Concurso CNMP: acordo de não persecução penal (ANPP)
Fala, pessoal, tudo certo? Hoje vamos analisar a figura do acordo de não persecução penal (ANPP), introduzido no ordenamento jurídico brasileiro a partir da Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime), a qual acrescentou o artigo 28-A no Código de Processo Penal (CPP). Para isso, analisaremos tanto aspectos da legislação pertinente quanto da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Primeiramente, é bom que se esclareça que, não obstante o Supremo Tribunal Federal (STF) ter, no bojo das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) nº 6298, 6299, 6300 e 6305, suspendido liminarmente alguns dos dispositivos inseridos na legislação penal e processual penal pelo Pacote Anticrime, esse não foi o caso do ANPP, encontrando-se em pleno vigor desde a publicação da legislação alteradora.
Sendo assim, vejamos a redação do caput do art. 28-A do CPP:
“Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: (…)
Cabimento do ANPP
Valendo-nos da redação acima transcrita do dispositivo legal, vamos, a partir de agora, dissecar o cabimento do acordo de não persecução penal (ANPP):
Formalidades
Quando não for caso de arquivamento do inquérito policial: deste trecho do dispositivo podemos extrair, portanto, o momento em que o ANPP poderá ser proposto, qual seja, na fase pré-processual (antes do oferecimento da denúncia).
Confissão formal e circunstancial: para o STJ, citando Paulo Queiroz, a confissão formal e circunstancial deve ser entendida como confissão simples e voluntária. Deverá, portanto, narrar a motivação, as circunstância juridicamente relevantes, entre outros pontos para o entendimento da infração penal cometida.
Destaca-se que, para o STJ, não é necessário que haja confissão antes da propositura do ANPP:
A exigência de que a confissão ocorra no inquérito para que o Ministério Público ofereça o acordo de não persecução penal traz, ainda, alguns inconvenientes que evidenciam a impossibilidade de se obrigar que ela aconteça necessariamente naquele momento. Deveras, além de, na enorme maioria dos casos, o investigado ser ouvido pela autoridade policial sem a presença de defesa técnica e sem que tenha conhecimento sobre a existência do benefício legal, não há como ele saber, já naquela oportunidade, se o representante do Ministério Público efetivamente oferecerá a proposta de ANPP ao receber o inquérito relatado. Isso poderia levar a uma autoincriminação antecipada realizada apenas com base na esperança de ser agraciado com o acordo, o qual poderá não ser oferecido pela ausência, por exemplo, de requisitos subjetivos a serem avaliados pelo membro do Parquet. (HC n. 657.165/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022.)
Da infração penal
Infração penal SEM grave ameaça ou violência: não se proporá o ANPP em caso de infrações penais praticadas com violência ou grave ameaça, como o roubo (art. 157, CP), a extorsão (art. 158, CP), homicídio (art. 121, CP), estupro (art. 213, CP), etc.
Ademais, chama-se atenção para o fato de o artigo mencionar “infração penal”, englobando, portanto, tanto as contravenções penais quanto os crimes.
Infração penal com pena MÍNIMA INFERIOR a 04 anos: note-se que o dispositivo não fala em “menor ou igual” a 04 anos, e sim pena mínima inferior. Portanto, a propositura do acordo de não persecução penal pressupõe crime com pena mínima INFERIOR a 04 anos.
Outro ponto a ser destacado é que o candidato não deve confundir a análise sobre a pena MÍNIMA com a pena máxima do crime. Isso porque, em outros institutos de direito penal e/ou processual penal, leva-se em consideração a pena máxima da infração penal para análise do cabimento de determinada medida.
Como exemplo, cita-se o cabimento da prisão preventiva (art. 313, inciso I, CPP); a possibilidade de a autoridade policial fixar fiança (art. 322, CPP); a definição do procedimento/rito processual ordinário e sumário (art. 394, § 1º, I e II, CPP). Ademais, a pena máxima presta-se para a definição dos crimes de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei 9.099/95); etc.
→ Importante: a pena mínima será analisada levando-se em consideração as causas de aumento (majorantes) e diminuição (minorantes) aplicáveis ao caso concreto.
Legitimação e condições
Legitimação: a autoridade pública legitimada a propor o ANPP é o Ministério Público;
O ANPP deve ser necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: aferir-se-á este critério mediante o cumprimento de condições ajustadas cumulativa e alternativamente, elencadas nos incisos do art. 28-A do CPP. Trataremos delas a seguir, em tópico apartado.
