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Informativo STF 1142 Comentado

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

1.     Tribunal de justiça e foro por prerrogativa de função: apreciação de medidas cautelares de natureza criminal

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

É inconstitucional — por violar a competência privativa da União para legislar sobre direito penal e processual penal (CF/1988, art. 22, I), o sistema acusatório e o princípio da isonomia (CF/1988, art. 5º, caput e LIII) — norma de Constituição estadual que condiciona à prévia autorização judicial, mediante decisão fundamentada da maioria absoluta do órgão especial do respectivo tribunal de justiça, o pedido de medida cautelar para fins de investigação criminal ou instrução processual penal em desfavor de autoridades com foro por prerrogativa de função.

ADI 7.496 MC-Ref/GO, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 21.06.2024 (Info 1142)

1.1.  Situação FÁTICA.

A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol) ajuizou a ADI 7496 em face de norma da Constituição do Estado de Goiás que exigia autorização colegiada do Tribunal de Justiça local (TJ-GO) para medidas cautelares em inquéritos e ações penais contra autoridades.

A regra, inserida na Constituição estadual pela Emenda 77/2023, passou a exigir decisão do Órgão Especial do TJ-GO, por maioria absoluta, para apreciar pedidos cautelares (prisão preventiva, busca e apreensão e bloqueio de bens, entre outros) no curso de procedimentos criminais contra autoridades que têm foro especial na corte local, como deputados estaduais e prefeitos.

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.    Violada a competência da União?

R: Bastante!!!

A norma impugnada, ao regular o foro por prerrogativa de função, não poderia dispor diversamente ou desbordar dos limites estabelecidos no modelo federal que, no caso, estão contidos no próprio Regimento Interno do STF (art. 21, XV). Conforme disposto na referida norma, que possui status de lei ordinária, a competência para supervisão judicial dos atos investigatórios de autoridades com prerrogativa de foro deve ser conferida ao relator, não havendo, portanto, necessidade de deliberação colegiada.

A razão jurídica que justifica a necessidade de supervisão judicial dos atos investigatórios de autoridades com prerrogativa de foro no STF aplica-se, por simetria, às autoridades com prerrogativa de foro nos tribunais de segundo grau de jurisdição. Ademais, conforme jurisprudência do STF, a competência do respectivo tribunal para a supervisão judicial nesses casos não torna obrigatória a deliberação do respectivo órgão colegiado, sendo suficiente decisão do ministro ou desembargador relator.

Nesse contexto, a exigência de controle judicial prévio por deliberação de órgão colegiado do tribunal de justiça local, além de conferir tratamento diferenciado aos seus detentores de foro por prerrogativa de função, destoa da lógica estabelecida por outras importantes disposições do RISTF (art. 21, IV e V, §§ 5º e 8º, e art. 230-C, § 2º).

1.2.2.    Resultado final.

 Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, converteu o referendo da medida cautelar em julgamento definitivo de mérito e, confirmando-a, julgou a ação parcialmente procedente para (i) declarar a inconstitucionalidade da expressão “mediante decisão fundamentada tomada pela maioria absoluta do órgão especial previsto no inciso VI do art. 93 da Constituição da República”, contida na alínea “p” do inciso VIII do art. 46 da Constituição do Estado de Goiás, com redação dada pela EC estadual nº 77/2023; e (ii) dar à parte remanescente do referido dispositivo interpretação conforme a Constituição, a fim de esclarecer que “o Desembargador Relator pode apreciar monocraticamente as medidas cautelares penais requeridas durante a fase de investigação ou no decorrer da instrução processual nos casos de urgência e, ainda, quando a sigilosidade se mostrar necessária para assegurar a efetivação da diligência pretendida, ressalvada a obrigatoriedade de referendo pelo órgão colegiado competente, em momento oportuno, sobretudo quando resultar em prisão cautelar, mas sempre sem comprometer ou lhe frustrar a execução”. 

DIREITO TRIBUTÁRIO

2.     “Refis I”: exclusão de contribuinte com a equiparação do pagamento de “parcelas ínfimas” à inadimplência

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Encontram-se presentes os requisitos para a concessão da medida cautelar, pois: (i) há plausibilidade jurídica no que se refere à alegação de ofensa aos princípios da legalidade tributária (CF/1988, art. 150, I), da segurança jurídica e da confiança legítima na exclusão de pessoas jurídicas do “Refis I”, com fundamento na tese das “parcelas ínfimas”; e (ii) há perigo da demora na prestação jurisdicional, diante do parecer editado pela PGFN e amplamente divulgado que impõe aos contribuintes os efeitos deletérios de uma suposta inadimplência tributária, situação que se agrava para aqueles que seguem recolhendo as parcelas, visto que, por força da prescrição, não será possível pleitear a devolução dos valores recolhidos.

ADI 7.370 MC-Ref/DF, relator Ministro Cristiano Zanin, julgamento virtual finalizado em 21.06.2024 (Info 1142)

2.1.  Situação FÁTICA.

Na ação, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) questiona um parecer de 2013 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que considerava inválidos os pagamentos quando os valores recolhidos de acordo com o critério legal (porcentagem da receita bruta) fossem insuficientes para amortizar as dívidas. Para a OAB, a Lei 9.964/2000, que instituiu o Refis, não prevê essa regra.

Em abril de 2023, o ministro Ricardo Lewandowski concedeu a liminar na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 77 e determinou a reinclusão desses contribuintes. A ADC foi convertida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7370).

O objetivo da OAB era a declaração da constitucionalidade dos dispositivos da Lei 9.964/2000, que instituiu o Refis, que dispõem sobre as hipóteses de exclusão do Programa. Segundo a entidade, o parecer da PGFN tem aberto precedentes para que empresas adimplentes e de boa-fé sejam excluídas do parcelamento, a partir de avaliação da Receita Federal do que seriam consideradas parcelas mensais ínfimas para a quitação da dívida em prazo razoável.

