Entenda a importância de investigar os processos de argumentação e as ferramentas de inferência para a progressão do discurso na elaboração do texto.
Olá, queridos, tudo bem?
Para escrever um bom texto, é preciso considerar que a ocorrência de eventos implica a realização de inferências cujos processos são necessários para elaborar uma escrita atenta e dentro dos limites argumentativos reais. Em se tratando do texto escrito, as inferências são usadas como enriquecedoras no processo argumentativo, na medida em que são elas as responsáveis pela progressão do seu discurso na elaboração do texto.
Sendo assim, conceituamos, nos termos de Fiorin (2017, p. 31), a inferência como uma “operação pela qual se admite como correta uma proposição em virtude de sua ligação com outras proposições consideradas verdadeiras”. Essa pode ocorrer por intermédio da implicação, da generalização ou, até mesmo, da analogia, sendo que este texto foca a primeira delas.
Há três tipos de inferências às quais se deve dar atenção: a lógica, a semântica e a pragmática. A primeira é determinada pela relação entre as proposições, sendo essas decorrências necessárias de implicações entre as premissas. O exemplo do livro Argumentação, de José Luiz Fiorin (2017) ilustra tal referência a partir da ideia de silogismo:
Quanto à inferência semântica, dizemos que ela se dá considerando o significado das palavras ou expressões. Na frase Antônio parou de fumar, ao identificarmos o verbo (no pretérito perfeito) parou, pressupõe-se que: 1) Antônio já fumou; 2) Ele não fuma mais.
A última, a inferência pragmática, advém das regras do jogo da linguagem. Na sentença A bandeira paulista tem 13 listras, é possível determinar quantas listras têm a bandeira? Sim, pois, ao se afirmar o número de listras da bandeira, por inferência, limita-se nela o número, determinando-se, assim, a quantidade de listras. Para compreender melhor o processo argumentativo através das inferências, apresentamos os processos nos próximos tópicos.
Responsáveis pela validade e progressão do seu discurso na elaboração do texto, os processos de inferência lógica podem ser classificados em 9 processos: afirmação do consequente, negação do antecedente, disjunção exclusiva, encadeamento, contraposição, negação da conjunção dupla, negação da disjunção dupla, bicondicionalidade e dupla negação. Esses processos serão, brevemente, apresentados nas próximas seções.
Se a implica b e a é verdadeiro, então b é verdadeiro. Por exemplo: Se meu time ganhar o campeonato, irei festejar na Avenida Paulista. Meu time ganhou o campeonato. Então, fui festejar na Avenida Paulista. Nesse caso, a condição de ir à Paulista se realiza apenas com a vitória do time, caso contrário, o evento não acontecerá. Assim, a condição de ganhar o campeonato implica festejar na Avenida Paulista.
Se a implica b e b não é verdadeiro, então a não é verdadeiro. Nesse processo, negamos a conclusão, porque negamos o valor-verdade do consequente. Por exemplo: Se eu ganhar na loteria, comprarei uma casa nova. Não comprei uma casa nova. Portanto, não ganhei na loteria. Com isso, o fato de não comprar um novo imóvel é garantia para que se saiba, também, que não se ganhou o prêmio.
Dados a ou b, não sendo b verdadeiro, então a é verdadeiro e vice-versa. Nesse caso, temos a exclusão de uma das proposições, isto é, essas não possuem valor-verdade simultaneamente. Por exemplo: Ou Pietro é mineiro ou é paulista. Ele não paulista. Então, é mineiro.
Na lógica argumentativa do encadeamento, se a, então b, se b, então c; logo se a, então c. A ideia do encadeamento é muito importante na construção de textos em virtude da preservação da coesão e coerência textuais. O linguista Fiorin (2017, p. 34) traz este exemplo:
Se comprar uma casa, deixarei de pagar aluguel. Se deixar de pagar aluguel, sobrará mais dinheiro do meu salário. Se comprar uma casa, sobrará mais dinheiro do meu salário.
Assim, é fundamental ter cuidado com ideias/teses utilizadas no texto. Elas até podem não estar, diretamente, vinculadas umas às outras, contudo, devem vir relacionadas de modo a coexistir harmonicamente para a formação de sentido adequada ao seu texto. Por esse motivo, é tão importante que haja concatenamento das ideias trazidas em redações.
Em relação à contraposição, se a, então b, se não a, então não b. Para exemplificar, Fiorin (2017, p. 34) traz o seguinte:
Se um polígono tem três lados, então é um triângulo. Se um polígono não tem três lados, então não é um triângulo. Este polígono não tem três lados, então não é um triângulo.
Nesse caso, a implicaria b, se e somente se (<->) não a implicasse não b.
