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Informativo STF 1068 Comentado

Informativo nº 1068 do STF COMENTADO. Fique ligado aqui no Estratégia Carreiras Jurídicas!

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DIREITO CONSTITUCIONAL

1.      Compartilhamento de dados no âmbito da Administração Pública federal

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE É legítimo, desde que observados alguns parâmetros, o compartilhamento de dados pessoais entre órgãos e entidades da Administração Pública federal, sem qualquer prejuízo da irrestrita observância dos princípios gerais e mecanismos de proteção elencados na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018) e dos direitos constitucionais à privacidade e proteção de dados. ADI 6649/DF, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento finalizado em 15.9.2022 (Info 1068)

1.1.  Situação FÁTICA.

O Conselho Federal da OAB ajuizou no STF a ADI 6649, contra o Decreto 10.046/2019 da Presidência da República, que dispõe sobre a governança no compartilhamento de dados no âmbito da administração pública federal e institui o Cadastro Base do Cidadão e o Comitê Central de Governança de Dados. Segundo a OAB, as medidas previstas na norma estão a construir uma ferramenta de vigilância estatal “extremamente poderosa”, cujo escopo inclui informações pessoais, familiares e trabalhistas básicas de todos os brasileiros — dados pessoais sensíveis (biométricos, palma da mão, digitais, a retina ou a íris, o formato da face, a voz e a maneira de andar), que podem ser coletados para reconhecimento automatizado.

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.     Legítimo o compartilhamento de dados?

R: Desde que observados alguns critérios, SIM!!! Consoante recente entendimento do STF, a proteção de dados pessoais e a autodeterminação informacional são direitos fundamentais autônomos, dos quais decorrem tutela jurídica específica e dimensão normativa própria. Assim, é necessária a instituição de controle efetivo e transparente da coleta, armazenamento, aproveitamento, transferência e compartilhamento desses dados, bem como o controle de políticas públicas que possam afetar substancialmente o direito fundamental à proteção de dados. Na espécie, o Decreto 10.046/2019, da Presidência da República, dispõe sobre a governança no compartilhamento de dados no âmbito da Administração Pública federal e institui o Cadastro Base do Cidadão e o Comitê Central de Governança de Dados. Para a sua plena validade, é necessário que seu conteúdo seja interpretado em conformidade com a Constituição Federal, subtraindo do campo semântico da norma, eventuais aplicações ou interpretações que conflitem com o direito fundamental à proteção de dados pessoais. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedentes as ações, para conferir interpretação conforme a Constituição Federal ao Decreto 10.046/2019, nos seguintes termos: “1. O compartilhamento de dados pessoais entre órgãos e entidades da Administração Pública, pressupõe: a) eleição de propósitos legítimos, específicos e explícitos para o tratamento de dados (art. 6º, inciso I, da Lei 13.709/2018); b) compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas (art. 6º, inciso II); c) limitação do compartilhamento ao mínimo necessário para o atendimento da finalidade informada (art. 6º, inciso III); bem como d) o cumprimento integral dos requisitos, garantias e procedimentos estabelecidos na Lei Geral de Proteção de Dados, no que for compatível com o setor público.
  1. O compartilhamento de dados pessoais entre órgãos públicos pressupõe rigorosa observância do art. 23, inciso I, da Lei 13.709/2018, que determina seja dada a devida publicidade às hipóteses em que cada entidade governamental compartilha ou tem acesso a banco de dados pessoais, ‘fornecendo informações claras e atualizadas sobre a previsão legal, a finalidade, os procedimentos e as práticas utilizadas para a execução dessas atividades, em veículos de fácil acesso, preferencialmente em seus sítios eletrônicos’.
  2. O acesso de órgãos e entidades governamentais ao Cadastro Base do Cidadão fica condicionado ao atendimento integral das diretrizes acima arroladas, cabendo ao Comitê Central de Governança de Dados, no exercício das competências aludidas nos arts. 21, incisos VI, VII e VIII do Decreto 10.046/2019: 3.1. prever mecanismos rigorosos de controle de acesso ao Cadastro Base do Cidadão, o qual será limitado a órgãos e entidades que comprovarem real necessidade de acesso aos dados pessoais nele reunidos. Nesse sentido, a permissão de acesso somente poderá ser concedida para o alcance de propósitos legítimos, específicos e explícitos, sendo limitada a informações que sejam indispensáveis ao atendimento do interesse público, nos termos do art. 7º, inciso III, e art. 23, capute inciso I, da Lei 13.709/2018; 3.2. justificar formal, prévia e minudentemente, à luz dos postulados da proporcionalidade, da razoabilidade e dos princípios gerais de proteção da LGPD, tanto a necessidade de inclusão de novos dados pessoais na base integradora (art. 21, inciso VII) como a escolha das bases temáticas que comporão o Cadastro Base do Cidadão (art. 21, inciso VIII); 3.3. instituir medidas de segurança compatíveis com os princípios de proteção da LGPD, em especial a criação de sistema eletrônico de registro de acesso, para efeito de responsabilização em caso de abuso.
  3. O compartilhamento de informações pessoais em atividades de inteligência observará o disposto em legislação específica e os parâmetros fixados no julgamento da ADI 6.529, Rel. Min. Cármen Lúcia, quais sejam: (i) adoção de medidas proporcionais e estritamente necessárias ao atendimento do interesse público; (ii) instauração de procedimento administrativo formal, acompanhado de prévia e exaustiva motivação, para permitir o controle de legalidade pelo Poder Judiciário; (iii) utilização de sistemas eletrônicos de segurança e de registro de acesso, inclusive para efeito de responsabilização em caso de abuso; e (iv) observância dos princípios gerais de proteção e dos direitos do titular previstos na LGPD, no que for compatível com o exercício dessa função estatal.
  4. O tratamento de dados pessoais promovido por órgãos públicos ao arrepio dos parâmetros legais e constitucionais importará a responsabilidade civil do ESTADO pelos danos suportados pelos particulares, na forma dos arts. 42 e seguintes da Lei 13.709/2018, associada ao exercício do direito de regresso contra os servidores e agentes políticos responsáveis pelo ato ilícito, em caso de culpa ou dolo.
  5. A transgressão dolosa ao dever de publicidade estabelecido no art. 23, inciso I, da LGPD, fora das hipóteses constitucionais de sigilo, importará a responsabilização do AGENTE estatal por ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 11, inciso IV, da Lei 8.429/1992, sem prejuízo da aplicação das sanções disciplinares previstas nos estatutos dos servidores públicos federais, municipais e estaduais.”

