Informativo nº 774 do STJ COMENTADO saindo do forno (quentinho) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!
RECURSO ESPECIAL
O termo inicial dos juros de mora, em ação de cobrança de valores pretéritos ao ajuizamento de anterior mandado de segurança que reconheceu o direito, é a data da notificação da autoridade coatora no mandado de segurança, quando o devedor é constituído em mora (arts. 405 do Código Civil e 240 do CPC).
REsp 1.925.235-SP, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 10/5/2023 (Tema 1133). (Info 774)
Policiais militares inativos ajuizaram uma ação em face do Estado de São Paulo e São Paulo Previdência – SPPREV, objetivando o pagamento das parcelas referentes ao Adicional Local de Exercício – ALE, no período que antecedeu à impetração de Mandado de Segurança Coletivo em que se reconheceu o direito à incorporação da verba aos proventos de aposentadoria e pensões.
A sentença julgou o pedido procedente e reconheceu o direito ao pagamento do Adicional em questão, no período pleiteado, fixando o termo inicial dos juros de mora a partir da citação dos réus, na ação de cobrança. Inconformados, os policiais interpuseram recurso no qual sustentam que o termo inicial dos juros de mora deve ser fixado na data da notificação da autoridade coatora do mandado de segurança que a embasou.
Código Civil:
Art. 405. Contam-se os juros de mora desde a citação inicial.
CPC2015:
Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil) .
§ 1º A interrupção da prescrição, operada pelo despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data de propositura da ação.
§ 2º Incumbe ao autor adotar, no prazo de 10 (dez) dias, as providências necessárias para viabilizar a citação, sob pena de não se aplicar o disposto no § 1º.
§ 3º A parte não será prejudicada pela demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário.
§ 4º O efeito retroativo a que se refere o § 1º aplica-se à decadência e aos demais prazos extintivos previstos em lei.
R: A data da notificação no MS!!!!
A controvérsia consiste em definir se o termo inicial dos juros de mora, em ação de cobrança de valores pretéritos ao ajuizamento de anterior mandado de segurança, deve ser contado a partir da citação, na ação de cobrança, ou da notificação da autoridade coatora, quando da impetração do mandado de segurança.
O pressuposto básico para configuração da mora é a viabilidade no cumprimento da obrigação: em que pese a impossibilidade transitória de satisfazê-la, a prestação ainda é possível e útil.
Na questão jurídica posta incide a mora solvendi, uma vez que é concernente ao não pagamento, pelo Estado de São Paulo, de Adicional de Local de Exercício – ALE, devido a policiais militares inativos, no caso, no período que antecedeu à impetração da ação mandamental coletiva, na qual foi reconhecido o direito. Tem-se, portanto, obrigação de natureza positiva e ilíquida, exigível por força de decisão judicial.
A impetração de mandado de segurança repercutirá na ação de cobrança sob os seguintes aspectos: I) interromperá o prazo prescricional para ajuizamento do feito; II) delimitará o pedido formulado, a partir do quinquênio que antecedeu à propositura do writ, e III) constituirá em mora o devedor.
A partir do regramento previsto para a constituição em mora do devedor, nas obrigações ilíquidas (art. 405 do Código Civil c/c art. 240 do CPC/2015), extrai-se que a notificação da autoridade coatora em mandado de segurança cientifica formalmente o Poder Público do não cumprimento da obrigação (mora ex persona). É, portanto, irrelevante, para fins de constituição em mora, a via processual eleita, pelo titular do direito, para pleitear a consecução da obrigação.
Desse modo, em se tratando de ação mandamental, cujos efeitos patrimoniais pretéritos deverão ser reclamados administrativamente, ou pela via judicial própria (Súmula 271/STF), a mora é formalizada pelo ato de notificação da autoridade coatora, sem prejuízo da posterior liquidação do quantum debeatur da prestação.
No ponto, cumpre esclarecer que a aludida limitação sumular apenas tem por escopo obstar o manejo do writ of mandamus como substitutivo da ação de cobrança (Súmula 269/STF), em nada interferindo na aplicação da regra de direito material referente à constituição em mora, a qual ocorre uma única vez, no âmbito da mesma relação obrigacional.
A citação válida da Fazenda Pública, entre outros efeitos, tem o condão de constituí-la em atraso no tocante ao direito que a parte autora entende titularizar (art. 405 do Código Civil de 2002), sendo desimportantes as eventuais limitações impostas pelo meio processual eleito para fazer valer, concretamente, o bem jurídico em discussão. Entender de modo contrário implicaria admitir que o instrumento processual manejado (no caso, ação de cobrança) é o parâmetro adequado para a fixação do termo inicial dos respectivos juros de mora, em detrimento do arcabouço normativo previsto pelo Código Civil de 2002, o qual, via de regra, considera a natureza da obrigação para a constituição formal do devedor em mora.
Portanto, em relação às parcelas pretéritas, cujo direito foi reconhecido, na via mandamental, o termo inicial dos juros de mora, na ação de cobrança, deve ser fixado na data da notificação da autoridade coatora, pois é o momento em que, nos termos do art. 405 do Código Civil c/c art. 240 do Diploma Processual, houve a interrupção do prazo prescricional e a constituição em mora do devedor.
