Informativo nº 822 do STJ COMENTADO. Pra cima dele!
RECURSO ESPECIAL
As concessionárias de rodovias respondem, independentemente da existência de culpa, pelos danos oriundos de acidentes causados pela presença de animais domésticos nas pistas de rolamento, aplicando-se as regras do Código de Defesa do Consumidor e da Lei das Concessões.
REsp 1.908.738-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 21/8/2024, DJe 26/8/2024. (Tema 1122). (Info STJ 822)
Creiton trafegava em seu veículo em uma rodovia quando, em razão da presença de um cão na pista, foi obrigado a realizar manobra brusca para evitar atingir o animal, mas que resultou em acidente e prejuízos materiais no seu veículo.
Inconformado, ajuizou ação em face da concessionária da rodovia, que, por sua vez, sustenta não estar presente o nexo de causalidade entre a conduta da concessionária e o acidente sofrido pelo usuário da rodovia, além de que a culpa seria do dono do animal que ingressou na pista.
CDC:
Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.
R: Exatamente!!!
A responsabilidade objetiva das concessionárias de serviço público pelos acidentes causados pelo ingresso de animais domésticos nas pistas de rolamento vem sendo reconhecida por ambas as Turmas de Direito Privado desta Corte de Justiça, aplicando-se a teoria do risco administrativo.
O mesmo vem ocorrendo em relação à incidência do Código de Defesa do Consumidor, especialmente porque há previsão legal expressa de sua aplicação aos casos que envolvem concessionárias de serviços públicos (art. 22, caput e parágrafo único do CDC), o que é reforçado pela previsão do art. 7° da Lei n. 8.987/1995.
Ressalte-se que a jurisprudência do STJ vai ao encontro do entendimento sedimentado no Supremo Tribunal Federal, no sentido de que “as pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviço público, respondem objetivamente pelos prejuízos que causarem a terceiros usuários e não usuários do serviço.” (RE 591.874-RG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski – Tema n. 130).
Portanto, não é possível adotar a teoria da culpa administrativa, tampouco afastar a responsabilidade das concessionárias com fundamento nas teses fixadas pelo STF no regime de repercussão geral nos seguintes termos: i) Tema n. 362 (RE 608.880): “Nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, não se caracteriza a responsabilidade civil objetiva do Estado por danos decorrentes de crime praticado por pessoa foragida do sistema prisional, quando não demonstrado o nexo causal direto entre o momento da fuga e a conduta praticada” e ii) Tema n. 366 (RE 136.861): “Para que fique caracterizada a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes do comércio de fogos de artifício, é necessário que exista a violação de um dever jurídico específico de agir, que ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais ou quando for de conhecimento do poder público eventuais irregularidades praticadas pelo particular”.
Ao contrário, no julgamento do RE 608.880, foi reafirmada a tese de que a responsabilidade civil objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público baseia-se na teoria do risco administrativo, inclusive nos casos de omissão.
Nos casos de acidentes provocados pelo ingresso de animais nas rodovias, os fatores determinantes para a quebra do nexo de causalidade e, consequentemente, para a exclusão da responsabilidade civil verificados no julgamento do RE 608.880 – i) intervalo entre o fato administrativo e o evento danoso e ii) superveniência de causas que contribuíram para a ocorrência do evento – não se fazem presentes.
Se os animais ingressaram na pista pouco tempo antes do acidente, não se verifica tal intervalo. Por outro lado, nos casos em que o acidente ocorre depois de um considerável intervalo de tempo, resta bem caracterizada a omissão das Concessionárias no tocante aos deveres de manejo e retirada. Além disso, não se cogita, em tese, a superveniência de fatos que contribuam para a ocorrência do evento danoso.
Seguindo a mesma linha, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 136.861 (Tema n. 366), reafirmou que a responsabilidade das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços assenta-se na teoria do risco administrativo.
Observa-se, nesse julgamento, que a clandestinidade da atividade de armazenamento de fogos de artifício tornou inexigível a atividade fiscalizatória do Poder Público. Ainda, levou-se em consideração a conduta dos comerciantes que, eivada de má-fé, fez do imóvel utilizado para o armazenamento um “verdadeiro depósito clandestino de pólvora”. Com efeito, não seria de se exigir atuação fiscalizatória sem que se soubesse a exata localização do estabelecimento que comercializa fogos de artifício. Além disso, é possível que os comerciantes mudem o local de atuação, justamente para se manterem na clandestinidade e se furtarem da atividade fiscalizatória ou da persecução penal.
Nos casos que envolvem o tema em análise, ainda que as rodovias sejam extensas, as atividades de fiscalização, sinalização, manejo e remoção de animais das pistas de rolamento são desenvolvidas em espaço determinado e inalterável. Ademais, como o ingresso de animais na pista é previsível, deve ser observado o princípio da prevenção.
Considerando o princípio da prevenção, as regras contratuais que impõem a instalação de bases operacionais com distâncias máximas entre elas, bem como a realização de rondas periódicas com intervalos máximos e a previsão de tempo máximo para o atendimento de ocorrências representam apenas padrões mínimos a serem observados pelas concessionárias.
Cabe salientar também que o dever de fiscalização dos entes públicos não afasta a responsabilidade civil das concessionárias, nos termos do art. 25 da Lei das Concessões.
Além disso, o princípio da primazia do interesse da vítima, decorrente do princípio da solidariedade, impõe a reparação dos danos independentemente da identificação do proprietário do animal cujo ingresso na rodovia causou o acidente. Assim, cabe à concessionária indenizar o usuário pelos danos sofridos e, se lhe aprouver, exercer eventual direito de regresso, oportunamente, contra o dono do animal envolvido no acidente.
Assim, fixa-se a seguinte tese: “As concessionárias de rodovias respondem, independentemente da existência de culpa, pelos danos oriundos de acidentes causados pela presença de animais domésticos nas pistas de rolamento, aplicando-se as regras do Código de Defesa do Consumidor e da Lei das Concessões”.
As concessionárias de rodovias respondem, independentemente da existência de culpa, pelos danos oriundos de acidentes causados pela presença de animais domésticos nas pistas de rolamento, aplicando-se as regras do Código de Defesa do Consumidor e da Lei das Concessões.
RECURSO ESPECIAL
Em ação ordinária na qual se objetiva a anulação de questão de prova e reclassificação de candidato, quando eventual inclusão deste implicar na necessária exclusão de terceiros, é necessário o chamamento dos demais candidatos afetados para integrarem a lide.
REsp 1.831.507-AL, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 6/8/2024, DJe 9/8/2024. (Info STJ 822)
Craudinei, aluno do ECJ, participou de certame para o ingresso na carreira da Procuradoria Geral do Estado de Alagoas e por que não foi bem sucedido em determinada fase do certame — de prova dissertativa — aforou uma ação ordinária cujo fim era a revisão de sua nota.
Ele obteve sucesso no primeiro grau de jurisdição, mas o Tribunal “a quo” anulou todo o procedimento por vislumbrar a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário daqueles candidatos que haviam sido aprovados e classificados dentro do número de vagas oferecidas.
Catorze candidatos haviam sido aprovados no concurso. A acolhida do pleito de Craudinei, com a alteração da sua nota na prova dissertativa, implicaria a modificação da ordem classificatória do certame, àquela altura já devidamente homologado.
R: Obviamente!!!!
Trata-se a controvérsia acerca de revisão de nota de prova discursiva aplicada em concurso público para o ingresso na carreira de Procurador do Estado, em que a parte objetivava a atribuição de nota a si bem como, em decorrência disso, o seu reposicionamento da lista de classificados, a fim de habilitá-lo à nomeação e à posse, com o refazimento de toda classificação.
