Mais um passo em nossa caminhada… Informativos do STJ em sua Edição Extraordinária n. 20 (Parte 1) COMENTADO. Vamo que vamo!
AGRAVO REGIMENTAL NO EMBARGOS EM RECURSO EPECIAL
A simples menção ao Diário da Justiça em que teriam sido publicados os acórdãos paradigmas, sem a indicação da respectiva fonte, quando os julgados encontram-se disponíveis na rede mundial de computadores ou Internet, não serve para fins de comprovação de dissídio em Embargos de Divergência.
AgRg nos EAREsp 2.301.144-PR, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 12/6/2024, DJe 17/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Dr. Creisson interpôs embargos de divergência. Na petição do recurso, incluiu a simples menção ao Diário da Justiça em que teriam sido publicados os acórdãos paradigmas.
Diante de tal procedimento, digamos heterodoxo, os embargos de divergência acabaram liminarmente indeferidos. A corte entendeu que Dr. Creisson não instrumentalizou a controvérsia corretamente, pois não juntou aos autos, no momento da interposição do recurso, o inteiro teor do acórdão indicado como paradigma.
R: Negativo!!!
Para a comprovação da existência de dissídio em Embargos de Divergência, o recorrente deve proceder às seguintes providências: a) juntada de certidões; b) apresentação de cópias do inteiro teor dos acórdãos apontados como paradigmas; c) citação do repositório oficial autorizado ou credenciado no qual eles se achem publicados, inclusive em mídia eletrônica; e (d) reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores com a indicação da respectiva fonte.
Segundo a jurisprudência do STJ, “a mera menção ao Diário da Justiça em que teriam sido publicados os acórdãos paradigmas trazidos à colação, sem a indicação da respectiva fonte, quando os julgados encontram-se disponíveis na rede mundial de computadores ou Internet, não supre a exigência da citação do repositório oficial ou autorizado de jurisprudência, visto que se trata de órgão de divulgação em que é publicada somente a ementa do acórdão”. (AgRg nos EREsp n. 2.063.024-PR, rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Terceira Seção, julgado em 20/6/2024, DJe de 26/6/2024).
A ausência de citação do repositório oficial autorizado de jurisprudência no momento da interposição dos embargos de divergência não atrai a incidência do parágrafo único do art. 932 da Lei n. 13.105/2015, uma vez que, nos termos do Enunciado Normativo n. 6: “Nos recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), somente será concedido o prazo previsto no art. 932, parágrafo único c/c o art. 1.029, § 3º, do novo CPC para que a parte sane vício estritamente formal”. (AgInt nos EDcl nos EAREsp 503.161-PR, rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 16/11/2021, DJe 19/11/2021).
A simples menção ao Diário da Justiça em que teriam sido publicados os acórdãos paradigmas, sem a indicação da respectiva fonte, quando os julgados encontram-se disponíveis na rede mundial de computadores ou Internet, não serve para fins de comprovação de dissídio em Embargos de Divergência.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
Não é possível a unificação de medidas socioeducativas estipuladas em remissão e em sentença que dá procedência à representação legal.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 17/6/2024, DJe 20/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
A defesa de Creitinho, adolescente infrator, impetrou HC para requerer concessão da ordem para unificar as seis medidas socioeducativas de liberdade assistida e internação, em especial a que foi aplicada em sede de remissão e a que está pendente de trânsito em julgado, apontando violação ao art. 45 da Lei n. 12.594/2012.
O juízo homologou a unificação das medidas socioeducativas aplicadas a Creitinho, convertendo-as em uma única medida de internação com atividades externas, por prazo indeterminado, respeitado o limite de 3 anos. A medida socioeducativa aplicada em sede de remissão não foi relacionada na unificação.
Lei n. 12.594/2012:
Art. 45. Se, no transcurso da execução, sobrevier sentença de aplicação de nova medida, a autoridade judiciária procederá à unificação, ouvidos, previamente, o Ministério Público e o defensor, no prazo de 3 (três) dias sucessivos, decidindo-se em igual prazo.
R: Nooopss!!!
No caso, a parte recorrente requer concessão da ordem para unificar as seis medidas socioeducativas de liberdade e internação, em especial a que foi aplicada em sede de remissão e a que está pendente de trânsito em julgado, apontando violação ao art. 45 da Lei n. 12.594/2012. O juízo de origem homologou a soma das medidas socioeducativas aplicadas ao réu em uma única medida de internação com atividades externas, por prazo indeterminado, respeitado o limite de 3 (três) anos. A medida socioeducativa aplicada em sede de remissão não foi relacionada na unificação.