1.2.2.     Resultado final.

Por fim, o Tribunal declarou, com efeito pro futuro, a inconstitucionalidade do art. 22 do Decreto 10.046/2019, preservando a atual estrutura do Comitê Central de Governança de Dados pelo prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de publicação da ata de julgamento, a fim de garantir ao Chefe do Poder Executivo prazo hábil para (i) atribuir ao órgão um perfil independente e plural, aberto à participação efetiva de representantes de outras instituições democráticas; e (ii) conferir aos seus integrantes garantias mínimas contra influências indevidas. Vencidos, parcialmente e nos termos de seus respectivos votos, os Ministros André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin.

2.      Produtos fumígenos: restrições à publicidade e inserção de advertências sanitárias nas embalagens

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Não viola o texto constitucional a imposição legal de restrições à publicidade de produtos fumígenos e de inserção de advertências sanitárias em suas embalagens quando se revelarem adequadas, necessárias e proporcionais para alcançar a finalidade de reduzir o fumo e o consumo do tabaco, hábitos que constituem perigo à saúde pública. ADI 3311/DF, relatora Min. Rosa Weber, julgamento virtual finalizado em 13.9.2022 (Info 1068)

2.1.  Situação FÁTICA.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) ajuizou no STJ a ADI 3311 contra os limites estabelecidos para a propaganda comercial de tabaco, que atualmente não pode ser veiculada em rádio e TV. O caput do artigo 3º da Lei 9.294/96, que trata das restrições ao uso e à propaganda de cigarro, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, determina, por exemplo, que a propaganda de cigarro só poderá ser feita por meio de pôsteres, painéis e cartazes afixados na parte interna dos locais de venda do produto. Entre as várias alegações da CNI está a de que “a exposição de cartazes ostentando a marca de cigarro no interior dos bares não é propaganda no sentido atual do termo. No máximo, esses cartazes são um acessório da propaganda na televisão e no rádio”. A confederação também reclama da necessidade de inclusão de advertência sobre os malefícios do fumo nos comerciais nas embalagens dos maços de cigarro com a utilização de figuras que ilustrem o sentido da mensagem, e que devem variar a cada cinco meses.

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.     Questão JURÍDICA.

CF/1988: Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. (…) § 4º A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

2.2.2.     As restrições encontram amparo na CF?

R: SIM!!! A propaganda comercial, embora protegida enquanto direito fundamental — uma vez que abrangida pelas liberdades de expressão e comunicação (CF/1988, art. 5º, IV e IX) — sujeita-se a restrições, desde que proporcionais, no cotejo com a proteção de outros valores públicos. Por sua vez, a atividade empresarial, inclusive a publicitária, submete-se aos princípios da ordem econômica, razão pela qual deve dialogar com a concretização dos demais valores públicos e a proteção dos direitos fundamentais potencialmente colidentes. Nesse contexto, o próprio texto constitucional explicita a possibilidade e a importância das limitações publicitárias de produtos notadamente nocivos. Na espécie, a imposição das referidas medidas visa conferir efetividade às políticas públicas de combate ao fumo e de controle do tabaco, desestimulando o seu consumo com o fim de proteger a saúde pública e concretizar a proteção do consumidor em sua dimensão informativa, possibilitando-o a refletir sobre a prática (CF/1988, art. 5º, XIV e XXXII, e art. 170, V). Prevalece, portanto, a tutela da saúde (CF/1988, art. 6º), inclusive à luz da proteção prioritária da criança e do adolescente (CF/1988, art. 227), sendo certo que as medidas limitam a livre iniciativa, na dimensão expressiva e comunicativa, visando concretizar os objetivos fundamentais da República (CF/1988, art. 3º).

