Olá, pessoal!
Meu nome é Rodrigo Vaslin, sou Juiz Federal do TRF4 e Professor de Processo Civil do Estratégia Concursos.
Neste artigo iremos comentar as questões do concurso para Defensor Público do Distrito Federal de 2019 apresentando um gabarito extraoficial.
Sempre faço o alerta aos alunos de Carreiras Jurídicas que as provas sobre o Novo CPC, desde 2016 até os dias atuais, têm exigido, prioritariamente, a lei seca, bem como alguns julgados pontuais do STJ e do STF a respeito das inovações do Código.
Portanto, você que está na luta, não deixe de lado a leitura detida do CPC. Em nosso curso, sempre ao explicar um assunto, faço questão de transcrever os dispositivos, pois eles são reproduzidos, ipsis litteris, nos certames.
Vamos às questões!
Questão 47
47 – Na execução fiscal, cabe à Fazenda Pública decidir se a dívida será executada no foro de domicílio do réu, no de residência dele ou no lugar onde ele for encontrado.
Gabarito Extraoficial: Correta.
A alternativa reproduziu o art. 46, §5º, CPC.
Art. 46, § 5º A execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado.
A doutrina majoritária, a exemplo de Elpídio Donizetti, diz que, de acordo com a literalidade do art. 578 (CPC/1973), a execução fiscal só poderia ser proposta no foro de residência do réu, ou no local onde ele fosse encontrado, se não tivesse domicílio certo. O CPC/2015, com o art. 46, §5º, deixa claro que caberá à Fazenda Pública a escolha.
Válido asseverar, porém, que a doutrina minoritária, a exemplo de Daniel Assumpção, entende que a Fazenda Pública não pode escolher livremente, pois há preferência entre os foros.
Assevera que, havendo domicílio conhecido, este o foro competente. Caso contrário, será competente o foro da residência do réu e, somente em última hipótese, quando não houver domicílio ou residência conhecidos, a competência será do lugar onde encontrado. Afirma que este último entendimento é até mais consentâneo com o art. 109, §1º, CRFB, que afirma que a União proporá a demanda no foro de domicílio do réu.
De todo modo, acredito que não haverá grandes discussões a respeito da alternativa e o gabarito virá como correta.
48 – Ocorrerá a preclusão lógica do recurso para a parte que aceitar, ainda que tacitamente, sentença que lhe foi desfavorável.
Gabarito Extraoficial: Correta.
A preclusão lógica é a perda de faculdade/poder processual em razão da prática de um ato anterior que com ele é incompatível.
No caso da aquiescência (expressa ou tácita) da decisão, ocorre exatamente essa preclusão lógica.
Ora, não pode a parte efetuar o pagamento ao qual foi condenada e, logo após recorrer.
Não pode levantar os valores depositados na ação consignatória, dando-se por satisfeita e, depois, recorrer.
Não pode pleitear o parcelamento da dívida (art. 916) e, depois, recorrer.
É o que está descrito no art. 1.000, CPC.
Art. 1.000. A parte que aceitar expressa ou tacitamente a decisão não poderá recorrer. Parágrafo único. Considera-se aceitação tácita a prática, sem nenhuma reserva, de ato incompatível com a vontade de recorrer.
Se a parte vier a interpor um recurso, além de haver preclusão lógica, estará violando a boa-fé objetiva, mais propriamente o nemo potest venire contra factum proprium.
49 – Salvo se o regime de bens for o de separação absoluta, haverá litisconsórcio necessário entre os cônjuges para que um deles proponha ação que verse sobre direito real imobiliário.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
O CPC prevê o litisconsórcio necessário no polo passivo e não ativo.
Art. 73, § 1o Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para a ação:
I – que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens;
II – resultante de fato que diga respeito a ambos os cônjuges ou de ato praticado por eles;
III – fundada em dívida contraída por um dos cônjuges a bem da família;
IV – que tenha por objeto o reconhecimento, a constituição ou a extinção de ônus sobre imóvel de um ou de ambos os cônjuges.