Quanto à violação do art. 45 da Lei n. 12.594/2012, ressalta-se que o dispositivo não tem aplicação para o caso, porquanto as medidas de prestação de serviços à comunidade e de liberdade assistida aplicadas em sede de remissão difere daquela aplicada em sede de sentença de procedência da representação legal, de modo que não se mostra viável efetivar a unificação delas, notadamente, em razão da natureza distinta e das consequências diversas decorrentes do seu descumprimento.
Nesse sentido, vide o seguinte precedente: […] “as medidas impostas no âmbito de remissão e aquela decretada em razão de sentença de procedência de representação pela prática de ato infracional possuem natureza distinta e consequências diversas em caso de descumprimento. De fato, o descumprimento das medidas decorrentes de remissão enseja o prosseguimento do processo de apuração do ato infracional e o não cumprimento daquelas decretadas em sentença ocasiona, preenchidos os requisitos legais, a regressão para medida mais gravosa. Tais circunstâncias, nos termos da jurisprudência de Superior Tribunal de Justiça, impedem a unificação pretendida. […] (AgRg no HC n. 683.950/SC, Sexta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 31/8/2022).
Descumprimento de medida socioeducativa derivada de:
REMISSÃO | SENTENÇA |
Prosseguimento do processo de apuração do ato infracional | Regressão para medida mais gravosa |
Não é possível a unificação de medidas socioeducativas estipuladas em remissão e em sentença que dá procedência à representação legal.
HABEAS CORPUS
A promessa de vantagem indevida para receber cartão amarelo em uma partida de futebol é suficiente para, em tese, cometer o crime do art. 198 da Lei Geral do Esporte, ainda que isso não altere diretamente o placar do jogo.
HC 861.121-GO, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 20/2/2024, DJe 23/2/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Craudiomiro, jogador de futebol profissional, recebeu valor para tomar cartão amarelo em partida de futebol, com o objetivo de favorecer apostadores previamente avisados do esquema.
A defesa do jogador, após a denúncia, impetrou HC no qual alega que, como não houve alteração do placar, não haveria crime algum na conduta do réu.
Lei n. 14.597/2023:
Art. 198. Solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva ou evento a ela associado:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
R: Yeap!!!!
Cinge-se a controvérsia em definir se a promessa de vantagem indevida para receber cartão amarelo tem o condão de alterar ou manipular o resultado jogo de futebol, configurando o delito tipificado no art. 198 da Lei n. 14.597/2023 (Lei Geral do Esporte).
O tipo penal está redigido nos seguintes termos: Art. 198. Solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva ou evento a ela associado: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
A elementar “competição esportiva” é mais ampla do que o placar de uma partida. Embora um cartão amarelo não tenha capacidade de alterar diretamente o placar de um jogo de futebol, segundo o regulamento específico do campeonato em questão, a quantidade de cartões amarelos é critério de desempate para efeito de classificação final, podendo definir os rebaixados, os classificados para as competições internacionais, Copa Sulamericana ou Copa Libertadores, ou mesmo o campeão.
Dessa forma, fica de plano afastada a alegação de que a promessa de vantagem para receber cartão amarelo não tem o condão de alterar o resultado da competição esportiva. Esse argumento, mais formal, tampouco é o único, exclusivo, pois o ânimo do jogador de futebol que recebeu cartão amarelo diminui diante da possibilidade de nova advertência por cartão amarelo e, consequentemente, conversão em expulsão.
Assim, sua participação na marcação do time perde vigor e altera sua conduta, podendo redundar em alteração do placar do jogo e, por conseguinte, da competição. Admitir que apenas a conduta que altera o placar de uma partida é tipificado, implicaria em deixar fora da norma penal incriminadora, por exemplo, a promessa de vantagem para cometimento de pênalti não convertido em gol.
A promessa de vantagem indevida para receber cartão amarelo em uma partida de futebol é suficiente para, em tese, cometer o crime do art. 198 da Lei Geral do Esporte, ainda que isso não altere diretamente o placar do jogo.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
O fato de ameaças serem proferidas em um contexto de cólera ou ira entre o autor e a vítima não afasta a tipicidade do delito.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 10/6/2024, DJe 26/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Crementino, em um momento de desentendimento com sua esposa Creide, foi tomado pela ira e a teria ameaçado. Em sua defesa, alega que as ameaças foram proferidas em momento de ira, o que afastaria a tipicidade.
