Informativo STF 1017 Comentado
Informativo nº 1017 do STF COMENTADO pintando na telinha (do seu computador, notebook, tablet, celular…) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!
DIREITO ADMINISTRATIVO
1. Promoção pessoal e divulgação de atos estatais
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Está em desconformidade com a Constituição Federal (CF) a delegação a cada Poder para definir, por norma interna, as hipóteses pelas quais a divulgação de ato, programa, obra ou serviço públicos não constituirá promoção pessoal.
ADI 6522/DF, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
1.1. Situação FÁTICA.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, ajuizou a ADI 6522 contra os parágrafos 5º e 6º do artigo 22 da LODF, incluídos pela Emenda 114/2019. O primeiro dispositivo estabelece que a divulgação feita por autoridade de ato, programa, obra ou serviços públicos de sua iniciativa não caracteriza promoção pessoal, quando atende os critérios previstos em norma interna de cada Poder. O segundo tem previsão semelhante em relação à inclusão, em material de divulgação parlamentar, do nome do autor da iniciativa do ato, programa, obra ou serviços públicos, incluídos os decorrentes de emendas à lei orçamentária anual.
Segundo Aras, o uso pessoal da publicidade institucional seria incompatível com os princípios republicanos, da impessoalidade, da moralidade administrativa, da igualdade e da publicidade, previstos no artigo 37 da Constituição Federal. Ele também apontou inconstitucionalidade na previsão de que “norma interna de cada poder” afaste antecipadamente a caracterização de condutas como promoção pessoal em atos de divulgação praticados por autoridades.
1.2. Análise ESTRATÉGICA.
1.2.1. Questão JURÍDICA.
CF:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.
LODF:
Art. 22. Os atos da administração pública de qualquer dos Poderes do Distrito Federal, além de obedecer aos princípios constitucionais aplicados à administração pública, devem observar também o seguinte:
§ 5º A divulgação feita por autoridade de ato, programa, obra ou serviço públicos de sua iniciativa, incluídos os decorrentes de emendas à lei orçamentária anual, não caracteriza promoção pessoal, quando atenda os critérios previstos em norma interna de cada poder.]6º Também não caracteriza promoção pessoal a inclusão em material de divulgação parlamentar do nome do autor que teve a iniciativa do ato, programa, obra ou serviço públicos, incluídos os decorrentes de emendas à lei orçamentária anual.”
1.2.2. Válida a norma que prevê o que configura ou não a promoção pessoal?
R: Nooops!!
O agente público não pode se valer do cargo que exerce ou dos recursos públicos que gere para a autopromoção política, sob pena de incorrer em desvio de finalidade e contrariar os princípios da impessoalidade e da probidade. O princípio estabelecido pelo § 1º do art. 37 da CF, sobre a finalidade legitimadora e os pressupostos da publicidade dos atos e das campanhas de órgãos públicos, não admite flexibilização por norma infraconstitucional ou regulamentar.
O § 5º do art. 22 da LODF — no qual se atribui a cada Poder a edição dos critérios pelos quais a divulgação de ato, programa, obra ou serviço públicos não será considerada promoção pessoal — abriu espaço INDEVIDO de regulamentação não previsto na CF, tornando deficiente a proteção contra eventuais desvios de finalidade. Não cabe a órgão ou Poder fixar critérios, pressupostos ou requisitos para a incidência de norma autoaplicável da Constituição.
A divulgação de atos e iniciativas de parlamentares é considerada legítima quando efetuada — com a finalidade exclusiva de informar ou educar — nos ambientes de divulgação do mandatário ou do partido político, não se havendo de confundi-la com a publicidade do órgão público ou entidade.
A divulgação feita pelo parlamentar de seus atos e iniciativas pode não constituir promoção pessoal indevida por não se confundir com a publicidade estatal prevista no § 1º do art. 37 da CF. Mas, para que não incorra em publicidade pessoal constitucionalmente vedada, há que se limitar ao que seja descrição informativa de sua conduta e com limites em sua atuação.
Ademais, a propaganda relacionada especificamente à prestação de contas pelo parlamentar ao cidadão não constitui situação vedada pela Constituição, desde que realizada nos espaços próprios do mandatário ou do partido político e seja assumida com os seus recursos, não devendo ser confundida com a publicidade do órgão público ou entidade.
1.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário julgou procedente o pedido formulado em ação direta de constitucionalidade para: a) declarar a inconstitucionalidade do § 5º do art. 22 da LODF; e b) atribuir interpretação conforme à Constituição ao § 6º do art. 22 da LODF.
2. Controle judicial da aplicação de percentual mínimo de recursos orçamentários em ações e serviços públicos de saúde
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
É compatível com a Constituição Federal controle judicial a tornar obrigatória a observância, tendo em conta recursos orçamentários destinados à saúde, dos percentuais mínimos previstos no artigo 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, considerado período anterior à edição da Lei Complementar nº 141/2012.
RE 858075/RJ, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
2.1. Situação FÁTICA.
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra o município de Nova Iguaçu e a União para ver cumpridas as regras constitucionais relativas à aplicação de recursos orçamentários mínimos no SUS relativamente aos anos de 2002 e 2003. A ação foi julgada parcialmente procedente em primeira instância e foi determinado que os recursos fossem depositados no Fundo Municipal de Saúde e efetivamente utilizados.
O juiz determinou ainda que a União acompanhasse o cumprimento de sua decisão, condicionando o repasse de recursos referentes à repartição de receitas tributárias à comprovação, por parte do município, do integral atendimento da sentença. A União então apelou ao Tribunal Regional Federal e conseguiu derrubar a sentença, uma vez que, para o TRF, seria inviável que o Poder Judiciário substitua a União para condenar municípios e ela própria a determinadas obrigações que ainda dependem de regulamentação.