Segundo o art. 10, CPC/73, art. 73, CPC/2015 e art. 1.647, II, CC[1], um cônjuge somente pode propor uma demanda real imobiliária com o consentimento do outro, salvo se casados em separação absoluta de bens.
Art. 73. O cônjuge necessitará do consentimento do outro para propor ação que verse sobre direito real imobiliário, salvo quando casados sob o regime de separação absoluta de bens.
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;
Perceba que não é o litisconsórcio que se impõe, exigindo-se apenas o seu consentimento. Não há necessidade de ambos serem autores. Um cônjuge pode ir sozinho ao judiciário, desde que o outro autorize. Assim, quanto ao polo ativo, trata-se de litisconsórcio facultativo e não necessário.
Em acréscimo, vale citar posição doutrinária segundo a qual não haveria litisconsórcio necessário no polo ativo por duas razões.
1ª razão: não é possível obrigar alguém a ser autor, a litigar em demanda judicial.
2ª razão: não é possível condicionar o direito de ação de uma parte (autor) à presença daquele outro colegitimado que não quer ir à juízo. O direito fundamental de acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CRFB) não pode depender da vontade de outrem.
Portanto, a alternativa está incorreta.
50 – Contraria o ordenamento jurídico o juiz que negar a defensor público o fornecimento de certidão do dispositivo de sentença proferida em processo tramitado em segredo de justiça, sob o fundamento de ausência de interesse jurídico.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
No meu entender, a alternativa coloca o defensor público não como aquele que atuou defendendo o assistido, mas sim como um terceiro que pleiteia o fornecimento de certidão de um processo alheio.
Nesse caso, ele se submete ao art. 189, §2º, CPC, que exige demonstração de interesse jurídico.
Art. 189, § 2º O terceiro que demonstrar interesse jurídico pode requerer ao juiz certidão do dispositivo da sentença, bem como de inventário e de partilha resultantes de divórcio ou separação.
Portanto, a alternativa está incorreta, pois a atitude do juiz não contraria o ordenamento jurídico.
Ademais, mesmo que a LC80/94 dê ao defensor público a prerrogativa de requisitar certidões de autoridades públicas, o art. 89, X, parte final exige que a requisição tenha ligação com o exercício de suas atribuições.
LC80/94, Art. 89. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios: X – requisitar de autoridade pública ou de seus agentes exames, certidões, perícias, vistorias, diligências, processos, documentos, informações, esclarecimentos e providências necessárias ao exercício de suas atribuições;
Portanto, o juiz também pode negar o fornecimento de certidão quando não houver esse interesse jurídico.
51 – Será considerado intempestivo o recurso de apelação interposto antes da publicação da sentença.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
Na vigência do CPC/73, a “jurisprudência defensiva” do STJ entendia que o recurso interposto antes da publicação da sentença era intempestivo.
Aliás, o Tribunal da Cidadania editou a súmula 418 que representava esse posicionamento.
Súmula 418, STJ: É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação.
O NCPC, felizmente, previu em dois dispositivos um entendimento contrário.
Ao art. 1.024, § 5º: § 5º Se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração será processado e julgado independentemente de ratificação.
Art. 218,§4º Será considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo.
Por conta dessa contrariedade, o STJ cancelou a súmula 418 e já aprovou um novo enunciado (579), revendo posicionamento anterior e adotando a ideia do NCPC.
Súmula 579, STJ: Não é necessário ratificar o recurso especial interposto na pendência do julgamento dos embargos de declaração quando inalterado o julgamento anterior.
Portanto, o ato processual prematuro é válido e tempestivo.
52 – Em sede de liquidação de sentença, a parte impugnou decisão judicial que incluiu na condenação juros de mora e correção monetária, sob o fundamento de configurar julgamento extra petita.
Assertiva: Nesse caso, a parte agiu erroneamente, porque a fixação de juros de mora e correção monetária constitui pedido implícito.
Gabarito Extraoficial: Correta.
A sentença extra petita é um vício de congruência externa, consubstanciando-se naquela em que o magistrado concede algo fora do que foi pleiteado, estando tal vício atrelado à certeza do pedido.
