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Informativo STJ 771 Comentado

Informativo nº 771 do STJ COMENTADO saindo do forno (quentinho) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!

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DIREITO PREVIDENCIÁRIO

1.      Cessão de crédito inscrito em precatório oriundo de ação previdenciária

RECURSO ESPECIAL

O crédito inscrito em precatório oriundo de ação previdenciária pode ser objeto de cessão a terceiros.

A possibilidade de cessão de precatórios decorrentes de ações previdenciárias não impede o juiz de controlar ex officio a validade de sua transmissão, negando a produção de efeitos a negócios jurídicos eivados de nulidade, independentemente de ajuizamento de ação própria.

REsp 1.896.515-RS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 11/4/2023, DJe 17/4/2023. (Info 771)

1.1.  Situação FÁTICA.

Creosvaldo ajuizou ação em face do INSS. Já em cumprimento de sentença, comunicou a cessão do respectivo Crédito à Creide, tendo o juízo de primeira instância, de ofício, negado a produção de efeitos do negócio jurídico ao fundamento de que o art. 114 da Lei n. 8.213/1991 obsta a transferência creditícia decorrente de prestações previdenciárias. 

Inconformada, Creide interpôs recurso alegando que o crédito inscrito em precatório decorrente de parcelas vencidas de benefício previdenciário poderia ser objeto de cessão a terceiros.

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.     Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.213/1991:

Art. 114. Salvo quanto a valor devido à Previdência Social e a desconto autorizado por esta Lei, ou derivado da obrigação de prestar alimentos reconhecida em sentença judicial, o benefício não pode ser objeto de penhora, arresto ou seqüestro, sendo nula de pleno direito a sua venda ou cessão, ou a constituição de qualquer ônus sobre ele, bem como a outorga de poderes irrevogáveis ou em causa própria para o seu recebimento.

Constituição Federal:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. 

§ 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham 60 (sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave, ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.            

§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado.     

§ 13. O credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor, não se aplicando ao cessionário o disposto nos §§ 2º e 3º.        

§ 14. A cessão de precatórios, observado o disposto no § 9º deste artigo, somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao Tribunal de origem e ao ente federativo devedor.   

Código Civil:

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

I – celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

III – o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;

IV – não revestir a forma prescrita em lei;

V – for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;

VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa;

VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.

§ 1 Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I – aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II – contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III – os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2 Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.

Art. 168. As nulidades dos artigos antecedentes podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

1.2.2.     Possível a cessão a terceiros?

R: Tá valendo!!!!

A controvérsia consiste em definir se, à luz do art. 114 da Lei n. 8.213/1991, o crédito inscrito em precatório decorrente de parcelas vencidas de benefício previdenciário pode ser objeto de cessão a terceiros.

Nos termos do art. 100, §§ 13 e 14, da Constituição Federal, na redação conferida pela EC n. 62/2009, o titular de créditos inscritos em precatório pode cedê-los a terceiros sem necessidade de anuência da Fazenda Pública, sendo a produção de efeitos do negócio jurídico condicionada apenas à comunicação ao tribunal de origem e à entidade devedora.

Depreende-se que o legislador constituinte não restringiu a cessão de precatórios em função da natureza do crédito da qual se origina, alcançando, por conseguinte, os débitos alimentares, definidos pelo § 1º do art. 100 da Lei Maior como “[…] aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil”.

Nesses casos, por expressa previsão do destacado § 13, conquanto preservada a natureza alimentar dos precatórios cedidos, a transferência creditícia implica o afastamento das preferências subjetivas arroladas nos §§ 2º e 3º do art. 100 da Constituição Federal.

Além disso, a instituição de mecanismo de transmissão desses créditos tem por escopo facultar ao credor, mediante negociações entabuladas com eventuais interessados na sua aquisição com deságio, a percepção imediata de valores que somente seriam obtidos quando da quitação da dívida pelo poder público, cuja notória demora no adimplemento fomenta a instituição de mercado dos respectivos títulos.

Por essa sistemática, outorga-se ao credor juízo definitivo acerca do interesse em receber os valores a que faz jus de maneira expedita, embora com redução do montante em virtude de acordos onerosos firmados com terceiros, ou aguardar a quitação integral do título pela entidade devedora em momento posterior. Trata-se de regramento FAVORÁVEL ao credor, maior interessado na eventual formalização de ajustes privados para permitir a satisfação de direito reconhecido judicialmente em tempo hábil a suprir-lhe as necessidades financeiras.

Portanto, a cessão de créditos inscritos em precatórios, autorizada pelo art. 100, §§ 13 e 14, da Constituição Federal, permite ao credor, mediante negociações entabuladas com eventuais interessados na aquisição do direito creditício com deságio, a percepção imediata de valores que somente seriam obtidos quando da quitação da dívida pelo poder público, cujo notório inadimplemento fomenta a instituição de mercado dos respectivos títulos, abrangendo, inclusive, as parcelas de natureza alimentar.

1.2.3.     É possível o controle do negócio jurídico pelo juízo?

R: Yeap!!!!

Apesar da viabilidade de cessão de precatórios decorrentes de ações previdenciárias, ressalva-se o controle judicial ex officio de acordos entabulados entre segurados e cessionários, notadamente para afastar eventuais transações abusivas firmadas em casos de premente necessidade econômica de pessoas vulneráveis.

As transferências de precatórios são perpetradas mediante instrumentos públicos ou particulares, qualificando-se como negócios jurídicos por meio dos quais o credor cede o seu direito obrigacional a terceiro, denominado de cessionário, que assume a posição daquele na relação havida com a Fazenda Pública, a qual não pode se opor à transação, nos termos do citado art. 100, § 13, da Constituição Federal.

Dessa maneira, tratando-se de acordos firmados entre particulares para a transmissão de direitos, aplicam-se a eles as causas de nulidade dos negócios jurídicos privados (arts. 166 e 167 do Código Civil).

Essas hipóteses revelam nulidade absoluta, razão pela qual, tratando-se de matéria de ordem pública, pode o juiz, de ofício, reconhecer a invalidade e negar a produção de efeitos aos respectivos negócios jurídicos sempre que tiver conhecimento da avença, independentemente de ajuizamento de ação própria, nos termos do art. 168, parágrafo único, do Código Civil.

Outrossim, a possibilidade de controle judicial dos negócios jurídicos relativos à cessão de precatórios não contraria o princípio da demanda previsto nos arts. 42 e 141 do CPC/2015, porquanto, a par da expressa autorização prevista no art. 168, parágrafo único, do Código Civil, tais transferências creditícias são praticadas na fase de cumprimento de sentença, na qual incumbe ao magistrado identificar o destinatário da ordem de pagamento, certificando-se da regularidade da transmissão dos respectivos créditos, de modo a garantir a escorreita satisfação do título judicial.

Além disso, sendo vedado à Fazenda Pública opor-se à cessão de precatório, impedir o magistrado de aferir a regularidade da transação abre margem a abusos praticados por agentes econômicos que, ante necessidade financeira de parcela dos segurados do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, podem impor condições excessivamente gravosas a pessoas socioeconomicamente vulneráveis para a obtenção imediata de recursos financeiros.

Dessa forma, embora possível a cessão de precatórios decorrentes de ações previdenciárias, pode o juiz controlar, de ofício, a validade das respectivas transferências creditícias, negando a produção de efeitos a negócios jurídicos eivados de nulidade.