Não se desconhece a jurisprudência há muito sedimentada no sentido da inexistência de comunhão de interesses entre candidatos quanto tratar-se de pretensão de anulação de prova de concurso, ou a recorreção dela, ou mesmo a alteração da classificação. Essa jurisprudência assenta que não há em tese nenhum direito que possa ser compartilhado entre os candidatos, e que o interesse de um apenas não repercute senão na sua própria esfera jurídica.
Isso, contudo, é um entendimento vetusto o qual, se ainda não pode ser integralmente afastado, há que ser ao menos mitigado sobretudo ao considerarmos que, mais modernamente, a classificação do candidato dentro das vagas implica a existência do direito à nomeação, algo que na formação do entendimento aludido, sobre o litisconsórcio, ainda não existia.
No caso sob exame, essa particularidade da novel jurisprudência sobre o direito à nomeação toma mais relevo quando se verifica que o próprio recorrente deduz pedido para a alteração da lista classificatória, a implicar, com a sua eventual inclusão, na necessária exclusão de terceiro, porque então se teria o limite de vagas atingido.
Assim, o edital previa o total de catorze vagas, sendo uma para candidatos com deficiência, e sendo assim a inclusão do recorrente no cômputo das treze vagas para a concorrência ampla significa, como dito, a exclusão de algum dos demais, e daí a necessidade de chamamento dos demais para integrarem a lide.
Logo, conforme jurisprudência do STJ, caso a providência almejada pelo impetrante resulte no atingimento de direito de terceiro, seria o caso de anulação da marcha processual para a reordenação do feito e oportunização do contraditório e da ampla defesa ao terceiro. (RMS n. 55.622/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 27/11/2017).
Em ação ordinária na qual se objetiva a anulação de questão de prova e reclassificação de candidato, quando eventual inclusão deste implicar na necessária exclusão de terceiros, é necessário o chamamento dos demais candidatos afetados para integrarem a lide.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
A competência do Superior Tribunal de Justiça para o processo e julgamento dos crimes de responsabilidade praticados por membros dos Tribunais de Contas dos Estados (art. 105,I, “a”, da CF/1988) não abarca a suposta autoria intelectual de crime de homicídio, tentado ou consumado.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Raul Araújo, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 21/8/2024. (Info STJ 822)
Creosvaldo, membro do Tribunal de Contas de certo estado, foi denunciado pelo crime de homicídio, no qual teria sido autor intelectual. A denúncia foi promovida no primeiro grau, ao passo que a defesa de Creosvaldo sustenta a existência de foro privilegiado para julgamento pelo STJ.
Processo sob segredo de justiça.
Lei n. 1.079/50:
Art. 10. São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária:
1- Não apresentar ao Congresso Nacional a proposta do orçamento da República dentro dos primeiros dois meses de cada sessão legislativa;
2 – Exceder ou transportar, sem autorização legal, as verbas do orçamento;
3 – Realizar o estorno de verbas;
4 – Infringir , patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária.
5) deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado Federal;
6) ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal;
7) deixar de promover ou de ordenar na forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei;
8) deixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro;
9) ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente; (
10) captar recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido;
11) ordenar ou autorizar a destinação de recursos provenientes da emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a autorizou;
12) realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei.
Art. 39-A. Constituem, também, crimes de responsabilidade do Presidente do Supremo Tribunal Federal ou de seu substituto quando no exercício da Presidência, as condutas previstas no art. 10 desta Lei, quando por eles ordenadas ou praticadas.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se aos Presidentes, e respectivos substitutos quando no exercício da Presidência, dos Tribunais Superiores, dos Tribunais de Contas, dos Tribunais Regionais Federais, do Trabalho e Eleitorais, dos Tribunais de Justiça e de Alçada dos Estados e do Distrito Federal, e aos Juízes Diretores de Foro ou função equivalente no primeiro grau de jurisdição.
R: Negativo!!!!
A Constituição da República (art. 105, I, a) dispõe competir ao Superior Tribunal de Justiça “processar e julgar, originariamente: a) nos crimes comuns (…) e nos de responsabilidade, (…) os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal (…)”. Dita disposição constitucional, registra a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sequer pode ser alterada por força da atuação do poder constituinte derivado decorrente (ADI 4190, Rel. Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 10/3/2010).
Em paralelo à discussão doutrinária sobre a natureza jurídica dos crimes de responsabilidade, indisputável é a constatação de que o Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido de competir privativamente à União instituir o regramento legal relativo à tipificação e ao procedimento dos crimes de responsabilidade. Nos termos da Súmula Vinculante n. 46: “A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são de competência legislativa privativa da União”.
A legislação federal vigente não contempla, como conduta abstrata apta à qualificação como crime de responsabilidade de membro de Tribunal de Contas Estadual a suposta autoria intelectual de crimes de homicídio, tentado e consumados. Pelo contrário, a norma vigente destina-se, quanto a membros do Tribunal de Contas, exclusivamente aos Presidentes e substitutos, nada dispondo sobre os Conselheiros, e mesmo assim apenas em relação a comportamentos contrários às normas orçamentárias (Lei n. 1.079/50, art. 39-A, parágrafo único, c/c art. 10).
A competência do Superior Tribunal de Justiça para o processo e julgamento dos crimes de responsabilidade praticados por membros dos Tribunais de Contas dos Estados (art. 105,I, “a”, da CF/1988) não abarca a suposta autoria intelectual de crime de homicídio, tentado ou consumado.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
A maioridade civil e a capacidade, em tese, de promoção ao próprio sustento, por si só, não são capazes de desconstituir a obrigação alimentar, devendo haver prova pré-constituída da ausência de necessidade dos alimentos.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Raul Araújo, Rel. para acórdão Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por maioria, julgado em 13/8/2024. (Info STJ 822)
Bernadete, filha de Neneco, recebeu pensão alimentícia do pai até os 18 anos, quando começou a trabalhar e auferir renda em valor inferior ao salário mínimo nacional. Neneco ajuizou ação com o intuito de desconstituir a obrigação alimentar e fundamentou o pedido na maioridade civil e capacidade, em tese, de Bernadete prover o próprio sustento.
Processo em segredo de justiça. Caso imaginado.
R: Nooopss!!!
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta que “a maioridade civil e a capacidade, em tese, de promoção ao próprio sustento, por si só, não são capazes de desconstituir a obrigação alimentar, devendo haver prova pré-constituída da ausência de necessidade dos alimentos” (HC 871.593/MG, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 5/3/2024, DJe de 13/3/2024).
A exoneração do alimentante sujeita-se a decisão judicial, mediante o contraditório, conforme orienta a nota n. 358 da Súmula de Jurisprudência do STJ. No ponto, o alimentante alegou que a alimentanda é maior de idade e tem emprego fixo. Porém, a alegada capacidade econômica foi analisada apenas com base nas alegações e documentos unilateralmente produzidos pelo impetrante, à míngua do necessário contraditório.
De fato, o salário da alimentada sequer alcança o piso nacional. No mais, embora devidamente citado para efetuar o pagamento ou justificar a impossibilidade de fazê-lo, o executado quedou-se inerte, sem prestar qualquer tipo de esclarecimento sobre o inadimplemento de prestação que corresponde a apenas 30% do salário mínimo nacional.
Depreende-se, assim, que a inadimplência e o acúmulo das prestações são resultado da recalcitrância do paciente, que teve diversas oportunidades para liquidar seu débito muito antes do decreto prisional.
