Comentários às Súmulas do TST – Parte 10 – Estudos para os TRTs
Texto extraído do meu livro DIREITO SUMULAR TST
ESQUEMATIZADO, 3ª Ed, 2013, Ed. Saraiva.
SÚMULA N. 90 I O tempo II A incompatibilidade entre os horários de início III A mera insuficiência de transporte público não IV Se houver V Considerando |
A Súmula n. 90 do TST, que faz
referência às horas in itinere, obteve nova redação com a incorporação das Súmulas ns. 324 e 325, bem como das Orientações
Jurisprudenciais ns. 50 e 236 da SBDI-1, por meio da Resolução n.
129/2005 do TST, publicada no DJ nos dias 20, 22 e 25.04.2005.
Trata-se de um dos
temas mais interessantes e importantes no Direito do Trabalho, concernente à
jornada de trabalho.
Sabe-se que, a
partir da CRFB/88, a jornada de trabalho diária passou a ser de até 8 (oito)
horas e a semanal de no máximo 44 (quarenta e quatro) horas. Entende-se por
jornada de trabalho, nos termos do art. 4º da CLT, (…) o período em que o empregado esteja à
disposição do
empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente
consignada.
Isso quer dizer que a jornada de trabalho começa a ser contada a partir do
momento em que o empregado chega à empresa, terminando com a sua saída. Se o
empregado laborou sem parar durante todo o dia ou ficou sem fazer nada,
houve o cumprimento integral da jornada de
trabalho, pois não se requer esforço efetivo.
Se o empregador determina ao empregado que espere ordens que serão logo anunciadas
e, esperando, ele se mantém durante todo o dia, é devida a remuneração daquela
jornada, com todos os seus efeitos legais.
Há que se ressaltar
que, mesmo sendo considerado para fins previdenciários (reconhecimento de acidente de trabalho), o tempo despendido
na ida ao trabalho e no retorno à residência não é, em regra, considerado jornada de trabalho.
Se João sai de casa às 5h da manhã e enfrenta 2 (duas) horas de trânsito para
chegar ao seu local de trabalho, essas horas não
serão consideradas trabalhadas, não possuindo o
empregador qualquer obrigação de arcar com tal custo. Nas grandes cidades, os
trabalhadores saem de casa cada vez mais cedo e chegam mais tarde, em virtude
do caos do trânsito, em especial nos dias de chuva. Infelizmente, esse ônus deve
ser suportado pelo próprio empregado. Se esse período não é computado
na jornada de trabalho, não pode ser considerado hora in itinere.
Existem
determinadas empresas que fornecem condução
para seus funcionários, proporcionando-lhes mais comodidade
e segurança. O empregado que não precisa enfrentar o
trânsito complicado de uma grande cidade chega melhor disposto para o trabalho,
mais calmo e relaxado. Ao utilizar-se da condução fornecida
pelo empregador, tem menos gastos com combustível, pode inclusive tirar um
cochilo no caminho, ler um livro etc. Exemplo típico são os ônibus contratados
e pagos pela Vale na cidade de Vitória, Capital do Estado do Espírito Santo.
Pela manhã, é comum ver os funcionários da companhia esperando os ônibus que os
levarão ao trabalho. Da mesma forma, acontece em outras cidades. Apesar de o
local de trabalho ser de fácil
acesso,
sendo possível, aos que assim preferem, locomover-se em carro próprio, a empresa prefere proporcionar tal
comodidade aos funcionários.
Contudo, o tempo
despendido nessas situações entre a casa do empregado e o local de trabalho não pode ser considerado jornada de trabalho, razão pela qual entende-se
que, por se tratar de comodidade ofertada aos
empregados, não se
configura hora in itinere.
Para configurar-se
a hora in itinere (ou
hora no itinerário, em tradução
livre), há que se preencher todos os requisitos
dispostos no inc. I da súmula em comento. Além de o transporte ser fornecido pelo empregador,
o local de trabalho deve ser de difícil acesso ou não
servido por transporte público regular. São esses os dois requisitos
legais: condução
fornecida pelo empregador e local de difícil acesso ou não servido por
transporte público regular.
Assim, não há que
se falar em horas
in itinere se o local for de difícil acesso e o empregado
dirigir-se ao trabalho em veículo
próprio,
emprestado, de um amigo etc. Também não será considerado se o local for de
difícil acesso, mas existir transporte
público regular.
Somente surge o
direito à percepção do benefício se o fornecimento da condução pelo empregador
vier associado à ideia de necessidade, e não de comodidade. Por que a empresa fornece condução para os
funcionários? Se a resposta for por necessidade, por ser a única forma
dos mesmos chegarem ao trabalho, já que é de difícil acesso o
local, estarão preenchidos os requisitos legais. Porém, se a resposta for por comodidade, para que cheguem
mais descansados ao trabalho, por exemplo, não restarão preenchidos os
requisitos exigidos por lei.
