Vamos iniciar com uma breve revisão da matéria.
Direitos de Nacionalidade na CF
Será nacional aquele que possui vínculo jurídico de nacionalidade com o Estado Brasileiro. Para aferir esse vínculo, a doutrina classifica critérios e modos de aquisição da nacionalidade. Uma vez nacional, a pessoa passa a ser parte do povo brasileiro e, devido a isso, sujeita-se aos deveres impostos pelo ordenamento jurídico e, em contrapartida, poderá exigir proteção jurídica do nosso Estado.
O assunto é disciplinado no art. 12, da Constituição Federal, e na Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro). Dada o histórico das bancas de concurso, vamos abordar o art. 12.
Brasileiro Nato
Nossa CF define primeiramente o brasileiro nato, que será originariamente brasileiro, caso se enquadre nos critérios de sangue (ius sanguini) ou do local de nascimento (ius soli), na forma do art. 12, I.
Esquematizando o Texto Constitucional, temos:
Brasileiro naturalizado
No inc. II, do art. 12, está a disciplina do brasileiro naturalizado. A aquisição da nacionalidade depende do preenchimento de uma série de requisitos e da manifestação de vontade do interessado. Sintetizamos o Texto Constitucional da seguinte forma:
Diante disso, pergunta-se:
Brasileiro nato e naturalizado recebem o mesmo tratamento jurídico perante nosso ordenamento?
A regra é “sim”! Somente a CF poderá dispender tratamento diferenciado entre brasileiro nato e naturalizado. Assim, a legislação infraconstitucional não poderá diferenciá-los.
Para fins de prova vejamos as distinções da CF:
Tratamento Jurídico diferenciado entre Brasileiro Nato e Naturalizado
Extradição
De acordo com o art. 5º, LI, da CF, o brasileiro nato nunca poderá ser extraditado. Já o brasileiro naturalizado pode ser extraditado em 2 hipóteses:
É justamente essa questão que foi explorada pelo STF. Veremos adiante!
Cargos Privativos de Brasileiro Nato
A CF estabelece, no art. 12, §3º, um rol de cargos que, em razão da linha sucessória Presidencial ou por motivos de segurança nacional, somente podem ser ocupados por brasileiros natos. Lembre-se:
Somente podem ser ocupados por brasileiros natos, em razão:
> da linha sucessória, os cargos de:
> de segurança nacional, o cargos de:
Membros do Conselho da República
O Conselho da República é o órgão superior de consulta da Presidência da República, criado para assessorar o presidente em momentos de crise.
Prevê o art. 89, IV, da CF, que os seis cidadãos que serão escolhidos (2 pelo Presidente da República) e eleitos (2 pelo Senado Federal e 2 pela Câmara dos Deputados) devem ser brasileiros natos.
Proprietários e capital social de empresas jornalísticas
Estabelece o art. 222, caput e §1º, da CF, que o naturalizado somente poderá ser proprietário de empresa jornalística caso esteja naturalizado há mais de 10 anos. Já em relação ao capital social, fixa-se que 70% do capital da empresa deve ser de propriedade de brasileiros natos ou brasileiros naturalizados há mais de 10 anos.
Em síntese:
Perda da nacionalidade e a jurisprudência do STF
Feita a revisão vamos explorar as hipóteses de perda da nacionalidade, cotejando com o julgamento do MS 33.864 pelo STF.
A CF estabelece no art. 14, §4º, duas hipóteses em que será declarada a perda da nacionalidade e, em relação à segunda hipótese, duas exceções. Veja:
Diante disso, um questionamento sempre presente é:
As hipóteses acima aplicam-se apenas ao brasileiro naturalizado ou poderão ser aplicadas ao nato também?
A primeira hipótese, denominada de “perda-punição”, aplica-se apenas ao brasileiro naturalizado que praticar atividade nociva ao interesse nacional. Será necessária a instauração de processo judicial, que tramitará perante a Justiça Federal, com fundamento no art. 109, X, da CF.
Portanto, não é possível declarar a perda da nacionalidade de brasileiro por atividade nociva ao interesse nacional.
A segunda hipótese, denominada de “perda-mudança”, atinge natos e naturalizados. Se um brasileiro adquirir voluntariamente outra nacionalidade estrangeira perderá a brasileira. Essa é a regra. Aqui não é necessário nem sequer processo judicial. A perda decorre de processo administrativo perante o Ministério da Justiça.
