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Questões comentadas de Direito Civil – AGU – Pessoa Natural e Prescrição

Prezados amigos, tudo bem?


Iniciarei este artigo fazendo quatro questionamentos:


a) Você sabe quando se inicia a
personalidade jurídica de uma pessoa natural?


b) E em relação ao nascituro, ele pode
ser titular de direitos e obrigações?


c) Um feto anencéfalo que tenha morrido
um milésimo de segundo após o nascimento tem possui direito a herança?


d) E quanto à prescrição: o credor que
deixa de exercer o seu direito no prazo legal perde o direito de agir?


Descubram a resposta com a resolução de quatro questões que foram cobradas na prova de
Advogado da União neste ano de 2012. Portanto, questões recentíssimas!!!


(Advogado da União – 2012 –
CESPE)


De acordo com o disposto no
Código Civil brasileiro acerca da pessoa natural, julgue os itens a seguir.


1. Embora a lei proteja o
direito sucessório do nascituro, não é juridicamente possível registrar no seu
nome, antes do nascimento com vida, um imóvel que lhe tenha sido doado.


O item está certo. Essa questão pode ser
resolvida com base na interpretação do art. 2º, do Código Civil, e com base no
conceito de personalidade jurídica.


Inicialmente, temos o Art. 2º,
CC, que ao estabelecer a regra referente ao início da personalidade da pessoa
natural, prescreve:


Art. 2o A
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a
salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.


Com base na parte final desse
dispositivo legal podemos inferir que, desde a concepção, ou seja, desde o
momento em ocorre a fecundação, a lei resguarda os direitos do nascituro. Isso
não significa que ele tenha personalidade jurídica, mas que os seus direitos
(cuja aquisição e exercício estão condicionados ao nascimento com vida) estão
assegurados.


Com base no dispositivo legal acima
podemos concluir, ainda, que o nascituro é sujeito despersonalizado, ou seja,
desprovido de personalidade jurídica. E qual a base para essa nossa
compreensão?


É o fato de a lei afirmar que a
personalidade começa do nascimento com vida. O nascituro ainda está por vir,
ainda não nasceu e, dessa forma, não terá adquirido personalidade jurídica.


E qual a consequência disso, ou seja,
de não lhe ser reconhecida a personalidade jurídica?


Pois bem.


A personalidade jurídica é o atributo
que confere às pessoas que a detenham (sejam pessoas naturais ou jurídicas) a
capacidade de titularizar relações jurídicas adquirindo direitos e contraindo
obrigações. Se não existe personalidade jurídica, consequentemente não se terá
a possibilidade de adquirir direitos e contrair obrigações.


É com base nessas informações que
podemos afirmar categoricamente que um nascituro, enquanto nessa condição, terá
mera expectativa de diretos (inclusive aos direitos sucessórios) e, ao nascer
com vida e por consequência adquirir personalidade jurídica, terá todos os
direitos que até então eram mera expectativa convertidos em direitos de fato
que ingressarão em seu patrimônio jurídico (os direitos sucessórios poderão ser
exercidos com o recebimento da herança que lhe for de direito, por exemplo).


Concluindo, está correto afirmar que a lei
protege o direito sucessório do nascituro, mas (por não possuir personalidade
jurídica) não é juridicamente possível registrar no seu nome, antes do
nascimento com vida, um imóvel que lhe tenha sido doado, o qual poderá ser
registrado a partir do momento em que nascer (com vida).


2. A recente decisão do STF em favor da possibilidade
de interrupção da gravidez de fetos anencéfalos não invalida o dispositivo
legal segundo o qual o feto nascido com vida adquire personalidade jurídica,
razão por que adquirirá e transmitirá direitos, ainda que faleça segundos
depois.


O item está certo. Para a aquisição da personalidade
jurídica pouco importa que tenha cérebro ou não (anencéfalo) ou mesmo que tenha
forma humana. Se o ser foi gerado de um homem com uma mulher e, por qualquer
circunstância se tornou uma aberração natural, ainda assim será ser humano.
Desse modo, tendo um
“sopro” de vida, ainda que ínfimo, terá adquirido personalidade jurídica
.