Segundo Didier, o pedido deve ser certo (art. 320, CPC), determinado (art. 324, CPC), claro (art. 330, §1º, II) e coerente (art. 330, §1º, IV).
O pedido certo (o que nos importa neste momento), é o pedido expresso.
Certeza é exigida tanto no aspecto processual quanto material. No pedido imediato, o autor deve indicar de forma expressa qual espécie de tutela jurisdicional pretendida, enquanto que, no pedido mediato, deve indicar também expressamente o gênero do bem da vida pleiteado.
Assim sendo, sentença extra petita é aquela que concede tutela jurisdicional diferente da pleiteada (pedido imediato), bem como aquela que concede bem da vida de diferente gênero daquele pedido pelo autor (pedido mediato).
Ocorre que o próprio ordenamento jurídico prevê exceções ao princípio da congruência, em que é possível conceder pedido não requerido pelas partes.
Um dos grandes exemplos é justamente a possibilidade de condenação em juros e correção monetária ainda que não pleiteados.
Art. 322, § 1o Compreendem-se no principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios.
Mais que pedidos implícitos, juros e correção monetária podem ser incluídos na execução mesmo que não tenham constado da sentença.
Súmula 254, STF: Incluem-se os juros moratórios na liquidação, embora omisso o pedido inicial ou a condenação.
53 – O juiz deve suspender o processo se arguida suspeição de membro do MP em razão de amizade íntima deste com o réu; nesse caso, será lícita apenas a prática de atos processuais urgentes.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
As causas de impedimento (art. 144) e suspeição (art. 145) do juiz se aplicam aos membros do Ministério Público.
Art. 148. Aplicam-se os motivos de impedimento e de suspeição:
I – ao membro do Ministério Público;
Assim, a amizade íntima do MP com uma das partes, de fato, é causa de suspeição.
Art. 145. Há suspeição do juiz:
I – amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados;
Contudo, o erro está no fato de que, para resolver a arguição de suspeição, não haverá suspensão do processo.
Art. 148, § 2º O juiz mandará processar o incidente em separado e sem suspensão do processo, ouvindo o arguido no prazo de 15 (quinze) dias e facultando a produção de prova, quando necessária.
Portanto, a alternativa está incorreta.
54 – Em ação cível, o mero despacho do juiz determinando a citação tem o condão de interromper a prescrição.
Gabarito Extraoficial: Correta.
Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).
§ 1º A interrupção da prescrição, operada pelo despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data de propositura da ação.
Quer saber um pouco da história dessa interrupção?
A redação original do CPC/73 trouxe a previsão de que a citação era o marco da interrupção da prescrição.
Todavia, uma reforma da década de 90 acrescentou o §1º ao artigo 219 do CPC, afirmando que, interrompida a prescrição, ela retroagiria à data da propositura da ação.
Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
§ 1o A interrupção da prescrição retroagirá à data da propositura da ação. (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
O problema era que, em 2002, o novo CC (art. 202, I) dispôs que o que interromperia a prescrição não seria a citação válida, mas sim o despacho do juiz que determinou a citação (momento anterior à citação válida, mas posterior à data de propositura da ação).
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
I – por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
Parcela doutrinária começou a dizer que o artigo 202 do CC teria derrogado o artigo 219 do CPC/73.
O NCPC tenta resolver o impasse gerado entre o art. 219, CPC/73 com o art. 202, CC, por meio do §1º do artigo 240.
Pela previsão legal, verifica-se que o que interrompe a prescrição é o despacho citatório (assumindo a regra do CC), e, uma vez interrompida a prescrição, retroage à data da propositura da ação.
Vejamos novamente o dispositivo legal:
Art. 240, § 1o A interrupção da prescrição, operada pelo despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data de propositura da ação.
Portanto, a alternativa está correta.
55 – Ao contrário da tutela de urgência, a tutela de evidência independe da demonstração de perigo de demora na prestação jurisdicional.
Gabarito Extraoficial: Correta.