Ademais, o mero ajuizamento da ação exoneratória não retira a exigibilidade da obrigação, em especial das prestações antecedentes. Isso, notadamente, porque o pedido de tutela provisória de urgência foi indeferido por meio de decisão amplamente fundamentada, com exame acurado da alegada modificação do binômio necessidade-possibilidade.
A maioridade civil e a capacidade, em tese, de promoção ao próprio sustento, por si só, não são capazes de desconstituir a obrigação alimentar, devendo haver prova pré-constituída da ausência de necessidade dos alimentos.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL
Sob a égide do Código Civil de 1916, na apuração de haveres decorrentes de dissolução parcial de sociedade, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
AgInt no AgInt no REsp 1.732.541-SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 13/8/2024.
Em uma ação de dissolução parcial de sociedade ajuizada em 1995, a primeira instância decidiu que os juros de mora incidiriam apenas após o trânsito em julgado da sentença que apurou a dívida, argumentando que o sócio dissidente só se torna credor dos haveres após perder sua qualidade de sócio, o que ocorre com a quebra da “affectio societatis” (vínculo de confiança entre os sócios).
Um dos sócios recorreu da decisão por entender que os juros caberiam desde a citação.
R: Da CITAÇÃO!!!
Cinge-se a controvérsia acerca do termo inicial de incidência dos juros de mora na hipótese de apuração de haveres decorrentes de dissolução parcial de sociedade.
Embora possa existir razoável discussão na doutrina sobre a natureza da sentença proferida na ação de dissolução parcial de sociedade, se declaratória ou constitutiva, a orientação jurisprudencial adotada pelo STJ é no sentido de que, nas ações de dissolução parcial de sociedade com apuração de haveres relativas a fatos ocorridos na vigência do Código Civil de 1916, os juros de mora incidem a partir da citação.
Tal entendimento se aplica mesmo que não tenha ainda sido quantificada a dívida, (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.335.117/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/11/2021, DJe de 1/2/2022; EDcl no REsp n. 1.499.772/DF, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 10/3/2020, DJe de 12/3/2020).
Sob a égide do Código Civil de 1916, na apuração de haveres decorrentes de dissolução parcial de sociedade, os juros de mora devem incidir a partir da citação.
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
O herdeiro que tem a posse exclusiva de imóvel objeto de herança possui legitimidade e interesse na declaração de usucapião extraordinária em nome próprio.
AgInt no AREsp 2.355.307-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/6/2024, DJe 27/6/2024. (Info STJ 822)
Craudio, herdeiro de Crementino, ajuizou ação de declaração de usucapião extraordinária em nome próprio. O tribunal local confirmou sentença que extinguiu o feito, por ausência de interesse processual, haja vista que o autor é herdeiro do imóvel que pretende usucapir.
Entendeu que, embora indiscutível a longa permanência do autor no imóvel, não seria possível considerar que os demais herdeiros abandonaram o imóvel enquanto o processo de inventário estava em curso. Por essa razão, exerceria mera detenção, embora fosse dono assim como os demais herdeiros proprietários.
R: Com certeza!!!!
Cinge-se a controvérsia ao interesse processual de herdeiro de imóvel objeto de processo de inventário em ajuizar ação de usucapião.
No caso, o Tribunal de origem confirmou sentença que extinguiu o feito, por ausência de interesse processual, haja vista que o autor é herdeiro do imóvel que pretende usucapir. Entendeu que, embora indiscutível a longa permanência do autor no imóvel, os julgadores entenderam que não seria possível considerar que os demais herdeiros abandonaram o imóvel enquanto o processo de inventário estava em curso. Por essa razão, exerceria mera detenção, embora fosse dono assim como os demais herdeiros proprietários.
Ocorre que a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que há possibilidade da usucapião de imóvel objeto de herança pelo herdeiro que tem sua posse exclusiva, ou seja, há legitimidade e interesse de o condômino usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião extraordinária.
Segundo precedentes do STJ, a partir da transmissão da herança com a abertura da sucessão, “cria-se um condomínio pro indiviso sobre o acervo hereditário, regendo-se o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, pelas normas relativas ao condomínio”. Assim, “O condômino, tem legitimidade para usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo determinado em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários” (REsp n. 1.631.859/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 22/5/2018, DJe de 29/5/2018).
O herdeiro que tem a posse exclusiva de imóvel objeto de herança possui legitimidade e interesse na declaração de usucapião extraordinária em nome próprio.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Compete às Turmas da Segunda Seção do STJ julgar litígio acerca de prova para obtenção de Título de Especialista em Cardiologia (TEC), promovida pela Sociedade Brasileira de Cardiologia.
CC 205.757-DF, Rel. Ministro Raul Araújo, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 21/8/2024. (Info STJ 822)
Dr. Creisson, médico, impetrou mandado de segurança em face da Sociedade Brasileira de Cardiologia, visando a obter o título de especialista em cardiologia (TEC) para manutenção do vínculo empregatício nos hospitais em que trabalha e que passaram a exigir referida titulação promovida pela SBC, associação civil sem fins lucrativos.
A causa de pedir refere-se à existência de questões da prova de especialização que, em tese, são passíveis de anulação, pois, segundo sustenta a parte, não possuem resposta correta, mais de uma resposta correta ou não estão previstas nos conteúdos da bibliografia indicada pelo edital.
Passou-se a questionar a competência interna do STJ para o julgamento do recurso.
R: Serviço para as Turmas da Segunda Seção do STJ!!!!
No caso, foi impetrado mandado de segurança em face apenas da Sociedade Brasileira de Cardiologia, visando a obter o título de especialista em cardiologia (TEC) para manutenção do vínculo empregatício nos hospitais em que trabalha e que passaram a exigir referida titulação promovida pela SBC, associação civil sem fins lucrativos.
A causa de pedir, conforme consta da exordial, refere-se a existência de questões da prova de especialização que, em tese, são passíveis de anulação, pois, segundo sustenta a parte, não possuem resposta correta, mais de uma resposta correta ou não estão previstas nos conteúdos da bibliografia indicada pelo edital.
Nesse contexto, a controvérsia diz respeito à eventual anulação de questões de prova de título de especialista em cardiologia, de responsabilidade de pessoa jurídica de direito privado – Sociedade Brasileira de Cardiologia -, não estando em discussão eventual falha na prestação de serviço público.
Com efeito, trata-se de litígio acerca de prova para obtenção de título de especialista em cardiologia, promovida pela Sociedade Brasileira de Cardiologia – que não integra a Administração Pública Direta ou Indireta -, sem a presença de qualquer ente público ou autarquia no polo passivo da demanda. Portanto, a controvérsia deve ser dirimida pelas regras de Direito Privado.
É de se concluir, por conseguinte, que, em consideração à natureza prevalente da relação jurídica litigiosa, como dispõe o caput do art. 9º do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça – RISTJ, a competência para processar e julgar o recurso, que ensejou o conflito de competência, é da Segunda Seção, nos termos dos incisos III e XIV do aludido § 2º do art. 9º do RISTJ.
Compete às Turmas da Segunda Seção do STJ julgar litígio acerca de prova para obtenção de Título de Especialista em Cardiologia (TEC), promovida pela Sociedade Brasileira de Cardiologia.
RECURSO ESPECIAL
É possível a alteração do polo passivo da demanda mesmo após o saneamento do processo e sem autorização do réu, desde que não haja alteração do pedido ou da causa de pedir.
REsp 2.128.955-MS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 13/8/2024, DJe 15/8/2024. (Info STJ 822)
Em uma execução de taxas condominiais, terceiros interessados acabaram confessado que o imóvel gerador do débito seria de sua propriedade. A exequente, atenta ao desenrolar do feito, requereu a inclusão desses terceiros no polo passivo da execução. O Juízo de Primeiro Grau admitiu tal alteração superveniente.
