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CACD 2020 – Prova de Geografia comentada com gabarito e possibilidades de recurso

Olá, futuros diplomatas!
Aqui é o Prof. Alexandre, como foram de prova?

Neste texto, vou corrigir todos os itens da Primeira Fase de Geografia, elencando as possibilidades de recurso. Sim, dá para entrar com recurso em alguns casos. Vejamos:


QUESTÃO 23

1. Diferentemente da produção de bens de consumo de massa (como eletroeletrônicos), a produção de bens derivados de tecnologias consideradas estratégicas pelos Estados Nacionais (setores de defesa e aeroespacial, por exemplo) é, ainda hoje, objeto de proteção e incentivos governamentais, sendo, portanto, concentrada geograficamente em alguns países.

Certo.

Tanto as indústrias de defesa quanto as do setor aeroespacial são consideradas estratégias pelos Estados nacionais e, de fato, estão concentradas em alguns países. Estados Unidos, Rússia, China e algumas poucas nações da União Europeia lideram as inovações militares e espaciais.

O item poderia gerar dúvida: apesar do setor aeroespacial estar concentrado em poucos Estados (afinal, não é qualquer um que tem capacidade técnica e financeira de lançar objetos e indivíduos ao espaço), todos eles, mesmo as diminutas nações, possuem sistemas de defesa — ainda que rudimentares. No entanto, a banca entendeu que tanto as inovações aeroespaciais quanto as inovações militares partem de poucos países, o que é uma verdade.

2. Alguns minerais como o lítio, o cobalto, o grafite e o vanádio, necessários para a produção de smartphones, semicondutores, painéis solares, turbinas cólicas, carros elétricos e satélites, têm sua extração concentrada em um pequeno número de áreas produtoras. No entanto, a restrita localização geográfica das jazidas minerais não impede que a extração e a comercialização daqueles minérios sejam crescentemente realizadas por empresas nas quais predominam capitais de terceiros países.

Certo.

A concentração da produção é uma realidade. Chile, Bolívia e Argentina possuem mais de 70% das reservas de lítio. A República Democrática do Congo (um país africano muito rico em recursos naturais, mas pobre em desenvolvimento humano) produz cerca de 60% de todo o cobalto do planeta. Os maiores produtores de grafite são Moçambique, China e Brasil — por aqui, com destaque à Minas Gerais, que produz mais de 70% do total nacional. Do mesmo modo, China e Rússia concentram a maior parte das reservas de vanádio.

São dados que poucas pessoas sabem, mas… a boa notícia é que não precisava sabe-los para acertar o item. Bastava entender que a produção de minerais é concentrada em poucos países, e que normalmente estes minerais são extraídos por terceiros.

Dentro de uma lógica globalizada, estes “terceiros” são empresas das maiores potências (EUA, China, Alemanha, entre outros) que operam na extração de minerais em países em desenvolvimento. Aqui no Brasil, por exemplo, há diversas multinacionais explorando jazidas no Pará e em Minas Gerais.

3. A tendência observada de outsourcing, offshoring, associações, clusters, redes e terceirização em escala mundial nas cadeias de fornecimento mostrou-se imune a eventuais aumentos de custos econômicos e políticos decorrentes da expansão geográfica da produção industrial. Nesse sentido, não se observam, nos últimos anos, estímulos para o chamado reshoring em cadeias produtivas internacionalizadas.

Errado.

A maior dificuldade deste item era entender os conceitos apresentados que refletem as dinâmicas da terceira revolução industrial e da acumulação flexível. “Outsourcing” é sinônimo de terceirização. “Offshoring” significa o deslocamento da produção de um país para outro (ex: saída de uma indústria dos EUA para a China). “Clusters” são grupos de empresas de um mesmo ramo que se concentram em uma mesma porção do território para obter vantagens políticas e econômicas (ex: Vale do Silício com empresas de tecnologia). Tudo isso faz parte do cenário globalizado, e até aí, a questão está certa.

Ocorre que “reshoring” significa o retorno das indústrias para o país de origem, algo que está ocorrendo no mundo atual (basta pensar nas políticas de Donald Trump, no “America First” que procurava trazer de volta as indústrias do México e da China para os EUA). No cenário global, a a própria pandemia de COVID está acelerando o reshoring.