Jurisprudência quanto ao cabimento do ANPP
Há direito subjetivo ao ANPP?
- Ainda quanto ao cabimento, é importante que fique claro que NÃO HÁ direito subjetivo ao Acordo de não persecução penal (ANPP). Ou seja, o investigado não pode exigir que seja proposto o acordo de não persecução penal em seu favor.
Trata-se de entendimento uníssono tanto no Supremo Tribunal Federal quanto no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. Tanto é assim que o art. 28-A menciona que o MP “poderá”, não “deverá”, propor o acordo.
Desse modo, ainda que o § 14 do art. 28-A do CPP possibilite ao investigado, no caso de recusa do Ministério Público em propor o acordo, que aquele requeira a remessa dos autos a órgão superior do MP, não se considera obrigatório o oferecimento do Acordo de não persecução penal (ANPP), uma vez que a decisão será revisada e não necessariamente revertida.
Nessa esteira, o STJ entende que não há previsão normativa sobre o momento em que o investigado deva ser cientificado do não oferecimento de ANPP. Por conseguinte, não há obrigação de o Ministério Público expedir notificação prévia, ao oferecimento da denúncia, de que não o oferecerá (STJ, AgRg no REsp n. 2.006.770/RN, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/9/2022, DJe de 19/9/2022).
O Tribunal da Cidadania, ainda, firmou compreensão segundo a qua o controle do Poder Judiciário quanto ao pedido de revisão do não oferecimento do ANPP deve se limitar a questões relacionadas aos requisitos objetivos, não é, portanto, legítimo o exame do mérito a fim de impedir a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público (STJ, AgRg no RHC n. 152.756/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 14/9/2021, DJe de 20/9/2021)
É possível aplicar o ANPP a situações pretéritas?
- O STJ entende pela possibilidade de aplicação retroativa do acordo de não persecução penal, desde que NÃO recebida a denúncia, haja vista que, tratando-se de norma de natureza híbrida (processual e material), deve ser aplicada aos fatos ocorridos antes da sua entrada em vigor, desde que não recebida denúncia, em consonância com o princípio do tempus regit actum e com a retroatividade penal benéfica. Nesse sentido: (STJ, AgRg no HC n. 778.828/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 08/11/2022, DJe de 16/11/2022)
Das condições necessárias para a reprovação e prevenção do crime
Conforme mencionado no último requisito de cabimento acima elencado, para a propositura do acordo de não persecução penal deverá ser demonstrado o cumprimento de algumas condições.
As condições a seguir arroladas deverão estar presentes ora cumulativa (todas juntas) ora alternativamente (uma ou algumas delas juntas):
I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
II – renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;
III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);
IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou
V – cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.
Hipóteses em que o ANPP não se aplica
O § 2º do artigo 28-A do CPP disciplinou as hipóteses em que o acordo de não persecução penal (ANPP) não se aplica:
- quando for cabível a transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da Lei 9.099/95 (artigo 76):
A transação penal assemelha-se ao ANPP por se cuidar de espécie de acordo entre o Ministério Público e o acusado, através do qual há a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta; - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas:
Nota-se que a última parte não exige, necessariamente, condenação por crime anterior, mas apenas que haja indícios de conduta habitual/reiterada/profissional - se o agente houver sido beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e
Trata-se de previsão que se assemelha àquela do artigo 76, § 2º, III, da Lei 9.099/95, isso é, que não se admitirá proposta de transação penal se o agente houver sido beneficiado anteriormente, no prazo de 5 anos, pela aplicação da transação.
No entanto, o ANPP não poderá ser proposto tanto se houver beneficiamento por proposta de acordo de não persecução penal nos 5 anos anteriores quanto se houver sido beneficiado por transação penal ou suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/95); - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.
Ações procedimentais para proposta e homologação do ANPP
A partir de agora, passaremos a tratar dos §§ 3º ao 13 do art. 28-A do CPP (os §§ 1º, 2º e 14 abordamos acima).
A previsão inicial de tais parágrafos é a de que o acordo de não persecução penal (ANPP) deverá ter sua formalização por escrito. A formalização da proposta envolverá seu titular (MP), o investigado e o defensor deste.
Após, uma vez formalizada a proposta, os proponentes a levarão ao conhecimento do Juízo competente. Assim, este deverá, necessariamente, realizar audiência.
Nessa audiência o juiz verificará a voluntariedade do acordo (ou seja, se o investigado, que estará assistido de seu defensor, realmente queria prosseguir daquela forma). Também analisará a legalidade do procedimento.