O Tribunal local, contudo, reformou a decisão sob o fundamento de que a alteração do polo passivo da execução ocorreu muito após a citação da parte executada – e sem concordância desta.
CPC:
Art. 329. O autor poderá:
I – até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;
II – até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.
R: SIM, desde que não haja alteração do pedido ou da causa de pedir…
O propósito recursal é decidir se é possível a alteração do polo passivo da demanda após o saneamento do processo e sem a autorização do réu.
A alteração do polo passivo quando mantido o pedido e a causa de pedir não viola o art. 329 do CPC. Pelo contrário, além de homenagear os princípios da economia processual e da primazia do julgamento de mérito, essa possiblidade cumpre com o dever de utilizar a técnica processual não como um fim em si mesmo, mas como um instrumento para a célere composição do litígio. Com efeito, esse entendimento foi firmado pelo STJ ainda na vigência do CPC/1973.
Determinar o ajuizamento de nova demanda apenas para que seja alterado o polo passivo traria mais prejuízos às partes, pois haveria um inefetivo adiamento do julgamento de mérito.
As causas em que o pedido ou a causa de pedir são iguais deverão ser julgadas conjuntamente, pois são conexas. Portanto, não há razão para impedir o aditamento que altera apenas a composição subjetiva da lide.
É possível a alteração do polo passivo da demanda mesmo após o saneamento do processo e sem autorização do réu, desde que não haja alteração do pedido ou da causa de pedir.
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
Cumprido tempestivamente o despacho que ordenou a complementação das custas, não há que se imputar à parte culpa pela citação realizada após o termo final da prescrição, nos termos da Súmula n. 106/STJ, de modo que a citação válida retroage à data da propositura da ação para efeitos de interrupção da prescrição, conforme disposto art. 240, § 1º, do CPC/2015.
AREsp 2.150.655-RJ, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 13/8/2024. (Info STJ 822)
Craudete sofreu acidente automobilístico e acionou a seguradora, que se recusou a indenizar os prejuízos. Inconformada, Craudete ingressou com cautelar visando à interrupção do prazo prescricional para buscar indenização. Como Craudete recolheu as custas a menor, o juiz a intimou a complementar o preparo, no prazo de quinze dias, o que foi cumprido.
A seguradora alega a ocorrência da prescrição, uma vez que a citação, após a regularização das custas, teria ocorrido quando já decorrido o prazo de inércia tolerado pela lei.
CPC:
Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil)
§ 1º A interrupção da prescrição, operada pelo despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data de propositura da ação.
§ 3º A parte não será prejudicada pela demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário.
R: Nops!! Os efeitos interruptivos retroagem à citação válida…
Nos termos do artigo 240, §§ 1° e 3°, do CPC, “considera-se interrompida a prescrição na data em que a petição inicial é protocolada, desde que não seja imputada ao exequente culpa pelo atraso do despacho ou da citação” (AgRg no REsp 1373799/MT, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 17/2/2016). No mesmo sentido é o enunciado da Súmula n. 106 do STJ, que estabelece que, “proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência”.
No caso, a Corte estadual entendeu que, a despeito do prazo concedido, que se inicia somente após a regular intimação da parte, a complementação das custas deveria ter ocorrido em 3 dias corridos (interregno entre a data que proferida a decisão e o termo final da prescrição), a fim de possibilitar a interrupção da prescrição com o despacho que ordena a citação, pois, “tratando-se de autos eletrônicos é possível ter acesso antes mesmo da publicação do ato, devendo o advogado zeloso, como sói acontecer em causa de grande complexidade e vulto, acompanhar de perto o andamento do feito, sob pena de ter a pretensão malograda no nascedouro”. Ou seja, o Tribunal a quo exigiu que a parte autora complementasse o recolhimento das custas antes mesmo de intimada acerca da referida necessidade.
Com efeito, os prazos processuais iniciados após a vigência do CPC/15 devem ser contabilizados em dias úteis, mesmo aqueles estabelecidos pelo juiz, nos termos do artigo 219, caput, do diploma processual. Ainda, verifica-se que é incontroverso que os autos tramitam de forma eletrônica, de modo que a intimação tácita ocorre após 10 (dez) dias corridos após o envio da intimação, a teor do disposto no artigo 5°, § 3°, da Lei n. 11.419/2005.
Ademais, o entendimento do Tribunal de origem viola o disposto no art. 290 do CPC por considerar desnecessária a intimação da parte para complementar as custas, considerando que seria suficiente que o advogado diligenciasse para acompanhar a movimentação processual e verificar se houve alguma determinação do juízo, ônus que a legislação não impõe a qualquer das partes.
Destaca-se, ainda, que a forma de cálculo das custas varia de tribunal para tribunal, sendo algumas delas mais complicadas do que outras. Não parece razoável que a parte seja responsabilizada nesse caso em que, tendo ajuizado a ação dentro do prazo prescricional, intimada, realizou a complementação das custas, nos termos do art. 290 do CPC.
Assim, no caso, cumprido tempestivamente o despacho que ordenou a complementação das custas, não há que se imputar à parte culpa pela citação realizada após o termo final da prescrição, nos termos da Súmula n. 106/STJ e do disposto no artigo 240, §§ 1° e 3°, do CPC.
Cumprido tempestivamente o despacho que ordenou a complementação das custas, não há que se imputar à parte culpa pela citação realizada após o termo final da prescrição, nos termos da Súmula n. 106/STJ, de modo que a citação válida retroage à data da propositura da ação para efeitos de interrupção da prescrição, conforme disposto art. 240, § 1º, do CPC/2015.
RECURSO ESPECIAL
O Município competente para cobrar o ISSQN sobre serviço prestado pelos laboratórios de análises clínicas é o do local em que coletado o material a ser examinado, independentemente de os procedimentos laboratoriais serem executados em município diverso.
REsp 2.030.087-RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 20/8/2024. (Info STJ 822)
América Diagnósticos alega que vem sendo cobrada por dois municípios; ambos querendo saber do ISSQN. Explica que os serviços prestados pelo laboratório são de análises clínicas, sendo que realiza a coleta dos materiais em um município, mas os exames são realizados em outro.
Lei Complementar n. 116/2003:
Art. 4o Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.
R: Ao município da coleta!!!!
Cinge-se a controvérsia acerca da competência para cobrança de ISSQN sobre o serviço prestado por laboratórios de análise clínica quando o local da coleta do material a ser examinado é diverso daquele onde realizados os procedimentos laboratoriais.
Relativamente ao ISSQN, a matéria era regulada pelo Decreto-Lei n. 406/1968, recepcionado com status de lei complementar, cujo art. 12 estabelecia, como regra, considerar-se local da prestação do serviço – aspecto espacial da hipótese de incidência do imposto municipal -, o do estabelecimento prestador, ou, em sua falta, o do seu domicílio, ressalvados os casos de construção civil ou de exploração rodoviária, constante do item 101 da então lista de serviços.
Com o advento da Lei Complementar n. 116/2003, manteve-se a lógica segundo a qual considera-se local da prestação do serviço o da sede do estabelecimento do prestador (art. 3º, caput), sendo previstas, contudo, hipóteses distintas para as hipóteses descritas nos incisos I a XXV.
No tocante aos serviços de análises clínicas, arrolados no item 4.02 da lista de serviços, incide a regra geral constante do caput do art. 3º da Lei Complementar n. 116/2003, porquanto não enquadrado entre as exceções arroladas, considerando-se, portanto, prestada a atividade no local do estabelecimento do prestador.
