Olá, tudo bem? Hoje responderemos o questionamento sobre o que significa a expressão “Non bis in idem”, conforme doutrina, legislação e jurisprudência.
Trata-se de tema de grande relevância no estudo do Direito Processual Penal, razão pela qual o assunto merece foco total a partir de agora.
Vamos ao que interessa!
A expressão “non bis in idem” (ou “ne bis in idem”) tem sua origem no direito romano e, numa tradução livre, poderia ser traduzido como “não incidir duas vezes”, “não ser duas vezes”, etc.
Esse conceito foi incorporado no Direito brasileiro como sendo um princípio que proíbe que um indivíduo seja processado ou punido duas vezes por um mesmo fato.
De acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF):
“Ora, a lei brasileira não admite seja o indivíduo processado criminalmente por delito pelo qual foi condenado. É dizer, consagra a lei brasileira a regra, que vem do direito romano, do non bis in idem – não duas vezes pelo mesmo delito, isto é, não se pune duas vezes a um acusado pelo mesmo crime.”
(STF, Ext 871, Relator Ministro CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 17-12-2003, DJ 12-03-2004)
Também é importante destacar, como já adiantamos acima, que o princípio do non bis idem impede tanto a condenação do agente por um mesmo fato quanto o processo/julgamento duplo.
Exemplo: imaginemos que um indivíduo foi processado pelo crime de homicídio, mas foi inocentado pois não havia provas suficientes de que ele tinha sido o autor do fato. Acontece que, 01 ano depois, surgiram novas provas, inclusive em vídeo, reforçando a tese que aquele indivíduo que foi inocentado seria sim o autor do fato. Pergunta: é possível, nesse caso, que seja processado novamente? A resposta é NÃO! Isso porque, tendo sido uma vez processado por aquele fato, não poderia ser novamente, sob pena de configuração do bis in idem. |
No entanto, é importante destacar o alerta que faz o professor Renan Araújo sobre quando o indivíduo é processado por um fato mas a decisão final do processo NÃO faz coisa julgada material – nesse caso NÃO haverá bis in idem.
É o que acontece, por exemplo, nos casos em que a denúncia ou queixa-crime sequer são recebidas pelo juiz, por lhes faltar, por exemplo, algum dos requisitos legais.
Veja que não houve juízo de valor sobre o crime ocorrido, ou mesmo sobre qual foi a participação, autoria, ou grau de importância daquele acusado na prática do crime descrito na denúncia. Na verdade, sequer houve análise da denúncia porque ela não estava corretamente preenchida.
Nesses casos, poderá haver novo processo, desde que suprida a irregularidade processual, por exemplo.
O princípio do ne bis in idem também tem relevante importância quando da dosimetria (cálculo) da pena.
Uma vez que o acusado no processo tenha sido condenado, o juiz deverá proceder ao cálculo (dosimetria) da pena, nos termos do artigo 68 do Código Penal:
Art. 68 – A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.
Veja que o dispositivo descreve três fases (pena-base; pena-intermediária; e pena-definitiva), consagrando a adoção do sistema trifásico no ordenamento jurídico brasileiro.
Sendo assim, sob a ótica do non bis in idem, uma circunstância não poderá ser utilizada duas fases, ainda que em fases diferentes, para valorar a pena do réu.
Então, se, por exemplo, considerou-se que o indivíduo cometeu o homicídio contra maior de 60 anos, não pode ser aplicada ao mesmo tempo a circunstância agravante o artigo 61, inciso II, alínea “h”, do CP (2ª fase da dosimetria) com a causa de aumento de pena (3ª fase da dosimetria) constante o § 4º do artigo 121 do CP.
Por fim, importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça entende NÃO haver bis in idem quando o réu pratica homicídio contra mulher gestante e, na fase de dosimetria da pena, se aplica a agravante do artigo 61, inciso II, alínea “h”, do Código Penal:
(…) 2. Não há bis in idem quanto à incidência da agravante do art. 61, II, “h”, do Código Penal no crime de homicídio contra gestante e a condenação pelo crime de aborto, porquanto as duas normas visam tutelar bens jurídicos diferentes: a agravante tutela pessoas em maior grau de vulnerabilidade e o aborto diz respeito ao feto. (…) (HC n. 141.701/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 1/12/2016, DJe de 13/12/2016.)
Além disso, importante destacar o entendimento do STF no sentido de que o bis in idem na fixação da pena somente se configura quando o mesmo fato – a mesma condenação definitiva anterior – é considerado como signo de maus antecedentes (circunstância judicial do art. 59 do Código Penal) e como fator de reincidência (agravante genérica do art. 61 também do Código Penal).
Portanto, caso se considere uma infração anterior para fins de reincidência, não há problema em considerar uma outra infração anterior para fins de maus antecedentes (STF, HC 99044, Relatora Ministra ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 27-04-2010).
Portanto, pessoal, esse foi nosso resumo sobre o que significa a expressão “Non bis in idem”, conforme doutrina, legislação e jurisprudência.
Considerando que não esgotamos aqui a temática, não deixe de revisar em seu material de estudo e praticar com diversas questões.
Até a próxima!
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