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Gabarito Oficial – Possibilidade de Recurso em Processo Civil – PGM – Campo Grande (MS)

Olá, pessoal!

Meu nome é Rodrigo Vaslin, sou Juiz Federal do TRF4 e Professor de Processo Civil do Estratégia Concursos.

Há dois dias, publiquei um artigo comentando as questões da prova da PGM Campo Grande, indicando o gabarito que achava o mais pertinente.

Segue o link: https://www.estrategiaconcursos.com.br/blog/gabarito-extraoficial-de-direito-processual-civil-pgm-campo-grande-2019/

Hoje, o gabarito oficial foi publicado.

Das 15 questões, apenas a de nº 63 foi divergente com os nossos comentários.

Nesse sentido, vou relatar aqui mais uma vez o porquê que eu entendo, data vênia, que a assertiva nº. 63 está equivocada e, portanto, merece a interposição de recurso.

Vamos lá!

63 – A incompetência territorial é uma questão relativa, que deve ser alegada na primeira oportunidade em que a parte se manifestar em juízo, salvo no caso de o objeto litigioso ser um bem imóvel, o que torna a competência territorial absoluta e passível de ser decretada de ofício pelo julgador.

Gabarito: O gabarito oficial a considerou correta, mas, respeitosamente, entendo que está incorreta.

Não é o fato de o “objeto litigioso ser bem imóvel” que tornará absoluta a competência territorial.

Nesses casos, para que haja competência territorial absoluta, a demanda deve tratar de DIREITO REAL sobre imóveis.

Querem uma explicação mais completa? Então, vamos com calma!

A regra geral de competência de foro (territorial) encontrava-se no art. 94, CPC/73 e, atualmente, encontra-se no art. 46, CPC/2015, sendo o foro de domicílio do réu para ações fundadas em direito pessoal E direito real sobre bens Móveis.

Assim, referida regra se aplica a demandas que versem sobre:

i- direito pessoal sobre móvel;

ii- DIREITO PESSOAL SOBRE IMÓVEL;

iii- direito real sobre móvel.

CPC/73 CPC/2015
Art. 94. A ação fundada em direito pessoal e a ação fundada em direito real sobre bens móveis serão propostas, em regra, no foro do domicílio do réu. § 1o Tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer deles. § 2o Sendo incerto ou desconhecido o domicílio do réu, ele será demandado onde for encontrado ou no foro do domicílio do autor. § 3o Quando o réu não tiver domicílio nem residência no Brasil, a ação será proposta no foro do domicílio do autor. Se este também residir fora do Brasil, a ação será proposta em qualquer foro. § 4o Havendo dois ou mais réus, com diferentes domicílios, serão demandados no foro de qualquer deles, à escolha do autor. Art. 46.  A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu. § 1o Tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer deles. § 2o Sendo incerto ou desconhecido o domicílio do réu, ele poderá ser demandado onde for encontrado ou no foro de domicílio do autor. § 3o Quando o réu não tiver domicílio ou residência no Brasil, a ação será proposta no foro de domicílio do autor, e, se este também residir fora do Brasil, a ação será proposta em qualquer foro. § 4o Havendo 2 (dois) ou mais réus com diferentes domicílios, serão demandados no foro de qualquer deles, à escolha do autor. § 5o A execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado.

Essa regra de competência territorial como domicílio do réu é relativa.

Art. 63.  As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações.

Qual a razão para que o legislador estabelecesse esse o critério geral para as ações fundadas em direito pessoal ou ações fundadas em direto real sobre móvel?

O legislador quis estabelecer compensação com a surpresa da ação para o réu. Para diminuir o desconforto com a situação de ser réu numa demanda, criou-se a regra de que, em princípio, se defenderá no domicílio em que mora.

Pois bem.

Ao lado dessa regra geral, temos várias regras especiais dispostas no NCPC.

Uma delas se encontra no art. 47, que dispõe:

CPC/73 CPC/2015
Art. 95. Nas ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro da situação da coisa. Pode o autor, entretanto, optar pelo foro do domicílio ou de eleição, não recaindo o litígio sobre direito de propriedade, vizinhança, servidão, posse, divisão e demarcação de terras e nunciação de obra nova.   Art. 47.  Para as ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro de situação da coisa. § 1o O autor pode optar pelo foro de domicílio do réu ou pelo foro de eleição se o litígio não recair sobre direito de propriedade, vizinhança, servidão, divisão e demarcação de terras e de nunciação de obra nova. § 2o A ação possessória imobiliária será proposta no foro de situação da coisa, cujo juízo tem competência absoluta.

Fazendo um parêntreses, é preciso dizer, a título de esclarecimento, as ações fundadas em direito real são aquelas que têm como objeto um direito real, derivado de uma relação jurídica de direito material existente entre uma pessoa (sujeito ativo) e uma coisa, sendo nesse caso a coletividade o sujeito passivo da obrigação. Os direitos reais estão previstos no art. 1.225, CC. Alguns defendem que se trata de rol taxativo. Outros entendem que é rol exemplificativo.

