Alteração na LINDB é sancionada com vetos: veja o que mudou

O Presidente da República, Michel Temer, sancionou com vetos o PL 7.448/2017, agora transformado em Lei 13.655/2018, que introduziu 10 novos artigos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB)

O PL 7.448/2017, proposto originalmente pelo Senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) em 2015, foi encaminhado à sanção presidencial em 5 de abril de 2018, após a análise da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.

O projeto de lei visava incluir na LINDB (Decreto-lei 4.567/1942) “disposições sobre segurança jurídica  e eficiência na criação e na aplicação do Direito Público”.

caput do agora artigo 20 da Lei de Introdução explicita que nas esferas administrativa, controladora (Tribunais de Contas) e judicial, as decisões não poderão ser tomadas com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.

Um dos dispositivos gerou mais polêmica é  o artigo 28, cujo caput prevê a responsabilidade pessoal dos agentes públicos por dolo ou erro grosseiro em decisões e opiniões técnicas. Os três parágrafos do artigo foram integralmente vetados pelo Presidente.

O artigo 25, integralmente vetado, foi motivo de manifestação do Tribunal de Contas da União. O dispositivo previa a possibilidade de ajuizamento de uma ação declaratória de validade do ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, cuja sentença faria coisa julgada com eficácia erga omnes.

Novidades Legislativas

O projeto Novidades Legislativas está de volta para discutir as mudanças na LINDB: hoje, 27 de abril, a partir das 19h os professores Paulo Sousa e Renato Borelli explicarão todos os impactos dos novos dispositivos introduzidos na Lei de Introdução.

 

Veja como ficaram os novos artigos da LINDB

Art. 20.  Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.

Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.”

Art. 21.  A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas.

Parágrafo único.  A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos.”

Art. 22.  Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.

§1º  Em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.

§2º  Na aplicação de sanções, serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para a administração pública, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes do agente.

§3º  As sanções aplicadas ao agente serão levadas em conta na dosimetria das demais sanções de mesma natureza e relativas ao mesmo fato.”

Art. 23.  A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.

Parágrafo único.  (VETADO).

Art. 24.  A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente constituídas.

Parágrafo único.  Consideram-se orientações gerais as interpretações e especificações contidas em atos públicos de caráter geral ou em jurisprudência judicial ou administrativa majoritária, e ainda as adotadas por prática administrativa reiterada e de amplo conhecimento público.”

 Art. 25.  (VETADO).

Art. 26. Para eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público, inclusive no caso de expedição de licença, a autoridade administrativa poderá, após oitiva do órgão jurídico e, quando for o caso, após realização de consulta pública, e presentes razões de relevante interesse geral, celebrar compromisso com os interessados, observada a legislação aplicável, o qual só produzirá efeitos a partir de sua publicação oficial.

§ 1º  O compromisso referido no caput deste artigo:

I – buscará solução jurídica proporcional, equânime, eficiente e compatível com os interesses gerais;

II – (VETADO);

III – não poderá conferir desoneração permanente de dever ou condicionamento de direito reconhecidos por orientação geral;

IV – deverá prever com clareza as obrigações das partes, o prazo para seu cumprimento e as sanções aplicáveis em caso de descumprimento.

§ 2º  (VETADO).

Art. 27.  A decisão do processo, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, poderá impor compensação por benefícios indevidos ou prejuízos anormais ou injustos resultantes do processo ou da conduta dos envolvidos.

§1º  A decisão sobre a compensação será motivada, ouvidas previamente as partes sobre seu cabimento, sua forma e, se for o caso, seu valor.

§2º  Para prevenir ou regular a compensação, poderá ser celebrado compromisso processual entre os envolvidos.”

Art. 28.  O agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.

§ 1º  (VETADO).

§ 2º  (VETADO).

§ 3º  (VETADO).

