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Interpretação “pro homine” dos Direitos Humanos

Em nossa aula inaugural do Curso de Direitos Humanos tratamos, entre outros assuntos, acerca da interpretação dos tratados internacionais. Vimos algumas regras de interpretação dos tratados internacionais, segundo a Convenção de Viena. Estudamos, também, os efeitos jurídicos e o posicionamento hierárquico dos tratados internacionais de Direitos Humanos, perante nosso ordenamento jurídico, de acordo com a CF e jurisprudência do STF.

Neste artigo, vamos tratar acerca de um método de interpretação desenvolvido pela doutrina, que possui importância para fins de concurso público, uma vez que mencionado em recente prova para Defensoria Pública.

Estudamos em Direitos Humanos que as normas não se excluem, mas se complementam. Assim, diante do conflito de normas, ao invés de aplicarmos as regras jurídicas de solução de antinomias (critério cronológico hierárquico ou da especialidade) ambas as normas devem ser aplicadas de forma complementar, buscando-se a melhor forma de se proteger a dignidade da pessoa.

Classicamente, diante da presença de duas normas conflitantes, válidas e emanadas de autoridade competente, sem que se possa dizer qual delas será aplicada no caso concreto, o aplicador do direito deverá se valer dos critérios acima mencionados.

Segundo o critério cronológico, a lei posterior revoga a lei anterior, vale dizer, prevalece a norma mais recente. Para o critério hierárquico a lei de superior hierárquica prevalece em comparação à lei inferior. Por fim, segundo o critério da especialidade, a lei específica tem prevalência sobre a lei que estabelece apenas normas gerais.

Em Direitos Humanos, entretanto, os critérios acima podem ser desconsiderados na hipótese de conflito entre normas a fim de que se aplique a norma mais favorável. Essa é a essência de aplicação do princípio “pro homine”.

Segundo doutrina de Luís Garcia, ao nos depararmos com o concurso simultâneo de normas, sejam elas internacionais ou internas, devemos escolher para aplicar a norma que: a) garantir mais amplamente o gozo do direito; b) que admitir menos restrições ao exercício do direito humano; ou c) a que impor maiores condições a eventuais restrições aos direitos humanos.

Assim, materialmente, a norma que otimizar de melhor forma o exercício de determinado direito, deverá prevalecer. Notem que o referido princípio relaciona-se com o conhecido princípio da norma mais favorável do Direito do Trabalho. Este princípio impõe ao jurista a opção pela norma mais favorável quando da elaboração da norma, no confronto entre regras concorrentes, bem como na interpretação da norma. Registre-se, ainda, que na definição da norma mais favorável prevalece a Teoria do Conglobamento por Institutos, pelo qual devemos optar pela norma mais favorável dentro do conjunto de normas relativos a determinada matéria ou instituto jurídico, de modo não desvirtuar o sistema jurídico.

Guardadas as devidas diferenças, o princípio “pro homine” impõe, seja no confronto entre normas, seja na fixação da extensão interpretativa da norma, a observância da norma mais favorável à dignidade da pessoa, objeto dos direitos humanos. Impõe a aplicação da norma que amplie o exercício do direito ou que produza maiores garantias ao direito humano que tutela.

O referido princípio torna-se importante no contexto atual dos Direitos Humanos, em especial, em razão da disciplina trazida pela Emenda Constitucional nº 45/2004, que conferiu especial importância aos Direitos Humanos.

Caso o tratado internacional seja equivalente à emenda constitucional – conforme dispõe o art. 5º, §3º, da CF – poderá prevalecer no confronto com as demais normas constitucionais que compreendem a CF, se for considerado “pro homine”, vale dizer, mais favorável à dignidade da pessoa.

Registre-se, ainda, que a aplicação desse princípio não é unânime, e encontra resistência, especialmente no que tange à hierarquia. A doutrina majoritária entende que não é possível, por exemplo, que tratado internacional de Direitos Humanos com caráter supralegal nos termos da jurisprudência do STF tenha preferência, em eventual conflito, sobre a Constituição. Argumenta-se, em síntese, que esse entendimento retira a supremacia do Texto Constitucional.

De todo modo, recentemente, a FCC, em prova para o concurso de Defensor Público na Paraíba, questionou se está correta a seguinte alternativa: “As reservas à Convenção Americana de Direitos Humanos devem ser interpretadas restritivamente como diretriz hermenêutica do princípio da interpretação pro homine”.

De acordo com a Convenção de Viena (art. 2º, 1, d): “reserva significa uma declaração unilateral, qualquer que seja a sua redação ou denominação, feita por um Estado ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado em sua aplicação a esse Estado”.

Portanto, considerando que o Pacto de San José da Costa Rica, prevê a implementação de diversos Direitos Humanos, segundo orientação do princípio “pro homine”, a aposição de reservas pelo Estado signatário deverá ser interpretada restritivamente, uma vez que tais reservas impõem limites à aplicação interna das normas pactuadas no tratado internacional.

Logo, está correta a alternativa.

Sem a compreensão do que trata o princípio seria difícil responder à questão. Portanto, fique atento!

Nosso curso está disponível em: https://www.estrategiaconcursos.com.br/curso/direitos-humanos-p-aft-prof-ricardo-torques-5383/

 

Bons estudos a todos!

Ricardo Torques

Professor de Direitos Humanos

Ricardo Torques

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