1.2.4.     Resultado final.

O crédito inscrito em precatório oriundo de ação previdenciária pode ser objeto de cessão a terceiros. A possibilidade de cessão de precatórios decorrentes de ações previdenciárias não impede o juiz de controlar ex officio a validade de sua transmissão, negando a produção de efeitos a negócios jurídicos eivados de nulidade, independentemente de ajuizamento de ação própria.

DIREITO CIVIL

2.      Bem imóvel adquirido no curso da demanda executiva como motivo de afastamento da impenhorabilidade do bem de família.

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

O fato de o bem imóvel ter sido adquirido no curso da demanda executiva não afasta a impenhorabilidade do bem de família.

AgInt nos EDcl no AREsp 2.182.745-BA, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 18/4/2023. (Info 771)

2.1.  Situação FÁTICA.

Em uma execução movida por Cobromesmo em face de Crementina, foi determinada a penhora do imóvel recém-adquirido por esta. Crementina alegou a impenhorabilidade do bem, tese acatada pelo juízo de primeiro grau.

Inconformada, Cobromesmo interpôs sucessivos recursos nos quais alega que houve violação da exceção prevista no art. 4º da Lei 8.009/90, referente à penhora sobre bem de família, uma vez que o imóvel fora adquirido pela devedora após ajuizada a ação de execução de origem.

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.     Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.009/1990:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;

III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida;                

IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;

V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;

VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.                 

2.2.2.     O fato de ser adquirido após o início da execução afasta a impenhorabilidade?

R: Nooops!!!!

As regras que estabelecem hipóteses de impenhorabilidade não são absolutas. O art. 3º da Lei n. 8.009/1990 prevê uma série de EXCEÇÕES à impenhorabilidade.

A aquisição do imóvel posteriormente à dívida não configura, por si só, fraude à execução, tampouco afasta proteção conferida ao bem de família (REsp 573.018/PR, relator Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, julgado em 9/12/2003, DJ 14/6/2004, p. 235, e REsp 1.792.265/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 14/12/2021, DJe 14/3/2022).

A regra de impenhorabilidade do bem de família trazida pela Lei n. 8.009/1990 deve ser examinada à luz do princípio da BOA FÉ OBJETIVA, que, além de incidir em todas as relações jurídicas, constitui diretriz interpretativa para as normas do sistema jurídico pátrio.

2.2.3.     Resultado final.

O fato de o bem imóvel ter sido adquirido no curso da demanda executiva não afasta a impenhorabilidade do bem de família.

3.      (Im)Possibilidade de responsabilização do fabricante de medicamento por reação adversa descrita na bula, risco inerente ou intrínseco à sua própria utilização

RECURSO ESPECIAL

Não é possível responsabilizar o fabricante de medicamento por reação adversa descrita na bula, risco inerente ou intrínseco à sua própria utilização.

REsp 1.402.929-DF, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/4/2023. (Info 771)

3.1.  Situação FÁTICA.

Craudete ingeriu dois comprimidos com o princípio ativo dipirona. Após alguns dias, começou a passar muito mal e foi internada, ocasião em que foi diagnosticada com a Síndrome de Stevens-Johnson, doença desencadeada pela alergia ao consumo dos comprimidos.

Inconformada, ajuizou ação em face do fabricante do medicamento postulando a condenação deste ao pagamento de danos morais e materiais. Por sua vez, o fabricante alega que tal risco constava na bula, razão pela qual não deveria ser responsabilizado.

3.2.  Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.     Possível a responsabilização?

R: Nooops!!!!

A reação adversa, por si só, não constitui motivo suficiente para configurar a responsabilidade do fabricante do medicamento. Isso porque a teoria do risco da atividade do negócio ou empreendimento adotada no Sistema do Código de Defesa do Consumidor não tem caráter absoluto, integral ou irrestrito, na medida em que admite exceções ou exclusões, dado que o dever de indenizar exige requisitos específicos, entre os quais o defeito do produto, sem o qual não se configura a responsabilidade civil objetiva do fornecedor.

Os medicamentos caracterizam-se como produtos de risco intrínseco, inerente, nos quais os perigos decorrem da sua própria utilização e da finalidade para a qual se destinam, sendo do conhecimento comum que a inoculação de qualquer remédio, seja por via oral ou injetável, tem potencial para ensejar reações adversas, as quais, ainda que sejam suportadas pelo consumidor, não configuram defeito do produto, afastando, em consequência, a obrigação de indenizar, desde que a potencialidade e a frequência desses efeitos nocivos estejam descritas na bula, em cumprimento ao dever de informação do fabricante.

A responsabilidade do fornecedor de medicamentos, segundo o sistema adotado pelo Código de Defesa de Consumidor, restringe-se aos casos em que for constatado defeito no produto, seja de concepção, fabricação ou de informação, e não os riscos normais e esperados, assim considerados os decorrentes da própria nocividade dos efeitos adversos de seus princípios ativos, situação que se verifica na generalidade dos casos de administração de remédios.

Essa conclusão não se altera em decorrência do medicamento estar incluído entre aqueles que podem ser adquiridos sem necessidade de prescrição médica, por apresentarem baixo grau de risco em sua ingestão, nocividade reduzida, destinarem-se ao tratamento de enfermidades simples e passageiras e não terem potencial de causar dependência física ou psíquica, conforme previsto em regulamentação específica. A dipirona preenche esses requisitos, diante da constatação de que a possibilidade de reação alérgica é ocorrência imprevisível e de incidência remotíssima.

Sendo incontestável a eficiência da dipirona para os fins a que se destina (analgésico e antitérmico), associada ao fato de que a reação alérgica que acometeu a parte autora da ação, a despeito de gravíssima, está descrita na bula, não decorre propriamente de defeito do fármaco, mas de IMPREVISÍVEL característica do sistema imunológico do paciente, não há que se falar em defeito do produto, pressuposto básico para a obrigação de indenizar do fornecedor.

3.2.2.     Resultado final.

Não é possível responsabilizar o fabricante de medicamento por reação adversa descrita na bula, risco inerente ou intrínseco à sua própria utilização.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

4.      Cópia de calendário obtido na página eletrônica do tribunal de origem como documento idôneo para fins de comprovação de interrupção ou suspensão de prazo processual

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

A cópia de calendário obtido na página eletrônica do tribunal de origem pode ser considerada documento idôneo para fins de comprovação de interrupção ou suspensão de prazo processual.

EAREsp 1.927.268-RJ, Rel. Ministro Raul Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado em 19/4/2023. (Info 771)

4.1.  Situação FÁTICA.

Em uma ação cível, o recurso interposto por Dr. Creisson não foi conhecido por ser considerado intempestivo. Ocorre que o relator deixou de considerar feriado local no tribunal de origem, o que fora alegado e comprovado com cópia de calendário obtido na página eletrônica do tribunal de origem.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.     Documento idôneo para comprovar feriado local?

R: Yeaph!!!

O STJ, a esse respeito, tem diversos julgados no sentido de que a cópia de calendário obtido na página eletrônica do tribunal de origem não pode ser considerada documento idôneo para fins de comprovação de interrupção ou suspensão de prazo processual, sendo necessária a juntada de cópia de lei ou ato administrativo comprovando a ausência de expediente forense na data.

