Dicas de Processo do Trabalho – Liquidação de sentença
LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA;
CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA:
A liquidação de sentença consiste em um
procedimento preparatório à execução, que se faz necessário em decorrência do
art. 586 do CPC, que aduz título
líquido, certo e exigível.
! Não é correto afirma que a
liquidação de sentença é uma ação autônoma. Trata-se, de acordo com a doutrina
majoritária, de um procedimento preliminar à execução.
Por vezes, a sentença faz menção ao que
se deve (na debeatur), mas silencia
em relação ao quanto é devido (quantum
debeatur), sendo que a procedimento de liquidação de sentença consiste na
prática de atos processuais tendentes a encontrar esse segundo elemento an debeatur gerando a possibilidade do
título ser executado.
O instituto encontra-se previsto no art.
879 da CLT, sendo que seu caput prescreve
o seguinte: Sendo ilíquida a sentença
exeqüenda, ordenar-se-á previamente, a sua liquidação, que poderá ser feita por
cálculo, por arbitramento ou por artigos.
Importante sempre frisar que nas
demandas que tramitam pelo rito sumaríssimo, que são aquelas cujo valor é de
até 40 (quarenta) salários mínimos, a sentença sempre deve ser líquida, não
havendo procedimento de liquidação posterior, tendo sido previsto pelo
legislador, quando da instituição do rito, a passagem direta do processo de
conhecimento para o processo de execução, em privilégio à celeridade
processual.
! A sentença proferida no rito
sumaríssimo não pode ser ilíquida, haja vista a inexistência de previsão legal
para o procedimento de liquidação de sentença naquele procedimento, bem como a
vedação imposta pelo art. 852-B, I da CLT, que impõe a formulação de pedido
certo e determinado.
O dispositivo referido acima afirma a
existência de 3 (três) espécies de liquidação, a saber: cálculos, arbitramento
e artigos. Porém, nada impede que sejam adotadas mais de uma espécie de
liquidação ao mesmo tempo, ou seja, que um capítulo da sentença seja liquidada
por cálculos e outro por arbitramento. Nessa hipótese, denomina-se liquidação mista.
Nada impede também que a liquidação de
sentença abranja apenas parte da sentença, por mostra-se em parte líquida e em
parte ilíquida.
ESPÉCIES;
CÁLCULOS:
Trata-se da hipótese mais comum de
liquidação de sentença, consistindo na apresentação e análise de cálculos
aritméticos pelas partes, conforme art. 879 da CLT e 475-B do CPC. Nesse
procedimento, utilizado para as situações mais corriqueiras do processo do
trabalho, o credor será intimado para apresentar os cálculos de liquidação em
10 (dez) dias. Os cálculos devem ser apresentados de maneira discriminada e
atualizada.
! Importante destacar a Súmula nº
211 do TST, que afirma que os juros e correção monetária devem ser incluídos
nos cálculos de liquidação mesmo que omisso o pedido inicial e a condenação,
por se tratarem de pedidos implícitos.
! Além disso, em relação aos juros,
esses são de 12% ao ano, contados da data do ajuizamento da demanda (art. 883
da CLT), incidentes sobre o valor da condenação já atualizado monetariamente,
nos termos da Súmula nº 200 do TST.
O credor, ao elaborar os cálculos de
liquidação, deverá incluir os valores devidos à Previdência Social a título de
contribuição previdenciária incidente sobre a condenação. Por fim, a liquidação
por cálculos pode ser utilizada para aferir o valor da condenação imposta sobre
as seguintes verbas: férias, 13º salário, horas extras, adicional noturno,
adicional de insalubridade e periculosidade, etc.
ARBITRAMENTO;
A liquidação por arbitramento é
realizada nas hipóteses do art. 475-C do CPC, a saber:
·
Por convenção das partes;
·
Por determinação judicial (quando a
sentença assim determinar);
·
O objeto da condenação exigir;
Nessa espécie de liquidação, o valor é
aferido após análise realizada por perito, ou seja, a realização de perícia é o
fator distintivo dessa espécie para as demais. Geralmente é realizada perícia
técnica para liquidar a sentença quando há pedido de condenação ao pagamento de
salário in natura, hipótese em que é
necessário conhecimento técnico para apurar-se o valor da utilidade ou quando
há necessidade de apurar-se o valor médio de salário para determinada
profissão.
! A necessidade de perícia técnica
é o ponto fundamental da liquidação por arbitramento, sendo o que a distingue
das demais.