Por sua vez, de acordo com o art. 4º da Lei Complementar n. 116/2003, para efeito de definir o local da prestação do serviço – e, por consequência, o município territorialmente competente para a instituição e cobrança do ISSQN -, o que importa é definir o local do estabelecimento do prestador, assim entendido o “lugar onde o contribuinte desenvolve a respectiva atividade, de modo permanente ou temporário, a título de unidade econômica ou profissional, independentemente da nomenclatura de agência, sucursal, filial etc”.
Ademais, mister consignar que, no julgamento do Tema 354/STJ e Tema 355/STJ, a Primeira Seção desta Corte fixou a seguinte tese: “O sujeito ativo da relação tributária, na vigência do DL 406/68, é o Município da sede do estabelecimento prestador (art. 12); a partir da LC 116/03, é aquele onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e aprovação do financiamento – núcleo da operação de leasing financeiro e fato gerador do tributo”.
Na ocasião, a par de estabelecer-se que o âmago do contrato de arrendamento mercantil (leasing) se tem por formalizado no local da sede da instituição financeira com poderes decisórios para a conclusão do negócio jurídico, restou firmada compreensão no sentido de que, na vigência da Lei Complementar n. 116/2003, viável a instituição e cobrança de ISSQN por Município no qual constatada a existência de unidade econômica ou profissional do prestador e na qual perfectibilizada a prestação dos serviços.
No entanto, inviável, para efeito de divisar o sujeito ativo do ISSQN, aplicar idêntica conclusão dos casos envolvendo contratos de leasing entabulados por instituições financeiras às hipóteses de serviços prestados por laboratórios de análises clínicas, pois presente relevante dintinguishing entre ambas as atividades.
Com efeito, no tocante ao leasing, é importante destacar que as análises e formalizações documentais são realizadas de forma centralizada na sede do arrendador, dispensando a presença do arrendatário, mesmo quando os correspondentes bancários operam diretamente em regiões mais remotas do país.
Por esse motivo, o STJ fixou intelecção segundo a qual, relativamente aos serviços de arrendamento mercantil, o sujeito ativo do ISSQN é o Município onde ocorre a análise e emissão do contrato, porquanto a transação não é formalizada onde o tomador do serviço apresenta proposta de contratação do serviço financeiro, mas, em verdade, no lugar da aprovação da operação de crédito.
A seu turno, o modus operandi nos laboratórios de análises clínicas é totalmente distinto, já que o tomador precisa estar no estabelecimento contratado para solicitar o serviço, realizar o pagamento ou conferir a autorização de plano de saúde, e, por fim, realizar a coleta do material orgânico, evidenciando o ato jurídico perfeito, naquele momento concretizado, sendo o laudo da análise – resultado do serviço prestado – exaurimento da relação jurídica previamente perfectibilizada.
Remarque-se, outrossim, que o paciente, como regra, retira o laudo (essência do serviço) no mesmo local onde realizada a coleta, ou de modo virtual, se assim preferir, mas nunca no estabelecimento técnico unicamente dotado de equipamentos e pessoal especializados para processamento do material biológico, evidenciando, portanto, que o início e o fim da relação jurídica ocorrem no local de coleta.
Desse modo, impende asseverar, para fins de identificação do sujeito ativo do ISSQN, a irrelevância de o material biológico coletado ser enviado para outro estabelecimento do mesmo grupo econômico com o intuito de realizar sua análise, porquanto o núcleo do serviço prestado ocorre efetivamente no local de coleta, pagamento e entrega de resultado.
Dessarte, diferentemente das conclusões alcançadas por esta Corte no Tema n. 355 quanto ao contrato de leasing – contexto no qual o âmago da transação é concluído na sede da instituição financeira – o sujeito ativo do ISSQN é o Município onde há uma unidade econômica ou profissional capaz de coletar e entregar o resultado ao paciente, uma vez que a prestação principal é a realização da análise clínica, comprovada pelo laudo emitido.
O Município competente para cobrar o ISSQN sobre serviço prestado pelos laboratórios de análises clínicas é o do local em que coletado o material a ser examinado, independentemente de os procedimentos laboratoriais serem executados em município diverso.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL
Não é possível o enquadramento, como salário-maternidade, dos pagamentos realizados às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais durante a emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus, segundo as hipóteses da Lei n. 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, para fins de compensação de tais valores com parcelas futuras de contribuições previdenciária e parafiscal devidas pela empresa.
AgInt no REsp 2.119.714-RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 12/8/2024, DJe 15/8/2024. (Info STJ 822)
Creide, empregada da Loja Comper, estava grávida na vigência da Lei 14.151/2021, que determinou o afastamento de trabalho às gestantes em razão do Covid-19.
A loja pagou os salários normalmente durante o afastamento, mas ajuizou ação por meio do qual intentava ter declarado o direito de enquadrar tais pagamentos como salário-maternidade e compensar tais valores com parcelas futuras de contribuições previdenciária e parafiscal devidas pela empresa.
R: Negativo!!!!
A controvérsia versa sobre o não enquadramento, como salário-maternidade, o valor que é pago às empregadas gestantes afastadas segundo as hipóteses da Lei n. 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, para fins de compensação com parcelas futuras de contribuição previdenciária e de contribuição parafiscal.
O Superior Tribunal de Justiça analisando caso análogo no julgamento dos REsps. 2.038.269/PR, 2.053.818/CE, 2.081.467/SC e 2.095.404/SC manifestou o entendimento de que o art. 1º da Lei 14.151/2021 determinou apenas o afastamento da gestante do trabalho presencial durante o período de emergência de saúde pública decorrente do coronavírus, não havendo falar, portanto, em suspensão ou interrupção do contrato de trabalho, mas apenas na alteração de sua forma de execução.
Desse modo, havendo o pagamento, pelo próprio empregador, de remuneração à empregada em razão direta da relação empregatícia, cujo contrato de trabalho se encontra em execução, não há como pretender compensar aquele valor com parcelas futuras de contribuição previdenciária e de contribuição parafiscal, como se salário-maternidade fosse.
Não é possível o enquadramento, como salário-maternidade, dos pagamentos realizados às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais durante a emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus, segundo as hipóteses da Lei n. 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, para fins de compensação de tais valores com parcelas futuras de contribuições previdenciária e parafiscal devidas pela empresa.
RECURSO ESPECIAL
A leitura do precedente formado no Tema n. 1.262/STF, em relação ao mandado de segurança, deve ser feita tendo em vista as ações transitadas em julgado com conteúdo condenatório, a despeito das Súmulas n. 269 e n. 271/STF e da jurisprudência do STJ que vedam, no mandado de segurança, a repetição de indébito tributário pela via dos precatórios e RPV’s.
REsp 2.135.870-SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 13/8/2024, DJe 20/8/2024. (Info STJ 822)
Uma associação impetrou Mandado de Segurança Coletivo visando ao reconhecimento do direito de seus associados recolherem as contribuições ao PIS e à COFINS excluindo de suas bases de cálculo a parcela relativa ao ICMS, bem como do direito à compensação dos valores indevidamente recolhidos, atualizados pela Taxa SELIC, tendo obtido julgamento favorável em decisão transitada em julgado.
O tribunal local também autorizou o pagamento do indébito tributário oriundo de decisão concessiva da ordem, por meio de precatório ou requisição de pequeno valor. A Fazenda Nacional discorda e alega que mandado de segurança não é substituto de ação de cobrança e não produz efeitos patrimoniais pretéritos, sendo incabível a restituição.
R: Mais ou menos…
Cinge-se a controvérsia acerca da possibilidade de restituição via precatórios de indébito tributário reconhecido em sede de mandado de segurança, à luz da interpretação do Tema n. 1.262/STF.