2.2. Análise ESTRATÉGICA.
2.2.1. Questão JURÍDICA.
CF/1988:
Art. 77. Até o exercício financeiro de 2004, os recursos mínimos aplicados nas ações e serviços públicos de saúde serão equivalentes: (Incluído pela Emenda Constitucional 29/ 2000)
III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, quinze por cento do produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e 159, inciso I, alínea b e § 3º. (Incluído pela Emenda Constitucional 29/2000) § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios que apliquem percentuais inferiores aos fixados nos incisos II e III deverão elevá-los gradualmente, até o exercício financeiro de 2004, reduzida a diferença à razão de, pelo menos, um quinto por ano, sendo que, a partir de 2000, a aplicação será de pelo menos sete por cento. (Incluído pela Emenda Constitucional 29/2000)”
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional 29/2000)
II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios; (Incluído pela Emenda Constitucional 29/2000)”
2.2.2. Pode ocorrer o controle judicial da exigência de aplicação mínima na saúde?
R: Yeaph!!!
O controle judicial da exigência de aplicação de um percentual mínimo de recursos orçamentários em ações e serviços públicos de saúde, previsto no art. 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), é compatível com a CF desde a edição da Emenda Constitucional (EC) 29/2000.
Apesar de o Plenário do STF já ter se manifestado pela impossibilidade de aplicação, antes do advento da Lei Complementar (LC) 141/2012, da sanção de restrição de transferência voluntária federal a estado-membro em razão do descumprimento do percentual mínimo de gastos em saúde, isso não conduz à impossibilidade do controle judicial do cumprimento dos percentuais mínimos de aplicação de recursos, previstos no art. 198, § 2º, II, da Constituição c/c o art. 77, § 1º, do ADCT.
A regra instituidora da sanção imputável ao ente federativo que descumpre o mínimo constitucional só sobreveio com a edição da LC 141/2012, mas a exigência de aplicação de um percentual mínimo em ações e serviços públicos de saúde decorre diretamente da Constituição, desde a edição da EC 29/2000. Com efeito, o art. 77, III e § 1º, do ADCT indica expressamente os percentuais mínimos a serem observados pelos municípios desde o ano 2000, deixando claro o caráter autoaplicável da previsão, que deveria ser obedecida desde a sua promulgação.
2.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, ao apreciar o Tema 818 da repercussão geral, o Plenário, por maioria, deu parcial provimento ao recurso extraordinário. Vencidos o ministro Marco Aurélio (relator), que deu provimento ao recurso, e o ministro Alexandre de Moraes, que lhe negou provimento.
DIREITO CONSTITUCIONAL
3. Censo Demográfico do IBGE: corte de verbas e conflito federativo
AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA
Compete ao Supremo Tribunal Federal (STF), processar e julgar, com base no art. 102, I, “f”, da Constituição Federal (CF), ação cível originária que questiona a inércia da Administração Pública federal relativamente à organização, ao planejamento e à execução do Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
ACO 3508 TA-Ref/DF, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
3.1. Situação FÁTICA.
O Estado do Maranhão ajuizou a ACO 3508 na qual alegou que a falta de dados sobre a população pode abalar o pacto federativo e levar à perda de receitas tributárias, gerando a diminuição de transferências de verbas. Sustenta, ainda, que a não realização do censo causa desequilíbrio na viabilização de ações governamentais, em razão da dificuldade na formulação e na execução de políticas públicas, com prejuízo à autonomia dos entes federativos.
3.2. Análise ESTRATÉGICA.
3.2.1. Questão JURÍDICA.
CF:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I – processar e julgar, originariamente:
f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;
Lei 8.184/1991:
Art. 1º A periodicidade dos Censos Demográficos e dos Censos Econômicos, realizados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, será fixada por ato do Poder Executivo, não podendo exceder a dez anos a dos Censos Demográficos e a cinco anos a dos Censos Econômicos.
3.2.2. Compete ao STF julgar ação em face da não realização do censo?
R: Yeaph!!!!
A controvérsia deduzida no caso — relativa ao não implemento dos atos administrativos e da alocação de recursos destinados à realização do censo demográfico no ano de 2021 — apresenta fator de potencial desestabilização do pacto federativo, de maneira a atrair a competência originária do STF e a legitimidade de cada uma das unidades federativas afetadas para desafiar a higidez da decisão política tomada pela União.
Configura-se ILEGÍTIMA a escolha política que, esvaziando as dotações orçamentárias vocacionadas às pesquisas censitárias do IBGE, inibe a produção de dados demográficos essenciais ao acompanhamento dos resultados das políticas sociais do Estado brasileiro.
O Poder Legislativo, ao editar a Lei 8.184/1991, reconheceu a ESSENCIALIDADE do Censo Demográfico para a formulação e acompanhamento de políticas públicas, assim como para o planejamento de investimentos privados e, por conseguinte, para o desenvolvimento da economia nacional. Embora o legislador tenha conferido certo grau de discricionariedade ao gestor público para definição da periodicidade das pesquisas censitárias, há o limite temporal de dez anos que deve ser sempre observado.
Ademais, a não realização do recenseamento pelo IBGE impede o levantamento de indicadores necessários para a atualização dos coeficientes de partilha do Fundo de Participação dos Estados (FPE), Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e salário-educação, mecanismos necessários para a garantia da autonomia política e financeira dos entes subnacionais menos favorecidos economicamente. Ela inviabiliza, igualmente, o acompanhamento dos resultados das políticas sociais dos governos federal, estadual e municipal, de maneira a permitir o contínuo aprimoramento do sistema de proteção social brasileiro.