Contudo, a questão está a merecer nova apreciação da Corte Especial, tendo em vista a existência de precedente firmado no âmbito da Primeira Turma do STF, consagrando entendimento inverso, no RMS 36.114/AM. Em tal julgado reformou-se o acórdão proferido por este Tribunal Superior, no julgamento do MS 23.896/AM, reconhecendo-se, ao final, a idoneidade do calendário judicial do tribunal de origem, extraído da internet, como forma de comprovação da tempestividade recursal.

Portanto, há no STJ de duas orientações antagônicas. Uma no sentido da idoneidade do calendário judicial obtido pela parte junto ao site do tribunal de origem como meio de prova da ocorrência de feriado local. A outra, no sentido de não ser hábil à comprovação da ausência de expediente forense a juntada de cópia de calendário editado pelo Tribunal de origem, pois, para tanto, é necessária a juntada de cópia de lei ou de ato administrativo exarado pela Corte de origem.

Acerca da temática, deve prevalecer como correto o novo entendimento veiculado pela Ministra Nancy Andrighi, no mencionado AgInt no MS 28.177/DF, concluindo ser mais adequado alinhar nossa jurisprudência àquela, mais liberal e justa, firmada no STF, que, ao examinar recurso ordinário em mandado de segurança, reformou o acórdão do STJ nos MS 23.896/AM e REsp 1.643.652/AM, para reconhecer como idônea a juntada de calendário judicial, disponibilizado no site do Tribunal de Justiça, para fins de demonstração de suspensão do expediente.

Entende-se que a comprovação de suspensão do expediente no tribunal local pode ser realizada pelas partes e seus advogados de forma mais ampla, inclusive por meio da apresentação de documentos disponibilizados, via internet, pelos próprios Tribunais, diante de sua confiabilidade e de seu caráter informativo oficial.

Com efeito, à luz da Lei n. 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial, as informações processuais disponibilizadas por meio da Internet, na página eletrônica dos Tribunais de Justiça e/ou Tribunais Regionais Federais, ostentam natureza oficial, gerando para as partes que as consultam a presunção de correção e confiabilidade. A referida norma confere caráter oficial às informações prestadas pelos Tribunais em sua página na internet, de maneira que, uma vez lançada a informação, no calendário judicial, da existência de suspensão de prazo, deve esta ser considerada para fins de contagem do lapso recursal.

O STJ já se pronunciou no sentido da oficialidade das informações processuais divulgadas, via internet, pelos Tribunais. No julgamento do REsp 1.324.432/SC (Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 17/12/2012, DJe 10/5/2013), concluiu-se corretamente a respeito das informações acerca do “andamento processual” provenientes de fonte oficial, que não podem servir de meio para confundir/punir as partes, levando-as a comportamentos equivocados e prejudiciais a seus interesses formais e materiais, conduzindo-as à perda de oportunidades processuais preclusivas.

Assim, conclui-se que não há como afastar a oficialidade e a confiabilidade do calendário judicial disponibilizado pelos Tribunais na internet, para fins de comprovação da suspensão do expediente forense a influenciar na contagem dos prazos processuais. Portanto, é devida a sua juntada aos autos pela parte, oportunamente, para o fim de comprovar a tempestividade do recurso.

4.2.2.     Resultado final.

A cópia de calendário obtido na página eletrônica do tribunal de origem pode ser considerada documento idôneo para fins de comprovação de interrupção ou suspensão de prazo processual.

5.      (Im)Possibilidade de a penhora de salário em execução de dívida de natureza não alimentar

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL

Na hipótese de execução de dívida de natureza não alimentar, é possível a penhora de salário, ainda que este não exceda 50 salários mínimos, quando garantido o mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família.

EREsp 1.874.222-DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, por maioria, julgado em 19/4/2023. (Info 771)

5.1.  Situação FÁTICA.

Em uma execução na qual se cobrava dívida de natureza não alimentar, Craudio requereu a penhora de parte do salário de Nirso, tendo em vista que as demais medidas executivas se mostraram vãs.

Foi deferida a penhora do salário de Nirso no percentual de 30%. Inconformado, o devedor interpôs sucessivos recursos nos qual alega que o ato constritivo agrediria a garantia do executado e de seu núcleo essencial.

5.2.  Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.     Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 833. São impenhoráveis:

§ 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º , e no art. 529, § 3º .

5.2.2.     Possível a penhora do salário?

R: Como diria o Prof. Raimundo: “E o salário, oh!”

A divergência reside em definir se, na hipótese de pagamento de dívida de natureza não alimentar, a impenhorabilidade está condicionada apenas à garantia do mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família ou se, além disso, há que ser observado o limite mínimo de 50 salários-mínimos recebidos pelo devedor.

De precedente da Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça (EREsp 1.518.169/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Rel. para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 3/10/2018, DJe 27/2/2019), é possível extrair que a exegese do dispositivo processual (art. 649, IV, do CPC/1973) deve ser orientada também pela teoria do mínimo existencial, admitindo a penhora da parcela salarial excedente ao que se pode caracterizar como notadamente alimentar. Prosseguindo e lançando o olhar sobre o critério previsto no § 2º do art. 833 do CPC/2015 – na parte alusiva às importâncias excedentes a 50 salários mínimos mensais – salientou-se o descompasso do critério legal com a realidade brasileira, a implicar na sua ineficácia.

Ao suprimir a palavra “absolutamente” no caput do art. 833, o novo Código de Processo Civil passa a tratar a impenhorabilidade como relativa, permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade.

Esse juízo de ponderação entre os princípios simultaneamente incidentes na espécie há de ser solucionado à luz da dignidade da pessoa humana, que resguarda tanto o devedor quanto o credor, e mediante o emprego dos critérios de RAZOABILIDADE e PROPORCIONALIDADE.

A fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família. Segundo a doutrina, “Restringir a penhorabilidade de toda a ‘verba salarial’ ou apenas permití-la no que exceder cinquenta salários mínimos, mesmo quando a penhora de uma parcela desse montante não comprometa a manutenção do executado, pode caracterizar-se como aplicação inconstitucional da regra, pois prestigia apenas o direito fundamental do executado, em detrimento do direito fundamental do exequente”.

Portanto, mostra-se possível a relativização do § 2º do art. 833 do CPC/2015, de modo a se autorizar a penhora de verba salarial inferior a 50 salários mínimos, em percentual condizente com a realidade de cada caso concreto, desde que assegurado montante que garanta a dignidade do devedor e de sua família.

Importante salientar, porém, que essa relativização reveste-se de caráter EXCEPCIONAL e dela somente se deve lançar mão quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução e, repita-se, desde que avaliado concretamente o impacto da constrição sobre os rendimentos do executado.

5.2.3.     Resultado final.

Na hipótese de execução de dívida de natureza não alimentar, é possível a penhora de salário, ainda que este não exceda 50 salários mínimos, quando garantido o mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família.

6.      Ausência de intimação da decisão que implicou o provimento parcial do recurso interposto pela parte contrária como motivo de cabimento de ação rescisória.

AÇÃO RESCISÓRIA

A ausência de intimação da decisão que implicou o provimento parcial do recurso interposto pela parte contrária é sempre prejudicial ao recorrido, sendo cabível o manejo de ação rescisória.

