Parecer técnico com recurso contra a questão 19 SEDUC CE Português
Olá, pessoal!
Venho aqui disponibilizar aos candidatos que se sentiram injustiçados pela banca UECE-CEV na questão 19 de Português, a qual transmite um erro claro e grave que vilipendia a norma gramatical brasileira.
Se você está lendo este artigo, mas não fez a prova e sabe de alguém que fez, junte-se aos mais de 20 candidatos que estão entrando na justiça contra o gabarito definitivo da banca, a qual ignorou os recursos, sem ao menos uma justificativa.
Parecer:
Profissional responsável pela elaboração do parecer: Professor Décio Terror Filho, formado em Letras pela Universidade Federal de Juiz de Fora-MG. Professor concursado na área federal, com especialização na didática, no ensino a distância e na produção de texto. Atua no ensino da Língua Portuguesa para concurso público desde 2000. Tem vários artigos publicados em revistas direcionadas para concurso público, portais de ensino, além de seus dois livros: Resoluções de Provas de Português – banca ESAF e Resoluções de Provas de Português + breve teoria – banca FCC, ambos lançados pela Editora Ímpetus.
Assunto: Anulação da questão 19 (de língua portuguesa) da prova do concurso para professor da SEDUC – Secretaria de Educação do estado do Ceará, certame 2018.
- Considerando a justificativa para a acentuação da palavra “pôde” em “… mas que nunca pôde ser totalmente esquecida” (linhas 26-27), assinale a opção em que a acentuação do termo destacado é justificada pelo mesmo motivo.
A) “Dali pra frente não há mais para onde andar.” (linhas 20-21)
B) “Isso se manifestava em três comportamentos…” (linhas 42-43)
C) “…a evidência viva, encarnada.” (linhas 76-77)
D) “…estão lutando por um lugar e sabem muito bem o porquê.” (linhas 68-69)
Justificativa: A comissão que elaborou esta questão confundiu o princípio de contraste da acentuação com a regra de acentuação diferencial, a qual é uma das regras especiais. Sinceramente, este é um grotesco erro gramatical da banca.
A palavra “pôde” recebe acento pela regra especial de acento diferencial, para destacar o pretérito perfeito do indicativo em relação ao presente do indicativo “pode”. Assim, a questão pede a mesma regra: regra especial de acento diferencial.
São quatro tipos desta regra:
a) O vocábulo “pôde” não teria acento, por ser paroxítona terminada em “e”, como em “classe”. Mas o pretérito perfeito do indicativo “pôde” recebe acento para marcar o timbre fechado em relação ao presente do indicativo “pode”.
b) Os vocábulos “têm” e “vêm” não teriam acento, por serem monossílabos tônicos terminados em “em”, como “bem”. Mas o acento em “têm” e “vêm” só ocorre para diferenciar este plural do singular “tem”, “vem”.
c) O verbo “pôr” não teria acento, por ser um monossílabo tônico terminado em “r”, como “mar”. Só há acento pela regra especial para diferenciá-lo da preposição “por”.
d) O substantivo “fôrma” não teria acento. Só é permitido o acento diferencial e é facultativo para marcar o timbre fechado, em contraste com o timbre aberto “forma”.
Assim, para haver a mesma regra, deveria haver uma das palavras acima nas alternativas, mas isso não ocorreu por erro da banca.
A alternativa (A) não apresenta a mesma regra, pois o verbo “há” é acentuado conforme a regra geral dos monossílabos tônicos terminados em “a”.
A alternativa (B) não apresenta a mesma regra, pois o numeral “três” é acentuado conforme a regra geral dos monossílabos tônicos terminados em “e”, seguidos de “s”.
A alternativa (C) não apresenta a mesma regra, pois o substantivo “evidência” é acentuado conforme a regra geral das paroxítonas terminadas em ditongo oral.
A alternativa (D) foi dada como a correta, mas de maneira alguma pode ser considerada uma regra especial diferencial. A palavra “porquê” foi substantivada pelo artigo “o”. Assim, há o substantivo “porquê”, que é uma palavra oxítona terminada em “e”, como “café”, “bebê”, “candomblé”. Veja: não é o acento simplesmente que o diferencia. Há um artigo que força que tal palavra seja entendida como tônica e por isso há uma regra geral de acentuação.
Note que a conjunção “porque” não tem acento por ser uma palavra átona.
O mesmo princípio ocorre com a conjunção “mas”, que é átona. Porém, quando ocorre o adjetivo “más”, que é uma palavra tônica, passa a ter acento por ser monossílabo tônico terminado em “a”, seguido de “s”. Isso não quer dizer que haja um acento diferencial entre “más”, “mas”. Concorda?
Com base nisso, peço anulação da questão, pois não há alternativa que apresente a regra especial de acento diferencial.
O que houve apenas foi a percepção de que as regras de acentuação gráfica ocorrem por contraste.
As palavras do gramático Domingos Paschoal Cegalla (página 39) reforçam aqui que a conjunção “porque” é átona :
Fonte: CEGALLA, Domingos Paschoal. Novíssima gramática da língua portuguesa ─48. ed. rev.─ São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2008.
Por tudo isso, meus amigos, peço a gentileza de entrar com recurso na esfera judicial, pois houve grosseiro erro da banca e os demais candidatos não podem ser penalizados por uma inobservância técnica da banca.
Autorizo desde já a utilização de meu nome como profissional responsável pelo parecer!
Grande abraço a todos!
Décio Terror