltrado e, consequentemente, de suas restrições. Sem contar que, mesmo se procurado de forma espontânea pela parte interessada, é difícil crer que o Ministério Público não oriente o interlocutor no que concerne a conduzir a conversa quanto a quais informações seriam necessárias e relevantes, limitando-se apenas a fornecer o equipamento necessário para a gravação.
Desse modo, a participação da polícia ou do Ministério Público na produção da prova exerce a atração dos marcos legais, que, no caso, repita-se, exigiam “circunstanciada autorização judicial“. Não obtida a chancela do Poder Judiciário, opera a regra de exclusão, pois a prova em questão é ilícita.
Por fim, esse reposicionamento ainda antevê debate sobre o teor do § 4º do art. 8º-A da Lei n. 9.296/1996, inserido pela Lei n. 13.964/2019, que reabre discussão acerca da amplitude da validade da captação ambiental feita por um dos interlocutores. Tal dispositivo não se aplica ao caso, mas busca restringir esse meio de prova, considerando que essa prova só será válida sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público.
A participação dos órgãos de persecução estatal na gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem prévia autorização judicial, acarreta a ilicitude da prova
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
As mesmas garantias e prerrogativas outorgadas aos Desembargadores dos Tribunais de Justiça devem ser estendidas aos Conselheiros estaduais e distritais, no que se inclui o reconhecimento do foro por prerrogativa de função durante o exercício do cargo, haja, ou não, relação de causalidade entre a infração penal e o cargo.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Raul Araújo, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 16/8/2023. (Info 783)
Um Conselheiro de Tribunal de Contas cometeu crime comum em nada relacionado às funções. Após a denúncia, sua defesa sustenta necessário o reconhecimento do foro por prerrogativa de função durante o exercício do cargo, haja, ou não, relação de causalidade entre a infração penal e o cargo.
*Processo sob segredo de justiça. Caso imaginado.
Constituição Federal:
Art. 96. Compete privativamente:
III – aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.
R: Aparentemente, SIM!!!
Embora fixada pelo STF tese segundo a qual “o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas” (QO na APn 937/DF), a prerrogativa de interpretar as normas constitucionais que disciplinam a competência do próprio STJ permitiu à Corte afastar excepcionalmente o mencionado requisito para a fixação do foro por prerrogativa de função de Desembargadores, sob o fundamento da necessidade de garantir independência também ao órgão julgador (QO na APn 878/DF).
Do mesmo modo, a Terceira Seção e a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao enfrentarem a discussão relativa ao foro por prerrogativa de função de membros do Ministério Público, igualmente consideraram inaplicável o critério, com base na equiparação prevista no art. 96, III, da Constituição Federal (CC 177.100/CE e HC 684.254/MG).
Na atribuição de definir os limites das hipóteses de competência ratione personae do STJ, a existência de decisões excepcionando os critérios adotados pelo STF demonstra o quão pulsante é o tema. Nesse contexto, a invocação do princípio republicano não pode chegar ao limite de negar o modelo de República Federativa fixada pela própria Constituição, que abrange o arranjo de garantias e prerrogativas a determinados cargos públicos, nunca com o fim de garantir odioso privilégio pessoal, mas sim como instrumento de salvaguarda da independência e da liberdade no exercício de atribuições particularmente relevantes para a sociedade.
Compreendida a questão nestes termos, ao estabelecer critérios distintos de definição da competência ratione personae para Desembargadores e Conselheiros, o que genuinamente estará sendo feito não é interpretar o art. 105, I, a, da Constituição Federal, mas, sim, escolher quais garantias e quais prerrogativas seriam extensíveis aos Conselheiros, ignorando que o art. 73, § 3º, da Constituição Federal garante aos membros das Cortes de Contas “as mesmas garantias, prerrogativas” da magistratura.
Portanto, cabe fixar o entendimento de que a competência por prerrogativa de foro aos membros dos Tribunais de Contas, perante o Superior Tribunal de Justiça, independe de a infração penal haver sido praticada durante o exercício do cargo e de estar relacionada às funções desempenhadas.
As mesmas garantias e prerrogativas outorgadas aos Desembargadores dos Tribunais de Justiça devem ser estendidas aos Conselheiros estaduais e distritais, no que se inclui o reconhecimento do foro por prerrogativa de função durante o exercício do cargo, haja, ou não, relação de causalidade entre a infração penal e o cargo.