Código Penal;
Ameaça
Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único – Somente se procede mediante representação.
R: Negativo!!!!
Trata-se de imputação da prática do crime de ameaça (art. 147 do Código Penal) em contexto de violência doméstica contra a mulher.
Registra-se que o delito deve ser analisado tendo como norte interpretativo a Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), pois trata-se de marco normativo de proteção à mulher em circunstância de violência doméstica e familiar.
No caso, a defesa alegou que o delito de ameaça não ficou configurado, pois houve a expressão de um sentimento de raiva, comum no contexto de discussões acaloradas.
Tal alegação não deve prosperar, uma vez que o fato de a promessa de mal injusto e grave ter sido proferida em momento de cólera ou ira não exclui, per se, o escopo de amedrontar a vítima nem enfraquece a sobriedade da ameaça.
Conforme leciona a doutrina, “partimos do conceito de dolo no delito de ameaça, consistente na vontade de expressar o prenúncio de mal injusto e grave a alguém, visando à sua intimidação. Se o dolo próprio do delito é esse, não fica excluído quando o sujeito procede sem ânimo calmo e refletido”.
Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: o fato de as ameaças terem sido proferidas em um contexto de altercação entre o autor e as vítimas não retira a tipicidade do delito. Além disso, o crime de ameaça é de natureza formal consumando-se com o resultado da ameaça, ou seja, com a intimidação sofrida pelo sujeito passivo ou simplesmente com a idoneidade intimidativa da ação, sendo desnecessário o efetivo temor de concretização. (HC n. 437.730/DF, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 1º/8/2018).
No caso, a análise das provas, nas quais se verifica o comportamento agressivo do réu, conjugadas com as declarações da vítima, demonstram que não se tratava de uma singela ou inofensiva discussão entre marido e mulher, pois quando “há violência, não há nada de relação de afetividade; é relação de poder, é briga por poder, é saber quem manda” nas palavras da Ministra Carmen Lúcia (STF, ADC n. 19, Tribunal Pleno, julgado em 9/2/2012).
Entender o contrário é banalizar a violência contra a mulher e desprezar todo o empenho e a construção jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça no sentido de dar plena efetividade à Lei n. 11.340/2006 e responsabilização dos agressores, sempre com absoluto respeito aos corolários do contraditório, ampla defesa e devido processo legal.
No entendimento jurisprudencial do STJ, demonstrada a violência – em qualquer das formas constantes no rol exemplificativo do art. 7º da Lei n. 11.340/2006 -, a vulnerabilidade da vítima mulher é presumida, pois tal situação é intrínseca à própria violência, que a atinge nas mais diversas dimensões pessoais.
Por fim, o STJ possui jurisprudência de que “a palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, possui relevante valor probatório, especialmente em crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher”. (AgRg no AREsp n. 2.285.584/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 15/8/2023, DJe 18/8/2023).
O fato de ameaças serem proferidas em um contexto de cólera ou ira entre o autor e a vítima não afasta a tipicidade do delito.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
A ausência de violência ou grave ameaça na conduta do réu de apalpar as partes íntimas de vítima, com o objetivo de satisfazer sua lascívia, impõe a desclassificação do crime de estupro para o delito importunação sexual.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 6/2/2024, DJe 15/2/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Tadeu entrou em um elevador no qual também estava Craudete. Em determinado momento, movido pela lascívia, entendeu que seria uma boa ideia apalpar as partes íntimas de Craudete, aproveitando-se de que esta estava distraída no celular. Craudete não gostou nem um pouco da abordagem e chamou a polícia.
Após a denúncia por estupro, a defesa de Tadeu impetrou HC no qual sustenta que a ausência de violência desqualificaria o crime de estupro para o delito importunação sexual.
Código Penal:
Importunação sexual
Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave
R: Foi o que entendeu o STJ no caso…
O crime de estupro resta configurado quando o agente constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
No caso, o réu apalpou as partes íntimas da vítima, com o objetivo de satisfazer sua lascívia, sem que para isso tenha utilizado de violência ou grave ameaça, uma vez que surpreendeu a vítima em um momento de distração, pois esta sequer percebeu a aproximação do réu.
Ademais, a desatenção da vítima não torna a conduta do réu violenta. O fato de ele ter apalpado a vítima por dentro de seu short, sem que nenhum elemento adicional tenha sido particularizado, revela a inexistência da violência ou grave ameaça necessária a caracterizar o crime de estupro.
