Olá, pessoal! Todos nós sabemos que foi publicado o edital do concurso da Sefaz DF. No edital, foram reservadas oito vagas para pessoas com deficiência. Todavia, alguns alunos me procuraram para questionar uma regra do edital, em virtude da potencial restrição ao acesso do cargo por pessoa com deficiência. Nesse caso, estamos falando do item 5.2 do edital, que prevê o seguinte:
5.2 Para concorrer a uma das vagas reservadas, o candidato deverá:
a) no ato da inscrição, informar que deseja concorrer às vagas reservadas às pessoas com deficiência;
b) enviar, via upload, a imagem de parecer emitido nos últimos 12 meses anteriores à data de publicação deste edital por equipe multiprofissional e interdisciplinar formada por três profissionais, entre eles um médico. O parecer deve atestar a espécie e o grau ou o nível de sua deficiência, com expressa referência ao código correspondente da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), bem como a provável causa da deficiência. Deve, ainda, conter as assinaturas e os carimbos dos profissionais especializados com o número de suas inscrições nos respectivos conselhos fiscalizadores da profissão, conforme a sua especialidade, na forma do subitem 5.2.1 deste edital e de acordo com o modelo constante do Anexo I deste edital.
5.2.1 O parecer emitido por equipe multiprofissional e interdisciplinar observará:
a) os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;
b) os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;
c) a limitação no desempenho de atividades;
d) a restrição de participação.
A dúvida de alguns alunos seria se estes dispositivos não estariam causando discriminação, em virtude da excessiva exigência quanto aos requisitos para demonstrar que a pessoa possui determinada deficiência.
Como ainda estamos em período de impugnação do edital e como foram vários alunos que me procuraram, resolvi escrever este breve artigo para esclarecer.
Eu procurei algumas informações e também obtive ajuda do Prof. Ricardo Torques (professor de legislação de pessoa com deficiência aqui do Estratégia Concursos).
De imediato, ressalto que esta não é a minha opinião em si sobre o tema. Eu vou escrever um artigo aqui pautado na legislação, no edital e no entendimento do STJ e, a partir disso, vou apresentar uma breve sugestão do que deve ser feito. Nesse momento, precisamos ser realistas!
Então, vamos lá!
De início, a Lei Complementar nº 840/2011, que trata do regime jurídico dos servidores do Distrito Federal, prevê que sejam reservadas vagas para pessoa com deficiência, na forma de seu art. 12, determinando a reserva de 20% das vagas, desprezando a parte decimal (LC 840/11, art. 12). Ademais, a deficiência e a compatibilidade para as atribuições do cargo são verificadas antes da posse, garantido recurso em caso de decisão denegatória, com suspensão da contagem do prazo para a posse (LC 840/11, art. 12, § 2º).
Além disso, o tema foi objeto de regulamentação específica, no âmbito do DF, por intermédio da Distrital 4.317/2009. Porém, os artigos da mencionada norma que abordavam as regras sobre concurso público para pessoa com deficiência foram declarados inconstitucionais pelo TJDFT por ofenda ao princípio da separação dos Poderes, uma vez que matéria relativa ao regime jurídico dos servidores dependeria de iniciativa reservada do Chefe do Executivo.
Consequentemente, ficamos sem uma regulamentação específica no âmbito do DF.
Nesse caso, recorrendo às referências do próprio edital do concurso, o Decreto Federal 9.508/2018 (mencionado no item 5.1.3 do Edital) dispõe que:
Art. 3º Para os fins do disposto neste Decreto, os editais dos concursos públicos e dos processos seletivos de que trata a Lei nº 8.745, de 1993, indicarão:
IV – a exigência de apresentação pelo candidato com deficiência, no ato da inscrição, de comprovação da condição de deficiência nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, sem prejuízo da adoção de critérios adicionais previstos em edital;
Ademais, o art. 2º, § 1º, da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) dispõe que:
§ 1º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:
I – os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;
II – os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;
III – a limitação no desempenho de atividades; e
IV – a restrição de participação.
Nesse contexto, de certa forma, existe fundamento legal e regulamentar para a exigência constante no item 5.2 do edital.
Ademais, em algumas oportunidades, o STJ já entendeu como lícito o indeferimento de inscrição de candidato em concurso público quando não houver o atendimento aos requisitos definidos no edital. Vejamos um caso:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NO QUADRO DE SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. EDITAL N. 19/2018. INDEFERIMENTO DA INSCRIÇÃO NA CONDIÇÃO DE PORTADOR DE NECESSIDADE ESPECIAL. CANDIDATO QUE NÃO APRESENTOU O LAUDO MÉDICO ORIGINAL OU EM CÓPIA DEVIDAMENTE AUTENTICADA. DESCUMPRIMENTO EXPLÍCITO DAS REGRAS PREVISTAS NO EDITAL DO CONCURSO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. SEGURANÇA DENEGADA. (MS 61.655/SC, DJe 18/09/2019)
Enfim, o fato é que, apesar de existir alguma margem para discussão, existe a previsão no edital e haverá certa dificuldade em revertê-la.