Na hipótese, tendo em conta que as falhas estatais não se resumem a uma conduta meramente omissiva, e, ainda, as preocupações externadas pela Coordenadora Operacional de Censos do IBGE quanto à possibilidade da execução do censo ainda em 2021, adotou-se posicionamento recente do STF no sentido de, nos casos em que as instâncias políticas dispuserem de ampla margem de discricionariedade, a Corte atuar na defesa de direitos negligenciados pelo Estado, sem, contudo, invadir o domínio dos representantes democraticamente eleitos ou assumir compromisso com a conformação das políticas públicas. Determinou-se, por conseguinte, que o Poder Executivo implemente a referida política pública no exercício financeiro subsequente.
3.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, confirmou parcialmente a medida liminar deferida pelo ministro Marco Aurélio (relator), para determinar a adoção de medidas administrativas e legislativas necessárias à realização do Censo Demográfico do IBGE no exercício financeiro seguinte ao da concessão da tutela de urgência (2022), observados os parâmetros técnicos preconizados pelo IBGE, devendo a União adotar todas as medidas legais necessárias para viabilizar a pesquisa censitária, inclusive no que se refere à previsão de créditos orçamentários para a realização das despesas públicas. Vencidos os ministros Marco Aurélio e Edson Fachin, que propuseram o referendo da medida liminar, e o ministro Nunes Marques, que negou o pedido liminar.
4. Covid-19: legislação estadual e planos de saúde
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Por usurpar a competência da União para legislar privativamente sobre direito civil e política de seguros, é formalmente inconstitucional lei estadual que estabelece a possibilidade de o Poder Executivo proibir a suspensão ou o cancelamento de planos de saúde por falta de pagamento durante a situação de emergência do novo coronavírus (Covid-19).
ADI 6441/RJ, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
4.1. Situação FÁTICA.
A Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSEG) ajuizou a ADI 6441 contra a Lei estadual 8.811/2020. Além de autorizar o Executivo fluminense a dispor sobre a proibição, a norma afastava a incidência de juros e multa sobre os valores devidos durante a pandemia e determinava que as operadoras possibilitassem o parcelamento dos débitos anteriores a março de 2020, quando teve início a situação de emergência.
Entre outros argumentos, a confederação sustentava que a lei estadual não poderia dispor sobre Direito Civil, contratos de natureza privada e seguros. Alegou, também, desrespeito à competência legislativa da União, exercida por meio da Lei federal 9.656/1998, que dispõe sobre planos e seguros privados de assistência à saúde, e o poder normativo da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), responsável pela regulação do setor.
4.2. Análise ESTRATÉGICA.
4.2.1. Competente o Estado do RJ para legislar sobre o tema?
R: Nana-nina-NÃO!!
O cuidado jurídico inaugurado pela Lei 8.811/2020 do estado do Rio de Janeiro ULTRAPASSA o escopo de proteção ao consumidor em situação de vulnerabilidade, autorizando, de modo geral e indiscriminado, o sobrestamento do dever de adimplemento de obrigação contratual. Além disso, a norma impugnada adentra campo jurídico de institutos de direitos civil sobre tempo e modo de pagamento. Impõe às operadoras de planos de saúde o recebimento do pagamento parcelado de débitos anteriores a março de 2020 e regulamenta juros e multas ao vedar a cobrança desses encargos sobre dívidas consolidadas no período de aplicação das medidas restritivas na pandemia.
Agrega-se a isso o fato de a Constituição Federal atribuir à União a disciplina sobre seguros e a fiscalização das operações relacionadas a essa matéria. Tais previsões alcançam os planos de saúde, tendo em vista a sua íntima afinidade com a lógica dos contratos de seguro, notadamente por conta do componente atuarial.
4.2.2. Resultado final.
Convertido o exame da cautelar em pronunciamento de mérito, o Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 8.811/2020 do estado do Rio de Janeiro. Vencidos os ministros Marco Aurélio, Edson Fachin e Rosa Weber.
5. Pessoas com deficiência e condição de dependência
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Na apuração do imposto sobre a renda de pessoa física, a pessoa com deficiência que supere o limite etário e seja capacitada para o trabalho pode ser considerada como dependente quando a sua remuneração não exceder as deduções autorizadas por lei.
ADI 5583/DF, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
5.1. Situação FÁTICA.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou a ADI 5583 que questiona os incisos III e V do artigo 35 da Lei 9.250/1995, segundo os quais podem ser considerados dependentes, para fins de Imposto de Renda, filhos e enteados até 21 anos ou de qualquer idade, quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho; e irmãos, netos ou bisnetos, sem arrimo dos pais, até 21 anos, desde que o contribuinte detenha a guarda judicial, ou de qualquer idade, quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho.
Na ação, a OAB argumentou que os dispositivos, ao não incluir as pessoas com deficiência que exercem atividade laborativa na relação de dependentes, ofendem o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal), o direito ao trabalho (artigo 6º) e a inclusão das pessoas com deficiência em sociedade (artigo 24, inciso XIV).
5.2. Análise ESTRATÉGICA.
5.2.1. Questão JURÍDICA.
Lei 9.250/1995:
Art. 35. Para efeito do disposto nos arts. 4º, inciso III, e 8º, inciso II, alínea c, poderão ser considerados como dependentes:
III – a filha, o filho, a enteada ou o enteado, até 21 anos, ou de qualquer idade quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho;
V – o irmão, o neto ou o bisneto, sem arrimo dos pais, até 21 anos, desde que o contribuinte detenha a guarda judicial, ou de qualquer idade quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho;
5.2.2. Tais pessoas podem ser consideradas dependentes para fins de IRPF?
R: SIM, desde que sua remuneração não exceda as deduções autorizadas por lei.