Alegou o ente fazendário que, ante o teor das Súmulas n. 269 e n. 271 do STF, o mandado de segurança não é substituto de ação de cobrança e não produz efeitos patrimoniais pretéritos, sendo incabível a restituição via precatórios ou requisições de pequeno valor – RPV no mandamus, não sendo permitida a expedição de precatório nos próprios autos de mandado se segurança, já que sua execução não possui natureza condenatória, e sim mandamental e imediata.
Sob o aspecto material, em matéria tributária, o mandado de segurança não pode ser utilizado como substitutivo de ação de repetição de indébito (ação de cobrança). Desta forma, a concessão da segurança, via de regra, não permite o reconhecimento de créditos do contribuinte relacionados a indébitos tributários pretéritos (quantificação) e também não permite a execução via precatórios ou requisições de pequeno valor – RPV’s. Precedentes: AgInt no REsp. n. 1.949.812-RS, Primeira Turma, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 2/10/2023; AgInt no REsp. n. 1.970.575-RS, Segunda Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 8/8/2022; Súmula n. 269/STF; Súmula n. 271/STF.
Consoante a Súmula n. 213/STJ, o mandado de segurança é meio apto a afastar os óbices formais e procedimentais ao Pedido Administrativo de Compensação tributária. Nessas condições, ele pode sim, indiretamente, retroagir, pois, uma vez afastados os obstáculos formais a uma compensação já pleiteada administrativamente (mandado de segurança repressivo), todo o crédito não prescrito outrora formalmente obstado poderá ser objeto da compensação. Do mesmo modo, se a compensação for pleiteada futuramente (mandado de segurança preventivo), todo o crédito não prescrito no lustro anterior ao mandado de segurança poderá ser objeto da compensação. Em ambas as situações, a quantificação dos créditos (efeitos patrimoniais) ficará a cargo da Administração Tributária, não do Poder Judiciário.
Quanto ao Pedido Administrativo de Ressarcimento, o mandado de segurança constitui a via adequada para o reconhecimento de créditos escriturais (fictícios, premiais, presumidos etc.) referentes a tributos sujeitos à técnica da não cumulatividade, desde que obedecido o prazo prescricional de 5 (cinco) anos. Precedentes repetitivos: REsp. n. 1.129.971-BA, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 24.2.2010; REsp. n. 1.111.148 – SP, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 24/2/2010.
Em flexibilização das Súmulas n. 269 e n. 271/STF, o mandado de segurança é meio apto a quantificar o indébito constante de Pedido Administrativo de Compensação tributária, desde que traga prova pré-constituída suficiente para a caracterização da liquidez e certeza dos créditos, não sendo admitida a repetição administrativa em dinheiro ou a repetição via precatórios. Precedentes repetitivos: REsp. n. 1.111.164-BA, Primeira Seção, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 13/5/2009 e REsp. n. 1.365.095-SP, Primeira Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 13/2/2019.
Muito embora a sentença mandamental tenha, em alguma medida, eficácia declaratória, a Súmula n. 461/STJ (“O contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”) em nenhum momento se referiu ao mandado de segurança e em nenhum momento permitiu a restituição administrativa em espécie (dinheiro).
Por tais motivos, a sua aplicação ao mandado de segurança se dá apenas mediante adaptações: 1ª) somente é possível a compensação administrativa; 2ª) jamais será permitida a restituição administrativa em (espécie) dinheiro ou; 3ª) o pagamento via precatórios/RPV.
A restituição permitida é aquela que se opera dentro do procedimento de compensação apenas já que a essa limitação se soma aqueloutra das Súmulas n. 269 e n. 271/STF, que vedam no mandado de segurança a possibilidade da restituição administrativa em espécie (dinheiro) ou via precatórios.
Os equívocos cometidos com a interpretação dessa jurisprudência foram tantos que culminaram com a necessidade de julgamento em sede de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal – STF gerando o Tema n. 1.262, sendo ali definida a seguinte tese: “Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal” (RE n. 1.420.691/SP, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 21/8/2023).
Realizado o julgamento do Tema n. 1.262/STF da repercussão geral, em não havendo notícia da expressa superação dos enunciados sumulares 269 e 271 do STF que vigem há décadas – conforme o exige o art. 927, § 4º, do CPC/2015, é de se presumir que permaneçam em vigor, devendo ser obedecidos na forma do art. 927, IV, também do CPC/2015. Assim, a leitura do precedente formado no Tema n. 1.262/STF, em relação ao mandado de segurança, deve ser feita tendo em vista as ações transitadas em julgado com conteúdo condenatório, a despeito das referidas súmulas e da jurisprudência do STJ que veda, no mandado de segurança, a repetição de indébito tributário pela via dos precatórios e RPV’s.
No caso, foi impetrado Mandado de Segurança Coletivo visando ao reconhecimento do direito de seus associados recolherem as contribuições ao PIS e à COFINS excluindo de suas bases de cálculo a parcela relativa ao ICMS, bem como do direito à compensação dos valores indevidamente recolhidos, atualizados pela Taxa SELIC, tendo obtido julgamento favorável em decisão transitada em julgado em 19 de setembro de 2018. A Corte de Origem também autorizou o pagamento do indébito tributário oriundo de decisão concessiva da ordem, por meio de precatório ou requisição de pequeno valor, o que contraria os precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
A leitura do precedente formado no Tema n. 1.262/STF, em relação ao mandado de segurança, deve ser feita tendo em vista as ações transitadas em julgado com conteúdo condenatório, a despeito das Súmulas n. 269 e n. 271/STF e da jurisprudência do STJ que vedam, no mandado de segurança, a repetição de indébito tributário pela via dos precatórios e RPV’s.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
Falta de reação enérgica da vítima e consentimento inicial não afastam o crime de estupro.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Rel. para acórdão Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por maioria, julgado em 13/08/2024, DJe 16/08/2024. (Info STJ 822)
No caso, embora inicialmente tenha a vítima consentido com o ato sexual, no curso da relação houve a negativa concreta dela em praticar o coito anal. Mesmo com expresso dissenso, e reiterados pedidos para que parasse o ato, o réu insistiu e, exercendo força física, caracterizada por continuar introduzindo o pênis com força, segurar a vítima e colocar o peso do seu corpo sobre o dela, obteve o seu intento.
A defesa do denunciado alega que a falta de uma reação mais enérgica da vítima afastaria o crime.
Código Penal:
Estupro
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:
Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
R: Era só o que faltava!!!!
A controvérsia reside na análise da presença dos requisitos necessários para a caracterização do crime previsto no art. 213 do Código Penal.
O delito de estupro tutela a liberdade sexual de qualquer pessoa, consistente na possibilidade de escolher livremente com quem e quando manter relações sexuais. O constrangimento configurador do núcleo do tipo do crime pode se dar mediante violência ou grave ameaça. E, no caso em exame, a violência ficou configurada pelo uso de força física para vencer a resistência da vítima apresentada por meio do seu dissenso explícito e reiterado para com o coito anal.
É certo que o dissenso da vítima é fundamental para a caracterização do delito. Portanto, a discordância da ofendida precisa ser capaz de demonstrar sua oposição ao ato sexual. Além disso, a concordância e o desejo inicial têm que perdurar durante toda a atividade sexual, pois a liberdade sexual pressupõe a possibilidade de interrupção do ato sexual. O consentimento anteriormente dado não significa que a outra pessoa possa obrigá-la à continuidade do ato sexual. Se um dos parceiros decide interromper a relação sexual e o outro, com violência ou grave ameaça, obriga a desistente a continuar, haverá a configuração do estupro.