Nos termos da jurisprudência do STJ “comete o crime de importunação sexual qualquer um que realize ato libidinoso em relação a outra pessoa (com ou sem contato físico, mas visível e identificável), satisfazendo seu prazer sexual, sem que haja concordância válida das partes envolvidas (supondo-se a anuência de adultos)” (AgRg no AREsp n. 1.844.610-SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 7/12/2021, DJe de 13/12/2021).
Assim, no caso, a ausência de violência ou grave ameaça na conduta do réu impõe a desclassificação do crime de estupro, para o delito previsto no art. 215-A, do Código Penal.
A ausência de violência ou grave ameaça na conduta do réu de apalpar as partes íntimas de vítima, com o objetivo de satisfazer sua lascívia, impõe a desclassificação do crime de estupro para o delito importunação sexual.
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL
O fato de ter sido encontrado resquício de droga na balança de precisão de acusado não é suficiente para a comprovação da materialidade do crime de tráfico de drogas.
AgRg no REsp 2.092.011-SC, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 24/6/2024, DJe 26/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Creitinho estava em casa quando a polícia cumpriu mandado de busca e apreensão no local. Não foram encontradas drogas em espécie armazenadas, mas foi encontrado resquício de drogas em uma balança de precisão que se encontrava na casa.
A defesa de Creitinho alega que tal “prova” seria insuficiente para comprovação da materialidade do crime de tráfico de drogas.
Lei n. 11.343/2006:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:
I – importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;
II – semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;
III – utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
IV – vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.
R: Negativo!!!!
O art. 33 da Lei n. 11.343/2006, que tipifica o crime de tráfico de entorpecentes, prevê como típicas as condutas de “importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.
“Drogas” é elementar do tipo e objeto material sobre o qual recai os verbos nucleares arrolados no artigo. Assim, só pode ser punido pelo crime de tráfico de drogas aquele que pratica quaisquer das condutas típicas incidentes sobre as substâncias consideradas drogas pela Portaria n. 344/1998 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, nos termos do art. 66 da Lei n. 11.343/2006.
Disso, exsurge imprescindível a apreensão das substâncias alegadamente ilícitas, sobre as quais, de fato, incidiu a conduta do acusado, e a sua submissão à perícia técnica, a fim de constatar se há o enquadramento na norma administrativa e, por conseguinte, a submissão da conduta à norma penal.
No caso, não há como dizer que a conduta imputada ao acusado (guardar em depósito ou vender) recai sobre “resquício” de cocaína encontrada na balança. Não se pode sequer afirmar que tal resquício seria decorrente da conduta imputada ao agente no presente feito ou de conduta pretérita acerca da qual o réu já teria respondido. Não há comprovação da materialidade do crime.
Ainda, verifica-se que não houve indicação da quantidade do referido resquício, diante da evidente impossibilidade de pesagem, consoante laudo pericial referido pela acusação.
Assim, o mencionado resquício não pode ser considerado objeto material do tráfico de drogas, pois não é sobre ele que recai qualquer das condutas imputadas ao agente.
O fato de ter sido encontrado resquício de droga na balança de precisão de acusado não é suficiente para a comprovação da materialidade do crime de tráfico de drogas.
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL
O benefício de indulto não é extensível aos condenados à pena restritiva de direitos, por expressa determinação legal dos art. 8º, I, do Dec. n. 11.302/2022, sendo irrelevante a reconversão dessa pena em privativa de liberdade.
AgRg no REsp 2.125.447-PR, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 24/6/2024, DJe 26/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Creosvaldo foi condenado à pena privativa de liberdade, a qual foi substituída por restritivas de direitos. Creosvaldo então requereu a concessão de indulto, o qual foi indeferido em razão da ausência de previsão para a extensão da benesse às penas restritivas de direitos.
Decreto n. 11.302/2022:
Art. 8º O indulto natalino de que trata este Decreto não é extensível às:
I – penas restritivas de direitos;
R: Negativo!!!
No caso em discussão, o Tribunal de origem manteve a não concessão do indulto porque o recorrente foi condenado à pena privativa de liberdade, a qual foi pelo sentenciante substituída por restritivas de direitos, situação que, independentemente da reconversão ao longo da execução penal, teria se mostrado impeditiva ao indulto, na forma do art. 8º, I do Decreto n. 11.302/2022.
O entendimento encontra amparo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, porquanto o art. 8º do Decreto n. 11.302/2022 traz em seu bojo institutos incidentes na ação penal, quais sejam, suspensão condicional do processo, aplicação de penas restritivas de direitos e cominação de multa.