A tutela de urgência exige o preenchimento dos requisitos:
a) probabilidade de direito (fumus boni iuris);
b) perigo de dano na demora (periculum in mora)
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Por outro lado, a tutela de evidência não depende do perigo na demora (perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo), necessitando apenas a probabilidade do direito, que se caracteriza pela subsunção do caso aos incisos (I a IV) do art. 311, CPC.
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
Portanto, a alternativa está correta.
56 – Ao reformar sentença que reconheceu prescrição, o tribunal deve determinar a devolução do processo ao juízo de primeiro grau, para julgamento e instrução, se for o caso.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
Segundo o art. 1.013, §4º, CPC, o tribunal, podendo, deverá julgar o processo, sem devolvê-lo ao juízo de primeiro grau.
Art. 1.013, § 4º Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau.
57 – O termo inicial do prazo de decadência para impetração de mandado de segurança contra aplicação de penalidade disciplinar é a data da publicação do respectivo ato no Diário Oficial.
Gabarito Extraoficial: Correta.
O examinador transcreveu o n. 6 da edição n. 91 da Jurisprudência em Teses do STJ.
Confiram:
Edição n. 91 da Jurisprudência em Teses; n. 6: O termo inicial do prazo de decadência para impetração de mandado de segurança contra aplicação de penalidade disciplinar é a data da publicação do respectivo ato no Diário Oficial. (AgInt no RMS 51.319, de relatoria da ministra Regina Helena Costa, na 1ª Turma).
58 – De acordo com o CPC, sentença transitada em julgado que tenha sido baseada em transação inválida poderá ser rescindida se o vício for verificado mediante simples exame dos documentos dos autos.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
Consoante o NCPC, o instrumento jurídico para impugnar sentença baseada em transação inválida não é ação rescisória, mas sim ação anulatória.
Art. 966, § 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.
Inclusive, essa é a posição mais recente do STF. Confiram:
A decisão judicial homologatória de acordo entre as partes é impugnável por meio de ação anulatória (art. 966, § 4º, do CPC/2015; art. 486 do CPC/1973). Não cabe ação rescisória neste caso. Se a parte propôs ação rescisória, não é possível que o Tribunal receba esta demanda como ação anulatória aplicando o princípio da fungibilidade. Isso porque só se aplica o princípio da fungibilidade para recursos (e ação anulatória e a ação rescisória não são recursos). STF. Plenário. AR 2440 AgR/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 19/9/2018 (Info 916).
Não cabe ação rescisória para desconstituir decisão judicial transitada em julgado que apenas homologou acordo celebrado entre pessoa jurídica e o Estado-membro em uma ação judicial na qual se discutiam créditos tributários de ICMS. É cabível, neste caso, a ação anulatória, nos termos do art. 966, § 4º do CPC. É inadmissível a ação rescisória em situação jurídica na qual a legislação prevê o cabimento de uma ação diversa. STF. Plenário. AR 2697 AgR/RS, Rel. Min. Edson Fachin, julgadoem 21/3/2019 (Info 934).
Querem saber um pouco mais sobre a discussão envolvendo essa temática?
No CPC/73, muito se discutia se a decisão homologatória de autocomposição era rescindível.
1ª corrente (Scarpinella Bueno): a ação anulatória (art. 486, CPC/73[2]) seria cabível nos casos de vício do negócio jurídico homologado, ainda que existisse sentença de mérito homologatória transitada em julgado.
A ação rescisória (art. 485, VIII, CPC/73[3]), por sua vez, seria manejada no caso de vício da própria sentença homologatória, e não no negócio jurídico homologado.
2ª corrente (HTJ, Marinoni, informativo 513, STJ) A sentença que homologasse o ato das partes seria anulável (art. 486), ao passo que a sentença que acolhia ou rejeitava o pedido com fundamento em renúncia, transação ou reconhecimento jurídico do pedido seria rescindível (art. 485, VIII).
Os efeitos da transação podem ser afastados mediante ação anulatória sempre que o negócio jurídico tiver sido objeto de sentença meramente homologatória. Se a sentença não dispõe nada a respeito do conteúdo da pactuação, não avançando para além da mera homologação, a ação anulatória prevista no art. 486 do CPC é adequada à desconstituição do acordo homologado. AgRg no REsp 1.314.900-CE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/12/2012 (informativo 513).