No caso, embora inicialmente tenha a vítima consentido com o ato sexual, no curso da relação houve a negativa concreta dela em praticar o coito anal e, mesmo assim, com expresso dissenso, e reiterados pedidos para que parasse o ato, o réu ignorou o pleito e, exercendo força física, aqui caracterizada por continuar introduzindo o pênis com força, segurar a vítima e colocar o peso do seu corpo sobre o dela, persistiu até obter o seu intento. Ou seja, o acusado, mesmo ciente da discordância expressa da vítima, continuou a relação sexual mediante uso da força física.
Quanto à ausência de resistência mais severa, o dispositivo do Código Penal que tipifica o delito de estupro não exige determinado comportamento ou forma de resistência da vítima. Exige sim, implicitamente, o DISSENSO, o que deveria ter sido respeitado prontamente.
Identifica-se aqui, semelhante ao que ocorreu no caso julgado por esta Corte (REsp n. 2.005.618/RJ), a tentativa de camuflar a discriminação contra as mulheres com a suposta necessidade de um rigoroso standart probatório, inexistente para outras modalidades de crimes, a exemplo da exigência de resistência física enérgica ou heroica, da desqualificação moral da vítima, do desvalor do depoimento da ofendida, dentre outros.
Assim, o fato de a vítima não ter reagido física ou ferozmente não exclui o crime, já que houve o dissenso claro, inclusive, reiterado. Aliás, tampouco o fato de a vítima, por fim, ter se submetido ao ato, esperando terminar, afasta o crime violento perpetrado, se demonstrada a expressa discordância. A (relativa) passividade, após a internalização de que a resistência ativa não será capaz de impedir o ato, não é, por diversos fatores, incomum em delitos dessa natureza.
Se as relações humanas fossem como a ciência exata da matemática ou vivêssemos em tempos passados, talvez, e ainda somente talvez, pudéssemos pensar em excluir a prática de crime tão violento por simples trocas posteriores de mensagens ou, quem sabe, pelo fato de a vítima não ter forças ou não aguentar mais resistir à brutalidade a que está sendo submetida e parar de reagir e somente torcer para que a violência chegasse logo ao fim. Mas a realidade é muito mais complexa. A conclusão pela não caracterização do delito não pode decorrer de atitudes posteriores de quem foi ofendida e que, possivelmente, ainda que de forma inconsciente, pode estar buscando mecanismos para diminuir o peso errôneo da culpa ou mesmo sobreviver mental e fisicamente à violência a que fora exposta.
Por fim, o Tribunal de origem, ao desacreditar a palavra da vítima em função de seu comportamento posterior e indicar a inexistência de testemunhas presenciais, afastou-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, há muito consolidada, de que o depoimento da vítima, em crimes sexuais, possui especial valor probante, notadamente no caso concreto em que há inúmeros outros relatos de outras ofendidas que suportaram semelhante modus operandi.
Falta de reação enérgica da vítima e consentimento inicial não afastam o crime de estupro.
HABEAS CORPUS
O fornecimento de perfil genético, nos termos do art. 9º-A da Lei de Execução Penal, não constitui violação do princípio da vedação à autoincriminação, configurando falta grave a recusa.
HC 879.757-GO, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 20/8/2024. (Info STJ 822)
Craudião, apenado, recusou-se a fornecer amostra para identificação de perfil genético, o que foi considerado como falta grava pelo juiz da execução penal. Em recurso, sua defesa alega que tal obrigação, sem uma apuração por crime cometido pelo apenado, configuraria violação do princípio da vedação à autoincriminação.
Lei de Execução Penal:
Art. 9º-A. O condenado por crime doloso praticado com violência grave contra a pessoa, bem como por crime contra a vida, contra a liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável, será submetido, obrigatoriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA (ácido desoxirribonucleico), por técnica adequada e indolor, por ocasião do ingresso no estabelecimento prisional.
§ 8º Constitui falta grave a recusa do condenado em submeter-se ao procedimento de identificação do perfil genético.
Art. 50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:
III – possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem;
Estupro de vulnerável
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
R: Yeap!!!
Nos termos do art. 9º-A da Lei de Execução Penal, com redação dada pela Lei n. 13.964/2019, o condenado por crime doloso praticado com violência grave contra a pessoa, bem como por crime contra a vida, contra a liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável, será submetido, obrigatoriamente à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA (ácido desoxirribonucleico), por técnica adequada e indolor, por ocasião do ingresso no estabelecimento penal.
Ninguém será obrigado a produzir elementos de prova contra si mesmo. Decorrente do direito ao silêncio, previsto no art. 5º, LXIII, da Constituição Federal, o referido princípio também tem sede convencional, especialmente no art. 8º, 2, g, da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), incorporado ao direito brasileiro pelo Decreto n. 678/1969.
No entanto, esse direito, de enorme importância no ordenamento jurídico encontra limitações. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a configuração do delito de desobediência diante de ordem de parada de policiamento ostensivo, concluiu que eventual evasão não encontra no princípio da vedação da autoincriminação compulsória uma excludente (Tema 1060).
Nessa linha, a vedação à autoincriminação compulsória faculta aos acusados não realizar o teste de alcoolemia, permanecer em silêncio quando convocado a depor, mesmo que na condição de testemunha, se e quando seu testemunho puder lhe incriminar, não fornecer padrões vocais ou gráficos para perícia e comparação com gravações telefônicas ou documentos obtidos em investigações.
Tais precedentes demonstram que o momento em que exigida a conduta indica a incidência ou não do referido princípio. Se a conduta determinada pela Lei impele alguém a, em razão de investigação, produzir elemento contrário ao seu interesse pela liberdade, há violação da vedação à autoincriminação; mas, ausente investigação sobre suposto crime, não há falar em violação do princípio da autoincriminação. Portanto, não há falar em obrigatoriedade da produção de provas de crime ainda não ocorrido, futuro e incerto.
Assim, não havendo fato definido como crime em apuração, o fornecimento do perfil genético não configura exigência de produção de prova contra o apenado. Tal exigência prevista na lei de execução busca recrudescer o caráter de prevenção especial negativo da pena
A determinação do art. 9º-A da Lei de Execução Penal não constitui violação do princípio da vedação à autoincriminação compulsória (nemo tenetur se detegere). A referida obrigatoriedade constitui procedimento de classificação, individualização e identificação. A identificação do perfil genético é uma ampliação da qualificação do apenado possível graças ao avanço da técnica, podendo ser utilizado como elemento de prova para elucidação de crimes futuros.
Desse modo, não se vislumbra ilegalidade na determinação de fornecimento do perfil genético do reeducando, condenado pelo delito do art. 217-A do Código Penal, não sendo possível recusar o fornecimento em razão de eventual futuro e incerto cometimento de crime, constituindo falta grave a recusa, nos termos dos arts. 9-A, § 8º, e 50, VIII, da Lei de Execução Penal.
O fornecimento de perfil genético, nos termos do art. 9º-A da Lei de Execução Penal, não constitui violação do princípio da vedação à autoincriminação, configurando falta grave a recusa.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
Concedida a liberdade provisória mediante imposição de cautelares diversas da prisão, é lícita a segregação superveniente, desde que observado o comando do art. 312, § 2º, do Código de Processo Penal.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 7/5/2024, DJe 10/5/2024. (Info STJ 822)
Creitinho foi abordado por um crime de trânsito. O juiz concedeu a liberdade provisória mediante imposição de cautelares diversas da prisão. Porém, vieram aos autos informações relevantes, tais como o laudo pericial que estimou a velocidade cerca de três vezes superior à da via (em desconformidade com as alegações de Creitinho em sede policial); relato de testemunhas oculares de ingestão alcoólica (fato também não narrado em sede policial); inconsistências havidas no momento do acidente veicular que findaram por contradizer o depoimento inicialmente prestado; registros infracionais administrativos prévios atribuídos a Creitinho não narrados na primeira abordagem; e possível influência na coleta de depoimentos de testemunhas. Em razão disso, foi revogada a liberdade provisória inicialmente concedida.