Nesse sentido, o STJ possui entendimento consolidado de que “tendo sido o paciente condenado à pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos, inviável o reconhecimento da extinção de punibilidade, haja vista a norma contida no art. 8º do Decreto n. 11.302/2022, que veda a extensão do indulto natalino às penas restritivas de direitos e de multa” (AgRg no REsp n. 2.080.932/RS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 11/3/2024, DJe de 14/3/2024)
Dessa forma, “por expressa determinação legal do art. 8º, I do Dec. n. 11.302/2022, o benefício de indulto não é extensível aos condenados à pena restritiva de direitos” (AgRg no HC n. 847.786/SC, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 15/4/2024, DJe de 18/4/2024). Conclusão que não se altera pela constatação de que no curso da execução penal e antes da edição do referido decreto, tenha ocorrido de forma definitiva a reconversão em pena privativa de liberdade pelo descumprimento das penas restritivas de direitos.
O benefício de indulto não é extensível aos condenados à pena restritiva de direitos, por expressa determinação legal dos art. 8º, I, do Dec. n. 11.302/2022, sendo irrelevante a reconversão dessa pena em privativa de liberdade.
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
Para a caracterização do crime de tráfico de drogas basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada a prática do delito.
AgRg no AgRg no AgRg no AREsp 2.470.304-MG, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 4/6/2024, DJe 13/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Creisson e Creiton, irmãos empreendedores, resolveram traficar drogas em um modelo semelhante ao de “drive-through”. Creisson negociava e recebia os valores, enquanto Creiton, na próxima esquina, entregava o produto combinado.
Eventualmente, Creiton foi apreendido com as drogas e seu irmão caio junto. A defesa de Creisson alega a que o rapaz tem nada a ver com o crime de tráfico de drogas, uma vez que com ele não foi encontrada droga alguma.
Lei n. 11.343/2006:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:
I – importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;
II – semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;
III – utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
IV – vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.
R: Desde que haja liame subjetivo, com certeza!!!
A caracterização do crime de tráfico de drogas prescinde de apreensão de droga em poder de cada um dos acusados; basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada, ao menos em tese, a prática do delito em questão.
Assim, a mera ausência de apreensão de drogas na posse direta do agente “não afasta a materialidade do delito de tráfico quando estiver delineada a sua ligação com outros integrantes da mesma organização criminosa que mantinham a guarda dos estupefacientes destinados ao comércio proscrito“, conforme bem decidido por ocasião do julgamento do HC n. 536.222/SC, de relatoria do Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 4/8/2020.
Segundo a doutrina, é possível constatar que o tráfico de drogas obedece a uma complexa organização que segue padrões hierarquizados, com diferentes graus de importância e de participação na estrutura do comércio ilegal de entorpecentes, o que aponta para “diferentes papéis nas ‘redes’ do tráfico, desde as atuações mais insignificantes até as ações absolutamente engajadas e com domínio do fato final”.
Nessa complexa estrutura de “rede”, há diversos atores interligados uns aos outros. Sem pretender analisar todos os papéis sociais existentes dentro da hierarquia do tráfico (que envolve diferentes graus de participação e importância dentro do grupo), a doutrina ressalta que há os “olheiros” ou “fogueteiros”, indivíduos cuja missão é avisar os superiores sobre a chegada da polícia; o “vapor”, responsável pela venda e pela distribuição de drogas; há, também, aqueles incumbidos do fluxo das mercadorias ilícitas; há, ainda, os “donos do morro”, aqueles que mandam e ficam com boa parte dos lucros auferidos com o comércio de drogas.
A realidade prática nos mostra que muitos dos que integram organizações criminosas direcionadas ao tráfico de drogas, inclusive os chefes desses bandos, dificilmente são flagrados na posse direta da droga, pois tal papel é delegado àquelas pessoas que ocupam posição de menor “prestígio” dentro da estrutura do narcotráfico. No entanto, nem por isso, deixam de responder pela prática do crime de tráfico de drogas, caso evidenciado o liame subjetivo entre os agentes.
Assim, a absolvição vai de encontro à jurisprudência desse Superior Tribunal, pois a hipótese em que a droga foi apreendida somente com os corréus, ou mesmo com terceiros não identificados, é distinta daquelas em que não há apreensão de droga nenhuma, caso em que, aí sim, não é possível a condenação de alguém pela suposta prática do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006), por ausência de provas acerca da materialidade do crime.
