[ADPF 378] Novo Rito do Impeachment do Presidente da República
Olá, pessoal, tudo bem?
Aqui é o Ricardo Vale, coordenador e professor do Estratégia Concursos.
Hoje, gostaria de conversar com vocês sobre o assunto do momento: o impeachment do Presidente da República. Sem dúvida, é um tema que deve ser cada vez mais cobrado em provas de concurso público.
O Supremo Tribunal definiu, ontem (18/12/2015), no âmbito da ADPF 378, um novo rito para o processo de impeachment. É algo totalmente inovador, indo no sentido contrário do que afirma a doutrina e a jurisprudência acerca do julgamento do Presidente da República.
Foram vários os temas examinados pelo STF no âmbito da ADPF 378. No entanto, a minha análise se concentrará em 3 (três) tópicos:
1) Eleição da Comissão Especial da Câmara dos Deputados;
2) Possibilidade de candidaturas avulsas para a formação da Comissão Especial;
3) Processo e Julgamento no Senado Federal.
Na minha opinião, são esses os temas mais relevantes e que impactam no rito do processo de impeachment.
Por se tratar de tema complexo, teremos que recorrer, também, à análise do Regimento Interno da Câmara dos Deputados.
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1) Eleição da Comissão Especial da Câmara dos Deputados:
Nos crimes de responsabilidade do Presidente da República, a denúncia é popular, o que significa que qualquer cidadão pode apresentar denúncia à Câmara dos Deputados.
Recebida a denúncia pela Câmara dos Deputados, o próximo passo é a eleição de uma Comissão Especial, que será responsável por analisar se a denúncia deverá ou não ser objeto de deliberação pelo Plenário da Câmara dos Deputados. Isso é exatamente o que se extrai do art. 19, da Lei nº 1.079/1950:
Art. 19. Recebida a denúncia, será lida no expediente da sessão seguinte e despachada a uma comissão especial eleita, da qual participem, observada a respectiva proporção, representantes de todos os partidos para opinar sobre a mesma.
A polêmica, então, gira em torno da eleição dessa Comissão Especial. Como será, afinal feita essa eleição? Teremos voto aberto ou voto secreto?
O Presidente da Câmara dos Deputados determinou que se fizesse uma votação secreta. Mas com qual fundamento?
É o seguinte! O art. 58, da Constituição Federal de 1988, determina que “o Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação”.
A Constituição, portanto, é explícita ao dizer que a forma de constituição das Comissões permanentes e temporárias das Casas Legislativas é matéria regimental. Não é a Constituição que deve dizer se a votação para eleição da comissão deve ser aberta ou secreta. É o Regimento Interno das Casas Legislativas que deverá fazê-lo.
E o que diz o Regimento Interno da Câmara dos Deputados?
O Regimento Interno da Câmara dos Deputados, com a força que lhe outorgou a Constituição, determina, em seu art. 188, III, que caberá votação secreta “para eleição do Presidente e demais membros da Mesa Diretora, do Presidente e Vice-Presidentes de Comissões Permanentes e Temporárias, dos membros da Câmara que irão compor a Comissão Representativa do Congresso Nacional e dos dois cidadãos que irão integrar o Conselho da República E NAS DEMAIS ELEIÇÕES.”
O Regimento Interno é claro ao determinar que a votação será secreta nas eleições que se realizarem no âmbito da Câmara dos Deputados. Veja: não estamos falando aqui em deliberações, mas sim em eleições! São coisas distintas. Logo, a eleição da Comissão Especial deveria mesmo ser feito pelo voto secreto.
E como entendeu o STF?
Quem assistiu o julgamento, viu que o Min. Luís Roberto Barroso disse as seguintes palavras:
“O voto secreto foi instituído por deliberação unipessoal do presidente da Câmara, no meio do jogo. Sem autorização constitucional, sem autorização legal, sem autorização regimental ele disse: ‘vai ser secreto’. A vida na democracia não funciona assim.”
A opinião do Min. Barroso acabou influenciado os demais Ministros do STF, que se manifestaram pela votação aberta.