Há, como esquematizado acima, duas exceções a essa hipótese: a) reconhecimento da nacionalidade brasileira como originária; e b) imposição da naturalização para que o sujeito possa permanecer no país estrangeiro ou para o exercício de direito civis no exterior.
Fora essas hipóteses do art. 14, §4º, da CF, não há explícita em nosso Texto Constitucional outras possibilidades de perda da nacionalidade brasileira.
Contudo, no julgamento do MS 33.864, o STF referendou portaria do Ministro da Justiça que decretou a perda da nacionalidade de brasileira nata que voluntariamente adquiriu a nacionalidade dos EUA, muito embora já tivesse assegurado o direito de permanecer e trabalhar nos EUA (green card).
A celeuma é interessante, pois Claudia Sobral foi casada com o americano Karl Hoerig. No mesmo dia em que o americano foi assassinado, a brasileira retornou ao país e é apontada pelas autoridades americanas como a principal suspeita pelo homicídio.
Diante disso, as autoridades americanas ingressaram com pedido de extradição da brasileira nata.
Assim, pergunta-se:
É possível extraditar brasileiro nato?
Não é possível em regra.
Tal como entenderam os Min. Edson Fachin e Marco Aurélio, embora instigante a discussão, o art. 5º, LI é indiscutível. Logo, não podemos ter a extradição de brasileiro nato.
Contudo, a tese adotada por Luís Roberto Barroso (e seguida por Rosa Weber e Luiz Fux) é no sentido de que, dada a voluntariedade da aquisição da nacionalidade americana, Claudia Sobral, com fundamento no art. 12, §4º, perdeu a nacionalidade nata brasileira, viabilizando-se a extradição pleiteada.
Assim, nós temos em um primeiro momento, a perda da nacionalidade brasileira pela aquisição voluntária de outra nacionalidade. Consequentemente, Claudia Sobral não está protegida pela garantia constitucional do art. 5, LI.
Diante disso, por maioria de 3 x 2, foi negado seguimento ao mandado de segurança, mantendo-se hígida a portaria do Ministro da Justiça que decretou a perda da nacionalidade de Claudia Sobral e a extradição para responder pelo crime comum que lhe fora imputado.
Interessante, não?!
Para fins de prova, sugere-se ter em mente os dispositivos constitucionais que esquematizados acima, especialmente, o art. 12 (nacionalidade), art. 5º, LI, art. 89, VI e art. 222, caput e §1º, da CF.
Portanto, apenas se a questão se reportar à jurisprudência do STF, é que você poderá considerar a possibilidade de extradição de brasileiro nato, quando houver voluntariamente adquirido outra nacionalidade, hipótese em que a pessoa perderá a nacionalidade brasileira.
Convido-o, por fim, para conheceu nossos cursos de Direito Eleitoral:
https://www.estrategiaconcursos.com.br/cursosPorMateria/direito-eleitoral-9/
Se você tiver alguma dúvida, deixe seu comentário abaixo.
Pessoal, curtam minha página no Facebook: Professor Ricardo Torques – Direito Eleitoral.
Sigam-me no Periscope: https://www.periscope.tv/rstorques
Bons estudos!
Ricardo Torques
Professor de Direito Eleitoral
O Tribunal de Justiça do Maranhão divulgou o resultado final dos provados de nível médio…
Foi divulgado nesta quinta-feira, 21 de novembro, o resultado final dos aprovados de nível médio…
O concurso do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), atrelado ao Concurso Nacional Unificado…
O concurso do Ministério da Cultura (MinC), que faz parte do edital unificado, habilitou novos…
O concurso do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), contemplado no edital unificado, habilitou…
Novos candidatos foram habilitados para a correção da prova discursiva do concurso da Agência Nacional…
Ver comentários
Excelente artigo e em boa hora, professor! Estava aguardando por algo parecido.
Curioso notar que a decisão foi, pelo menos a meu ver, erroneamente noticiada por grande parte da mídia (mesmo a especializada). A rigor não houve extradição de brasileiro nato. Houve a confirmação da declaração de perda de nacionalidade de uma brasileira nata (em conformidade com o que determina a Constituição) seguida da extradição dessa pessoa, que não podia mais ser considerada como brasileira nata.