As pessoas com deficiência, capacitadas para o trabalho, podem ser consideradas dependentes para efeito de imposto de renda, mesmo quando superado o limite etário previsto em lei, desde que sua remuneração não exceda as deduções autorizadas.
O art. 35, III e V, da Lei 9.250/1995 introduziu DISCRIMINAÇÃO INDIRETA contra as pessoas com deficiência, já que a aparente neutralidade do critério da capacidade física ou mental para o trabalho oculta o efeito anti-isonômico produzido. Para a generalidade dos indivíduos, pode fazer sentido que a aptidão laborativa seja o critério definidor da condição de dependente em relação aos ganhos do genitor ou responsável, tendo em vista que, sob essa circunstância, eles possuem chances de se alocarem no mercado de trabalho e proverem o próprio sustento. Tal probabilidade se reduz de forma drástica quando se trata de pessoas com deficiência, cujas condições físicas ou mentais restringem de forma mais ou menos intensa as oportunidades profissionais.
A Constituição veda que o tratamento tributário (i) cause discriminação indireta, em ofensa à isonomia, (ii) prejudique o direito ao trabalho das pessoas com deficiência e (iii) afronte o conceito constitucional de renda e a capacidade contributiva de quem arca com as despesas.
5.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado em ação direta para dar interpretação conforme à Constituição ao art. 35, III e V, da Lei 9.250/1995. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator).
6. Temporalidade de patentes e princípios constitucionais
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
É inconstitucional o parágrafo único do art. 40 da Lei 9.279/1996, segundo o qual os prazos de vigência de patentes e de modelos de utilidade podem ser prorrogados na hipótese de o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.
ADI 5529/DF, relator Min. Dias Toffoli, julgamento em 12.5.2021(Info 1017)
6.1. Situação FÁTICA.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou a ADI 5529 contra o artigo 40, parágrafo único, da lei, que estabelece que o prazo de vigência da patente não pode ser inferior a 10 anos para invenção e a sete anos para modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) “estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.
6.2. Análise ESTRATÉGICA.
6.2.1. Questão JURÍDICA.
Lei 9.279/1996:
Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito.
Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.
6.2.2. Tal possibilidade de prorrogação encontra amparo na CF?
R: Nooops!!!
A norma impugnada contraria a segurança jurídica, a temporalidade da patente, a função social da propriedade intelectual, a duração razoável do processo, a eficiência da administração pública, a livre concorrência e a defesa do consumidor e o direito à saúde.
A INDETERMINAÇÃO do prazo contido no parágrafo único do art. 40 da Lei 9.279/1996 gera insegurança jurídica e ofende o próprio Estado Democrático de Direito. Com efeito, a previsibilidade quanto ao prazo de vigência das patentes é ESSENCIAL para que os agentes de mercado (depositantes, potenciais concorrentes e investidores) possam fazer escolhas racionais. A ausência de regras claras dá margem ao arbítrio e à utilização oportunista e anti-isonômica das regras do jogo, tais como as estratégias utilizadas pelos depositantes para prolongar o período de exploração exclusiva dos produtos.
Para além de representar ofensa à segurança jurídica, a norma questionada subverte a própria essência do art. 5º, XXIX, da CF, que determina que seja assegurada por lei a proteção à propriedade industrial mediante um privilégio temporário, com observância do interesse social e do desenvolvimento tecnológico e econômico do País. Nesse sentido, o dispositivo questionado não observa o quesito da temporariedade, pois, ao se vincular a vigência da patente à data de sua concessão, ou seja, indiretamente, ao tempo de tramitação do respectivo processo no INPI, se indetermina o prazo de vigência do benefício, o que concorre para a extrapolação dos prazos previstos no caput do art. 40 da Lei de Propriedade Industrial (LPI) e para a falta de objetividade e previsibilidade de todo o processo.
A norma questionada também enseja violação da função social da propriedade intelectual. Bens incorpóreos não são exceção à imposição constitucional de observância à função social da propriedade e, como tais, demandam a harmonização de interesses individuais e coletivos. A temporariedade da patente permite a harmonização da proteção à inventividade com o cumprimento da função social da propriedade, pois, apesar de resguardar os direitos dos autores de inventos ou modelos de utilidade por um período determinado, incentivando e remunerando os investimentos em inovação, garante, ao restante da indústria e à sociedade, a possibilidade de se apropriar dos benefícios proporcionados pelos produtos da criatividade, a partir da extinção dos privilégios de sua exploração.
Se por um lado a CF concede o privilégio da proteção à propriedade industrial, por outro, garante que, a partir de determinado prazo, os demais agentes da indústria venham a se igualar ao titular da patente na possibilidade de exploração do objeto protegido, liberando-o à lógica concorrencial do mercado. O prolongamento arbitrário do privilégio vem em prejuízo do mercado como um todo, pois proporciona justamente o que a Constituição buscou reprimir, ou seja, a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros, aprofundando a desigualdade entre os agentes econômicos e transformando o que era justificável e razoável em inconstitucional.
Além disso, a falta de justa limitação temporal das patentes evidencia contrariedade à livre concorrência e à defesa do consumidor, pois o adiamento da entrada da concorrência no mercado possui sérios impactos sobre os preços dos produtos e, consequentemente, sobre o acesso dos consumidores a tais produtos. De fato, a CF, ao promover uma ordem econômica em que haja competição entre os agentes do mercado de forma igualitária, busca garantir, também, a liberdade de escolha dos consumidores, cujo exercício depende da multiplicidade de opções.