AR 6.463-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 12/4/2023. (Info 771)

6.1.  Situação FÁTICA.

Após o julgamento unipessoal de agravo em recurso especial, a secretaria do STJ, em virtude de equívoco na autuação, efetuou a publicação em nome de advogado que não tinha e nunca teve representação nos autos e não em nome do único advogado constituído pelo autor na ação originária.

Não houve apresentação de recurso e foi certificado o trânsito em julgado. Inconformada, a parte derrotada ajuizou ação rescisória na qual alega prejuízo em razão da intimação ausente/equivocada.

6.2.  Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.     Questão JURÍDICA.

CPC 2015:

Art. 272. Quando não realizadas por meio eletrônico, consideram-se feitas as intimações pela publicação dos atos no órgão oficial.

§ 2º Sob pena de nulidade, é indispensável que da publicação constem os nomes das partes e de seus advogados, com o respectivo número de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, ou, se assim requerido, da sociedade de advogados.

6.2.2.     Cabível a ação rescisória?

R: Mas é claro!!!!!

Cinge-se a controvérsia a analisar a rescisão da decisão impugnada por ausência de intimação válida do advogado na ação originária.

Em caso versando sobre “a possibilidade do manejo da ação rescisória, no caso de reconhecimento de nulidade absoluta, pela falta de intimação do procurador do recorrente acerca dos atos processuais praticados”, esta Corte concluiu que “a exclusividade da querela nullitatis para a declaração de nulidade de decisão proferida sem regular citação das partes, representa solução extremamente marcada pelo formalismo processual. […] A desconstituição do acórdão rescindendo pode ocorrer tanto nos autos de ação rescisória ajuizada com fundamento no art. 485, V, do CPC/1973 quanto nos autos de ação anulatória, declaratória ou de qualquer outro remédio processual” (STJ, REsp 1.456.632/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 7/2/2017, DJe 14/2/2017).

Assim sendo, é admissível a presente ação rescisória para declarar a nulidade da intimação do autor após o julgamento unipessoal do recurso especial interposto pelo réu.

Na hipótese, após o julgamento unipessoal do AREsp 1.370.930/SP em 29/11/2018, a Secretaria desta Corte, em virtude de equívoco na autuação, efetuou a publicação, em 7/12/2018, em nome de advogado que não tinha e nunca teve representação nos autos e não em nome do único advogado constituído pelo autor na ação originária.

O § 2º do art. 272 do CPC 2015 dispõe que: “Sob pena de nulidade, é indispensável que da publicação constem os nomes das partes e de seus advogados, com o respectivo número de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, ou, se assim requerido, da sociedade de advogados”. Assim, a publicação da decisão unipessoal desta Corte em nome de advogado que nunca representou o autor nos autos da ação originária implicou violação manifesta ao disposto no § 2º do art. 272 do CPC 2015.

Como decidido pelo STJ, em mais de uma oportunidade, a ausência de intimação da parte em virtude de equívoco na autuação autoriza a rescisão do julgado. “A ausência de intimação do recorrido, por erro na autuação do recurso especial, para a apresentação de contrarrazões e demais atos da parte constitui violação literal ao disposto no § 1º do art. 236 do Código de Processo Civil de 1973, possibilitando-se a rescisão do julgado com fundamento no art. 485, V, do mesmo estatuto“.

Em suma, a ausência de intimação da decisão que implicou o provimento parcial do recurso interposto pela parte contrária é sempre prejudicial ao recorrido. Nessa direção, o STJ já observou que “o defeito ou a ausência de intimação – requisito de validade do processo (arts. 236, § 1º, e 247 do CPC/1973) – impedem a constituição da relação processual e constituem temas passíveis de exame em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de forma, alegação de prejuízo ou provocação da parte. Trata-se de vícios transrescisórios”.

Impõe-se concluir pela procedência do primeiro pedido rescisório (CPC 2015, art. 968, inciso I) para reconhecer que a publicação da decisão rescindenda em nome de advogado que nunca representou o autor nos autos da ação originária violou literalmente o disposto no art. 272, § 2º, do CPC 2015.

6.2.3.     Resultado final.

A ausência de intimação da decisão que implicou o provimento parcial do recurso interposto pela parte contrária é sempre prejudicial ao recorrido, sendo cabível o manejo de ação rescisória.

7.      Reparação de prejuízos causados pela compensação e depósito de cheque nominal.

RECURSO ESPECIAL

É extra petita a decisão que, em ação de reparação de prejuízos supostamente causados pela compensação e posterior depósito de cheque nominal endossado por quem não tinha poderes para tanto, condena a instituição financeira ao pagamento do valor das cártulas indevidamente compensadas.

REsp 2.035.370-DF, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/4/2023. (Info 771)

7.1.  Situação FÁTICA.

Crementino ajuizou ação em face do Banco Brasa por meio da qual requereu a restituição dos prejuízos resultantes da desídia imputada à instituição financeira demandada ao deixar de conferir a regularidade de endossos lançados em cheques por ela compensados, equivalente aos valores despendidos para pôr fim às demandas judiciais contra ela ajuizadas pelos emitentes das cártulas, acrescido do numerário que viesse a ser despendido nos demais feitos que ainda estavam em curso.

O tribunal local, para encurtar a conversa, foi logo condenando o Banco ao pagamento de valores referentes às cártulas indevidamente compensadas. Inconformado, o banco interpôs recurso no qual sustenta que houve julgamento extra petita.

7.2.  Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.     Extra petita?

R: Yeaph!!!!

A pretensão da parte autora era a restituição dos prejuízos resultantes da desídia imputada à instituição financeira demandada ao deixar de conferir a regularidade de endossos lançados em cheques por ela compensados, equivalente aos valores despendidos para pôr fim às demandas judiciais contra ela ajuizadas pelos emitentes das cártulas, acrescido do numerário que viesse a ser despendido nos demais feitos que ainda estavam em curso. Contudo, o Tribunal de origem foi logo condenando a parte ré ao pagamento de valores referentes às cártulas indevidamente compensadas, com correção monetária e juros de mora desde a data das respectivas compensações bancárias.

Ao assim decidir, o órgão julgador concedeu providência jurisdicional diversa da requerida, em flagrante desrespeito ao princípio da congruência, impondo a devolução dos autos à origem para novo julgamento da apelação.

Em que pese já ter sido concomitantemente examinado na origem o pedido de reparação dos prejuízos alegadamente sofridos em virtude da desídia imputada à instituição financeira, que a autora não possuía, naquele momento, interesse recursal para se irresignar contra o acórdão que, ao fim e ao cabo, concedeu-lhe provimento jurisdicional distinto, daí a necessidade de se determinar o retorno dos autos à origem de modo a facultar o pleno exercício do direito fundamental à jurisdição efetiva em todos os graus recursais.

É que, em regra, a decretação de nulidade é a sanção prevista para a hipótese de decisão extra ou ultra petita, somente podendo ser relativizada, mediante o decote da parte que excede à pretensão manifestada, se não houver prejuízo para as partes. Havendo prejuízo para uma das partes, como ocorre na espécie, proclama-se a nulidade de todo o julgado.