4. Nas últimas décadas, a queda nos custos de transporte e comunicação diminuiu a proteção historicamente conferida a significativo número de setores produtivos que se beneficiavam da proximidade dos mercados locais, eliminando, dessa forma, produtores pouco competitivos. Algumas atividades econômicas, como a indústria do vinho e o turismo, no entanto, souberam extrair rendas adicionais derivadas das características únicas (naturais, arquitetônicas, históricas) do território.

Certo, mas dá para entrar com recurso.

A questão narra uma consequência bem conhecida da globalização: a diminuição das distâncias que, ao acirrar a concorrência geográfica, penaliza os menores produtores em detrimento dos maiores, fazendo com que “produtores pouco competitivos” percam mercado.

Apesar do gabarito “certo”, é possível entrar com recurso, uma vez que os “produtores pouco competitivos” nem sempre são “eliminados”. Aqui no Brasil, por exemplo, eles produzem a maioria de diversos gêneros — como o arroz, feijão e hortifruti. O termo “eliminando” é muito forte e prejudicou o julgamento do item.

QUESTÃO 24

1. As diversas versões da chamada Geografia tradicional privilegiaram os conceitos de paisagem e região, estabelecendo, em torno desses conceitos, a discussão a respeito do objeto da Geografia e de sua identidade no âmbito das disciplinas científicas. Paisagem, região natural, região-paisagem, região geográfica, paisagem cultural e gênero de vida, por exemplo, foram conceitos amplamente utilizados pelos geógrafos vinculados ao positivismo e ao historicismo do século 19 e da primeira metade do século 20.

Certo.

Na Geografia Tradicional, as categorias de análise paisagem e região eram mais estudadas, cabendo aos demais (espaço, território e lugar) mera posição secundária — ainda que o território, segundo a geografia política da época, tivesse certa relevância.

O maior problema deste item são os conceitos de “região natural, região-paisagem, região geográfica, paisagem cultural e gênero de vida” que são pouco utilizados na Geografia atual e que nunca caíram no CACD. Na minha opinião, um dos itens mais difíceis da prova.

“região  geográfica”  (na  bibliografia  francesa)  ou  “região-paisagem” (na bibliografia alemã) partem  “da   descrição, da  caracterização   das   particularidades,   das   individualidades,   da identidade de cada região, buscando sintetizar a ação transformadora do homem sobre um determinado ambiente e suas relações” (Talaska, 2011).

Já o conceito de “região natural” tem viés determinista, partindo da ideia de que as características naturais de uma região (ex: clima, relevo, recursos minerais…) influenciam a sociedade que nela se desenvolve. Também pode ser aplicado à biogeografia significando ecossistemas relativamente homogêneos.

Os conceitos de “paisagem cultural” e “gênero de vida” são semelhantes. Segundo La Blache, gênero de vida seria, grosso modo, a forma de cada grupo, seu “modo de ser” que seria transmitido de geração à geração por meio do hábito. E isso, de certo modo, moldaria diferentes “paisagens culturais” pois, a partir do desenvolvimento da sociedade, uma “paisagem natural” (com pouca influencia humana) vai se transformando em uma “paisagem cultural” (com mais influência humana).

2. A noção de região pode ser empregada na linguagem cotidiana como referência associada à localização e extensão de determinado fato ou fenômeno e, da mesma forma, é comumente utilizada como unidade administrativa, sendo a base para a divisão regional adotada pela administração estatal. A noção de região geográfica, cientificamente mais rigorosa, nasce da ideia de que o ambiente natural tem certo domínio sobre a orientação do desenvolvimento da sociedade, condicionando a evolução dos diversos grupos humanos.

Errado.

Outro item difícil de História da Geografia. Não tanto pela dificuldade, mas pela baixa frequência nas provas do CACD sobre o assunto. No entanto, vale a premissa que vimos nas aulas: a banca do CACD jamais é determinista! Isso significa, na prática, que jamais podemos “culpar” a natureza pelos problemas da sociedade, pois, segundo a visão possibilista defendida pela banca, o homem pode moldar a natureza por meio da técnica e, deste modo, contornar as adversidades.