Para a caracterização do crime de tráfico de drogas basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada a prática do delito.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
Admite-se o distinguishing quanto ao Tema 918/STJ (REsp 1.480.881/PI), na hipótese em que a diferença de idade entre o acusado e a suposta vítima, esta com 13 anos e aquele com 23 anos de idade, não se mostrou tão distante quanto a diferença do acórdão paradigma; bem como porque houve consentimento da adolescente, além de ocorrido relacionamento amoroso entre ambos.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 14/5/2024, DJe 17/5/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Trata-se de mais um daqueles casos em que o acusado de estupro presumido conta é mais velho (com 23 anos), enquanto a suposta vítima conta com 13 anos. A adolescente consentiu com a relação, que deu fruto a relacionamento amoroso. A defesa do rapaz interpôs recurso no qual alega o distinguishing quanto ao Tema 918/STJ (REsp 1.480.881/PI).
R: Aqui sim…
De acordo com o precedente da Terceira Seção, submetido ao rito dos recursos repetitivos: “Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime” (REsp 1.480.881/PI, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015).
No mesmo sentido, é o entendimento do enunciado 593 da Súmula do STJ, ao dispor que “o crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente” (Súmula 593, Terceira Seção, julgado em 25/10/2017, DJe 6/11/2017).
Contudo, na presente hipótese vislumbra-se a necessidade de realização da distinção em razão de que, no caso em análise, a diferença de idade entre o acusado e a vítima não se mostrou tão distante quanto a do acórdão paradigma (a vítima era uma criança, com 8 anos de idade, e o imputado possuía idade superior a 21 anos), bem como porque houve consentimento da adolescente, além de ocorrido relacionamento amoroso entre ambos. Não se evidencia, portanto, relevância social do fato a ponto de resultar a necessidade de sancionar o acusado, tendo em vista que não se identificou comportamento do réu que pudesse colocar em risco a sociedade, ou o bem jurídico protegido.
Dessa forma, as particularidades do presente feito, em especial a vontade da vítima e o relacionamento amoroso ocorrido, denotam que não houve afetação relevante do bem jurídico a resultar na atuação punitiva estatal, de modo que não se evidencia a necessidade de pena, consoante os princípios da fragmentariedade, subsidiariedade e proporcionalidade. Além disso, não se registra proveito social com a condenação do recorrente, pois o fato delituoso não se mostra de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado.
Por fim, o Superior Tribunal de Justiça, em precedentes recentes que tiveram por objeto situações fáticas análogas, deixou de aplicar o enunciado da Súmula n. 593 do STJ, haja vista a distinção de paradigmas fáticos (por exemplo, AgRg no REsp 1919722/SP, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe 20/8/2021 e AREsp n. 1.555.030/GO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 18/5/2021, DJe de 21/5/2021).
Admite-se o distinguishing quanto ao Tema 918/STJ (REsp 1.480.881/PI), na hipótese em que a diferença de idade entre o acusado e a suposta vítima, esta com 13 anos e aquele com 23 anos de idade, não se mostrou tão distante quanto a diferença do acórdão paradigma; bem como porque houve consentimento da adolescente, além de ocorrido relacionamento amoroso entre ambos.
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
A condição de ‘mula’ do tráfico, por si só, não comprova que o acusado integra organização criminosa e, por via de consequência, não se presta a fundamentar a não aplicação da minorante do tráfico privilegiado, mas, tão-somente, justifica a aplicação da referida causa de diminuição em seu patamar mínimo, de 1/6 (um sexto).
AgRg no AREsp 2.482.593-PI, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 18/6/2024, DJe 20/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Creitinho exercia a função de “mula” no tráfico de drogas. Foi preso transportando 5 kg e cocaína em tal condição. Sua defesa requereu a aplicação do redutor do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, na maior fração possível de redução da pena, por entender que o rapaz não integra a organização criminosa.
Lei n. 11.343/2006:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
R: Não necessariamente!!!
Cinge-se a controvérsia acerca da possibilidade de aplicação do redutor do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, em fração maior para a redução da pena, de, no mínimo, 1/4 (um quarto), ao agente condenado pela prática do delito de tráfico de drogas à pena de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 833 (oitocentos e trinta e três) dias-multa, ante o transporte de cerca de 5kg (cinco quilos) de cocaína na condição de “mula”.