Além disso, nas razões da apelação foi aventada a hipótese de cerceamento de defesa em virtude do indeferimento do pedido de produção de provas, de modo que, calcada a improcedência do pedido de reparação de prejuízos na ausência de prova quanto aos fatos constitutivos do direito da autora, impõe-se mesmo determinar o rejulgamento da apelação em toda a sua extensão.

7.2.2.     Resultado final.

É extra petita a decisão que, em ação de reparação de prejuízos supostamente causados pela compensação e posterior depósito de cheque nominal endossado por quem não tinha poderes para tanto, condena a instituição financeira ao pagamento do valor das cártulas indevidamente compensadas.

8.      Tema 1076 e aplicabilidade em ação extinta sem resolução de mérito, conquanto se trate de uma situação de fato.

RECURSO ESPECIAL

A circunstância de a ação ter sido extinta sem resolução de mérito, conquanto se trate de uma situação de fato, não é suficientemente relevante para aplicar distinguishing em relação ao precedente firmado no julgamento do Tema 1076, especialmente porque essa circunstância fática também estava presente em dois dos recursos representativos daquela controvérsia e, ainda assim, a Corte Especial compreendeu se tratar de hipótese em que a regra do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, igualmente deveria ser aplicada de maneira literal.

REsp 1.743.330-AM, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Rel. para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 11/04/2023, DJe 14/04/2023 (Info 771)

8.1.  Situação FÁTICA.

Geremias interpôs embargos de terceiro sob a alegação de que estava sofrendo ameaça de constrição de um imóvel que lhe pertencia. Em recurso, o Tribunal local extinguiu os embargos sem resolução do mérito e fixou honorários de 10% sobre o valor da causa, conforme definido no tema 1076.

8.2.  Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.     Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I – o grau de zelo do profissional;

II – o lugar de prestação do serviço;

III – a natureza e a importância da causa;

IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:

I – mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;

II – mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;

III – mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;

IV – mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;

V – mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

8.2.2.     Cabe honorários mesmo sem resolução de mérito?

R: Sim sinhô (e sinhora)!

O propósito recursal consiste em definir se, em embargos de terceiro extintos sem resolução do mérito por ausência de interesse processual, aplica-se o Tema repetitivo 1076, impondo-se o arbitramento de honorários advocatícios sucumbenciais ao patrono do vencedor no percentual de 10 a 20% sobre o valor atualizado da causa.

Deve-se verificar, para a conclusão do entendimento a seguir exposto, dois relevantes momentos históricos do STJ. São eles:

O primeiro desses momentos é o julgamento do REsp 1.746.072/PR, perante a Segunda Seção, cujo acórdão foi publicado no DJe 29/3/2019. Naquela ocasião, esta Corte deu o primeiro sinal concreto de que poderia mudar a sua histórica orientação a respeito da possibilidade de fixação equitativa de honorários advocatícios quando a fixação rígida resultasse em verba demasiadamente vultosa.

O segundo momento é o recente julgamento do Tema 1076, perante a Corte Especial, cujos acórdãos foram publicados em 31/5/2022, em que aquela sinalização inicial se materializou em forma de um precedente vinculante. Nesse julgamento, houve debate acerca da desproporcionalidade, irrazoabilidade, necessidade de conformação constitucional e injustiça, fundando-se naquilo que havia de mais profundo e moderno na doutrina da sociologia jurídica, da filosofia jurídica, da teoria da constituição e da teoria geral do direito, o que pode ser observado no voto vencido.

Registre-se, ainda, que o fato de a ação ser extinta sem resolução de mérito foi expressamente considerado no precedente, compreendendo a Corte Especial que a tese firmada no julgamento do Tema 1076 seria aplicável também nessa hipótese.

A distinção – que permite que os órgãos fracionários se afastem de um precedente vinculante firmado no julgamento de recursos especiais submetidos ao rito dos repetitivos somente poderá existir diante de uma hipótese fática diferente daquela considerada relevante para a formação do precedente.

Não se deve, portanto, reconhecer a existência de uma distinção entre o precedente firmado no Tema 1076 e a hipótese em exame, de modo a impor-se solução jurídica diversa, razão pela qual é preciso dar balizas exatas ao que se deve compreender como distinguishingQuanto a esse ponto: “ao contrário do que ocorre na revogação de precedentes, a diferenciação de casos pode ser realizada por qualquer magistrado, não existindo problemas atinentes à competência, havendo a possibilidade de distinção de um precedente do STF por um juiz de primeiro grau. É uma espécie de técnica que visa o afastamento de um precedente não por ele ser injusto, mas simplesmente por não se adequar à situação fática”.

Não há que se falar em distinção pela injustiça, pela desproporcionalidade, pela irrazoabilidade, pela falta de equidade ou pela existência de outros julgados do Supremo Tribunal Federal que não se coadunariam com o precedente, pois tais circunstâncias importariam na eventual necessidade de superação do precedente, mas não no uso da técnica de distinção, que é lícito fazer, quando de sua aplicabilidade prática, mas desde que presente uma circunstância fática distinta. Tais circunstâncias, quando muito, importariam na eventual necessidade de superação do precedente, mas jamais no uso da técnica de distinção que se pode fazer quando de sua aplicabilidade prática, desde que presente uma circunstância fática distinta.

Assim, o art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, deverá ser aplicado, de forma literal, pelos órgãos fracionários do STJ se e enquanto não sobrevier modificação desse entendimento pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 1.412.073/SP, do RE 1.412.074/SP e do RE 1.412.069/PR, todos em tramitação perante o Supremo Tribunal Federal, ou se e enquanto não sobrevier, no STJ, a eventual superação do precedente formado no julgamento do Tema 1076.

8.2.3.     Resultado final.

A circunstância de a ação ter sido extinta sem resolução de mérito, conquanto se trate de uma situação de fato, não é suficientemente relevante para aplicar distinguishing em relação ao precedente firmado no julgamento do Tema 1076, especialmente porque essa circunstância fática também estava presente em dois dos recursos representativos daquela controvérsia e, ainda assim, a Corte Especial compreendeu se tratar de hipótese em que a regra do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, igualmente deveria ser aplicada de maneira literal.

9.      (I)Legitimidade da sociedade empresária para figurar no polo passivo da fase executiva em ação de dissolução parcial de sociedade por cotas

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL

Em ação de dissolução parcial de sociedade por cotas, a sociedade empresária possui legitimidade para figurar no polo passivo da fase executiva, ainda que não tenha sido citada e não tenha integrado a fase de conhecimento, quando todos que participavam do quadro social integraram a lide e não se constata prejuízos às partes.

AgInt no AgInt no REsp 1.922.029-DF, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 18/4/2023. (Info 771)

9.1.  Situação FÁTICA.

Em uma ação de dissolução parcial de sociedade por cotas, passou-se a discutir a legitimidade da sociedade empresária para figurar no polo passivo da fase executiva, ainda que não citada e não tendo integrado a fase de conhecimento.

9.2.  Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.     Parte legítima?

R: Yeaph!!!!

A parte, sociedade empresária (pessoa jurídica), argumenta que não seria parte legítima para figurar no polo passivo da demanda executiva, pois, não tendo sido citada e não tendo integrado a ação de conhecimento – Dissolução Parcial de Sociedade por Cotas -, da qual participaram apenas os sócios (pessoas físicas), não poderia ser responsabilizada pelo pagamento dos haveres na fase de cumprimento de sentença.

