Jurídico

Informativo STJ 616 | Direito do Consumidor

Olá pessoal, tudo bom?

Meu nome é Igor Maciel e sou professor aqui do Estratégia Concursos das disciplinas de Direito Administrativo e de Direito do Consumidor.

Com a publicação do Informativo STJ 616, selecionei, da área de Direito do Consumidor, o REsp 1.644.405-RS. Aqui você vai poder conhecer mais detalhes do acórdão de novembro de 2017 que abordou questões importantes que podem te ajudar nos seus estudos.

Convido-os a seguir minhas redes sociais onde deixo várias dicas para seus estudos: @profigormaciel


Esse julgado trata de um tema muito interessante: existe direito a indenização por dano moral do consumidor em virtude de corpo estranho encontrado em produtos alimentícios?

Mesmo quando o consumidor não ingere o produto, ainda assim é possível a configuração do dano de natureza moral?

Confira abaixo a ementa do acórdão:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. AQUISIÇÃO DE PACOTE DE BISCOITO RECHEADO COM CORPO ESTRANHO NO RECHEIO DE UM DOS BISCOITOS. NÃO INGESTÃO. LEVAR À BOCA. EXPOSIÇÃO DO CONSUMIDOR A RISCO CONCRETO DE LESÃO À SUA SAÚDE E SEGURANÇA. FATO DO PRODUTO. EXISTÊNCIA DE DANO MORAL. VIOLAÇÃO DO DEVER DE NÃO ACARRETAR RISCOS AO CONSUMIDOR.
1. Ação ajuizada em 04/09/2012. Recurso especial interposto em 16/08/2016 e concluso ao Gabinete em 16/12/2016.
2. O propósito recursal consiste em determinar se, para ocorrer danos morais em função do encontro de corpo estranho em alimento industrialização, é necessária sua ingestão ou se o simples fato de levar tal resíduo à boca é suficiente para a configuração do dano moral.
3. A aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor à risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana.
4. Hipótese em que se caracteriza defeito do produto (art. 12, CDC), o qual expõe o consumidor à risco concreto de dano à sua saúde e segurança, em clara infringência ao dever legal dirigido ao fornecedor, previsto no art. 8º
do CDC.
5. Na hipótese dos autos, o simples “levar à boca” do corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física do consumidor que sua ingestão propriamente dita.
6. Recurso especial provido.
(REsp 1.644.405-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 09/11/2017, DJe 17/11/2017).

O caso

O caso apresentado versa sobre ação de indenização por danos morais em face de empresa alimentícia que fabrica biscoitos recheados.

Os autores discutiam em juízo que um de seus filhos, à época com oito anos, ao mastigar o produto, encontrou uma aliança no recheio de um dos biscoitos, cuspindo-a antes de engolir.

O Tribunal de Justiça Local negou a indenização pretendida ao argumento de que se inexistente a ingestão do produto, não há que se falar em dano moral, razão pela qual os Autores recorreram ao STJ.

Conteúdo teórico pertinente

Basicamente a discussão que se desenha é a seguinte: existe direito a dano moral por parte do consumidor em caso de corpo estranho encontrado em embalagens de alimentos?
A pretensão se justifica tanto em razão do artigo 6º, inciso I quanto do artigo 12 do CDC:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Este tema é bastante polêmico e possui decisões divergentes no seio do próprio STJ.

De um lado, há corrente que entende ser a simples exposição da saúde do consumidor a risco, um fato que exige a reparação por dano moral.

Isto porque as regras protetivas à sua saúde e segurança são princípios básicos da relação consumerista. Trata-se de posicionamento já exarado pela 3ª turma do STJ, em especial no Informativo 537 e que ainda encontra guarida em julgado de 2016:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESENÇA DE CORPO ESTRANHO EM ALIMENTO. EXPOSIÇÃO DO CONSUMIDOR A RISCO DE LESÃO À SUA SAÚDE E SEGURANÇA. DANO MORAL EXISTENTE.
1. A disponibilização de produto considerado impróprio para consumo em virtude da presença de objeto estranho no seu interior afeta a segurança que rege as relações consumeristas na medida que expõe o consumidor a risco de lesão à sua saúde e segurança e, portanto, dá direito à compensação por dano moral.
2. Agravo regimental provido.
(AgRg no REsp 1380274/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/05/2016, DJe 19/05/2016)

Por outro lado, a posição que parece prevalecer é a de que este fato constitui-se em mero dissabor vivenciado pelo consumidor, conforme Informativo de número 553. É que a ausência de ingestão do produto afasta eventual pretensão indenizatória.

Neste sentido, também em 2016, a 4ª Turma do STJ assim entendeu:

AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE CONDENATÓRIA – AQUISIÇÃO DE PRODUTO IMPRÓPRIO PARA CONSUMO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECLAMO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO.
INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
1. “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se consolidou no sentido de que a ausência de ingestão de produto impróprio para o consumo configura, em regra, hipótese de mero dissabor vivenciado pelo consumidor, o que afasta eventual pretensão indenizatória decorrente de alegado dano moral.” (cf. AgRg no AREsp 489.030/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/04/2015, DJe 27/04/2015) 2. Agravo interno desprovido.
(AgInt no REsp 1179964/RJ, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 10/10/2016)

O caso analisado neste Informativo 616 é diferente de ambos os anteriores: a criança colocou o produto na boca, mas não chegou a engolir. Neste caso, caberia dano moral?

O STJ entendeu que sim.

Segundo a Ministra Relatora, Dr. Nancy Andrighi, restou configurada a ofensa ao artigo 12 do CDC na medida em que:

É indubitável que o corpo estranho contido no recheio de um biscoito expôs o consumidor a risco, na medida em que, levando-o à boca por estar encoberto pelo produto adquirido, sujeitou-se à ocorrência de diversos tipos de dano, seja à sua saúde física, seja à sua integridade psíquica. O consumidor foi, portanto, exposto a grave risco, o que torna ipso facto defeituoso o produto.

O voto, seguido integralmente pela Terceira Turma do STJ, pontuou inclusive que

Além disso, o simples “levar à boca” do corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física e psíquica do consumidor que sua deglutição propriamente dita, pois desde este momento poderá haver contaminações e lesões de diversos tipos. Na hipótese dos autos, portanto, o risco ao consumidor manifestou-se de forma concreta e patente, sendo o consumidor merecedor de toda a proteção oferecida pelo CDC.

Questão de prova

De acordo com a jurisprudência do STJ, o simples “levar à boca” do corpo estranho presente dentro de alimentos possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física do consumidor que sua ingestão propriamente dita, ensejando o dever de indenizar do Fornecedor à luz do artigo 12 do CDC.

Item verdadeiro, conforme recente julgado do STJ.


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Grande abraço,

Igor Maciel (@profigormaciel)

Igor Maciel

Graduado na Universidade Federal de Pernambuco, com extensão na Universidade de Coimbra/Portugal. Especialista LLM em Direito Corporativo pelo IBMEC/RJ. Mestrando em Direito e Políticas Públicas pelo UNICEUB/DF. Advogado com atuação profissional centrada no Direito Tributário e no Direito Administrativo, especialmente na defesa de servidores públicos.

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