Mas fica a minha dúvida: o "green card" realmente confere ao estrangeiro nos EUA a fruição total dos direitos civis?
Olá Vitor, justamente! As notícias que vi levam a uma conclusão diversa da que cheguei após estudar a situação mais a fundo. De todo modo, será necessário aguardar o acórdão para que saibamos quais foram os argumentos utilizados.
Não, não tenho certeza, mas não concede TODOS os direitos civis, tal como o direito de votar. Ele constitui uma autorização permanente para permanecer nos EUA.
Valeu pelo artigo, Ricardo! Sempre fazendo a diferença! /0/
Obrigado Willy, continue nos acompanhando e excelentes estudos!
Adorei esse artigo, se não tivesse lido jamais iria ficar sabendo desse problema. Na minha opinião o STF foi muito rigoroso, se a moça é Brasileira nata, ela continua sendo brasileira, mesmo sendo naturalizada estrangeira, eles deveriam observar que o marido era estrangeiro e morava lá, nesse caso ela tinha que ir morar com ele. Vou dá um exemplo. Um jogador brasileiro naturalizou-se Espanhol, foi convocado para a seleção brasileira, mas ele preferiu jogar pela seleção da Espanha. Se ele quisesse jogaria pela nossa seleção, e agora..Ele poderia jogar pela seleção ou não, se for positivo, nesse caso está havendo dois pesos e duas medida. O Jogador poderia voltar sem empecilho, mas a moça não pode....Tem que ser extraditada, nesse caso o jogador seria extraditado também?
Olá Francisco, pelo simples fato de o sujeito ser espanhol ele não poderá "jogar na seleção brasileira". Na realidade, ele somente adquirirá a nacionalidade brasileira se preencher os requisitos da naturalização extraordinária. Além disso, pela situação do modo como você trouxe não há qualquer crime (comum ou de tráfico) que justifique a extradição. De todo modo, concordo com você que a decisão foi realmente dura! Excelentes estudos!
Professor, tem um erro na segunda imagem:
Naturalização ordinária = decisão discricionária;
Naturalização extraordinária = decisão vinculada.
Olá Izabela! Já retificado ;)
Bons estudos!
Professor, na CF - art. 12 parág. 4 inc. II a - traz outra exceção à perda da nacionalidade: de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira. Neste caso, por acaso não houve esse reconhecimento?
Olá Daniele, acredito que não, caso contrário não se justificaria o decreto de perda.
BOM
Artigo muito esclarecedor sobre o posicionamento do STF em relação ao caso concreto.
No entanto, me surgiu a seguinte dúvida:
Se, hipoteticamente, já tivesse sido declarada a perda da nacionalidade de uma brasileira nata por aquisição voluntária de outra, ela retornasse ao Brasil (sem ser investigada por qualquer cometimento de crime) e requeresse novamente a nacionalidade brasileira, a nova condição dela seria de brasileira nata ou naturalizada?
Há divergência a respeito Roberta. O entendimento predominante é no sentido de que ela seria naturalizada.
Caro Ricardo Torques,
Eu peço licença para discordar da forma equivocada que essa notícia (não a decisão) está sendo veiculada. E para ser o mais objetivo possível, só tenho a destacar que, justamente por ter havido a naturalização da ré, por opção da mesma, perdendo a brasileira, ela NÃO É MAIS, brasileira nata. Ela já foi, e tal condição jurídica, ao deixar de existir, anula, para fins legais e até mesmo políticos, o fato de ela ter nascido brasileira.
Ou seja, é possível a extradição de brasileiro nato? NÃO, E SEM EXCEÇÃO, POIS NÃO HOUVE EXCEÇÃO NA DECISÃO.
Não há forma de concordar que a ré, no caso em questão, pudesse ser considerada brasileira nata. Ela é somente norte-americana, e sua condenação se baseia nisso.
Cordialmente,
André Meireles
É isso mesmo André!
Bons estudos!
Parabéns pelo artigo professor.
Agora o STF errou feio, ao meu ver, o portador do Green Card não possui os mesmos direitos que o cidadão americano. Além disso, ele está sujeito a algumas restrições que não são aplicadas ao cidadão americano.
Independente da pessoa em questão está usando a nacionalidade para fugir de um crime o STF não poderia ter feito isso.
Ricardo, excelente! Com esse exemplo prático (e real! rs) ficou mais fácil. Obrigado mestre.