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Carreira AFT: “Gato” rouba trabalhadores em Rondônia

Há poucos dias um trabalhador procurou a Auditoria Fiscal do Trabalho aqui em Rondônia. Ele procurava ajuda. Havia trabalhado por mais de 80 dias e não recebeu um tostão.

Esse trabalhador contou que foi aliciado por um gato* para trabalhar numa propriedade rural. O serviço era para fazer roçada dentro da mata.

Ele disse que inicialmente o gato foi gentil. Informou sobre o serviço, disse que a propriedade ficava distante da cidade do trabalhador (mas não informou a distância). Combinou o preço. Combinou o dia de saída para a empreitada.

Segundo o trabalhador, saíram de madrugada. Ele e outros trabalhadores aliciados viajaram sobre a carroceria de um caminhão. Viajaram deitados para não serem descobertos pela Polícia Rodoviária. Assim, deitados, ninguém viu para onde estavam indo.

Eles somente levantaram da carroceria quando chegaram no local de trabalho, uma mata fechada. O trabalhador disse que não viu nenhuma “casa” nas proximidades. Ficaram acampados no meio do mato e dormiam em barracos de lona.

O trabalhador disse que o gato os deixou lá no meio da mata e eles não tinham noção de onde estavam. O gato aparecia de vez em quando trazendo comida e material de trabalho. O gato continuou sendo muito cordial.

Assim, trabalharam por mais de 80 dias. O preço combinado foi de R$ 80,00 por dia de trabalho.

Quando acabaram o trabalho, o gato disse que levaria os trabalhadores para as suas cidades. Marcaram o dia da saída. Desmontaram o acampamento.

Novamente, saíram de madrugada. Novamente, deitados na carroceria do caminhão. Novamente, sem saber onde estavam e para onde estavam indo.

Quando estava amanhecendo, o veículo parou numa cidade próxima da capital (Porto Velho). Não era a cidade de onde o trabalhador tinha sido levado. Todos desceram do caminhão. O gato reuniu o pessoal e disse que estava muito cedo e o banco ainda demoraria para abrir. Assim, como ele tinha alguns negócios a resolver na cidade, pediu que todos esperassem no local que ele voltaria com o pagamento. Estavam perto de um hotel. Inclusive, o gato disse que podiam se hospedar no hotel para descansar e tomar um banho que ele pagaria as despesas.

O gato saiu. O trabalhador esperou uma hora. Duas horas. Três horas. Passou o horário do almoço. Entardeceu. Anoiteceu. O trabalhador esperou e nada. Somente no dia seguinte o trabalhador e seus companheiros perceberam que haviam sido enganados.

A Auditoria Fiscal do Trabalho tentou colher informações do trabalhador para tentar encontrar o local do trabalho realizado ou o gato que aliciou os trabalhadores. No entanto, o trabalhador não conhecia o gato, o chamavam por apelido, ele não sabia a que horas tinham saído e a que horas tinham chegado no acampamento. Não viu nada durante a viagem. Não viu nenhuma residência próxima ao local de trabalho. O acampamento somente foi visitado pelo gato durante o tempo de trabalho. Não soube dizer a que horas da madrugada saiu do acampamento. Não soube dizer se o caminhão rodava rápido ou devagar. Não soube dizer se passaram por rios e pontes. Apenas disse que se visse novamente o gato, o reconheceria.

Infelizmente, por não desconfiar da situação, nem mesmo a placa do caminhão o trabalhador anotou. Ainda ficou confuso e não soube dizer exatamente qual a marca, cor e modelo do caminhão porque sempre teve contato com o veículo durante a noite.

No caso em tela, a Auditoria Fiscal do Trabalho não pode agir, pois não foi possível encontrar o gato e a propriedade rural. Deixamos nosso número de telefone com o trabalhador para que ele pudesse entrar em contato se tivesse alguma notícia da pessoa que o contratou ou tivesse algum fato novo que pudesse ajudar a esclarecer a situação.

O que percebemos aqui é que está havendo uma mudança de postura das pessoas que “dão o golpe” nos trabalhadores. Está deixando de existir o capataz bruto e mal. Na relação de trabalho acima, o gato foi sempre muito cordial. Não deixou faltar comida no acampamento. Sempre aparecia. Conversava com todos. Fazia piadas. Comia com eles. Essa atitude foi para que nenhum dos trabalhadores desconfiasse da situação e saísse do acampamento para pedir ajuda ou denunciar o trabalho sem registro e em condições precárias.