Então, se um feto nasce e, em seguida
morre, terá adquirido personalidade jurídica, inclusive com direito a registro
de nascimento (e em seguida o de óbito).

Desse modo, está correto afirmar que a recente
decisão do STF em favor da possibilidade de interrupção da gravidez de fetos anencéfalos
não invalida o dispositivo legal segundo o qual o feto nascido com vida adquire
personalidade jurídica, razão por que adquirirá e transmitirá direitos, ainda
que faleça segundos depois.


A respeito da prescrição,
julgue os itens seguintes.


3. O devedor capaz que pagar
dívida prescrita pode reaver o valor pago se alegar, na justiça, a ocorrência
de pagamento indevido ao credor, estando o direito de reaver esse valor fundado
no argumento de que o credor que receba o que lhe não seja devido enriquece às
custas do devedor.


O item está errado.


Nos termos do Art. 882, CC, não se pode repetir o que se pagou
para solver dívida prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.


Primeiramente é importante mencionar
que o pagamento é indevido quando
alguém recebe algo que não lhe era devido. Nesse sentido, o art. 876, CC,
abaixo transcrito:


Art. 876. Todo aquele que recebeu o que
lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que
recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.


Um segundo ponto importante: o
fenômeno da prescrição incide sobre a pretensão
, ou seja, o
direito de exigir judicialmente o cumprimento da obrigação. Assim, o credor de
dívida prescrita não poderá exigir judicialmente o pagamento da dívida.
Contudo, o direito em si continua
existindo configurando-se como obrigação natural e, se o devedor paga a dívida,
o credor recebe algo que lhe era devido e aquele não terá sucesso em eventual ação em que busque
obter o ressarcimento dos valores pagos
(repetição de
indébito).


Observe-se, ainda, que o enriquecimento
sem causa está previsto no art. 884, CC. E o referido dispositivo legal
prescreve:



Art. 884. Aquele que, sem justa causa,
se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente
auferido, feita a atualização dos valores monetários”.


Portanto, se a dívida existe por se
tratar de obrigação natural, o seu pagamento não ocorrer sem justa causa e, desse
modo, não haverá enriquecimento sem causa.


4. Considere a seguinte situação
hipotética.


Carla, vítima de atropelamento,
pretende, passados mais de três anos do fato, ajuizar, contra o agente que a
vitimou, ação de reparação pelos danos materiais e morais sofridos.


Nessa situação, Carla, em razão
de sua inércia, perdeu o direito de agir com o referido objetivo em face do
agente.


O item está errado.


Nessa questão o examinador tentou confundir o candidato usando um
conceito que muitos alunos das ciências jurídicas saem da faculdade sem saber.

Trata-se do conceito e aplicação prática da prescrição.


A prescrição, nas sábias palavras do professor Nelson
Rosenvald “é a perda
da pretensão de reparação de um direito violado, em razão da inércia do
titular, durante o lapso temporal estipulado em lei.


Observem o seguinte: com o decurso do prazo prescricional o direto de
fundo continua existindo. Contudo, o titular não pode mais exigir o seu
cumprimento. A maior confusão que ocorre é pensar
que ocorre a prescrição do direito de agir. Frisando: não existe a prescrição
do direito de agir, ou seja, de exercer o direito de ação recorrendo ao
judiciário com o pedido de condenar o devedor ao pagamento. O que ocorre, na
verdade, é a prescrição da pretensão (exigir o cumprimento judicialmente), a
qual não se confunde com o direto de agir (ação).


O erro da questão está em afirmar que “Carla, em razão de sua inércia,
perdeu o direito de agir”.
Ela poderá, sim, exercer o direito de ação, ingressando no judiciário (direito
de agir). O que ocorrerá, contudo, é que, se o devedor alegar prescrição ou mesmo o juiz
reconhecê-la de ofício, Carla não poderá coagir o devedor a repará-la.


Forte abraço e bons estudos!


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Anderson Hermano de Oliveira

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