Precedentes do STJ indicavam que “Na ação de dissolução parcial de sociedade limitada, é desnecessária a citação da pessoa jurídica se todos os que participam do quadro social integram a lide” (REsp 1.121.530/RN, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 13/9/2011, DJe 26/4/2012).

Por outro lado, julgados mais recentes, ainda sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, apontam que “A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que, em regra, na ação para apuração de haveres de sócio, a legitimidade processual passiva é da sociedade e dos sócios remanescentes, em litisconsórcio passivo necessário” (REsp 1.015.547/AM, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 1º/12/2016, DJe 14/12/2016).

Nesse mesmo julgado ponderou-se que seria possível mitigar esse entendimento diante de especificidades do caso concreto, em que não se constate prejuízos às partes demandadas, às quais tenha sido assegurada a ampla defesa e o contraditório.

Nesse contexto, no caso ora em análise, verifica-se que eram partes na ação de dissolução parcial da sociedade todos os sócios da empresa. Trata-se de sociedade empresária pequena, com apenas uma sócia remanescente, após o falecimento do outro sócio, a qual foi citada e integrou a ação de dissolução parcial da sociedade, em que o interesse da sócia se confunde com o da própria sociedade.

No decorrer da ação, houve ampla defesa e contraditório, inclusive com apresentação de contestação, reconvenção, réplica e outras petições, agravo de instrumento e apelação. Deve ser aplicado, portanto, o princípio pas de nullité sans grief (“não há nulidade sem prejuízo”).

9.2.2.     Resultado final.

Em ação de dissolução parcial de sociedade por cotas, a sociedade empresária possui legitimidade para figurar no polo passivo da fase executiva, ainda que não tenha sido citada e não tenha integrado a fase de conhecimento, quando todos que participavam do quadro social integraram a lide e não se constata prejuízos às partes.

DIREITO TRIBUTÁRIO

10.  Aplicabilidade da isenção prevista no Regulamento das Telecomunicações Internacionais (Melbourne)

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

O Regulamento das Telecomunicações Internacionais (Melbourne) não foi objeto de apreciação específica pelo Congresso Nacional, de modo que a isenção nele prevista, com repercussão na oneração do patrimônio nacional, não pode ser aplicada para afastar a incidência do IRRF e da CIDE sobre as remessas de recursos ao exterior, porque jamais foram incorporadas ao ordenamento jurídico pátrio.

AREsp 1.426.749-RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 18/4/2023. (Info 771)

10.1.                   Situação FÁTICA.

Tchau Telefônica ajuizou ação cujo objetivo era a declaração de ausência de relação jurídica com a União Federal que legitime a exigência de IRRF e CIDE sobre remessas ao exterior de valores relativos à prestação de serviços de telefonia internacional (tráfego sainte).

A empresa alega ser prestadora de serviços de telecomunicação, inclusive internacionais, e celebra contratos com empresas de telecomunicação sediadas em outros países, com o intuito de viabilizar a comunicação pelo uso respectivo de suas redes. Explica que as ligações internacionais originadas de outros países com destino ao Brasil são conhecidas como “tráfego entrante”, enquanto as ligações originadas no Brasil com destino a pessoas localizadas no exterior, são denominadas “tráfego sainte”.

Sustenta que as operações telefônicas internacionais estariam subordinadas ao Regulamento de Melbourne, que fixa normas a respeito do tratamento a ser dado aos valores cobrados por operações telefônicas internacionais no sentido de que: i) os tributos incidentes sobre operações telefônicas só podem incidir sobre as tarifas cobradas dos usuários do país que realiza a tributação e; ii) os pagamentos feitos entre as empresas prestadoras de serviços de telecomunicação devem ser feitos em relação a saldo apurado em prol de uma delas, após compensação dos valores dos serviços reciprocamente prestados.

10.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1. Questão JURÍDICA.

Decreto Legislativo n. 67/1998:

Art. 1º  São aprovados os textos dos Atos Finais da Conferência Adicional de Plenipotenciários de Genebra, ocorrida em 1992, e da Conferência de Plenipotenciários de Quioto, ocorrida em 1994, da União Internacional de Telecomunicações – UIT.

Parágrafo único. São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que alterem os referidos Protocolos, assim como quaisquer ajustes complementares que, nos termos do art. 49, I, da Constituição Federal, acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. 

10.2.2. Aplicável a isenção prevista no Regulamento de Melbourne?

R: Nooops!!!!

A discussão tem como ponto inicial a internalização ou não, no ordenamento jurídico pátrio, do Regulamento das Telecomunicações Internacionais, integrante dos Atos Finais da Conferência Administrativa Mundial Telegráfica e Telefônica de Melbourne, firmado em 1988.

De início, convém ressaltar que o Regulamento de Melbourne não foi incorporado à Constituição e à Convenção da União Internacional de Telecomunicações, concluídas em Genebra, em 22/12/1992, tampouco ao seu instrumento de Emenda, aprovado em Quioto, em 14/10/1994. O Tratado de Melbourne possui natureza meramente complementar aos referidos instrumentos, de acordo com o que dispõe o art. 4º, § 3º, número 3, da Convenção.

Sendo assim, a aprovação da Convenção, pelo Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo n. 67/1998, não significou a aprovação do Regulamento de Melbourne. Na verdade, o art. 1º do Decreto Legislativo n. 67/1998 fez constar expressamente que os acordos complementares que acarretassem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional devem se sujeitar à aprovação do Congresso Nacional.

Não obstante a disposição contida no art. 54 da Convenção da União Internacional de Telecomunicações, em se tratando de encargos e compromissos assumidos antes ou depois do Decreto Legislativo n. 67/1998, é imprescindível a submissão do instrumento, de forma específica, à aprovação do Congresso Nacional. O raciocínio decorre da interpretação que se faz do parágrafo único do art. 1º do Decreto Legislativo n. 67/1998, que, inicialmente, trata dos atos que alteram a Convenção e, em um segundo momento, impõe a aprovação, pelo Congresso Nacional, dos acordos complementares que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.

O Regulamento das Telecomunicações Internacionais (Melbourne) não foi objeto de apreciação específica pelo Congresso Nacional, de modo que a isenção nele prevista, com repercussão na oneração do patrimônio nacional, não pode ser aplicada para afastar a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e da contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE) sobre as remessas de recursos ao exterior, porque jamais foram incorporadas ao ordenamento jurídico pátrio.

10.2.3. Resultado final.

O Regulamento das Telecomunicações Internacionais (Melbourne) não foi objeto de apreciação específica pelo Congresso Nacional, de modo que a isenção nele prevista, com repercussão na oneração do patrimônio nacional, não pode ser aplicada para afastar a incidência do IRRF e da CIDE sobre as remessas de recursos ao exterior, porque jamais foram incorporadas ao ordenamento jurídico pátrio.

DIREITO PENAL

11.  Momento de consumação do crime de “obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira”

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL

O crime de “obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira” se consuma no momento em que assinado o contrato de obtenção de financiamento mediante fraude.