Tendo isso em vista, é questionável a afirmação de que “o ambiente natural tem certo domínio sobre a orientação do desenvolvimento da sociedade” (ou seja, de que a natureza impera sob o homem). Do jeito que está escrito, parece que uma sociedade desenvolvida em escassas condições naturais estaria fadada ao fracasso, o que é falso. O item é difícil, mesmo.

3. A chamada revolução teorético-quantitativa da Geografia, iniciada na década de 1950, orientou-se pelo positivismo lógico, tendo como pressuposto a presença de uma ordem estrutural matemática implícita por trás do padrão empírico de organização espacial dos fenômenos. A tarefa da Geografia enquanto ciência seria a de descobrir e revelar esses padrões matemáticos no espaço, o qual passa a ser o conceito-chave da disciplina geográfica sob paradigma teorético-quantitativo. A ideia de que há uma ordem subjacente ao espaço possibilitaria, ainda, estimar projeções e fazer prognósticos, aproximando a Geografia do planejamento.

Certo.

Item que descreve perfeitamente a geografia teorética (ou quantitativa), cujo auge se deu entre as décadas de 1960 e 1970. Partindo-se de premissas positivistas, esta corrente enxergava a realidade como se fosse linear, sujeita a leis e a processos dotados de ordem. Se a sociedade é previsível, é possível prevê-la, calculá-la, relevando padrões e fazendo previsões. Se eu conheço a lei da gravidade, por exemplo, eu posso calcular a velocidade de um objeto em queda (é claro que esse exemplo é sobre física, mas esse raciocínio também era aplicado à Geografia). O espaço, sendo dotado de ordem e previsibilidade matemática, era possível de ser planejado por meio da matemática e da estatística, especialmente pelo Estado.

4. A Geografia da percepção e do comportamento, assim como a chamada Geografia humanista, procurou elaborar um enfoque globalizador e subjetivo da realidade, inserindo a intuição como elemento constitutivo do processo de conhecimento. Sua preocupação com o espaço vivido coloca, no centro da análise geográfica, o lugar. Não se trataria, no entanto, de um lugar em si, objetivo apenas, mas algo que transcende sua materialidade por ser repleto de significados. O lugar não seria apenas natural, mas também cultural.

Certo.

De fato, tanto a Geografia da percepção e do comportamento (que serviu de base à Geografia humanista) quanto esta segunda, tinham como características a preocupação com o espaço vivido (que era subjetivo, variável de acordo com cada grupo social) e o lugar (conceito que se relaciona à identidade afetiva destes grupos). Para os autores humanistas, a globalização influencia os lugares, uma vez que processos globais possuem grande capilaridade (ex: é possível comprar produtos de grandes empresas mesmo em pequenos bairros).

O lugar “transcende a materialidade” justamente porque é subjetivo, variável de acordo com o grupo ou com o indivíduo. Por exemplo, uma tribo indígena tem uma percepção da floresta bem diferente de um grupo de ruralistas, ainda que ambos convivam em uma mesma região. É algo subjetivo, não objetivo.

QUESTÃO 25

1. O domínio das terras baixas florestadas da Amazônia compreende as planícies inundáveis, com matas de terra firme, várzeas e igapós. Situa-se aí a maior extensão de florestas tropicais-úmidas contínuas do planeta, contendo milhões de espécies de organismos com uma grande diversidade biológica, quando comparada a outros domínios vegetacionais. Estima-se que, em média, cm um hectare de floresta de terra firme preservada, convivam cerca de 200 a 300 espécies de árvores.

Certo.

Do jeito que está escrito (“planícies inundáveis, com matas de terra firme”) parece que a área de terra firme (que nunca inunda) faz parte das planícies inundáveis, o que estaria errado. Contudo, o raciocínio da banca está correto na maior parte do item. De fato, a Amazônia é a maior floresta tropical do mundo. Também é verdade que contém milhões de espécies de organismos e grande diversidade biológica (ainda que alguns estudos apontem biodiversidade maior do que a apontada na questão, com até 900 espécies por hectare).