2.2.3.     Resultado final.

Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação. Impedidos os Ministros Luis Roberto Barroso e Cármen Lúcia.

DIREITO DO TRABALHO

3.      Piso salarial nacional para os profissionais da enfermagem

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Os efeitos da Lei 14.434/2022 ficarão suspensos até que sejam avaliados os seus impactos sobre a situação financeira dos estados e municípios, os riscos para a empregabilidade e a qualidade dos serviços de saúde, tudo com base em informações a serem prestadas, no prazo de 60 (sessenta) dias, pelos entes estatais, órgãos públicos e entidades representativas da área de saúde. ADI 7222 MC-Ref/DF, relator Min. Luís Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 16.9.2022 (Info 1068)

3.1.  Situação FÁTICA.

A Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) questionou no STF dispositivos da Lei 14.434/2022 que fixam piso salarial para enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem e para parteiras. Segundo a confederação, o Projeto de Lei (PL) 2564/2020, que deu origem à lei, foi aprovado de forma rápida e sem amadurecimento legislativo na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, em que não passou por nenhuma comissão, mesmo diante da relevância da medida e de seus impactos significativos. Outro argumento é o de quebra da autonomia orçamentária dos estados e dos municípios, com risco de descontinuação de tratamentos essenciais em razão da limitação dos recursos financeiros e do aumento dos serviços privados de saúde. De acordo com a CNSaúde, deveriam ter sido realizados estudos sobre a viabilidade da adoção de novo piso, levando em consideração os impactos econômicos diretos e indiretos. Porém, essas questões não foram avaliadas durante a tramitação do PL.

3.2.  Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.     O que faz?

R: Suspende até a avaliação dos impactos! No caso, estão presentes os requisitos para a concessão da medida cautelar: a plausibilidade jurídica das alegações de inconstitucionalidade da norma — ao menos até que esclarecidas as questões suscitadas — e o evidente perigo na demora. O primeiro se justifica (i) pelo suposto vício de iniciativa no processo legislativo, tendo em vista que toda a sua tramitação se deu sem amparo de norma constitucional legitimadora da instituição do piso salarial e a superveniente constitucionalização via emenda não teria o condão de sanar o vício de origem; (ii) pela indicação de vulneração ao pacto federativo, dada a interferência na autonomia financeira e orçamentária de estados e municípios (CF/1988, art. 169, § 1º, I); e (iii) pela alegada desproporcionalidade da medida em relação a destinatários com menor poderio econômico. Já o segundo decorre da incidência imediata do piso salarial e do alegado risco à prestação e à qualidade dos serviços de saúde, considerando-se a ameaça de demissões em massa (CF/1988, art. 170, VIII) e de redução tanto da oferta de leitos hospitalares como dos quadros de enfermeiros e técnicos (CF/1988, art. 196).

3.2.2.     Resultado final.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, referendou a medida cautelar para manter suspensos os efeitos da Lei 14.434/2022 até que sejam devidamente esclarecidos os seus impactos sobre cada um dos pontos elencados.

DIREITO FINANCEIRO

4.      Autonomia municipal e vinculação de parte do ICMS recebido pelo estado

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE É inconstitucional, por violação à cláusula constitucional da não afetação da receita oriunda de impostos e à autonomia municipal, norma estadual que determina a forma de aplicação dos recursos destinados ao município em razão da repartição constitucional de receitas. ADI 2355/PR, relator Min. Nunes Marques, julgamento virtual finalizado em 16.9.2022 (Info 1068)

4.1.  Situação FÁTICA.

A PGR ajuizou a ADI 2355 questionando a validade da Lei 12.690/1999 do Paraná, que obriga os municípios a aplicarem 50% do repasse constitucional do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) diretamente em áreas indígenas localizadas em seus territórios.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.     Questão JURÍDICA.

CF/1988: Art. 30. Compete aos Municípios: (…) III – instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei; (…) Art. 167. São vedados: (…) IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo

4.2.2.     A norma é constitucional?

R: Nana-nina-NÃO!!!! Conforme jurisprudência desta Corte, é de pleno direito dos próprios municípios a parcela que lhes é devida na repartição constitucional de receitas, de modo que NÃO cabe o estabelecimento de qualquer forma de condicionamento ou retenção pelos estados. Os estados-membros podem fixar, mediante lei, a maneira como será feito o crédito de parcela do valor da arrecadação do ICMS a ser repartido (CF/1988, art. 158, IV e parágrafo único). Contudo, isso não implica alteração da titularidade da quota pertencente aos municípios, razão pela qual a destinação que será dada ao repasse depende de decisão autônoma do ente municipal beneficiário, notadamente porque ocorre em fase posterior ao ingresso do montante no erário.

4.2.3.     Resultado final.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, confirmou a medida cautelar anteriormente deferida (Informativo 273) e julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da Lei 12.690/1999 do Estado do Paraná.
Jean Vilbert

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