A seu ver, a PGFN não poderia excluir esses contribuintes sob esse fundamento, após mais de uma década de sua adesão ao Refis I, se o parcelamento foi devidamente homologado pela autoridade administrativa competente e se as parcelas vinham sendo pagas no percentual sobre o faturamento indicado na própria norma.

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.    Questão JURÍDICA.

Lei nº 9.964/2000: “Art. 5º A pessoa jurídica optante pelo Refis será dele excluída nas seguintes hipóteses, mediante ato do Comitê Gestor: I – inobservância de qualquer das exigências estabelecidas nos incisos I a V do caput do art. 3º; II – inadimplência, por três meses consecutivos ou seis meses alternados, o que primeiro ocorrer, relativamente a qualquer dos tributos e das contribuições abrangidos pelo Refis, inclusive os com vencimento após 29 de fevereiro de 2000; III – constatação, caracterizada por lançamento de ofício, de débito correspondente a tributo ou contribuição abrangidos pelo Refis e não incluídos na confissão a que se refere o inciso I do caput do art. 3º, salvo se integralmente pago no prazo de trinta dias, contado da ciência do lançamento ou da decisão definitiva na esfera administrativa ou judicial; IV – compensação ou utilização indevida de créditos, prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa referidos nos §§ 7º e 8º do art. 2º; V – decretação de falência, extinção, pela liquidação, ou cisão da pessoa jurídica; VI – concessão de medida cautelar fiscal, nos termos da Lei nº 8.397, de 6 de janeiro de 1992; VII – prática de qualquer procedimento tendente a subtrair receita da optante, mediante simulação de ato; VIII – declaração de inaptidão da inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, nos termos dos arts. 80 e 81 da Lei nº 9.430, de 1996; IX – decisão definitiva, na esfera judicial, total ou parcialmente desfavorável à pessoa jurídica, relativa ao débito referido no § 6º do art. 2º e não incluído no Refis, salvo se integralmente pago no prazo de trinta dias, contado da ciência da referida decisão; X – arbitramento do lucro da pessoa jurídica, nos casos de determinação da base de cálculo do imposto de renda por critério diferente do da receita bruta; XI – suspensão de suas atividades relativas a seu objeto social ou não auferimento de receita bruta por nove meses consecutivos. § 1º A exclusão da pessoa jurídica do Refis implicará exigibilidade imediata da totalidade do crédito confessado e ainda não pago e automática execução da garantia prestada, restabelecendo-se, em relação ao montante não pago, os acréscimos legais na forma da legislação aplicável à época da ocorrência dos respectivos fatos geradores. § 2º A exclusão, nas hipóteses dos incisos I, II e III deste artigo, produzirá efeitos a partir do mês subseqüente àquele em que for cientificado o contribuinte. § 3º Na hipótese do inciso III, e observado o disposto no § 2º, a exclusão dar-se-á, na data da decisão definitiva, na esfera administrativa ou judicial, quando houver sido contestado o lançamento. (…) Art. 9º O Poder Executivo editará as normas regulamentares necessárias à execução do Refis, especialmente em relação: I – às modalidades de garantia passíveis de aceitação; II – à fixação do percentual da receita bruta a ser utilizado para determinação das parcelas mensais, que poderá ser diferenciado em função da atividade econômica desenvolvida pela pessoa jurídica; III – às formas de homologação da opção e de exclusão da pessoa jurídica do Refis, bem assim às suas conseqüências; IV – à forma de realização do acompanhamento fiscal específico; V – às exigências para fins de liquidação na forma prevista nos §§ 7º e 8º do art. 2º.”

2.2.2.    Justifica a medida cautelar?

R: Yeap!

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) concluiu, mediante o Parecer PGFN/CDA nº 1.206/2013, que as empresas aderentes ao Programa de Recuperação Fiscal I (“Refis I”) devem ser consideradas inadimplentes no caso de o valor das parcelas pagas ser insuficiente para quitar a dívida (tese das “parcelas ínfimas”), atribuindo-lhes, inclusive, os efeitos dela decorrentes, como a indisponibilidade e a expropriação de bens, bem como a impossibilidade de emissão de certidões de regularidade fiscal. No entanto, as hipóteses de exclusão do “Refis I” estão no rol TAXATIVO da Lei nº 9.964/2000 (art. 5º), o que impede o uso de analogia ou interpretação extensiva que extraia hipótese não prevista na lei.

Nesse contexto, a Administração Pública federal, por meio de interpretação ampliativa da norma tributária, usurpou a competência do Poder Legislativo para criar hipótese de exclusão do parcelamento.

Ademais, o Poder Público modificou sua conduta de forma inesperada, de maneira a surpreender o administrado e frustrar suas legítimas expectativas, já que, sem autorização em lei em sentido estrito, pôs fim a parcelamento regularmente firmado.

2.2.3.    Resultado final.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, referendou a medida cautelar anteriormente concedida — no bojo da ADC 77/DF (antes de sua reautuação) — para dar interpretação conforme a Constituição aos arts. 5º e 9º da Lei nº 9.964/2000 e (i) afirmar que é vedada a exclusão, com fundamento na tese das “parcelas ínfimas ou impagáveis”, de contribuintes do “Refis I”, os quais, aceitos no parcelamento, vinham adimplindo-o em estrita conformidade com as normas existentes do programa, até o definitivo julgamento desta ação; e (ii) determinar a reinclusão dos contribuintes adimplentes e de boa-fé, que, desde a adesão ao referido parcelamento, permaneceram apurando e recolhendo aos cofres públicos os valores devidos, até o exame do mérito.

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