O entendimento das instâncias ordinárias não se encontra em conformidade à orientação do Superior Tribunal de Justiça, pois, em casos de transporte de entorpecente, ainda que não integre, em caráter estável e permanente, a organização criminosa, o transportador tem perfeita consciência de estar a serviço de um grupo dessa natureza, o que não pode ser desprezado, razão pela qual o paciente faz jus à minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 na fração de 1/6 (um sexto).
Na linha da jurisprudência do STJ, “a condição de ‘mula’ do tráfico, por si só, não comprova que o Acusado integra organização criminosa e, por via de consequência, não se presta a fundamentar a não aplicação da minorante do tráfico privilegiado, mas, tão-somente, justifica a aplicação da referida causa de diminuição em seu patamar mínimo, de 1/6 (um sexto)” (AgRg no HC n. 663.260/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 10/8/2021, DJe 25/8/2021).
A condição de ‘mula’ do tráfico, por si só, não comprova que o acusado integra organização criminosa e, por via de consequência, não se presta a fundamentar a não aplicação da minorante do tráfico privilegiado, mas, tão-somente, justifica a aplicação da referida causa de diminuição em seu patamar mínimo, de 1/6 (um sexto).
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS
É admitida a aplicação do princípio da insignificância ao crime de contrabando de cigarros ao reincidente, desde que a reincidência ocorra por crimes de natureza diversa ao contrabando, não se aplicando o Tema 1143/STJ.
AgRg no RHC 185.605-RS, Rel. Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 24/6/2024, DJe 27/6/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Craudiomiro, fumante inveterado, foi preso quando transportava 466 maços de cigarros provenientes do Paraguai e, mesmo sendo reincidente em outros crimes, sua defesa requereu a aplicação do princípio da insignificância.
R: Yeap!!!!
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça ao submeter a julgamento o Recurso Especial Repetitivo n. 1.971.993/SP firmou, no Tema Repetitivo n. 1.143/STJ, a seguinte tese: O princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar 1.000 (mil) maços, seja pela diminuta reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão ao contrabando de vulto, excetuada a hipótese de reiteração da conduta, circunstância apta a indicar maior reprovabilidade e periculosidade social da ação.
Desse modo, foram instituídos dois requisitos, de ordem objetiva, essenciais para o reconhecimento da bagatela no contrabando de cigarros: ser a quantidade limitada ao máximo de 1.000 (mil) maços e a ausência de reiteração específica na conduta de contrabando de cigarros, considerando a recorrência delituosa demonstrativo de maior reprovabilidade e periculosidade social da ação.
Por essa razão, evidenciado que foram contrabandeados menos de 1000 maços de cigarro e que o sujeito não é reincidente na conduta ou em crimes da mesma natureza, a conduta narrada é atípica, preenchendo os requisitos do Tema Repetitivo n. 1.143 do STJ.
A recidiva em crimes diversos ao contrabando não afasta a mínima ofensividade e o reduzido grau de reprovabilidade da conduta, demonstrada a maior reprovabilidade da reiteração apenas em crimes de mesma natureza.
É admitida a aplicação do princípio da insignificância ao crime de contrabando de cigarros ao reincidente, desde que a reincidência ocorra por crimes de natureza diversa ao contrabando, não se aplicando o Tema 1143/STJ.
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS
O exame pericial torna-se excepcionalmente prescindível à comprovação da qualificadora prevista no inciso III, do § 4º, do art. 155 do Código Penal, quando inexistirem vestígios no veículo furtado e houver a apreensão de chave falsa em poder do agente.
AgRg no HC 876.671-SC, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 29/4/2024, DJe 3/5/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Geremia foi condenado pelo crime de furto de veículo mediante o uso de chave falsa. Sua defesa impetrou HC no qual alega a necessidade de exame pericial para a aplicação da qualificadora, mesmo que inexistentes vestígios no veículo furtado e houver a apreensão de chave falsa em poder do agente.
R: Excepcionalmente!!!
Em que pese ser necessária a realização de exame pericial quando o delito deixa vestígios, o STJ entende pela possibilidade de que a perícia não seja realizada quando houver a comprovação, por outros meios, da ocorrência da qualificadora.
No caso, o uso da chave falsa foi reconhecido de forma indireta, uma vez que a vítima afirmou que não houve nenhuma avaria no bem, motivo pelo qual o veículo nem sequer foi encaminhado à perícia pela autoridade policial.
Além disso, a chave falsa foi apreendida em poder do recorrente, o que torna o exame pericial, excepcionalmente, prescindível à comprovação da mencionada qualificadora.