AgRg no REsp 2.002.450-SE, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 17/4/2023, DJe 19/4/2023. (Info 771)

11.1.                   Situação FÁTICA.

Creiton, mediante fraude, obteve financiamento habitacional junto à CEF. Ocorre que antes da assinatura do contrato, a instituição financeira teria observado a inidoneidade dos documentos, isto é, antes mesmo da formalização do negócio. O MP mandou bala na denúncia e o juizão condenou Creiton pelo crime previsto no art. 19 da Lei 7.482/1986 em sua forma qualificada, uma vez que cometido o delito contra instituição financeira oficial. A defesa interpôs sucessivos recursos nos quais alega que não houve prejuízo ao Sistema Financeiro Nacional.

11.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1. Questão JURÍDICA.

Lei n. 7.492/1986:

Art. 19. Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira:

Pena – Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é cometido em detrimento de instituição financeira oficial ou por ela credenciada para o repasse de financiamento.

11.2.2. Em que momento o crime se consuma?

R: No momento da ASSINATURA!!!

O crime do art. 19 da Lei n. 7.492/1986 se consuma no momento em que assinado o contrato de obtenção de financiamento mediante fraude.

Citam-se precedentes do STJ firmados no mesmo sentido:

” (…) 4. Acrescentou, ademais, a inadequação da via do recurso especial para se alegar ofensa a orientação de enunciado sumular e, por fim, salientou a irrelevância da quitação dos financiamentos, haja vista que, na linha do que decidiu a instância ordinária, ‘a consumação do crime [do art. 19 da Lei n. 7.492/1986] se dá no momento em que o financiamento é obtido através de fraude, dispensando-se a efetiva existência de prejuízo econômico‘ (…)” (EDcl no AgRg no REsp 1.570.225/RS, relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 25/10/2019).

“(…) 2. Para a configuração do delito descrito no art. 19 da Lei n. 7.492/1986, segundo a pacífica orientação desta Corte, basta a obtenção, mediante fraude, de financiamento em instituição financeira. Logo, o dolo do agente, que caracteriza o referido crime, não é aferido devido ao pagamento ou não de parcelas referentes ao financiamento, mas em momento anterior, isto é, por ocasião da celebração do financiamento, que pressupõe a utilização de fraude. (…)” (AgRg no REsp 1.761.580/PE, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 30/4/2020).

11.2.3. Resultado final.

O crime de “obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira” se consuma no momento em que assinado o contrato de obtenção de financiamento mediante fraude.

12.  Contratação de serviços espirituais para provocar a morte de autoridades e crime de ameaça.

HABEAS CORPUS

A contratação de serviços espirituais para provocar a morte de autoridades não configura crime de ameaça.

HC 697.581-GO, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 7/3/2023, DJe 15/3/2023. (Info 771)

12.1.                   Situação FÁTICA.

Craudete, Secretária de Saúde de um município, teria contratado serviços espirituais para provocar a morte de diversas autoridades da localidade, Promotor, Delgado, Presidente da Câmara de Vereadores e repórter.

A questão foi investigada em inquérito policial, no qual foram requeridas medidas de busca e apreensão, quebra do sigilo telefônico, e afastamento das funções públicas. Inconformada, a defesa da secretária impetrou HC no qual alega a impossibilidade de iniciar-se um inquérito com base na notícia de que alguém contratara um trabalho espiritual.

12.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1. Questão JURÍDICA.

CP:

Ameaça

Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único – Somente se procede mediante representação.

Lei n. 8.069/1990:

Art. 241-B.  Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Art. 241-E.  Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais.

12.2.2. Configurado o crime de ameaça?

R: Nooops!!!!

Consta dos autos que houve a contratação de trabalhos espirituais visando à morte de várias autoridades, incluindo autoridade policial, promotor de justiça, vereador, prefeito e repórter investigativo.

O delito de ameaça somente pode ser cometido dolosamente, ou seja, deve estar configurada a intenção do agente de provocar medo na vítima.

Na hipótese dos autos, a representação policial e a peça acusatória deixaram de apontar conduta da paciente direcionada a causar temor nas vítimas, uma vez que não há no caderno processual nenhum indício de que a profissional contratada para realizar o trabalho espiritual procurou um dos ofendidos, a mando da paciente, com o propósito de atemorizá-los. Não houve nenhuma menção a respeito da intenção em infundir temor, mas tão somente foi narrada a contratação de trabalho espiritual visando a “eliminar diversas pessoas”.

Como ressaltado pelo Parquet federal, dos elementos colhidos não ficou demonstrado que a ré: “teve a vontade livre e consciente de intimidar os ofendidos: a conduta dela consistiu em contratar uma ‘profissional especializada’ que trabalha com esse tipo serviço – que se pode denominar de metafísico -, a fim de que fosse causado mal grave e injusto aos ofendidos. Resta claro que ela esperava que a profissional mantivesse o sigilo, o que, contra sua vontade, não ocorreu. Não há, portanto, o dolo de ameaça, dirigida, direta ou indiretamente, aos ofendidos, como exige a objetividade jurídica do tipo penal, sob pena de, em não se levando em conta tal fator, adotar-se a configuração de responsabilidade penal objetiva na espécie. (…)”.

De toda forma, o tipo penal (art. 147 do CP), ao definir o delito de ameaça, descreve que o mal prometido deve ser injusto e grave, ou seja, deve ser sério e verossímil. A ameaça, portanto, deve ter potencialidade de concretização, sob a perspectiva da ciência e do homem médio, situação também não demonstrada no caso.

Diante das circunstâncias do caso, a instauração do inquérito policial, e as medidas cautelares determinadas, bem como a ação penal, porquanto baseadas em fato atípico (ameaça), são nulas.

12.2.3. Resultado final.

A contratação de serviços espirituais para provocar a morte de autoridades não configura crime de ameaça.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

13.  Requisitos da receptação em sua forma qualificada

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

A receptação, em sua forma qualificada, demanda especial qualidade do sujeito ativo, que deve ser comerciante ou industrial.

AgRg no AREsp 2.259.297-MG, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 18/4/2023, DJe 24/4/2023. (Info 771)

13.1.                   Situação FÁTICA.

Creitinho adquiria peças de de procedência duvidosa (veículos desmanchados após serem furtados) e então fazia a revenda em seu comércio. Um belo dia (nem tão belo assim para Creitinho) a polícia ficou sabendo e a casa caiu. Creitinho foi condenado pelo crime de receptação qualificada, assim como Nirso que também foi flagrado no estabelecimento vendendo peças.

A defesa de Nirso interpôs recurso no qual alega que ele não era responsável direto pela venda das peças, motivo pelo qual deveria ser afastada a qualificadora.

13.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1. Questão JURÍDICA.

Código Penal:

Receptação

Art. 180 – Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:      

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.  

13.2.2. Necessária a qualidade de comerciante ou industrial?

R: Yeaph!!!

Para que se configure a modalidade qualificada no crime de receptação, há a exigência legal de que a prática de um dos verbos nucleares ocorra no exercício de atividade comercial ou industrial com efetiva habitualidade.

A figura do § 1º do art. 180 do Código Penal foi introduzida para punir mais severamente os proprietários de “desmanches” de carros, exigindo-se ainda o exercício de atividade comercial ou industrial.  É certo que o § 2º equipara à atividade comercial qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência, abrangendo, com isso, o “desmanche” ou “ferro-velho” caseiro, sem aparência de comércio legalizado (REsp 1.743.514/RS). Mas deve haver habitualidade!