Pode ocorrer,
contudo, que exista transporte
público regular
até o local de trabalho, mas os horários sejam incompatíveis com a jornada de trabalho. Caso a jornada tenha início
às 8h da manhã e a única linha de ônibus passe na residência do empregado às
6h, obrigando-o a esperar das 6h30 às 8h até o início da mesma, pode-se afirmar
existir (…)
incompatibilidade entre os horários de início e término da jornada do empregado
e os do transporte público regular. Nessa situação, considera-se
inexistir serviço público regular de fato, sendo devidas as horas in itinere caso a empresa
forneça a condução. Considera-se que tal condução é o único meio do empregado deslocar-se até o
trabalho, preenchendo-se a ideia antes exposta de necessidade, e não de comodidade.
No
entanto, nos termos do inc. III da súmula ora analisada, a mera insuficiência de transporte
público não enseja o pagamento de horas in itinere. Se
existe transporte público regular, mas é insuficiente, como pela
existência de poucos ônibus ou metrô, tal fato não acarreta o pagamento
das horas despendidas no trajeto até o trabalho, pois a condução fornecida pelo
empregador nessa hipótese configura apenas comodidade, pois o empregado,
mesmo com algumas dificuldades, poderia valer-se do transporte público
e chegar ao local de trabalho. Esse era o entendimento da Súmula n. 324 do TST, cancelada em virtude da incorporação
à Súmula n. 90.
Por vezes, as horas
in itinere
compreendem todo o período de tempo em que o
empregado permanece dentro da condução ofertada pelo empregador, por inexistir totalmente transporte público regular para
o local de trabalho. Não há qualquer linha que o leve até aquela localização.
Outras vezes ocorre existir transporte público regular em parte do trajeto, inexistindo em
outra parte. Nessa situação, o fornecimento da condução pelo empregador em todo
o trajeto importa parte comodidade e
parte necessidade.
Nessa hipótese, as
horas in itinere
somente compreenderão o percurso não compreendido pelo transporte público regular.
Essa situação pode ocorrer quando os trabalhadores residem na cidade, mas
laboram em indústria situada em local afastado do centro ou, então, para
empregados que trabalham em empresas especializadas em perfuração de poços de
petróleo, em geral situados em áreas de difícil acesso. Se houver transporte público em parte do trajeto
apenas, as horas in
itinere serão consideradas apenas na outra parte do percurso.
Esse era o entendimento da Súmula n.
325 do TST, cancelada em virtude da incorporação à Súmula n. 90.
Por fim, destaca-se
o inc. V da súmula, que possui a seguinte redação: Considerando que as horas in
itinere são
computáveis na jornada de trabalho, o tempo que extrapola a jornada legal é
considerado como extraordinário e sobre ele deve incidir o adicional
respectivo. Trata-se da Orientação Jurisprudencial n. 236 da SBDI-1 do TST, cancelada em virtude
de sua incorporação à Súmula n. 90.
Trata-se de norma
de fácil entendimento. Se a jornada diária-padrão imposta pela CRFB/88 é de 8
(oito) horas, nenhum empregado poderá manter-se à disposição
do empregador, salvo situações excepcionais, em período superior ao mencionado. Se o período compreendido
entre o momento em que o empregado adentra
a condução fornecida pelo empregador, para levá-lo a local de difícil acesso ou não servido por transporte regular, e o momento em
que chega ao trabalho é considerado jornada de trabalho, assim como o período
do retorno até sua residência, concluiu-se que tal prazo deve ser considerado
para fins de observação quanto ao respeito à jornada diária máxima. Se o
empregado gasta 1 (uma) hora na ida e outra na volta, nas condições já
explicadas, somente poderá laborar no local de trabalho durante 6 (seis) horas,
sob pena de lhe ser pago adicional de horas extraordinárias. As 2 (duas) horas
gastas no trajeto são
consideradas jornada de trabalho. Se o empregado laborar 8 (oito)
horas no local de
trabalho, em verdade estará trabalhando 10 (dez) horas, o que
gera o direito à percepção de horas extras.
Em situações
normais, em que não ocorre hora in itinere, a jornada é computada a partir do momento em
que se inicia o trabalho no local predeterminado, findando quando o empregado
se retira daquele.
Na
situação posta linhas atrás, em que se vislumbram todos os requisitos legais, a
jornada é contada a partir do momento em que o empregado ingressa na condução
até o momento em que dela sai, no retorno para sua casa. Claro que não é considerado o
intervalo intrajornada para descanso e alimentação e outros de igual natureza
jurídica.