Assim, a perícia da chave falsa se mostra desnecessária, diante do comprovado o uso inequívoco da chave micha.
O exame pericial torna-se excepcionalmente prescindível à comprovação da qualificadora prevista no inciso III, do § 4º, do art. 155 do Código Penal, quando inexistirem vestígios no veículo furtado e houver a apreensão de chave falsa em poder do agente.
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
O cálculo para remição da pena em razão de trabalho interno de conservação e manutenção do estabelecimento penal, realizado em horário especial inferior a 6 horas diárias, deve se dar pela quantidade de dias efetivamente trabalhados.
AgRg no AREsp 2.356.272-RN, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 27/2/2024, DJe 4/3/2024. (Info STJ Ed. Ext. 21)
Jacó desenvolveu atividades laborais, no interior do presídio, e em jornada inferior a 6 horas diárias, com autorização da administração penitenciária, nos termos do art. 33 da Lei de Execução Penal, uma vez que desempenhava serviço de conservação e manutenção do estabelecimento penal, trabalhando como “pagador” (entregando as refeições aos demais internos) e ASG (Auxiliar de Serviços Gerais).
Requereu a remição de pena em razão do trabalho realizado, a qual foi deferida e calculada com base nos dias de trabalho. O MP não concordou com a forma de cálculo e recorreu da decisão, por entender que deveria ser calculado de acordo com as horas trabalhadas.
Lei de Execução Penal:
Art. 33. A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 (seis) nem superior a 8 (oito) horas, com descanso nos domingos e feriados.
Parágrafo único. Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal.
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
I – 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
II – 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.
R: Dias!!!!
No caso, o apenado desenvolveu atividades laborais, no interior do presídio, e em jornada inferior a 6 horas diárias, com autorização da administração penitenciária, nos termos do art. 33 da Lei de Execução Penal, uma vez que desempenhava serviço de conservação e manutenção do estabelecimento penal, trabalhando como “pagador” (entregando as refeições aos demais internos) e ASG (Auxiliar de Serviços Gerais).
Se a regra geral disposta na caput do art. 33 da LEP prevê que a jornada normal de trabalho não pode ser inferior a 6 horas e nem superior a 8 horas diárias, com descanso aos domingos e feriados, a situação de horário reduzido autorizada no parágrafo único do mesmo artigo deve ser equiparada à “jornada normal de trabalho”.
O Superior Tribunal de Justiça compreende que, pelo teor do art. 33, c/c o art. 126, §1º, ambos da LEP, na jornada de trabalho não inferior a 6 nem superior a 8 horas diárias, o cálculo para remição deve se dar pela quantidade de dias efetivamente trabalhados. Com essa premissa, não há motivo para que a exceção autorizada no parágrafo único do art. 33 conte com raciocínio diverso.
Dessa forma, os argumentos no sentido de que o art. 33 da LEP prevê a “possibilidade de utilização de jornada de trabalho distinta daquela preconizada pela CLT – 6 horas ininterruptas ou 8 horas com intervalo -, bem como o benefício de não serem desprezadas as horas trabalhadas aquém da jornada comum”, se coadunam com o citado entendimento do STJ, veiculando, com outras palavras, a regra da especialidade das normas de execução penal em relação às normas trabalhistas gerais.
Em que pese a ausência de norma suficientemente clara para o caso em apreço, a melhor interpretação, dentro das opções oferecidas pela hermenêutica penal e processual penal, é aquela que prestigie solução mais favorável ao réu e, nesse sentido, a contagem de prazo para remição por dia trabalhado é a que mais se coaduna com os princípios constitucionais ligados à dignidade da pessoa humana. No mesmo sentido: HC n. 94163, relator Ministro Carlos Britto, Primeira Turma do STF, julgado em 2/12/2008, DJe-200 DIVULG 22/10/2009 PUBLIC 23/10/2009 EMENT VOL-02379-04 PP-00851 e AgRg no HC n. 638.412/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 9/3/2021, DJe de 15/3/2021.
Ressalte-se, ainda, que a conclusão veiculada no RHC n. 136.509, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, corrobora com o raciocínio interpretativo aqui construído, pois, conforme já afirmado por esta Corte, “Referido entendimento [remição por horas de trabalho] – que excepcionalmente afasta a regra contida na disposição legal [remição por dias de trabalho] – aplica-se, no entanto, somente aos casos em que a jornada tenha sido imposta pela administração penitenciária da unidade” (AgRg no HC n. 390.755/MG, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 10/10/2017, DJe de 23/10/2017).
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