Em resumo, a questão poderia confundir o candidato, mas seu raciocínio geral está certo.

2. O domínio da caatinga é um dos três espaços semiáridos da América do Sul, verdadeira exceção no contexto climático e hidrológico brasileiro, tendo em vista o predomínio de climas úmidos e subsumidos intertropicais, do Amazonas ao Rio Grande do Sul. O vazio de precipitações naquele domínio pode durar de seis a sete meses. O período de chuvas, por sua vez, ocorre concentrado em alguns meses do ano, com características de regularidade, o que garante a perenidade dos poucos rios que atravessam aquele domínio.

Errado.

De fato, a Caatinga é um dos três espaços semiáridos do continente. Além desta, existem as regiões Guajira (Colômbia e Venezuela) e diagonal seca do Cone Sul (Argentina e Chile, onde estão a Patagônia e o Atacama). Porém, a questão tem dois grandes erros.

Primeiramente, em alguns locais da Caatinga, a seca pode durar mais de sete meses — em alguns locais, oito; em outros, nove. Em segundo lugar, a perenidade dos rios é garantida não pelas chuvas, mas por dois fatores: (1) pelo fato de o Rio São Francisco, principal rio da região, nascer em Minas Gerais, onde o clima é tropical úmido; (2) pelo dinâmica hidrológica dos lençóis freáticos que determina a perenidade de algumas nascentes da região. Na verdade, a imensa maioria dos cursos d’água da Caatinga são intermitentes.

3. Os chapadões cobertos por cerrados brasileiros pertencem ao bioma savânico. Os cerrados arbóreos têm fisionomia marcada por árvores geralmente tortuosas e espaçadas, com troncos de cortiça espessa e aspecto xeromórfico das árvores e dos arbustos, em razão da escassez de água, característica daquele domínio morfoclimático durante a estação mais seca. Os cerrados brasileiros, em contraste com as savanas africanas, são, portanto, secos em virtude da baixa umidade média observada em boa parte do ano.

Errado.

O item possui vários erros. Em primeiro lugar, é verdade que o cerrado tem árvores tortuosas e espaçadas, mas isso não pode ser explicado exclusivamente pelo déficit hídrico, mas também pela pobreza do solo e pela presença de queimadas. Em segundo lugar, o xeromorfismo, apesar de também ocorrer no Cerrado, é mais frequente na Caatinga (xeromorfismo = plantas que armazenam água nos troncos para usar em épocas secas). Em terceiro lugar, a savana africana NÃO é mais úmida que a savana brasileira (Cerrado), sendo ambas regidas pelo clima tropical com duas estações bem definidas.

4. O domínio dos planaltos de araucária compreende as terras de altitude média da porção meridional do Brasil, cobertas originariamente por formações florestais de diferentes densidades e extensões, com destaque para a presença de coníferas. O domínio é caracterizado por solos férteis, climas com temperaturas moderadas a baixas no inverno e precipitações relativamente bem distribuídas ao longo do ano.

Certo.

Item repleto de verdades. O domínio Mata de Araucárias é realmente abrangido por altitudes médias (Planalto Meridional), pelo clima com temperaturas moderadas (subtropical), pelo solo fértil (terra roxa) e pelas precipitações bem distribuídas (outra característica do clima subtropical que conta com quatro estações bem definidas). Apesar da predominância de araucárias (um tipo de conífera), há outras espécies com muitas “densidades e extensões”.

QUESTÃO 26

1. A categoria de cidades médias no Brasil é oficialmente definida pelos critérios de localização, papel regional, densidade e porte demográfico.

Errado.

De fato, fatores como “localização, papel regional, densidade e porte demográfico” ajudam a caracterizar uma cidade média no Brasil, no entanto, NÃO existe uma definição oficial, e aí está o erro do item.

De acordo com o IBGE (estudo REGIC), as cidades brasileiras podem ser classificadas em ordem decrescente de importância, sendo: Metrópoles (grande metrópole nacional, metrópole nacional e demais metrópoles); Capitais Regionais (capital regional A, capital regional B e capital regional C); Centros Sub-regionais (centro subregional A e centro sub-regional B); Centro de Zona (centro de zona A e centro de zona B) e Centro Local).