R: Obviamente!!!!
O ordenamento jurídico vigente, em atenção ao princípio da presunção da inocência, consagra a liberdade do indivíduo como regra. Desse modo, a prisão revela-se cabível tão somente quando estiver concretamente comprovada a existência do periculum libertatis, sendo impossível o recolhimento de alguém ao cárcere caso se mostrem inexistentes os pressupostos autorizadores da medida extrema, previstos na legislação processual penal.
Ou seja, “Para a decretação da prisão preventiva, é indispensável a demonstração da existência da prova da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes da autoria. Exige-se, mesmo que a decisão esteja pautada em lastro probatório, que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato (art. 312 do CPP), demonstrada, ainda, a imprescindibilidade da medida” (AgRg no HC 880.538/SP, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 2/5/2024).
Nos termos do art. 282, §5º do CPP: “O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”
De fato, o permanente escrutínio exercido pelo magistrado é nota típica das medidas cautelares, sejam elas as diversas da prisão, seja ela a segregativa, a se permitir afirmar que “a decisão que decreta a prisão cautelar é uma decisão tomada rebus sic stantibus, pois está sempre sujeita a nova verificação de seu cabimento, quer para eventual revogação, quando cessada a causa ou o motivo que a justificou, quer para sua substituição por medida menos gravosa, na hipótese em que seja esta última suficientemente idônea (adequada) para alcançar o mesmo objetivo daquela” (HC 585.882/CE, rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 01/10/2020).
Não há falar, portanto, em preclusão do comando que decidiu pelo cabimento das cautelares diversas do encarceramento provisório, assim como não há imutabilidade intraprocessual do decisum que decreta a prisão preventiva.
Há, contudo, entendimento pacífico no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o provimento recursal de que resulte a revogação da liberdade provisória funda contexto decisório excepcional e se investe de caráter inovador em favor do investigado. Novo decreto segregatório deve, portanto, indicar a existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem o recurso à mais drástica das cautelares (HC 435.611/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 30/5/2018).
A jurisprudência do STJ garante que, uma vez concedida a liberdade provisória mediante imposição de cautelares diversas da prisão, eventual segregação superveniente há de atentar ao comando do art. 312, § 2º, do Código de Processo Penal, que dispõe que “A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada”.
Não há, destarte, vedação a tal tipo de decisão ou restrição jurídico-material que imponha que só ocorra se houver violação das medidas cautelares. Há, isso sim, exigência de que se aponte, motivada e fundamentadamente, elementos que indiquem “receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada.”
No caso, tais eventos podem ser assim sumarizados: o advento de laudo pericial do local que estimou velocidade cerca de três vezes superior à da via (em desconformidade com as alegações do paciente em sede policial); relato de testemunhas oculares de ingestão alcoólica prévia (fato também não narrado em sede policial); inconsistências havidas no momento do acidente veicular que findaram por contradizer o depoimento inicialmente prestado; registros infracionais administrativos prévios atribuídos ao paciente não narrados na primeira abordagem; e possível influência na coleta de depoimentos de testemunhas.
Assim, observa-se restar incontroverso que a imposição da segregação cautelar apoiou-se em fatos supervenientes, contudo, contemporâneos ao evento apontado como delitivo, os quais foram reputados como descobertos após as primeiras decisões que trataram da temática do acautelamento.
Concedida a liberdade provisória mediante imposição de cautelares diversas da prisão, é lícita a segregação superveniente, desde que observado o comando do art. 312, § 2º, do Código de Processo Penal.
PROCESSO EM SEGREDO DE JUSTIÇA
A intenção normativa do art. 252, inciso III, do CPP impede que o mesmo julgador, seja em razão do deslocamento do próprio magistrado ou da ação penal, prolate uma decisão e, posteriormente, em sede recursal, a reexamine.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 20/8/2024. (Info STJ 822)
Tibúrcio, político eleito, teve contra si ação penal que tramitou inicialmente perante o Tribunal de Justiça, que então exercia competência originária, em razão de foro por prerrogativa de função. Posteriormente, em decorrência da renúncia do cargo por Tibúrcio, o feito foi remetido ao juízo de 1º Grau, responsável por prolatar a sentença condenatória. Em seguida a ação penal retornou ao Tribunal de origem, agora em virtude da competência recursal.
Os desembargadores que já haviam analisado o processo não se declararam como impedidos, o que motivou recurso pela defesa de Tibúrcio.
Código de Processo Penal:
Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que:
I – tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
II – ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha;
III – tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;
IV – ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.
Art. 253. Nos juízos coletivos, não poderão servir no mesmo processo os juízes que forem entre si parentes, consangüíneos ou afins, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive.
R: Sim sinhô!!!!
O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacificado no sentido de que o rol de impedimentos previsto nos artigos 252 e 253, do Código de Processo Penal, é taxativo. Nessa linha de intelecção, para que se configure a hipótese de impedimento prevista no art. 252, III, do CPP, é necessário que o julgador tenha funcionado, no mesmo processo, como “juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão”. Precedente: AgRg no HC 761.201/CE, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 18/10/2022.
Portanto, a lei processual veda que o mesmo magistrado se debruce sobre idêntica questão, em instâncias diferentes, situação, de fato, não configurada na hipótese em que há o deslocamento da ação penal, na qual os julgadores permaneceram em sua respectiva instância. No caso, a ação tramitou inicialmente perante o Tribunal de Justiça, que então exercia competência originária, em razão de foro por prerrogativa de função, e, posteriormente, em decorrência do declínio da competência em razão de renúncia do cargo, foi remetida ao juízo de 1º Grau, responsável por prolatar a sentença que condenou o acusado. Em seguida a ação penal retornou ao Tribunal de origem, agora em virtude da competência recursal.
Assim, embora, no caso, o declínio da competência para julgar a ação penal tenha ocorrido antes da prolação de sentença, não é possível afirmar que não houve pronunciamento de fato ou de direito sobre a questão pelos Desembargadores, porquanto, em razão do foro por prerrogativa de função, o Tribunal de origem foi o órgão responsável por receber a denúncia oferecida pelo Parquet e por analisar todas as medidas cautelares submetidas à cláusula de reserva de jurisdição pleiteadas em desfavor do sentenciado.
Nesse contexto, caso a apelação interposta fosse efetivamente apreciada pelo mesmo órgão fracionário do Tribunal a quo, os julgadores se debruçariam sobre as mesmas questões de fato e de direito na instrução processual originária e em seu respectivo recurso, o que representaria o esvaziamento indireto do princípio do duplo grau de jurisdição.
Portanto, embora a situação em exame não se subsuma direta e imediatamente ao disposto no art. 252, inciso III, do CPP, tem-se como inevitável reconhecer o impedimento dos Desembargadores que atuaram na ação inicialmente. Isso porque o julgador não deve se limitar à interpretação literal do dispositivo legal, cabendo-lhe também agregar interpretação teleológica e sistemática às normas para aquilatar o exato alcance do texto legal.
A intenção normativa do art. 252, inciso III, do CPP impede que o mesmo julgador, seja em razão do deslocamento do próprio magistrado ou da ação penal, prolate uma decisão e, posteriormente, em sede recursal, a reexamine.
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