Mas temos que deixar aqui bem claro que o STF fez uma “pirueta interpretativa”. Impressionante o malabarismo da Corte ao interpretar algo que é claro. Mais impressionante, ainda, é que o Min. Barroso tenha dito que o “voto secreto foi instituído sem autorização regimental”. Ele não deve ter lido o Regimento Interno…
Simplificando, a Constituição dá poderes ao Regimento Interno para determinar a forma de constituição das Comissões; o Regimento, por sua vez, determina explicitamente que a votação será secreta. Mesmo assim, o STF decidiu que a votação será aberta.
2) Possibilidade de candidaturas avulsas para a formação da Comissão Especial:
O art. 19, da Lei nº 1.079/50 determina que devem participar da Comissão Especial representantes de todos os partidos, observada a respectiva proporção.
A polêmica, então, é a seguinte: esses representantes dos partidos devem ser indicados pelos líderes ou são admitidas candidaturas avulsas?
O art. 33, § 1º, do Regimento Interno, determina que “as Comissões Temporárias compor-se-ão do número de membros que for previsto no ato ou requerimento de sua constituição, designados pelo Presidente por indicação dos Líderes, ou independentemente desta se, no prazo de quarenta e oito horas após criar-se a Comissão, não se fizer a escolha”.
As Comissões Temporárias da Câmara são, então, formadas por membros designados pelos líderes partidários. Por essa lógica, o líder do PMDB poderia designar quais deputados do partido participarão da Comissão. Destaque-se, todavia, que não estaremos aí diante de uma eleição, mas sim de mera escolha / designação. A Lei nº 1.079/1950 estaria, a princípio, sendo contrariada.
O que foi feito, então, na Câmara dos Deputados?
Na Câmara dos Deputados, foram criadas duas “chapas”: a primeira, formada pelos Deputados indicados pelos líderes partidários; a segunda “chapa”, por sua vez, seria formada por candidaturas avulsas, observando-se a proporção partidária em sua composição. Ocorreu, então, a eleição da Comissão Especial em plenário. Ganhou a chapa formada por candidaturas avulsas.
O STF, apreciando o tema, decidiu pela impossibilidade da existência de candidaturas avulsas para a formação da Comissão Especial. O Min. Barroso deixou consignado o seu entendimento de que a palavra “eleição”, prevista na Lei nº 1.079/50 deve ser entendida como sinônima de “escolha”. Para ele, os membros da Comissão Especial devem ser “escolhidos” pelos líderes partidários.
3) Processo e Julgamento no Senado Federal:
A Constituição Federal determina que “admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade”.
Até a ADPF 378, a doutrina e a jurisprudência eram unânimes em reconhecer que, uma vez admitida a acusação contra o Presidente da República pela Câmara dos Deputados, o Senado Federal estaria obrigado a instaurar o processo.
Em outras palavras, o juízo de admissibilidade político da Câmara dos Deputados vinculava o Senado Federal. Não havia outra opção. Após a autorização da Câmara dos Deputados (por 2/3 dos seus membros), o Senado deveria processar e julgar o Presidente da República.
Não foi esse, todavia, o entendimento que prevaleceu!
Na ADPF 378, o STF decidiu que, no Senado, haverá novo juízo de admissibilidade da denúncia (por maioria simples). O Senado Federal possui, dessa forma, discricionariedade para decidir pela instauração ou não do processo contra o Presidente da República. Em outras palavras, o Senado Federal não está vinculado ao juízo de admissibilidade da Câmara dos Deputados.
Admitida a denúncia pelo Senado Federal (por maioria simples), será instaurado o processo contra o Presidente. O Senado Federal irá, então, atuar como verdadeiro “Tribunal político”, sendo presidido pelo Presidente do STF. A condenação do Presidente pelo Senado Federal depende do voto nominal (aberto) de 2/3 dos seus membros.
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Abraços,
Ricardo Vale
“O segredo do sucesso é a constância no objetivo”
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