Se não a e não b, então não a ou não b. A progressão do seu discurso na elaboração do texto ocorre quando esse processo argumentativo é colocado em prática. Por exemplo: Não se pode assoviar e chupar cana. Como estou assoviando, então não estou chupando cana ou, como estou chupando cana, não estou assoviando. Assim, paralelamente à escrita dos textos, precisamos criar condições para que as ideias expostas na redação sejam coerentes entre si considerando o processo de implicação e a inferência contidos nelas
Na negação da disjunção exclusiva, se não a ou não b, então não a e não b. Por exemplo: Valentina não é paulista ou não é mineira. Então, ela não é paulista e mineira simultaneamente. Ao elaborar o texto, é preciso atentar-se ao uso das conjunções ou e e de modo a determinar, precisamente, se o fenômeno das proposições impõe uma relação de conjunção ou não.
Muitas vezes, os alunos adicionam funções que nem sempre são características de duas ideias propriamente ditas. Isso pode prejudicar a continuidade das teses e, consequentemente, dos argumentos acrescidos a elas.
Nesse processo argumentativo, temos que a se e somente se b. Logo, se a, então b e se b, então a, então se a, então b e vice-versa. Por exemplo: Alguém tem nacionalidade brasileira se e somente se for descendente de brasileiros. Ana é brasileira, então é descendente de brasileiros; Ana é descendente de brasileiros, então é brasileira. Em uma primeira leitura, isso nos parece óbvio, certo? No entanto, por vezes, durante a construção do discurso, o aluno pode se perder no raciocínio.
Se não não a, então a. Por exemplo:
Não é verdade que ela não estuda. Portanto, ela estuda.
Cabe ressaltar, no entanto, que, garantir a progressão do seu discurso na elaboração do texto requer consciência de que há casos no Português Brasileiro em que a dupla negação não implica uma afirmação. Nesse sentido, é preciso atentar-se ao procedimento lógico da comunicação escrita, garantido, assim, eficácia nos efeitos de sentido da produção textual.
A inferência semântica no texto revela conceitos de sentido e frase do enunciado. “A significação é dada pelos elementos linguísticos e pela relação entre eles, enquanto o sentido é o resultado da significação mais as informações do contexto ou da situação de comunicação” (FIORIN, 2017, p. 36).
Por exemplo, se um filho se direciona à mãe afirmando Não tenho mais camisas limpas, temos algumas inferências de significados possíveis: 1) Ele tinha camisas limpas; 2) Ele não tem mais camisas limpas. Isso implica dizer que a significação dessa sentença refere-se o fato de que o filho não tem peças que poderiam ser utilizadas. Contudo, quanto ao sentido (significação + contexto), podemos afirmar que o filho nada mais quer, senão que sua mãe lave as peças de uso dele.
Assim, as inferências semânticas ocorrem a partir da relação entre as significações das estruturas da linguagem e do contexto comunicativo. Muitas vezes, os alunos se perdem na construção do pensamento para garantir a progressão do seu discurso na elaboração do texto, é o famoso: “eu quis/queria dizer tal coisa”. Para que isso não ocorra, é imprescindível compreender que as inferências são possíveis, mas elas não podem ocorrer, arbitrariamente, de acordo com a subjetividade daquele que escreve.
A inferência pragmática “resulta da utilização dos princípios que governam a utilização da linguagem na troca verbal” (FIORIN, 2017, p. 40). De acordo com o linguista Grice (1975), esse tipo de argumentação pode ser divido em quatro máximas: quantidade, qualidade, relação e maneira.
A máxima da quantidade deve cumprir os requisitos de comunicação e contribuir para que o fato em análise tenha o tanto de informação exigida para que a mensagem seja eficaz. Nesse sentido, não se deve apresentar, no discurso, informações além do que é exigido.
A máxima da qualidade estabelece que a informação transmitida na comunicação (escrita ou não) seja verídica. Assim, não se pode afirmar o que você pensa que é falso, nem afirmar o que não se tem provas.
Quanto à máxima da relação, essa tem como base o princípio da pertinência. Diante disso, para determinar a progressão do seu discurso na elaboração do texto, é preciso que se escreva o que é concernente ao assunto tratado sem tangenciar o tema proposto, o que ocorre, frequentemente, nas produções textuais.
Em relação à máxima da maneira, pressupõe-se que a comunicação seja clara. Para isso, evite: exprimir-se de maneira obscura; ser ambíguo; ser prolixo; e falar de maneira desordenada.
Portanto, é fundamental averiguar os processos de argumentação e as ferramentas de inferência para a progressão do seu discurso na elaboração do texto, motivo pelo qual é valioso revisar esse conteúdo. Quanto mais estivermos familiarizados com esse assunto, mais progredimos no discurso produzido nas redações. Isso facilita o processo de desenvolvimento dos textos que tendem a estar mais harmônicos e coerentes.
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Um abraço a todos,
Igor Alcântara
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