3ª corrente (Barbosa Moreira e Alexandre Câmara): A rescisória seria cabível se houvesse o trânsito em julgado enquanto que a ação anulatória seria o instrumento ideal para quando não tivesse havido o trânsito em julgado, por analogia ao art. 352, CPC/73.
Art. 352. A confissão, quando emanar de erro, dolo ou coação, pode ser revogada:
I – por ação anulatória, se pendente o processo em que foi feita;
II – por ação rescisória, depois de transitada em julgado a sentença, da qual constituir o único fundamento.
Parágrafo único. Cabe ao confitente o direito de propor a ação, nos casos de que trata este artigo; mas, uma vez iniciada, passa aos seus herdeiros.
O NCPC dissipou a controvérsia ao prever, no art. 966, §4º, que contra a homologação do juízo é cabível ação anulatória?
1ª corrente (Teresa Arruda Alvim[4]): Sim. Além do art. 966, §4º prever claramente a necessidade de ação anulatória para impugnar atos de disposição de direitos – reconhecimento jurídico do pedido, renúncia à pretensão e transação, o próprio rol do art. 966 não contempla a hipótese de rescisória contra decisão homologatória.
Art. 966, § 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.
Assim, a ação anulatória teria uma verdadeira função rescindente de sentença de mérito transitada em julgado.
Parece ser essa a corrente que tem sido adotada em prova e pelo STF.
Além de ser cobrada no presente certame, foi exigida na DPE-MA.
FCC/DPE-MA – Defensor Público/2018 – A ação rescisória c) é o meio correto para a impugnação de sentença homologatória de acordo entre as partes com trânsito em julgado.
Comentários: A alternativa C está incorreta. A decisão judicial homologatória de acordo entre as partes é impugnável por meio de ação anulatória (art. 966, § 4º, do CPC/2015).
A decisão judicial homologatória de acordo entre as partes é impugnável por meio de ação anulatória (art. 966, § 4º, do CPC/2015; art. 486 do CPC/1973). Não cabe ação rescisória neste caso. Se a parte propôs ação rescisória, não é possível que o Tribunal receba esta demanda como ação anulatória aplicando o princípio da fungibilidade. Isso porque só se aplica o princípio da fungibilidade para recursos (e ação anulatória e a ação rescisória não são recursos). STF. Plenário. AR 2440 AgR/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 19/9/2018 (Info 916).
Não cabe ação rescisória para desconstituir decisão judicial transitada em julgado que apenas homologou acordo celebrado entre pessoa jurídica e o Estado-membro em uma ação judicial na qual se discutiam créditos tributários de ICMS. É cabível, neste caso, a ação anulatória, nos termos do art. 966, § 4º do CPC. É inadmissível a ação rescisória em situação jurídica na qual a legislação prevê o cabimento de uma ação diversa. STF. Plenário. AR 2697 AgR/RS, Rel. Min. Edson Fachin, julgadoem 21/3/2019 (Info 934).
2ª corrente (Fredie Didier e Leonardo da Cunha): Se há homologação de negócio jurídico sobre o objeto litigioso (transação, renúncia ao direito sobre o que se funda a ação ou reconhecimento da procedência do pedido), há decisão judicial de mérito, que, uma vez transitada em julgado, somente poderá ser desfeita por rescisória ou querela nullitatis.
Com base no art. 966, caput, é cabível ação rescisória de sentença homologatória, podendo se fundar não só no conteúdo do ato de disposição de direito, mas também em vício da decisão de homologação.
Ex1: ação rescisória de decisão que homologou renúncia obtida mediante coação (art. 966, III);
Ex2: ação rescisória de decisão que homologou transação em fraude à lei (art. 966, III);
Ex3: ação rescisória de decisão homologatória por juízo absolutamente incompetente.
Ex4: Se a partilha for decidida ou homologada pelo juízo e a decisão tiver transitado em julgado, caberá ação rescisória.