*Gato: Indivíduo que contrata trabalhador para prestar serviços em grandes fazendas, muitas vezes em regime escravo ou em condições de trabalho precárias, como mediador entre estes e o empreiteiro (dicionário online Michaelis)

 

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Adinoél Sebastião

Meu nome é ADINOÉL SEBASTIÃO. Sou formado em Ciências Contábeis pela Fundação Faculdade de Ciências Econômicas de Apucarana-PR (FECEA). Sou Auditor-Fiscal do Trabalho (AFT). Estou lotado em Brasília-DF na Secretaria de Inspeção do Trabalho em Brasília-DF. Fui aprovado no concurso de AFT-2013. Esse concurso, segundo o CESPE, teve 48.035. Fui Analista Tributário da Receita Federal (ATRFB) por mais de 22 anos (1991 a 2013). Sou autor do site "www.adinoel.com" e sou colaborador com traduções livres de Inglês e de Espanhol em alguns sites de concursos. Já atuei como professor e tutor online da ESAF (aulas de informática, palestras, funcionamento do CAC, etc). Elaborei/elaboro aulas de Espanhol, Inglês e Português para concursos. Possuo vários cursos de formação pessoal, entre eles destaco: curso de Espanhol no Instituto Cervantes da Espanha; curso de Inglês nas escolas FISK; curso online "Mejores Prácticas en la Administración Tributaria, Ed. 9", do Instituto de Estudios Fiscales e da Fundación CEDDET da Espanha.

Ver comentários

  • Vi algo parecido em Barreiras na Bahia. Chegou um caminhão e vários trabalhadores subiram. Mas , antes disso comeram bolacha e tomaram refrigerante. Estavam famintos. Vi essa cena. Inacreditável. Faz muito tempo. . Estou estudando no ciclo inicial. A carreira trabalhista me fascina. Achava que isso não acontecia mais.

  • Muito triste. É realmente desumano, e de um mau caratismo enorme.
    Nessas condições o MTE enquadra o trabalhador como em trabalho escravo? Caso sim, pelo menos ele teria direito ao seguro desemprego, e não ficaria completamente desamparado.

  • Quando eu for auditor fiscal do trabalho e a empresa perguntar se a gente pode dar um jeito referente a multa, eu vou dizer que quem perdoa é Deus o auditor só multa.

  • Muito, muito interessante o post, professor, parabéns!
    Algumas dúvidas ficaram no ar: o celular é rastreável, eles ficaram 80 dias incomunicáveis, sem celular, por acaso?
    Foi feito um retrato falado do "gato"?
    Não há câmeras pelas cidade que ajudariam identificar o "gato" e o caminhão? Em Tiradentes MG, por exemplo, eles solucionaram um crime olhando as diversas mini câmeras que exitem espalhadas pela cidade escondias nos postes.
    Quando o "gato" chegava com a comida, ele chegava lá como? De barco, a pé, de carro?
    Se eles vão abaixados na caçamba do caminhão e isso é uma coisa recorrente, poderia haver câmeras que filmassem por cima os caminhões na estrada.
    Parece até um crime perfeito, rs.

  • É uma realidade corrente na região norte do país.Muitas vezes, os trabalhadores têm aquela fantasia, acerca de uma oportunidade melhor na vida, e geralmente são pessoas de nível intelectualmente baixo. Por conseguinte, acabam nas garras de um "Gato", que devoram a vida humana e social delas. Infelizmente, acontecimentos como esse são reais...

  • Infelizmente é uma situação ainda muito comum em pleno século XXI. O que mudou foi mesmo a postura do gato - mais bem informado a fim de aprimorar as técnicas de captura de trabalhadores inocentes e não ser pego pela fiscalização. Parece até cena de série da Netflix...Triste, Dino.

  • Lamentável tudo isso! penso que esse tipo de fato deveria ser divulgado na mídia (sobretudo nos noticiários da localidade onde ocorreu o fato) para que a população pudesse ficar atenta a esse modus operante, assim, poderiam se lembrar da placa do caminhão, e de alguma forma fazer alguns marcos, como tempo de viagem, para se tentar chegar a esses criminosos.

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