Observa-se, ademais, que a prorrogação do prazo de vigência da patente prevista no parágrafo único do art. 40 da LPI, ao tempo em que não contribui para a solução do atraso crônico dos processos submetidos ao INPI, acaba por induzir o descumprimento dos prazos previstos no caput do dispositivo. A norma ameniza as consequências da mora administrativa e prolonga o período de privilégio usufruído pelos depositantes, em prejuízo dos demais atores do mercado, além da Administração Pública, incorrendo, assim, em direta afronta aos princípios da razoável duração do processo e da eficiência administrativa.
Por fim, digno de atenção é o impacto da extensão do prazo de vigência de patentes no Sistema Único de Saúde (SUS), pois, sendo ele um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo e contando com uma rede de atendimento que visa universalizar o acesso à saúde gratuita, demanda recursos públicos compatíveis com sua amplitude e complexidade, os quais, todavia, esbarram em problemas financeiros e orçamentários típicos de um país em desenvolvimento como o Brasil. O domínio comercial proporcionado pela patente por períodos muito longos tem impacto no acesso da população a serviços públicos de saúde, uma vez que onera o sistema ao eliminar a concorrência e impor a aquisição de itens farmacêuticos por preço estipulado unilateralmente pelo titular do direito, acrescido do pagamento de royalties sobre os itens patenteados que o Poder Público adquire e distribui. Consequentemente, a extensão do prazo de vigência das patentes afeta diretamente as políticas públicas de saúde do País e obsta o acesso dos cidadãos a medicamentos, ações e serviços de saúde, dando concretude aos prejuízos causados não apenas a concorrentes e consumidores, mas principalmente àqueles que dependem do SUS para garantir sua integridade física e sua sobrevivência.
6.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, conheceu da ação direta e julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40 da Lei 9.279/1996. Vencidos os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux (Presidente). Além disso, o Plenário, por maioria, modulou os efeitos da decisão de declaração de inconstitucionalidade. Vencidos os ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Marco Aurélio. Os ministros Roberto Barroso e Luiz Fux (Presidente) modularam os efeitos da decisão em maior extensão.
DIREITO TRIBUTÁRIO
7. Incidência do ICMS na base de cálculo da contribuição para o PIS e da COFINS –Modulação de efeitos
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
A tese, com repercussão geral, fixada no julgamento do RE 574706 (“O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da Cofins”) produz efeitos a partir de 15.3.2017 (data da sessão de julgamento), ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até essa data.
RE 574706 ED/PR, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento em 13.5.2021(Info 1017)
7.1. Situação FÁTICA.
Em julgamento de Embargos de Declaração do RE 574706,a União pretendia que os efeitos retroativos da decisão fossem considerados válidos somente após o julgamento dos embargos. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) também alegava haver contradições em relação a precedentes da Corte sobre a inclusão de tributos na base de cálculo de outros recursos e apontava o impacto econômico da decisão, diante do enfrentamento da pandemia de Covid-19, superior a R$ 250 bilhões.
O STF então decidiu que a exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do PIS/Cofins somente seria válida a partir de 15/3/2017, data em que foi fixada a tese de repercussão geral (Tema 69), no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 574706. Os ministros também esclareceram que o ICMS que não se inclui na base de cálculo do PIS/Cofins é o que é destacado na nota fiscal.
7.2. Análise ESTRATÉGICA.
7.2.1. A prudência recomenda modular os efeitos?
R: Aparentemente, SIM!!
A atual incidência da sistemática de repercussão geral, com efeitos erga omnes e vinculante aos órgãos da Administração Pública e ao Poder Judiciário, recomenda o balizamento dos efeitos do que decidido no processo, para preservar a segurança jurídica dos órgãos fazendários, ressalvados os casos ajuizados até a data da sessão de julgamento, em 15.3.2017.
A boa-fé, a confiança e a segurança jurídica são princípios fundamentais subjacentes à prospecção dos efeitos das decisões judiciais modificadoras da jurisprudência até então dominante (v. Informativos STF 856 e 857). Por isso, a modulação também pode ser aplicada a casos em que a modificação na orientação jurisprudencial ocorre em desfavor da Fazenda Pública.
O planejamento fazendário deu-se dentro de legítimas expectativas traçadas de acordo com a interpretação até então consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive em sede de recurso repetitivo.
7.2.2. Resultado final.
Com esse entendimento, o Plenário, por maioria, acolheu, em parte, os embargos de declaração, para modular os efeitos do julgado, vencidos os ministros Edson Fachin, Rosa Weber e Marco Aurélio. O Plenário, também por maioria, rejeitou os embargos quanto à alegação de omissão, obscuridade ou contradição. No ponto referente ao ICMS excluído da base de cálculo das contribuições PIS-Cofins, prevaleceu o entendimento de que se trata do ICMS “destacado” nas notas fiscais, vencidos os ministros Nunes Marques, Roberto Barroso e Gilmar Mendes.
8. Capacidade tributária ativa: Imposto de Renda incidente sobre rendimentos pagos a autarquias e fundações estaduais e distritais
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
É dos Estados e Distrito Federal a titularidade do que arrecadado, considerado Imposto de Renda, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por si, autarquias e fundações que instituírem e mantiverem.