O entendimento doutrinário, por sua vez, considera que a expressão “no exercício de atividade comercial ou industrial” pressupõe habitualidade no exercício do comércio ou da indústria, pois é sabido que a atividade comercial (em sentido amplo) não se aperfeiçoa com um único ato, sem continuidade no tempo.

No caso, as instâncias consignaram a demonstração de que as peças retiradas dos carros furtados/roubados seriam vendidas no estabelecimento comercial do acusado. Porém, com relação aos outros réus, não se comprovou o exercício da atividade comercial prestado de forma habitual, atraindo, quanto a eles, a desclassificação do crime qualificado para receptação simples (art. 180, caput, do CP).

13.2.3. Resultado final.

A receptação, em sua forma qualificada, demanda especial qualidade do sujeito ativo, que deve ser comerciante ou industrial.

14.  Critério de unificação das penas na LEP

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL

Nos termos do art. 111 da Lei de Execução Penal, as penas de reclusão e de detenção devem ser consideradas cumulativamente, já que ambas são da mesma espécie, ou seja, penas privativas de liberdade.

AgRg no REsp 1.991.853-MG, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 17/4/2023, DJe 20/4/2023. (Info 771)

14.1.                   Situação FÁTICA.

Crementino, criminoso convicto, foi condenado por diversos crimes com penas privativas de reclusão, mas também em um crime em que a natureza da pena era de detenção. O juízo da execução e o tribunal local entenderam pela impossibilidade de unificação dessas penas de reclusão e de detenção.

14.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

14.2.1. Questão JURÍDICA.

Lei n. 7.210/1984:

Art. 111. Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição.

Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime.

14.2.2. Unifica ou não?

R: Põe tudo xunto reunido!!!!

A jurisprudência de ambas as Turmas de Direito Penal do Superior Tribunal de Justiça está fixada no sentido de que “(…) concorrendo penas de reclusão e detenção, ambas devem ser somadas para efeito de fixação da totalidade do encarceramento, porquanto constituem reprimendas de mesma espécie, ou seja, penas privativas de liberdade. Inteligência do art. 111 da Lei n. 7.210/84” (HC 460.460/RS, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 19/2/2019, DJe 1º/3/2019).

No caso, o Tribunal de origem concluiu pela impossibilidade de unificação das penas de reclusão e de detenção, sob o argumento de que o acusado fora condenado a diversos crimes com penas privativas de reclusão, mas há um crime que a natureza da pena é de detenção (dano qualificado). Assim, primeiramente deveria ser cumprida a pena de reclusão, e posteriormente a pena de detenção, não podendo haver a soma pura e simples para fins de execução, na medida em que as reprimendas possuem natureza jurídica e forma de execução diversa.

Todavia, o entendimento do acórdão recorrido está em desacordo com a orientação do STJ. O art. 111, caput, da Lei n. 7.210/1984 não faz tal distinção e o seu parágrafo único prescreve a soma da pena superveniente, como forma de determinação do regime.

Portanto, reitera-se que as penas de reclusão e de detenção devem ser consideradas cumulativamente.

14.2.3. Resultado final.

Nos termos do art. 111 da Lei de Execução Penal, as penas de reclusão e de detenção devem ser consideradas cumulativamente, já que ambas são da mesma espécie, ou seja, penas privativas de liberdade.

15.  (I)Licitude da prova obtida por meio de reconhecimento fotográfico judicial que não observou o art. 226 do Código de Processo Penal

RECURSO ESPECIAL

É ilícita a prova obtida por meio de reconhecimento fotográfico judicial que não observou o art. 226 do Código de Processo Penal, sendo devida a absolvição quando as provas remanescentes são tão-somente a confissão extrajudicial, integralmente retratada em Juízo, e a apreensão de um dos bens subtraídos, meses após os fatos, efetivada no curso das investigações, o qual estava com um dos acusados que não foi reconhecido por nenhuma das vítimas.

REsp 1.996.268-GO, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 11/4/2023. (Info 771)

15.1.                   Situação FÁTICA.

Craudio foi condenado pelo crime de latrocínio. Ocorre que não consta ter havido reconhecimento, fotográfico ou pessoal, durante a fase inquisitiva. O reconhecimento fotográfico realizado em Juízo, por sua vez, ocorreu quase 8 (oito) meses após os fatos narrados na denúncia, sendo feito pela simples apresentação, às Vítimas, das fotos do acusado.

As demais provas eram a confissão extrajudicial (oitiva na delegacia) retratada em juízo, e alguns bens subtraídos (celulares das vítimas que foram interceptados), apreendidos meses depois com um dos acusados, mas que não foram reconhecidos pelas vítimas.

Inconformada, a defesa de Craudio interpôs sucessivos recursos nos quais sustenta que a condenação estaria lastreada estritamente em provas colhidas na fase investigatória, e em reconhecimento fotográfico realizado sem observância das regras processuais.

15.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

15.2.1. Questão JURÍDICA.

Código de Processo Penal:

Art. 155.  O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.                     

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.        

 Art. 197.  O valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância.

Art. 226.  Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma:

I – a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida;

Il – a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la;

III – se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;

IV – do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.

Parágrafo único.  O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento.

15.2.2.  A condenação se sustenta?

R: Nooops!!!!

A condenação dos réus está fundamentada estritamente nos reconhecimentos fotográficos feitos judicialmente, na confissão extrajudicial dos Recorrentes, integralmente retratada em Juízo, e no fato de que um dos celulares roubados teria sido apreendido com um dos réus, meses após o delito, no curso das investigações, porque houve a quebra do sigilo do aparelho. Esta fundamentação, entretanto, é ilícita, insuficiente e inidônea.

No que diz respeito ao reconhecimento fotográfico, não foram observados os ditames do art. 226 do Código de Processo Penal, o que, por si só, seria suficiente para afastar a validade da prova. Mostrando-se inválido o reconhecimento fotográfico, restaram apenas as confissões extrajudiciais dos réus (retratada em juízo) e a apreensão do aparelho celular de uma das vítimas, com um dos réus.

z, se mesmo uma confissão judicial não é apta para isoladamente, dar suporte a uma condenação, muito menos o será aquela feita apenas perante a autoridade policial, porém retratada em Juízo, segundo a interpretação dos arts. 155 e 197 do Código de Processo Penal.

O fato de que um dos celulares roubados foi apreendido com um dos réus, em razão de ter havido a determinação de interceptação telefônica do referido aparelho de uma das vítimas, durante a investigação, também não é apto para dar suporte à sua condenação, mormente quando nenhuma das vítimas o reconheceu, no inválido reconhecimento fotográfico e a apreensão do aparelho ocorreu mais de 3 (três) meses depois dos fatos, em razão da determinação de quebra do sigilo do aparelho, durante a investigação dos crimes que deram origem à presente ação penal, ou seja, a apreensão não se deu logo após a ocorrência dos crimes.

15.2.3. Resultado final.

É ilícita a prova obtida por meio de reconhecimento fotográfico judicial que não observou o art. 226 do Código de Processo Penal, sendo devida a absolvição quando as provas remanescentes são tão-somente a confissão extrajudicial, integralmente retratada em Juízo, e a apreensão de um dos bens subtraídos, meses após os fatos, efetivada no curso das investigações, o qual estava com um dos acusados que não foi reconhecido por nenhuma das vítimas.

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