Obs: Um direito real pode dizer respeito a um bem móvel ou imóvel. Ex: propriedade de um computador (bem móvel) ou propriedade de um apartamento (bem imóvel).

Art. 1.225. São direitos reais:

I – a propriedade;

II – a superfície;

III – as servidões;

IV – o usufruto;

V – o uso;

VI – a habitação;

VII – o direito do promitente comprador do imóvel;

VIII – o penhor;

IX – a hipoteca;

X – a anticrese.

XI – a concessão de uso especial para fins de moradia;                         (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

XII – a concessão de direito real de uso; e                      (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)

XIII – a laje.                        (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)

No dispositivo colacionado na tabela, estabelece-se o fórum rei sitae – foro da situação do Imóvel como o competente para as demandas que versem sobre direito real Imobiliário.

Acontece que o CPC estabelece também foros concorrentes a ele.

Uma ação real imobiliária, segundo o art. 47, §1º pode ser propostas em 3 lugares:

i- situação da coisa

ii- domicílio do réu

iii- foro de eleição, se houver

Havendo essas 3 hipóteses, conclui-se que se trata de competência relativa.

O legislador, no entanto, estabeleceu SETE CASOS em que não se pode optar. NESSES 7 CASOS, A COMPETÊNCIA É ABSOLUTA.

Quais são os sete?

Direito de propriedade, direito de vizinhança, servidão, divisão de terras, demarcação de terras, nunciação de obra nova (§1º) e posse (§2º).

Não são todas as ações reais imobiliárias que estão aqui no art. 47, §1º, CPC. Existem ainda a anticrese, enfiteuse, usufruto, superfície etc. Nesses casos, a competência é relativa.

Em conclusão, não é o fato de o “objeto litigioso ser bem imóvel” que tornará absoluta a competência territorial.

Nesses casos, para que haja competência territorial absoluta, a demanda DEVE TRATAR DE DETERMINADOS DIREITOS REAIS SOBRE IMÓVEIS.

Assim, dois apontamentos são importantes:

1º ponto: Se o feito abordar um direito real não elencado nos §§1º e 2º, art. 47, a competência não será absoluta.

2º ponto: Se a demanda versar sobre um direito pessoal sobre imóveis, a competência não será absoluta, mas sim relativa.

A exemplo, o próprio STJ já definiu que a competência é do foro de eleição (relativa) na demanda em que o autor cumula pedido de rescisão contratual e reintegração de posse de bem imóvel.

A priori, uma ação sobre resolução de compromisso de compra e venda é pessoal, tendo como regra geral o domicílio do réu.

Já uma ação exclusiva de reintegração de posse entra na regra de competência absoluta do artigo 47, §2º, CPC, de foro da situação do imóvel.

No caso de cumulação, a jurisprudência entende que a reintegração é uma consequência automática da resolução do compromisso de compra e venda, motivo pelo qual o direito em jogo será considerado pessoal, na forma abaixo.

PROCESSO CIVIL. PEDIDO DE RESOLUÇÃO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL CUMULADO COM REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DIREITO PESSOAL. PREVALÊNCIA DO FORO DE ELEIÇÃO. EXISTÊNCIA DE DOIS CONTRATOS, CADA UM CONTENDO CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO DIVERSA. CUMULAÇÃO IMPRÓPRIA DE PEDIDOS. LIMITAÇÃO DA COGNIÇÃO AOS LIMITES DA COMPETÊNCIA DO ÓRGÃO JULGADOR. – Por se tratar de discussão a respeito da competência para processar e julgar a ação, deve ser afastada a retenção do recurso especial, prevista no art. 542, § 3º, do Código de Processo Civil. Precedentes. – A ação de resolução de compromisso de compra e venda assenta-se em direito pessoal. A existência do pedido de reintegração de posse, conseqüência natural que decorre da resolução, não atrai a regra de competência absoluta insculpida na segunda parte do art. 95 do Código de Processo Civil. Prevalece o foro de eleição. – É imprópria a cumulação de pedidos que envolvem fundamentos diversos e competências distintas. Diante da propositura de uma única ação, fundada em contratos diversos, com cláusulas de eleição de foro díspares, a demanda deve ser analisada apenas nos limites da competência do órgão julgador. Recurso Especial conhecido e provido. (STJ, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 13/11/2007, T3 – TERCEIRA TURMA)

No julgado acima, temos um caso em que um dos objetos da demanda é um imóvel e, mesmo assim, o STJ considerou que a competência é relativa, mais propriamente do foro de eleição previsto no contrato.

Portanto, entendo pela admissibilidade de recurso e possibilidade de mudança de gabarito ou anulação da questão.

Se tiverem algum posicionamento divergente, estou plenamente aberto a discussões e debates. Qualquer dúvida ou sugestão, sigo à disposição pelo email rodrigovaslin@gmail.com e em nosso Fórum de Dúvidas – para os alunos.

Grande abraço,

Rodrigo Vaslin

Rodrigo Vaslin

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