RE 607886/RJ, relator Min. Marco Aurélio, julgamento virtual finalizado em 4.5.2021(Info 1017)
8.1. Situação FÁTICA.
Trata-se de Recurso Extraordinário interposto pelo Estado do Rio de Janeiro contra decisão do TRF local que determinou a conversão à União das quantias depositadas em juízo no âmbito de mandado de segurança em que um beneficiário de complementação de aposentadoria paga pela Rioprevidência (autarquia estadual) questionava a incidência de IR sobre a parcela.
Ao determinar a destinação das quantias depositadas em juízo à União, o TRF-2 entendeu que esta, além da competência relativa à instituição do tributo, detém capacidade ativa para a cobrança, por ser sujeito ativo da relação tributária, cabendo ao Estado do Rio de Janeiro apenas a condição de destinatário da arrecadação.
8.2. Análise ESTRATÉGICA.
8.2.1. Questão JURÍDICA.
CF:
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre::
III – renda e proventos de qualquer natureza;”
Art. 157. Pertencem aos Estados e ao Distrito Federal:
I – o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem
8.2.2. De quem é o disputado IR arrecadado na forma mencionada?
R: ESTADOS E DF.
Pertence aos estados e ao Distrito Federal o produto da arrecadação do Imposto de Renda incidente sobre os rendimentos, quando pagos, por si, respectivas autarquias e fundações.
Nos termos do que disposto no art. 157, I, da CF, depreende-se haver o constituinte estabelecido DISTINÇÃO considerados o ente competente e o beneficiado pela receita tributária. Embora a competência impositiva tenha sido atribuída à União (CF, art. 153, III), cabe aos estados e ao Distrito Federal a arrecadação, na fonte, do tributo sobre os rendimentos pagos. No ato de retenção dos valores, dá-se a incorporação, ao patrimônio estadual ou distrital, do produto arrecadado.
Frise-se que, ao disciplinar a entrega de recursos a ser realizada pela União, considerada fração do montante arrecadado a título de Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI e Imposto de Renda – IR, o constituinte decotou, para efeito de cálculo, o importe versado no art. 157, I, da CF, o que revela a disponibilidade originária e efetiva dos valores pelos estados e Distrito Federal.
Por fim, sendo as unidades federativas destinatárias do tributo retido, cumpre reconhecer-lhes a capacidade ativa para arrecadar o imposto. Por esse motivo, na linha de precedente da Corte, cabe à Justiça comum estadual julgar controvérsia envolvendo Imposto de Renda retido na fonte, na forma do art. 157, I, da CF, ante a ausência do interesse da União sobre ação de repetição de indébito relativa ao tributo.
8.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, ao apreciar o Tema 364 da repercussão geral, deu provimento a recurso extraordinário para determinar a conversão, em renda do estado do Rio de Janeiro, dos depósitos judiciais realizados no processo.
9. Contribuição previdenciária do empregado e do trabalhador avulso: progressividade e não cumulação de alíquotas
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
É constitucional a expressão ‘de forma não cumulativa’ constante do ‘caput’ do art. 20 da Lei 8.212/1991.
RE 852796/RS, relator Min. Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
9.1. Situação FÁTICA.
Trata-se de RE interposto pela União contra decisão de Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais que garantiu a um segurado o direito à aplicação das alíquotas previstas na lei de forma gradual, exclusivamente sobre a parcela dos rendimentos inseridos dentro das respectivas faixas de tributação. Segundo o acórdão, a sistemática de cálculo das contribuições previdenciárias mediante a aplicação de apenas uma alíquota à totalidade do salário de contribuição seria desproporcional e violaria o princípio da isonomia. Assim, incidentalmente, a Turma Recursal declarou a inconstitucionalidade da expressão “de forma não cumulativa”.
9.2. Análise ESTRATÉGICA.
9.2.1. Questão JURÍDICA.
Lei 8.212/1991:
Art. 20. A contribuição do empregado, inclusive o doméstico, e a do trabalhador avulso é calculada mediante a aplicação da correspondente alíquota sobre o seu salário-de-contribuição mensal, de forma não cumulativa, observado o disposto no art. 28, de acordo com a seguinte tabela: Salário-de-contribuição – Alíquota em % – até 249,80 – 8,00 – de 249,81 até 416,33 – 9,00 – de 416,34 até 832,66 – 11,00”
9.2.2. Não cumularás?
R: Nooops!!!!
É compatível com a CF a progressividade simples estipulada no art. 20 da Lei 8.212/1991, ou seja, a apuração das contribuições previdenciárias devidas pelo segurado empregado, inclusive o doméstico, e pelo trabalhador avulso mediante a incidência de apenas uma alíquota — aquela correspondente à faixa de tributação — sobre a íntegra do salário de contribuição mensal.
O preceito questionado não incidiu em inconstitucionalidade ao utilizar-se da progressividade tributária no âmbito das contribuições previdenciárias devidas pelo empregado, inclusive o doméstico, e pelo trabalhador avulso. Além de a progressividade ser COMPATÍVEL com a aludida exação, não se vislumbra, no texto constitucional, qualquer restrição a seu uso na disciplina do tributo. A expressão “de forma não cumulativa” traduz a opção do legislador pela progressividade SIMPLES, portanto, não foi eleita a progressividade gradual, tradicionalmente presente, por exemplo, na tabela adotada para a apuração do imposto de renda.
Ademais, não há que se falar que o aumento na contribuição previdenciária seja inconstitucional por eventualmente acarretar “decréscimo remuneratório”. De um lado, a cláusula da irredutibilidade não se estende aos tributos, porque não implica imunidade tributária. Do outro, os aumentos da carga tributária resultantes da passagem de uma faixa para outra podem ser suportados pelo contribuinte, haja vista o aumento de sua capacidade contributiva — não há efeito confiscatório, tampouco os aumentos são irrazoáveis ou desproporcionais.