Aplica-se o art. 475-D do CPC ao
processo do trabalho, sendo que tal dispositivo prevê que o Juiz, ao determinar
a liquidação de sentença por arbitramento, designará perito e fixará o prazo
para a entrega do laudo. Após a apresentação do laudo, poderão as partes
manifestar-se no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de preclusão, podendo ainda
ser designada audiência, principalmente para colher esclarecimentos do perito.
Apesar da realização de perícia
consistir no principal aspecto da espécie em estudo, não se pode afirmar que
nesse procedimento é realizada perícia de acordo com as normas já estudadas na
fase instrutória, já que presentes as seguintes diferenças:
·
A perícia realizada na liquidação terá
por objeto o que foi determinado na sentença, ao passo que a perícia realizada
quando da instrução terá por objeto o que for determinado pelo Juiz no
saneamento do processo, que ocorre em audiência, após a entrega da defesa pelo
réu;
·
Na liquidação, não há possibilidade das
partes apresentarem quesitos e assistentes técnicos;
·
Na liquidação é perito é único, ao passo
que na instrução podem ser tantos quantos designados pelo Magistrado;
Por fim, pode haver conversão da
liquidação por arbitramento em cálculos, se assim determinar o Juiz, ao
perceber que essa espécie possui aptidão para tornar líquida a sentença. Tal
conversão é possível haja vista ir ao encontro dos princípios da economia e
celeridade processuais.
ARTIGOS;
Prevista no art. 475-E do CPC, a
liquidação por artigos caracteriza-se pela necessidade de provar fatos novos,
indispensáveis à prova do valor da condenação. Em reclamatória trabalhista,
reconheceu-se o direito do reclamante a perceber horas extras sem, contudo,
afirmar-se o valor, tendo em vista a ausência de provas concretas acerca do
número exato de horas extraordinárias trabalhadas durante o período do vínculo
empregatício. Em liquidação da sentença, será necessário provar o número de
horas extraordinárias laboradas para daí definir-se o valor exato da
condenação.
! Lembrando que no rito
sumaríssimo, o pedido de condenação ao pagamento de horas extraordinárias é
possível desde que o reclamante quantifique as horas trabalhadas na inicial,
formulando desde já pedido certo e determinado, segundo disposição contida no
art. 852-B, I da CLT.
Na liquidação por artigos, há
necessidade de nova cognição em relação aos fatos novos que necessitam de
prova, devendo-se o Magistrado convencer-se acerca dos mesmos. Isso torna o
procedimento extremamente complexo, uma verdadeira nova reclamação
trabalhista, pois dispõe o art. 475-F da CLT que seguir-se-á o procedimento
ordinário, razão pela qual mostra-se bastante desaconselhável, devendo o
Magistrado Trabalhista, antes de proferir sentença condenatória, buscar
elementos que o permitam proferir sentença desde já líquida ou que demanda
apenas a apresentação de cálculos.
Importante salientar que o entendimento
majoritário é no sentido de que tal espécie de liquidação não pode ser manejada
de ofício pelo Magistrado, dependendo sempre de pedido da parte, uma vez que
essa deverá levar aos autos os fatos novos, bem como as provas necessárias,
consistindo em quebra ao princípio da imparcialidade a atuação ex officio.
Ao se adotar o procedimento ordinário,
diz-se que deverá ser apresentado requerimento pelo credor, com a narrativa dos
fatos e provas documentais, citando-se o devedor para apresentar defesa. A
ausência dessa importa em revelia, sendo designada audiência para buscar a
conciliação e a produção de provas orais.
IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DA DECISÃO NA
LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA;
A impossibilidade de inovação em sede de
liquidação de sentença, qualquer que seja a espécie, encontra previsão legal no
art. 879, §1º da CLT e 475-G do CPC. A fidelidade à sentença liquidanda é uma
característica da qual não se pode abrir mão, já que garantidora do
contraditório e ampla defesa, pois sobre aquela matérias dispostas na decisão
exeqüenda puderam as partes se manifestar no curso do processo.
! Na liquidação provisória, a
decisão liquidanda pode ser alterada em sede recursal, mas a impossibilidade de
inovação se mantém, já que a parte, ao requerer a liquidação, não poderá
realizar qualquer alteração no julgado.
No tocante à liquidação definitiva, a
impossibilidade de inovação vai ao encontro do instituto da coisa julgada
material, cuja previsão encontra-se, sobretudo, no art. 5º, XXXI da CRFB/88.
IMPUGNAÇÃO À CONTA DE LIQUIDAÇÃO;
Talvez seja esse um dos temas mais
cobrados em concursos públicos sobre liquidação da sentença, por mostra-se, às
vezes, confuso.