Assim, entendendo que as condições dispostas no ANPP são “inadequadas, insuficientes ou abusivas”, o juiz devolverá os autos ao MP para reformulação da proposta. A proposta reformulada deverá, assim, ser novamente aquiescida pelo investigado e seu defensor.
Homologação do acordo
Estando tudo certo, ocorrerá a homologação do acordo, e o juiz devolverá os autos para que o MP inicie a execução perante o juízo da execução penal. Sobre isso, vejamos como o STJ já se posicionou:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. ART. 28-A, § 6.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. APLICAÇÃO DAS REGRAS ATINENTES À EXECUÇÃO PENAL. COMPETÊNCIA. CUMPRIMENTO. JUÍZO QUE HOMOLOGOU O ACORDO. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO SUSCITADO.
1. O art. 28-A, § 6.º, do Código de Processo Penal, ao determinar que o acordo de não persecução penal será executado no juízo da execução penal, implicitamente, estabeleceu que o cumprimento das condições impostas no referido acordo deverá observar, no que forem compatíveis, as regras pertinentes à execução das penas.
2. Segundo pacífica orientação desta Corte Superior, a competência para a execução das penas é do Juízo da condenação. No caso específico de execução de penas restritivas de direitos, em se tratando de condenado residente em jurisdição diversa do Juízo que o condenou, também é sedimentada a orientação de que a competência para a execução permanece com o Juízo da condenação, que deprecará ao Juízo da localidade em que reside o apenado tão-somente o acompanhamento e a fiscalização do cumprimento da reprimenda.
3. Em se tratando de cumprimento das condições impostas em acordo de não persecução penal, a competência para a sua execução é do Juízo que o homologou, o qual poderá deprecar a fiscalização do cumprimento do ajuste e a prática de atos processuais para o atual domicílio do Apenado.
4. Conflito conhecido para declarar competente o JUÍZO FEDERAL DA 1.ª VARA CRIMINAL DE SÃO PAULO – SJ/SP, o Suscitado.
(CC n. 192.158/MT, Terceira Seção, Relatora Ministra Laurita Vaz, julgado em 9/11/2022, DJe de 18/11/2022, grifei)
Entretanto, o juiz pode recusar a homologação da proposta quando (i) não atender aos requisitos legais; ou quando (ii) o MP não ajustar as condições que haviam sido reputadas como “inadequadas, insuficientes ou abusivas”. Se assim proceder o Juízo, haverá a devolução dos autos ao MP para que este analise se é necessário complementar as investigações ou deixar de lado o acordo de não persecução penal (ANPP) e oferecer denúncia.
Ademais, o CPP ainda prevê que a intimação da vítima acerca da homologação e/ou descumprimento do ANPP.
No que diz respeito ao descumprimento do acordo de não persecução penal (ANPP), salienta-se competir ao MP informar ao juízo, visando (i) à rescisão da proposta de acordo; (ii) a possibilitar posterior oferecimento da denúncia; e (iii) a utilizar o descumprimento como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo (art. 89, Lei 9.099/95).
Efeitos da celebração do ANPP
A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal (ANPP) não constarão de certidão de antecedentes criminais (não gerará reincidência), exceto para constar que o agente foi beneficiado pelo ANPP naquela data, quando então passará a ser inaplicável mesmo procedimento nos 05 (cinco) anos ulteriores, nos termos do inciso III do § 2º do art. 28-A.
Por fim, o juízo competente decretará a extinção da punibilidade do agente quando cumprir integralmente o acordo de não persecução penal.
Aponta-se, derradeiramente, que o recurso cabível contra a decisão que recusar homologação à proposta de acordo de não persecução penal é o recurso em sentido estrito (RESE), vide art. 581, inciso XXV, do CPP.
Conclusão
Dessa forma, verifica-se que o acordo de não persecução penal (ANPP) é um instrumento de natureza híbrida (ora material ora processual). Além disso, vê-se que possui hipóteses de cabimento bem definidas, as quais, em sua maioria, são de cunho objetivo, enquanto há casos em que o ANPP não se faz aplicável.
Por fim, é importante dizer que as chances de cobrança em provas aumentam, uma vez que se cuida de previsão legal recente no ordenamento jurídico. Assim, é necessário que o candidato ao CNMP analise as questões já elaboradas pela banca CESPE/CEBRASPE.
Bons estudos, galera!
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