2. Processos complexos e diversos, como a expansão do agronegócio, a desconcentração industrial e a expansão do setor de serviços, são responsáveis pela expansão das cidades médias pelo interior brasileiro.

Certo.

Os três fatores mencionados estão relacionados entre si. Com a expansão do agronegócio, há também a expansão da agroindústria com a produção de alimentos, havendo cada vez mais, uma simbiose entre os setores primário e secundário.

Esse processo se relaciona diretamente com a desconcentração industrial, uma vez que regiões historicamente agrárias estão se industrializando — especialmente os interiores do Centro-Oeste, Sul e Sudeste.

Por conta das demandas da agroindústria, o setor de serviços também prospera, tanto os diretamente envolvidos na produção (ex: manutenção de máquinas, fertilizantes, combustíveis, insumos químicos…) quanto os que se desenvolvem de forma indireta devido às necessidades destas novas populações (ex: restaurantes, farmácias, hotéis…).

Resumindo: desenvolvendo a agricultura, desenvolve-se a indústria, e daí, desenvolvem-se os serviços; e tudo isso possibilita o crescimento das cidades médias no Brasil.

3. O complexo agroindustrial de beneficiamento/ industrialização da produção agropecuária instala-se em cidades médias do interior brasileiro. Centros urbanos como Uberlândia (MG), Rio Verde (GO) e Maringá (PR) são exemplos de cidades médias inseridas em regiões produtivas do agronegócio.

Certo.

O fenômeno está correto e os exemplos também (e aqui vale a explicação do item anterior).

Uberlândia (MG) está localizada no Triângulo Mineiro, uma região com grande produção de soja, café e cana-de-açúcar. Possuindo grande estrutura agroindustrial, Rio Verde (GO), é conhecida por ser a maior produtora de grãos de Goiás. Maringá (PR) também é uma grande produtora de soja (aliás, tanto Goiás quanto Paraná são dois estados com elevada produção).

4. As cidades médias são centralidades nos próprios contextos regionais, constituindo uma articulação da sua região de influência à economia mundial.

Certo.

Dentro da lógica da rede de cidades, as cidades médias, de fato, polarizam as pequenas cidades em seu entorno. Ainda que a articulação destas cidades com a “economia mundial” possa ser questionada  (afinal, as cidades médias não estão tão articuladas aos processos globalizatórios quanto as grandes metrópoles), a banca considerou a alternativa correta.

O raciocínio utilizado foi o seguinte: dentro da rede de cidades global, os pequenos centros locais primeiro se articulam com as cidades médias, depois com as cidades maiores do Brasil e/ou com as cidades globais internacionais.

No caso da alternativa anterior, por exemplo (cidades médias Rio Verde, Maringá e Uberlândia), o agronegócio regional se articula tanto com as metrópoles brasileiras quanto com as cadeias globais de produção, processos que influenciam as cidades menores de entorno.

QUESTÃO 27

1. A agricultura científica globalizada, emergente na década de 1990, tem-se expressado como a nova forma de organização do agronegócio brasileiro. É caracterizada principalmente pela incorporação de novas tecnologias da informação ao campo e pela maior intervenção estatal. Trata-se da transição de um período de fraca intervenção estatal na agricultura, predominante desde a década de 1960, para uma maior regulação das empresas mundiais para o comércio agrícola (tradings).

Errado.

A década de 1990 marca a transição do modelo nacional-desenvolvimentista (1930s – 1980s) para o modelo neoliberal (década de 1990); ou seja, de um modelo com MAIOR intervenção do Estado para um modelo com MENOR intervenção do Estado, algo típico do novo cenário da globalização.

Na verdade, a agricultura dos anos 1990 “é caracterizada principalmente pela incorporação de novas tecnologias da informação ao campo e pela” MENOR “intervenção estatal”. “Trata-se da transição de um período de” FORTE “intervenção estatal na agricultura […]para uma” MENOR “regulação das empresas mundiais para o comércio agrícola (tradings).