REVISÃO CRIMINAL
A mudança de entendimento jurisprudencial não autoriza o ajuizamento de revisão criminal, ressalvadas hipóteses excepcionalíssimas de entendimento pacífico e relevante.
RvCr 5.620-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por maioria, julgado em 14/6/2023, DJe 30/6/2023. (Info 783)
Craudião foi condenado à pena de reclusão, tudo conforme processo transitado em julgado sob a batuta da jurisprudência prevalente à época. Ocorre que, algum tempo depois houve significativa mudança de entendimento jurisprudencial que embasou a condenação e dosimetria da pena aplicada. Incansável, a combativa defesa de Craudião ajuizou revisão criminal por entender que a mudança de entendimento jurisprudencial justificaria a revisão da pena aplicada.
R: Não, ressalvadas hipóteses excepcionalíssimas de entendimento pacífico e relevante!!!!!
A controvérsia consiste em ação revisional que pretende, em síntese, o refazimento da dosimetria da pena aplicada ao sentenciado, ante a impropriedade da consideração da quantidade da droga apreendida (79 kg de maconha) em duas fases: na primeira, para exasperação da pena-base; na terceira, para o afastamento do tráfico privilegiado.
De início, consigna-se que a jurisprudência da Quinta Turma à época não reconhecia bis in idem na prática de majorar a pena-base e também afastar o tráfico privilegiado com fundamento na quantidade e/ou natureza de entorpecentes, distinguindo tal situação da julgada pelo Supremo Tribunal Federal no ARE 666.334/AM.
Sendo assim, considerando que a revisão criminal tem por objeto rever decisão monocrática que se conformava com o posicionamento do órgão colegiado ao tempo em que proferida, não há como conhecer de seus fundamentos, tendo em vista que a jurisprudência do STJ está consolidada no sentido de que “a mudança de entendimento jurisprudencial não autoriza o ajuizamento de Revisão Criminal” (AgRg no HC 439.815/SC, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 17/9/2019), a não ser em hipóteses excepcionalíssimas que não estão presentes no caso.
Ademais, não se olvida que a Terceira Seção do STJ já se pronunciou no sentido de que é “cabível o manejo da revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP em situações nas quais se pleiteia a adoção de novo entendimento jurisprudencial mais benigno, desde que a mudança jurisprudencial corresponda a um novo entendimento pacífico e relevante” (RvCr 3.900/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, DJe 15/12/2017).
Contudo, nos julgamentos em que a Terceira Seção excepcionou o entendimento de que não cabe revisão criminal em face de mudança de jurisprudência foram identificadas PECULIARIEDADES que não estão presentes no caso em análise. No julgamento da Revisão Criminal 3.900/SP, concluiu-se que a decisão revisada, na data em que proferida (6/8/2015), contrariou a jurisprudência desta Casa já consolidada anteriormente, sendo citados precedentes de 2013 em diante. Já no caso da Revisão Criminal 5.627/DF, aplicou-se o entendimento advindo de relevante alteração jurisprudencial, qual seja, reconhecimento de inconstitucionalidade do preceito secundário do art. 273 do Código Penal pelo Supremo Tribunal Federal, em recurso com repercussão geral reconhecida (RE n. 979.962/RS).
Vale frisar novamente que, a despeito de o precedente do Supremo Tribunal Federal ter sido proferido no ano de 2014 (ARE 666.334/AM), a divergência acerca da situação em que a quantidade de drogas era utilizada para negar a minorante do tráfico persistiu no âmbito desta Corte de Justiça até o início do ano de 2020. Logo, em prol da estabilidade jurídica, somente um maior distanciamento temporal permitirá concluir que a referida jurisprudência ostenta a força necessária para, excepcionalmente, reverter provimentos jurisdicionais definitivos, como é o caso.
Desse modo, o caso em discussão se distingue dos dois referidos precedentes, seja porque a decisão revisada se conformava à jurisprudência do colegiado ao tempo em que proferida, seja porque o entendimento jurisprudencial que se sucedeu não foi consolidado em precedente qualificado. Logo, não parece ser o caso de excepcionar o entendimento firme desta Terceira Seção quanto ao não cabimento de revisão criminal em face de mudança de entendimento jurisprudencial.
A mudança de entendimento jurisprudencial não autoriza o ajuizamento de revisão criminal, ressalvadas hipóteses excepcionalíssimas de entendimento pacífico e relevante.
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