A partir disso, eu posso sugerir algumas alternativas.
Primeiro, a despeito do que eu expliquei acima, se você não concorda com a exigência do edital, logicamente que você deverá elaborar a sua impugnação. Não se esqueça, todavia, que o momento para questionar a regra do edital é este. Não adianta depois alegar que o edital possui uma regra restritiva. Ao término do período da impugnação, basicamente estaremos concordando com as regras não questionadas do edital. Então, se você não concordou com o edital: faça a impugnação.
Alguns argumentos que podem ser apresentados são justamente a onerosidade que tal medida poderá trazer. Vale mencionar que art. 5º do Decreto 9.508/2018 também prevê que o órgão ou entidade promotor do concurso deverá dispor da equipe multidisciplinar. Logo, nesse caso, está sendo transferido para o candidato um encargo de responsabilidade do órgão / entidade.
Ademais, o momento da comprovação também pode ser prematuro, já que seria possível realizar essa mesma exigência apenas após a realização da prova, mas antes da homologação do concurso. Inclusive a LC 840/2011 dispõe que “a deficiência e a compatibilidade para as atribuições do cargo são verificadas antes da posse”, logo exigir a comprovação cabal antes mesmo da realização da prova seria uma medida desarrazoado e desproporcional.
Após a realização da prova objetiva, o concorrente já saberia da sua possibilidade de aprovação ou não. Então, o custo da realização de exames e testes, nesse momento mais avançado, seria mais razoável, sem qualquer prejuízo para a administração.
Outra alternativa é o questionamento judicial da regra. Porém, somente recomendo tal medida após um eventual indeferimento da impugnação. Ademais, sempre ressalvo que as ações judiciais são caras e demoradas. Assim, o concorrente tem que realmente estar disposto a isso. Vale lembrar que, às vezes, a impugnação judicial pode ser mais cara do que a realização dos exames com a equipe multidisciplinar.
A terceira alternativa que posso propor é a seguinte: se você realmente sabe que possui deficiência e também que possui aptidão para desempenhar as atribuições do cargo, procure uma equipe multidisciplinar e faça os testes e exames necessários. Eu sei que isso não é tão simples assim, mas é importante você procurar algum médico especialista de sua confiança e pedir sugestões de como obter o tal parecer. O prazo para o upload desse documento é até o dia 19 de dezembro.
Mesmo nessa terceira alternativa, eu apresentaria uma impugnação quanto à redação do item 5.2 do edital. Isso porque o item solicita que o parecer seja “emitido nos últimos 12 meses anteriores à data de publicação” do edital. Nesse caso, em uma interpretação literal, os laudos emitidos após a publicação do edital poderiam ser questionados. Portanto, a melhor alternativa é impugnar o edital, pedindo esclarecimentos sobre a validade de pareceres emitidos após a publicação do edital e, se for o caso, propor a adaptação da redação para evitar eventuais indeferimentos.
Por fim, mesmo que você faça a impugnação do edital, sempre sugiro que você também já procure alternativas para realizar os exames e testes com a equipe multidisciplinar. Não podemos ficar de braços cruzados esperando um eventual deferimento de uma impugnação que poderá ser indeferida. Então, temos que correr atrás de outras soluções.
Em qualquer caso, não se esqueça de outro ponto importante: estudar muito!
Era isso, pessoal. Ressalto mais uma vez: esta não é uma opinião meramente pessoal. Busquei trazer um artigo técnico para te ajudar na tomada de decisão. Por isso, preciso ser objetivo e realista, já que não posso ficar criando falsas esperanças.
Abraços!
Herbert Almeida
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Boa tarde!
Ótimo artigo mestre!
Sofri muito e não consegui tempo para reverter meu pleito junto a CESPE, no concurso de 2018/19, na CGE CE.
O edital citado estava com as mesmas exigências desse da SEFAZ DF, mas diferente de outros como o da PGE PE, também de 2018/19.
Entendo que existe uma fase do pleito de concorrer como deficiente, ok, através de laudos e atestados médicos, mas existe a fase da comprovação, e por isso existe e sempre existiu a perícia médica, momento este que se comprova pessoalmente, e tira-se qualquer dúvida.
Então antecipar um processo de um candidato, estudante e muitas vezes desempregado e sem plano de saúde, ter de correr atrás de equipe multidisciplinar, não é fácil, realmente sem comentários!!
Liguei no início dese ano, várias vezes, para a banca e argumentei toda a dificuldade existente, até simulei possíveis problemas que outros como eu poderiam estar enfrentando, mas não houve flexibilidade alguma. Olhe que possuo deficiência e cheguei a enviar vários documentos comprovatórios e nada.
Aproveito para agradecer sua iniciativa, pois até o momento essa é a primeira manifestação sobre a exigência desta banca, que leio.