9.2.3. Resultado final.
Ao apreciar o Tema 833 da repercussão geral, o Plenário deu provimento a recurso extraordinário, declarando, incidentalmente, a constitucionalidade da expressão “de forma não cumulativa” constante do caput art. 20 da Lei 8.212/1991.
10. ICMS-comunicação e inadimplência do consumidor final
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
A inadimplência do usuário não afasta a incidência ou a exigibilidade do ICMS sobre serviços de telecomunicações.
RE 1003758/RO, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 14.5.2021(Info 1017)
10.1. Situação FÁTICA.
Global Village Telecom impetrou mandado de segurança contra o secretário de Finanças do Estado de Rondônia requerendo o reconhecimento do direito à compensação do ICMS recolhido sobre prestações de serviços em relação aos quais houve inadimplência do consumidor. A empresa argumentava que o ICMS perderia a característica de “imposto sobre o consumo” quando vedada a restituição, diante da impossibilidade de repasse.
O TJ-RO negou o mandado de segurança, o que levou a empresa a apresentar recurso no STJ, que manteve o entendimento da corte estadual. Em seguida, a empresa interpôs o RE no Supremo alegando ofensa aos princípios constitucionais da não cumulatividade, da capacidade contributiva e do não-confisco.
10.2. Análise ESTRATÉGICA.
10.2.1. Questão JURÍDICA.
CF:
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
XII – cabe à lei complementar:
g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
10.2.2. A incidência do ICMS independe do adimplemento?
R: É mais ou menor por aí…
As vendas inadimplidas não podem ser excluídas da base de cálculo do tributo, pois a inadimplência do consumidor final — por se tratar de evento posterior e alheio — não obsta a ocorrência do fato gerador do ICMS-comunicação.
Uma vez prestado o serviço de comunicação ao consumidor, de forma onerosa, incidirá necessariamente o imposto, independentemente de a empresa ter efetivamente auferido receita com a realização do serviço.
Ressalte-se, nesses termos, a existência de duas relações jurídicas DISTINTAS e INDEPENDENTES entre si, regidas por normas específicas: uma entre a empresa (contribuinte de direito) e o respectivo consumidor/usuário (contribuinte de fato) de natureza civil; e outra, de caráter estritamente tributário, entre a empresa (sujeito passivo) e o Fisco (sujeito ativo).
Além disso, não possui qualquer respaldo constitucional, sendo, portanto, absolutamente inadmissível, repassar ao Erário os riscos próprios da atividade econômica em face de eventual inadimplemento dos consumidores/usuários, a pretexto de fazer valer os princípios da não-cumulatividade, da capacidade contributiva e da vedação ao confisco.
Por fim, a inadimplência do usuário não constitui excludente legal do tributo, de modo que admitir que as vendas inadimplidas pudessem ser excluídas da base de cálculo do ICMS implicaria violação direta ao princípio da legalidade tributária, bem como ao disposto nos artigos 150, § 6º, e 155, § 2º, XII, g, da CF. Nessa hipótese, o STF estaria atuando como legislador positivo, modificando as normas tributárias inerentes ao ICMS para instituir benefício fiscal em favor dos contribuintes, o que ensejaria violação também ao princípio da separação dos Poderes.
10.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, apreciando o Tema 705 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário. Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Edson Fachin.
11. Diferencial de alíquota de ICMS e empresas optantes pelo Simples Nacional
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
É constitucional a imposição tributária de diferencial de alíquota do ICMS pelo Estado de destino na entrada de mercadoria em seu território devido por sociedade empresária aderente ao Simples Nacional, independentemente da posição desta na cadeia produtiva ou da possibilidade de compensação dos créditos.
RE 970821/RS, relator Min. Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 11.5.2021(Info 1017)
11.1. Situação FÁTICA.
Empresa gaúcha interpôs RE contra decisão do TJ-RS que reconheceu a validade de regras das Leis estaduais 8.820/1989 e 10.043/1993 que autorizam a cobrança antecipada do ICMS nas aquisições de mercadorias por micro e pequenas empresas em outras unidades da Federação.
11.2. Análise ESTRATÉGICA.
11.2.1. Questão JURÍDICA.
LC 123/2002:
Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
§ 1º O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:
XIII – ICMS devido:
g) nas operações com bens ou mercadorias sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, nas aquisições em outros Estados e Distrito Federal: 1. com encerramento da tributação, observado o disposto no inciso IV do § 4º do art. 18 desta Lei Complementar; 2. sem encerramento da tributação, hipótese em que será cobrada a diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sendo vedada a agregação de qualquer valor;
“Art. 23. As microempresas e as empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional não farão jus à apropriação nem transferirão créditos relativos a impostos ou contribuições abrangidos pelo Simples Nacional.
§ 1º As pessoas jurídicas e aquelas a elas equiparadas pela legislação tributária não optantes pelo Simples Nacional terão direito a crédito correspondente ao ICMS incidente sobre as suas aquisições de mercadorias de microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, desde que destinadas à comercialização ou industrialização e observado, como limite, o ICMS efetivamente devido pelas optantes pelo Simples Nacional em relação a essas aquisições.
§ 2º A alíquota aplicável ao cálculo do crédito de que trata o § 1º deste artigo deverá ser informada no documento fiscal e corresponderá ao percentual de ICMS previsto nos Anexos I ou II desta Lei Complementar para a faixa de receita bruta a que a microempresa ou a empresa de pequeno porte estiver sujeita no mês anterior ao da operação.