Art. 658. É rescindível a partilha julgada por sentença:
I – nos casos mencionados no art. 657;
II – se feita com preterição de formalidades legais;
III – se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja.
Enunciado 137, FPPC: (art. 658; art. 966, §4º; art. 1.068) Contra sentença transitada em julgado que resolve partilha, ainda que homologatória, cabe ação rescisória.
Se a partilha for amigável, realizada extrajudicialmente, ou tendo sido homologado pelo juiz, mas ainda não transitou em julgado, será cabível ação anulatória.
Para essa 2ª corrente, portanto, o art. 966, §4º se destina a invalidação de atos processuais praticados pelas partes ou pelos auxiliares da justiça, não cuidando de invalidação de atos decisórios.
Isso porque os arts. 966, caput e 966, §2º deixam claro que decisão jurisdicional de mérito e sem mérito, uma vez transitadas em julgado, são alvos de ação rescisória.
Percebam que a 1ª corrente está se demonstrando predominante, devendo ser adotada em provas.
59 – A DP tem legitimidade ativa para propor ACP que tutele direitos individuais homogêneos, desde que comprovada a hipossuficiência econômica dos interessados, conforme entendimento do STJ.
Gabarito Extraoficial: Incorreta.
O STJ tem inúmeros julgados reconhecendo que a DP tem legitimidade ativa para propor ACP que tutela direitos individuais homogêneos ainda que não reste comprovada a hipossuficiência econômica dos interessados.
Isso porque o Tribunal da Cidadania entende que a expressão “necessitados” presente na CRFB inclui não só os hipossuficientes financeiros, mas também os organizacionais.
Confiram julgado da Corte Especial do STJ:
1. Controvérsia acerca da legitimidade da Defensoria Pública para propor ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos de consumidores idosos, que tiveram seu plano de saúde reajustado, com arguida abusividade, em razão da faixa etária. (…) 4. “A expressão ‘necessitados’ (art. 134, caput, da Constituição), que qualifica, orienta e enobrece a atuação da Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação Civil Pública, em sentido amplo, de modo a incluir, ao lado dos estritamente carentes de recursos financeiros – os miseráveis e pobres –, os hipervulneráveis (isto é, os socialmente estigmatizados ou excluídos, as crianças, os idosos, as gerações futuras), enfim todos aqueles que, como indivíduo ou classe, por conta de sua real debilidade perante abusos ou arbítrio dos detentores de poder econômico ou político, ‘necessitem’ da mão benevolente e solidarista do Estado para sua proteção, mesmo que contra o próprio Estado. Vê-se, então, que a partir da ideia tradicional da instituição forma-se, no Welfare State, um novo e mais abrangente círculo de sujeitos salvaguardados processualmente, isto é, adota-se uma compreensão de minus habentes impregnada de significado social, organizacional e de dignificação da pessoa humana ” (REsp 1.264.116/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/10/2011, DJe 13/04/2012). 5. O Supremo Tribunal Federal, a propósito, recentemente, ao julgar a ADI 3943/DF, em acórdão ainda pendente de publicação, concluiu que a Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública, na defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, julgando improcedente o pedido de declaração de inconstitucionalidade formulado contra o art. 5.º, inciso II, da Lei n.º 7.347/1985, alterada pela Lei n.º 11.448/2007. STJ. CE. EREsp1.192.577-RS, Rel. Laurita Vaz, d.j. 21/10/2015 (Info 573)
Aprofundando, em nosso curso, explicamos o seguinte:
no que tange ao conceito de necessitados, os Defensores Públicos[5] diferenciam:
a) Função típica (atribuição tradicional): ligada à hipossuficiência/vulnerabilidade econômica/financeira;
A interpretação literal do termo “necessitados” (art. 134 da CRFB), em conjugação com a expressão “insuficiência de recursos” (art. 5º, LXXIV, da CRFB) revela a função constitucional típica da Defensoria Pública, voltada para aqueles que não possuem condições econômicas de arcar com o pagamento das despesas necessárias ao pleno e adequado acesso à justiça.
b) Função atípica (atribuição não tradicional): ligada à hipossuficiência jurídica, organizacional e circunstancial.
