Comentários às questões aplicadas na prova da Defensoria Pública do Distrito Federal em julho de 2019. As questões de criminologia e legislação penal especial serão comentadas por outros professores da nossa equipe.
Segue a análise, com os votos de sucesso a quem prestou a prova.
Considerando o Código Penal brasileiro, julgue os itens a seguir, com relação à aplicação da lei penal, à teoria do delito e ao tratamento conferido ao erro.
61 Para a teoria limitada da culpabilidade, o erro do agente que recaia sobre pressupostos fáticos de uma causa de justificação configura erro de tipo permissivo.
O item está correto. A teoria limitada da culpabilidade trata o erro do agente, que recai sobre os pressupostos fáticos de uma excludente de ilicitude, como erro de tipo permissivo (ou descriminante putativa por erro de tipo). É a teoria adotada pelo Código Penal, conforme se depreende da leitura do seu artigo 20, caput e § 1º;
Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
§ 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo. (…).
62 Em razão da teoria da ubiquidade, considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria ter se produzido o resultado.
O item está correto. Quanto ao lugar do crime, o Código Penal adotou a teoria da ubiquidade, conforme se depreende do seu artigo 6º:
Art. 6º – Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.
63 A superveniência de causa relativamente independente da conduta do agente excluirá a imputação do resultado nos casos em que, por si só, ela tiver produzido o resultado.
O item está correto. É exatamente o que prevê o parágrafo primeiro do artigo 13 do Código Penal:
§ 1º – A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.
Com base no entendimento do STJ, julgue os próximos itens a respeito da aplicação da pena.
64 Condenação anterior por delito de porte de substância entorpecente para consumo próprio não faz incidir a circunstância agravante relativa à reincidência, ainda que não tenham decorrido cinco anos entre a condenação e a infração penal posterior.
O item está correto. É o atual entendimento do STJ:
“(…) E, se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, mostra-se desproporcional o delito do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade (HC n. 453.437/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 15/10/2018). (…)” (STJ, AgRg no REsp 1778346/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Jr, Sexta Turma, DJe 03/05/2019).
65 A confissão espontânea na delegacia de polícia retratada em juízo deverá ser considerada atenuante da confissão espontânea, ainda que o magistrado não a utilize para fundamentar a condenação do réu.
O item está incorreto. Se a confissão for feita apenas em âmbito policial e for retratada em juízo, não fará incidir a agravante se o juiz não utilizá-la para fundamentar a sentença condenatória. É o que se depreende da Súmula 545 do STJ:
“Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal.”
Acerca da ação penal, das causas extintivas da punibilidade e da prescrição, julgue os itens seguintes.
66 Nos casos de concurso formal ou de continuidade delitiva, a extinção da punibilidade regula-se pela pena imposta a cada um dos crimes isoladamente, afastando o acréscimo decorrente dos respectivos aumentos de pena.
O item está correto. No caso do concurso formal de crimes, há o artigo 119 do Código Penal, que é bem claro:
Art. 119 – No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.
Quanto à continuidade delitiva, a Súmula 497 do STF demonstra que o item está correto:
“Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação”.
67 Conforme entendimento do STF, a persecução penal por crime contra a honra de servidor público no exercício das suas funções é de ação penal pública condicionada à representação do ofendido.
O item está incorreto. O STF entende que a legitimidade, em tal caso, é concorrente, nos termos da Súmula 714:
“É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do ministério público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções”.
68 A sentença concessiva de perdão judicial nos casos previstos em lei é causa extintiva da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório, salvo para fins de reincidência.
O item está incorreto. O STJ entende que não subsiste nenhum efeito condenatório, nem o de gerar a reincidência. Neste sentido, sua Súmula 18:
“A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.”
Com relação aos delitos tipificados na Parte Especial do Código Penal, julgue os itens subsecutivos:
69 Situação hipotética: Pedro, réu primário, valendo-se da confiança que lhe depositava o seu empregador, subtraiu para si mercadoria de pequeno valor do estabelecimento comercial em que trabalhava. Assertiva: Nessa situação, apesar de configurar a prática de furto qualificado pelo abuso de confiança, o juiz poderá reconhecer o privilégio.
O item está incorreto. O STJ entende ser compatível com o privilégio do furto qualquer qualificadora de ordem objetiva. Deste modo, a única qualificadora que não é compatível é a de abuso de confiança. Neste sentido:
“(…) 7. Nos termos da pacífica jurisprudência desta Corte, consolidada na Súmula 511/STJ, é viável a incidência do privilégio na hipótese de furto qualificado, desde que a qualificadora seja de caráter objetivo. Decerto, a única qualificadora que inviabiliza o benefício penal é a de abuso de confiança (CP, art. 155, § 4º, II, primeira parte). (…)”.
STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1386937/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe 14/02/2019.
70 Segundo o STJ, a previsão legal do crime de desacato a funcionário público no exercício da função não viola o direito à liberdade de expressão e de pensamento previstos no Pacto de São José da Costa Rica.
O item está correto. Neste sentido, o recente julgado:
“(…) 1. Consoante entendimento pacificado pela Terceira Seção desta Corte Superior, no julgamento do HC n. 379.269/MS, desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela continua a ser crime, conforme previsto no art. 331 do Código Penal – CP, não havendo que falar em ofensa ao direito à liberdade de expressão, prevista em Tratado Internacional de Direitos Humanos. Precedentes. (…)” (STJ, AgRg no REsp 1791198/RO, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe 09/04/2019).
71 A circunstância de descumprimento de medida protetiva de urgência imposta ao agressor, consistente na proibição de aproximação da vítima, constitui causa de aumento de pena no delito de feminicídio.
O item está correto. A majorante do feminicídio está prevista no artigo 121, § 7º, IV, do CP:
“§ 7o A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: (…)
IV – em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006”.
Cumpre, então, fazer a leitura do artigo 22, III, a, da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), que traz a medida mencionada na assertiva:
“Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
III – proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; (…)”.
Espero que os comentários sejam de grande proveito e deixo o convite para que me sigam no Instagram: @professor.procopio.
Abraço,
Prof. Michael Procopio
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