§ 3º Na hipótese de a operação ocorrer no mês de início de atividades da microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, a alíquota aplicável ao cálculo do crédito de que trata o § 1 º deste artigo corresponderá ao percentual de ICMS referente à menor alíquota prevista nos Anexos I ou II desta Lei Complementar.
§ 4º Não se aplica o disposto nos §§ 1º a 3º deste artigo quando: I – a microempresa ou empresa de pequeno porte estiver sujeita à tributação do ICMS no Simples Nacional por valores fixos mensais; II – a microempresa ou a empresa de pequeno porte não informar a alíquota de que trata o § 2º deste artigo no documento fiscal; III – houver isenção estabelecida pelo Estado ou Distrito Federal que abranja a faixa de receita bruta a que a microempresa ou a empresa de pequeno porte estiver sujeita no mês da operação. IV – o remetente da operação ou prestação considerar, por opção, que a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º do art. 18 desta Lei Complementar deverá incidir sobre a receita recebida no mês.
§ 5º Mediante deliberação exclusiva e unilateral dos Estados e do Distrito Federal, poderá ser concedido às pessoas jurídicas e àquelas a elas equiparadas pela legislação tributária não optantes pelo Simples Nacional crédito correspondente ao ICMS incidente sobre os insumos utilizados nas mercadorias adquiridas de indústria optante pelo Simples Nacional, sendo vedado o estabelecimento de diferenciação no valor do crédito em razão da procedência dessas mercadorias. § 6º O Comitê Gestor do Simples Nacional disciplinará o disposto neste artigo
11.2.2. As normas questionadas encontram amparo na CF?
R: Yeaph!!!
É constitucional a cobrança antecipada de diferencial de alíquota de ICMS de sociedade empresária optante pelo Simples Nacional, independentemente de o contribuinte estar na condição de consumidor final no momento da aquisição.
A cobrança do diferencial de alíquota não viola a sistemática do Simples Nacional, uma vez que há previsão expressa no art. 13, § 1º, XIII, g, da LC 123/2002. Além disso, não há ofensa à regra da não cumulatividade, haja vista que o art. 23 da LC 123/2002 veda explicitamente a apropriação ou compensação de créditos relativos a impostos ou contribuições abrangidos pelo Simples Nacional.
O diferencial de alíquota consiste em recolhimento pelo estado de destino da diferença entre as alíquotas interestadual (menor) e interna (maior), de maneira a equilibrar a partilha do ICMS em operações entre entes federados. Complementa-se o valor do ICMS devido na operação. Ocorre, portanto, a cobrança de um ÚNICO imposto (ICMS) calculado de duas formas distintas, de modo a alcançar o valor total devido na operação interestadual.
Cabe ao legislador ordinário excepcionar a norma-regra da não cumulatividade mesmo em situação de plurifasia, impedindo a formação do direito ao abatimento, desde que em prol da racionalidade do regime diferenciado e mais favorável ao micro e pequeno empreendedor, bem como lastreado em finalidades com assento constitucional, como é o caso da promoção do federalismo fiscal cooperativo de equilíbrio e da continuidade dos pilares do Estado Fiscal.
Cabe destacar, por fim, que a opção pelo Simples Nacional é facultativa no âmbito da livre conformação do planejamento tributário, arcando-se com bônus e ônus decorrentes dessa escolha empresarial que, em sua generalidade, representa um tratamento tributário sensivelmente mais favorável à maioria das sociedades empresárias de pequeno e médio porte. Nesse contexto, não há como prosperar uma adesão parcial ao regime simplificado, adimplindo-se obrigação tributária de forma centralizada e com carga menor, simultaneamente ao não recolhimento de diferencial de alíquota nas operações interestaduais.
11.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 517 da repercussão geral, negou provimento a recurso extraordinário.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
12. Acordo de Não Persecução Penal
HABEAS CORPUS
HC 194677/SP, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento em 11.5.2021(Info 1017)
12.1. Situação FÁTICA.
Ruth, cidadã venezuelana, foi denunciada pelo tráfico internacional de drogas. O juiz da primeira instância estipulou a pena em quatro anos e dez meses de prisão. O procurador da República responsável pelo caso se recusou a oferecer o acordo, e, em seguida, o juiz não permitiu que o processo fosse remetido ao órgão superior do Ministério Público para reavaliar a questão.
Inconformada, a Defensoria Pública da União impetrou Habeas Corpus no qual requereu o reconhecimento judicial do direito ao acordo.
12.2. Análise ESTRATÉGICA.
12.2.1. Questão JURÍDICA.
CPP:
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:
§ 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código
12.2.2. Pode obrigar o MP a oferecer o ANPP?
R: Em absoluto!!!
Não cabe ao Poder Judiciário, que não detém atribuição para participar de negociações na seara investigatória, impor ao MP a celebração de acordos.
Não se tratando de hipótese de manifesta inadmissibilidade do ANPP, a defesa pode requerer o reexame de sua negativa, nos termos do art. 28-A, § 14, do CPP, não sendo legítimo, em regra, que o Judiciário controle o ato de recusa, quanto ao mérito, a fim de impedir a remessa ao órgão superior no MP.
Isso porque a redação do art. 28-A, § 14, do CPP determina a iniciativa da defesa para requerer a sua aplicação.
12.2.3. Resultado final.
Com base nesse entendimento, a Segunda Turma concedeu parcialmente a ordem, para determinar a remessa dos autos à Câmara de Revisão do Ministério Público Federal, a fim de que seja apreciado o ato que negou a oferta de ANPP. Vencido, parcialmente, o ministro Ricardo Lewandowski, que concedia a ordem em maior extensão.