A hipossuficiência pode derivar de relação jurídica. Cite-se o caso de um acusado criminalmente que não constitui advogado. Ele está em posição de vulnerabilidade frente à acusação, devendo um Defensor Público defendê-lo, independente de sua condição financeira[6].
Doutro lado, segundo Ada Pellegrini Grinover, são carentes organizacionais todos aqueles “que no intenso quadro de complexas interações sociais hoje reinante, são isoladamente frágeis perante adversários poderosos do ponto de vista econômico, social, cultural ou organizativo, merecendo, por isso mesmo, maior atenção com relação a seu acesso à ordem jurídica justa e à participação por intermédio do processo”.
São albergados todos aqueles que são socialmente vulneráveis: os consumidores, os usuários de serviços públicos, os usuários de planos de saúde, os que queiram implementar ou contestar políticas públicas, como as atinentes à saúde, à moradia, ao saneamento básico, ao meio ambiente etc. É no campo da hipossuficiência organizacional que a Defensoria Pública deflagra as ações coletivas.
Por fim, além dessa tríade (hipossuficiência econômica, jurídica e organizacional), já se fala em uma quarta vertente da hipossuficiência/necessidade – a hipossuficiência circunstancial.
Franklyn Roger e Diogo Esteves, sempre eles, explicam e dão exemplo:
Mesmo possuindo condições econômicas e sociais favoráveis para o exercício regular de seus direitos, o indivíduo pode enfrentar situações episódicas em que o acesso ao sistema de justiça pode ser obstaculizado ou inviabilizado. Nesses casos, a assistência jurídica gratuita prestada pela Defensoria Pública pode constituir importante instrumento para a superação da vulnerabilidade episódica ou transitória, garantindo o acesso pleno à justiça.
Esse quadro de vulnerabilidade momentânea vem sendo identificado tipicamente nos plantões judiciários diurnos e noturnos da Defensoria Pública, quando pessoas que possuem recursos suficientes para contratar advogado acabam necessitando da assistência jurídica gratuita para obter tutela judicial considerada emergencial (ex.: pessoa com vastos recursos econômicos procura o plantão judicial noturno com o objetivo de garantir a realização de procedimento cirúrgico emergencial em familiar que se encontra internado, buscando a assistência jurídica da Defensoria Pública por não ter tido tempo hábil para contatar advogado particular; nesse caso, o serviço jurídico-assistencial público deve atuar unicamente para obter e garantir o cumprimento da tutela provisória antecipada de urgência, devendo a causa ser posteriormente assumida por advogado regularmente contratado pela parte).
60 – De acordo com o STF, são imprescritíveis as ações de ressarcimento de danos ao erário decorrentes de ato doloso de improbidade.
Gabarito Extraoficial: Correta.
Foi o que decidiu o STF no seguinte julgado:
São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. STF. Plenário. RE 852475/SP, Rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, Rel. para acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 08/08/2018.
Terminamos, meus amigos.
Ressalto que a presente correção está sujeita a equívocos e posteriores correções. Inclusive, estou plenamente aberto a discussões e debates. Qualquer dúvida ou sugestão, sigo à disposição (rodrigovaslin@gmail.com e em nosso Fórum de Dúvidas – para os alunos).
Grande abraço,
Rodrigo Vaslin
[1] Isso foi uma mudança em relação ao CC/2002, porquanto o art. 235 do CC/16 exigia o consentimento prévio qualquer que fosse o regime de bens.
[2] Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.
[3] Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
VIII – houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença;
[4]https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI287442,41046-Transacao+homologada+anulatoria+ou+rescisoria
[5] João Paulo Cachete, Defensor Público da União, <https://blog.ebeji.com.br/assistencia-juridica-dilatada-e-o-quadruplo-alcance-do-termo-vulnerabilidade/>
[6] A DPU, por exemplo, defendeu acusado na operação Lavajato que não era hipossuficiente econômico, mas sim jurídico. Veja: https://www.conjur.com.br/2015-fev-10/defensoria-questiona-grampos-competencia-moro-lava-jato
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