2. Desde a década de 1940, a agricultura brasileira tem passado por um profundo reajustamento produtivo voltado a sua modernização. Esse processo tem sido permeado pelo crescente aumento das trocas intersetoriais e por um rearranjo técnico-econômico territorial resultante da contínua melhoria e ampliação dos sistemas logísticos de infraestrutura, de transporte e de armazenagem.

Certo, mas cabe recurso.

Para quem estudou Geografia Agrária, as informações apresentadas são bem tranquilas. De fato, houve a modernização do campo brasileiro nas últimas décadas, o que realmente provocou um rearranjo no território.

Entretanto, o recorte na década de 1940 prejudicou o julgamento do item. Na verdade, foi a partir das décadas de 1950 e 1960 — especialmente após a década de 1970 — que o campo brasileiro REALMENTE se modernizou. Na década de 1950, houve a abertura econômica de JK e a importação de insumos agrícolas. Na década de 1970, a criação do INCRA e a parcerias Brasil-Japão para o desenvolvimento agrícola do Cerrado. Na década de 1980, o aumento expressivo da mecanização.

Questão correta, porém, cabe recurso no termo “desde a década de 1940”.

3. O agronegócio engloba sistemas produtivos que vão desde produção agropecuária até o seu beneficiamento, transformação e distribuição no mercado nacional e internacional e, em 2019. representou 21,4% do produto interno bruto (PIB) brasileiro. No Brasil e no mundo, esses sistemas produtivos prescindem de tecnologias voltadas ao aumento da produtividade da terra, do trabalho e do capital; exigem conhecimentos, tecnologias, investimentos e escala mínima de produção.

Errado.

Os dados apresentados estão corretos. De acordo com a CNA “em 2019, o PIB do agronegócio representou 21,4% do PIB brasileiro total.” (CNA, 2020) (dica: normalmente, quando a questão apresenta dados, raramente o erro está no número, mas no conceito — é o que ocorre aqui).

Aliás, o item está quase totalmente correto, exceto pelo termo “escala mínima”. Na verdade, os sistemas de agropecuária exigem GRANDES ESCALAS de produção, tanto para beneficiar a agroindústria com insumos quanto para a exportação dos bens in natura. O erro é pontual e quase imperceptível para o leitor pouco atento.

4. O Brasil dispõe da maior reserva de água doce do mundo, 12% do total, concentrada na região amazônica. E o único país continental do mundo cujo eixo principal está no sentido norte-sul. O País domina a mais avançada tecnologia de processo em agricultura tropical, resultante dos investimentos efetuados por instituições públicas e privadas de pesquisa.

Certo.

De acordo com dados da Agência Nacional de Águas (ANA), o Brasil realmente possui 12% de toda a água doce do mundo. Até pouco tempo, acreditava-se que o Centro-Sul concentrava a maior parte deste total (Aquífero Guarani); porém, com a descoberta do Aquífero Alter do Chão, a Amazônia foi reconhecida como o maior polo de água doce do país — o Rio Amazonas, por exemplo, é o maior do mundo em extensão e volume.

Junto a Estados Unidos e China, o Brasil é uma das grandes potências agrícolas do planeta, no entanto, é a maior potência em região tropical.

A questão é tranquila, porém, a expressão “norte-sul” poderia gerar dúvidas. Na verdade, o termo foi literalmente retirado de um estudo acadêmico, cujo trecho explicado segue abaixo:

“O  Brasil  dispõe  da  maior  reserva  de  água  doce  do  mundo,  12%  do  total,  concentrada  na  região  amazônica.É   o   único   país   continental   do   mundo   cujo   eixo   principal   está   no   sentido   norte-sul,   apresentando  todos  os  climas,  desde  o  tropical  até  o  frio.  Domina  a  mais  avançada  tecnologia  de  processo  em  agricultura  tropical,  devido  aos  investimentos  efetuados  pela  EMBRAPA,  junto  com  alguns  Institutos Estaduais Públicos e Privados de pesquisa.” (https://img.fae.edu/galeria/getImage/1/746399500200267.pdf)

QUESTÃO 28

1. O espaço rural brasileiro começou efetivamente a se estruturar no século 16, com a inserção da cana-de-açúcar na Região Nordeste. Por se destinar ao mercado interno, essa lavoura era desenvolvida da seguinte maneira: em larga escala; nos grandes latifúndios; com o uso extensivo do solo; com técnicas rudimentares; e com a utilização de mão de obra escrava.