Art. 29.  Em qualquer órgão ou Poder, a edição de atos normativos por autoridade administrativa, salvo os de mera organização interna, poderá ser precedida de consulta pública para manifestação de interessados, preferencialmente por meio eletrônico, a qual será considerada na decisão.

§ 1º  A convocação conterá a minuta do ato normativo e fixará o prazo e demais condições da consulta pública, observadas as normas legais e regulamentares específicas, se houver.

§ 2º  (VETADO).

Art. 30.  As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas.

Parágrafo único.  Os instrumentos previstos no caput deste artigo terão caráter vinculante em relação ao órgão ou entidade a que se destinam, até ulterior revisão.

Vigência

À exceção do artigo 29 da LINDB, que entrará em vigência após a vacatio legis de 180 dias, todos os novos dispositivos entram em vigor a partir da data de sua publicação, 26 de abril de 2018.

Associações nacionais se mobilizaram pelo veto

Um conjunto de associações nacionais protocolou, em 10 de abril, um ofício à Presidência da República, sugerindo o veto integral do PL.

Originalmente elaborado pela ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), o ofício foi subscrito pela AJUFE (Associação Nacional dos Juízes Federais do Brasil), a ANPT (Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho), a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), a CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público) e o SINAIT (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho).

Sobre o artigo 20, o ofício frisou que, embora vede que as decisões sejam tomadas com base em valores jurídicos abstratos, o texto do caput foi composto com um conjunto de expressões abstratas, como “segurança jurídica de interesse geral” e “interesses gerais da época”.

O que pode ser caput do artigo 22 da LINDB estatui que a interpretação das leis deve considerar “os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo“.

Segundo o ofício enviado pelas associações, isto pode criar uma interpretação casuística e arbitrária, justificando que “os fins justificam os meios”, perspectiva que é incompatível com a Administração Pública.

A Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, enviou também ao Presidente da República um ofício, a fim de encaminhar uma nota técnica conjunta das Câmaras de Coordenação e Revisão da Procuradoria-Geral da República.

No ofício, Raquel Doge frisou que concluiu-se, na Nota Técnica, que a sanção ao PL traria prejuízos ao sistema de controle, responsabilização e ressarcimento aos atos lesivos ao erário e ao interesse público.

A PGR também salientou que os novos dispositivos irão afetar a adequada aplicação da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), constituindo também um indesejado fator de insegurança jurídica, afetando a já consolidada jurisprudência nos Tribunais Superiores a respeito da improbidade.

O Tribunal de Contas da União foi o último órgão a se juntar ao coro daqueles que pedem o veto integral às alterações na LINDB.

Em análise preliminar do texto do PL, emitido pelo gabinete da Presidência do TCU e encaminhado ao Palácio do Planalto, houve especial preocupação com o artigo 25 do PL, que foi posteriormente vetado pelo Presidente:

Art. 25. Quando necessário por razões de segurança jurídica de interesse geral, o ente poderá propor ação declaratória de validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, cuja sentença fará coisa julgada com eficácia erga omnes.

Para o TCU, o o artigo era flagrantemente inconstitucional, já que ofenderia os artigos 70 e 71 da Constituição Federal (1988), subtraindo, pela via infraconstitucional, as competências do Poder Legislativo na verificação da regularidade dos atos, contratos, ajustes, processos e normas da Administração Pública, levando-os à análise do Poder Judiciário sem que se aponte lesão ou ameaça de direito.

Na prática, esse artigo permitiria submeter ao Judiciário um edital de licitação ou um contrato de concessão de uma rodovia, por exemplo, a fim de que o Juiz o declare válido, sobre os seus múltiplos aspectos, e ainda declare a sua adequação e a economicidade de seus preços“, diz a análise preliminar do TCU.

Leia aqui o ofício enviado pelas associações nacionais.

Leia aqui o ofício enviado pelas associações nacionais.

Leia aqui o ofício enviado pelas associações nacionais.

Paulo H M Sousa

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