Dois são os caminhos que podem ser
seguidos pelo Magistrado Trabalhista, a saber:
·
Art.
884, §3º da CLT: o Juiz julga a liquidação, definindo o
valor a ser executado, sem oportunizar a parte o contraditório naquele momento.
Com base no valor conferido à execução, expede-se mandado de citação, penhora e
avaliação, oportunidade em que o devedor poderá, após a garantia dos bens,
apresentar embargos e/ou impugnar a conta de liquidação. Verifica-se claramente
que o contraditório está presente, sendo apenas relegado a momento posterior. O
exeqüente, ao responder aos embargos e/ou impugnação, poderá igualmente
manifestar-se em 5 (cinco) dias.
!
Mesmo que o executado não apresente embargos à execução, deverá o exeqüente ser
intimado para, em 5 (cinco), manifestar-se sobre a conta de liquidação, já que
possui direito ao contraditório, que consiste na demonstração de equívocos na
fixação do valor.
·
Art.
879, §2º da CLT: a partir da Lei nº 8.432/92, passou a
CLT a prever uma segunda situação, caracterizada pelo exercício anterior do
contraditório, se comparado à primeira hipótese estudada. Segundo o §2º do art.
879 da CLT, elaborada a conta de liquidação, o Juiz intima credor e devedor
para, em 10 (dez) dias, manifestarem-se, sob pena de preclusão, sendo que a
omissão nesse momento impedirá qualquer manifestação posterior, não sendo
lícito questionar o valor nos futuros embargos à execução, que poderão ser
manejados conforme art. 884 da CLT. A União deverá ser intimada para em 10 (dez)
dias manifestar-se, sob pena de preclusão, nos termos do art. 879, §3º da CLT.
! A impugnação a ser apresentada à
conta de liquidação deve sempre ser fundamentada, com a indicação dos equívocos
cometidos, não sendo possível a apresentação de manifestação genérica, por
violar o contraditório e ampla defesa.
Pela análise realizada, constata-se que
o Juiz do Trabalho possui a faculdade de abrir prazo de 10 (dez) dias para as
partes apresentarem manifestação quando da elaboração da conta de liquidação. A
não abertura de prazo não impõe a nulidade do processo, pois poderão ser
alegados eventuais erros nos embargos à execução. Em relação à União, a
intimação é obrigatória, pois aquele verificará se alguma verba devida ao ente
público foi sonegada na decisão de liquidação.
NATUREZA JURÍDICA DA DECISÃO DE LIQUIDAÇÃO E
RECORRIBILIDADE;
O art. 475-H do CPC, ao dizer que da decisão de liquidação caberá agravo de
instrumento, deixa claro, terminando com forte dissenso doutrinário e
jurisprudencial na seara processual civil, que a decisão que finda o
procedimento de liquidação é interlocutória,
cabendo, portanto, agravo de instrumento.
Esse também é o entendimento majoritário
na seara processual do trabalho: a decisão de liquidação consiste em decisão interlocutória, portanto,
irrecorrível de imediato, seguindo-se o princípio da irrecorribilidade das
interlocutórias, já estudado anteriormente, previsto no art. 893, §1º da CLT e
Súmula 214 do TST.
! Não cabe recurso de imediato da
decisão que torna líquida a sentença exeqüenda, podendo ser interposto recurso
posteriormente, quando do julgamento dos embargos à execução e/ou impugnações.
Não sendo possível a interposição de
qualquer recurso (Súmula nº 214 do TST), será expedido mandado de citação,
penhora e avaliação, com posterior possibilidade de ajuizamento de embargos à
execução, desde que garantido o juízo. Nos embargos, poderão as partes renovar
as impugnações apresentadas anteriormente (no rito do art. 879 da CLT) ou apresentá-las
pela primeira vez (no rito do art. 884 da CLT), cabendo o recurso de agravo de
petição da decisão que julgar aquele incidente (embargos à execução), nos
termos do art. 897, b da CLT.
Por fim, acerca da possibilidade de
ajuizamento de ação rescisória em face da decisão de liquidação, destaque para
a Súmula nº 399, II do TST, que resume a controvérsia ao afirmar que:
·
Se a decisão for meramente
homologatória, não cabe rescisória, diante da ausência de coisa julgada
material;
·
Se a decisão analisar o mérito da
impugnação, ou seja, decidir as questões envolvidas na elaboração da conta de
liquidação, caberá ação rescisória, haja vista que seu conteúdo é de mérito e,
por isso, há formação de coisa julgada material.