Errado.

De fato, o espaço rural brasileiro se estruturou a partir do século XVI quando os portugueses ocuparam zona da mata nordestina com as plantations de cana-de-açúcar, exatamente como descrito na alternativa.

Porém, ao contrário do afirmado, a cana era destinada para o mercado EXTERNO, não interno: do nordeste brasileiro, era exportada para as metrópoles europeias.

2. Além da lavoura de cana-de-açúcar, cultivos que passaram a ser exportados no século 18, como algodão, cacau e tabaco, tiveram grande importância na estruturação do espaço rural brasileiro.

Certo.

Estes cultivos se enquadram dentro da lógica de “arquipélago econômico” — “ilhas” de prosperidade econômica pouco articuladas entre si, mas muito bem articulada com os mercados externos — um modelo que perdurou durante grande parte do Brasil-colônia.

Apesar do predomínio, na época, do ciclo do ouro em Minas Gerais, estes cultivos redesenharam a economia brasileira nas demais regiões do país. O algodão teve grande destaque no Maranhão entre os séculos XVIII e XIX (ainda que hoje, o maior produtor seja o Mato Grosso). O cacau se destacou (e ainda se destaca) no sul da Bahia. O tabaco era produzido pelas tribos indígenas, mas logo se incorporou à economia colonial, sendo exportado a partir de Alagoas e Bahia, principalmente. Tudo isso, conforme afirmado pelo item, foi estruturando o espaço rural brasileiro.

3. A produção agropecuária no Brasil da década de 1940 estava estruturada sobre uma malha fundiária extremamente desigual. Ao lado de grandes estabelecimentos dedicados à pecuária e a lavouras de alto valor comercial, coexistiam pequenos estabelecimentos que praticavam uma agricultura destinada à subsistência.

Certo.

Essa descrição não somente se refere à década de 1940, mas também se mantém no campo atual — e, inclusive, é uma de suas principais características. Trata-se de uma visão dicotômica típica da Geografia Crítica, que analisa o espaço pela ótica da luta de classes. De um lado, há o agronegócio tecnificado, exportador, estimulado pelo grande capital, conectado às redes globais de produção. De outro, há o pequeno produtor, menos tecnificado, com menos recursos, porém, mais conectado aos mercados locais e regionais — ou ainda, praticando cultivos de subsistência, como afirmado na questão.

4. No território brasileiro, a estrutura fundiária e a configuração do processo produtivo agropecuário consolidaram-se sob a gestão de diversas políticas públicas. Essas políticas tinham em comum a persistência de uma estrutura fundiária concentrada com predomínio da produção monocultora.

Certo, mas cabe recurso.

O julgamento da questão foi prejudicado, e é mais uma que cabe recurso. Historicamente, de fato, as políticas públicas foram as maiores responsáveis pela concentração de terras atuais. Basta lembrar, por exemplo, da escravidão, das plantations do período colonial, da Lei de Terras de 1850 (que condicionava à posse da terra à compra) ou das oligarquias cafeeiras do início do século XX. Podemos afirmar com segurança que, nos primeiros quatrocentos anos de Brasil, o Estado beneficiou os grandes produtores ao invés dos pequenos.

No entanto (e aí cabe o recurso), ainda que hoje o Brasil tenha uma estrutura fundiária desigual, diversos governos fizeram políticas públicas que, ao contrário do afirmado, visavam sua desconcentração. Podemos pensar, por exemplo, nos estatutos da Terra e do Trabalhador Rural do João Goulart, nos projetos de Reforma Agrária dos governos militares (que forneciam terra aos pequenos) e dos acontecimentos recentes dos governos Lula-Dilma (ex: Seguro-Safra, PRONAF, polígonos de irrigação, entre outros). Há ainda o trabalho do INCRA na formação de assentamentos agrários. Resumindo: nem toda política pública concentra terra, e isso prejudicou o julgamento do item.

Espero que tenham ido bem!
Um grande abraço!
Prof. Alexandre Vastella (@geografiaCACD)

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