O termo inicial dos juros de mora, em ação de cobrança de valores pretéritos ao ajuizamento de anterior mandado de segurança que reconheceu o direito, é a data da notificação da autoridade coatora no mandado de segurança, quando o devedor é constituído em mora (arts. 405 do Código Civil e 240 do CPC).
PROCESSO SOB SEGREDO DE JUSTIÇA
A norma do art. 36, III, “b”, da Lei n. 8.112/1990 não pode ser aplicada de maneira subsidiária aos membros do Ministério Público da União.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 9/5/2023. (Info 774)
Creide, membro do MPU lotada no interior de certo estado, teve um filho diagnosticado com autismo severo. Em razão disso, solicitou remoção para sua cidade natal, local que oferece diversas opções de terapia e acompanhamento do filho. Creide sustenta que o direito à remoção por motivos de saúde do dependente está previsto no art. 36, III, “b” da Lei 8.112/1990. Alega que o referido dispositivo legal seria aplicável aos membros do MPU.
Processo sob segredo de justiça. Caso imaginado.
Lei n. 8.112/1990:
Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
III – a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:
a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração
b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;
LC n. 75/1993 :
Art. 287. Aplicam-se subsidiariamente aos membros do Ministério Público da União as disposições gerais referentes aos servidores públicos, respeitadas, quando for o caso, as normas especiais contidas nesta lei complementar.
Constituição Federal:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
R: Nooops!!!!
O art. 36, III, “b”, da Lei n. 8.112/1990 disciplina a possibilidade de o servidor público federal ser removido a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração, por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial.
A pretensão de aplicação subsidiária da referida norma aos membros do Ministério Público da União se assenta no argumento de que o disposto no art. 287, caput, da LC n. 75/1993 assegura que “aplicam-se subsidiariamente aos membros do Ministério Público da União as disposições gerais referentes aos servidores públicos, respeitadas, quando for o caso, as normas especiais contidas nesta lei complementar”.
Todavia, a partir da leitura do próprio art. 287, caput, da LC n. 75/1993, tem-se que a aplicação do Estatuto dos Servidores Públicos Federais em relação aos membros do Ministério Público somente pode ocorrer quando a legislação desta última carreira mencionada não preveja instituto próprio para solucionar a questão jurídica controvertida.
A LC n. 75/1993, posterior à Lei n. 8.112/1990 (que se pretende aplicar subsidiariamente), poderia ter criado o direito à remoção nessas hipóteses, mas optou por tratar da questão mediante instituto próprio (a licença), devendo prevalecer tal previsão especial.
Além disso, o número de agentes de poder que gozam de inamovibilidade (a exemplo dos membros do MP e os magistrados) é sempre inferior ao de servidores que compõem as carreiras de apoio, fora o fato de que aqueles necessariamente desempenham as atribuições de chefia e gestão. Assim, os impactos de uma remoção de ofício em relação aos promotores, procuradores e magistrados são muito maiores em termos logísticos do que aqueles gerados pela remoção de ofício de um servidor, a justificar a diferença de tratamento legal: para os primeiros reservou-se o direito do gozo de licença; para os segundos o direito à remoção em si.
Ainda, se se entender que o art. 36 da Lei n. 8.112/1990 pode ser aplicado subsidiariamente, nos casos em que o procurador tiver como cônjuge servidor e esse for removido de ofício (art. 36, III, “a”), o primeiro também terá direito à remoção, ampliando-se bastante as hipóteses de remoção de membro de poder, em detrimento da organização do serviço público e da criteriosa lista de antiguidade.
É lícito concluir que a omissão na lei própria do MPU a respeito da remoção para tratamento de saúde de familiar não se tratou de omissão atécnica do legislador, mas caso de silêncio eloquente/opção nesse aspecto.
R: Não é bem assim…
Colhe-se do caso concreto que a recorrida se encontra removida para tratar filho menor (com autismo) desde 2016, constando ainda do acórdão recorrido que foi produzida vasta e incontroversa prova no sentido de que: (a) o infante deve permanecer no local onde iniciou as terapias relacionadas ao autismo e manter seu convívio familiar, social, terapêutico e escolar, o mais estruturado possível, sem alterações significativas; (b) quaisquer variações no ambiente de vivência do menor, mesmo que mínimas, reverberam sobejamente na progressão/regressão da doença, dada a sua sensibilidade psicológica; (c) a cidade de lotação originária da autora não dispõe de quadro de profissionais que pudessem atender às necessidades da criança; (d) ficou evidenciada a extrema importância da presença da mãe junto à criança para que essa apresente desenvolvimento saudável, bem como os impactos negativos, com comprometimento de sintomas e do processo de desenvolvimento, em caso de ausência da genitora; e (e) poderia haver prejuízos à criança em caso de mudança de domicílio, com afastamento de outros familiares, pois o filho da recorrida estaria saindo do “seu mundo autista, para ele intocável e só dele, para algo diferente e estranho onde o processo de socialização será afetado de forma brutal, acarretando prejuízo na possível melhora de seus sintomas e um prognóstico reservado”.
Todo esse contexto demonstra que, a despeito de a tese jurídica defendida pela União ser a correta, no caso concreto, a restauração da estrita legalidade, com a mudança da autora e do filho (pessoa com deficiência) para a lotação de origem ocasionaria muito mais danos sociais que a manutenção da situação consolidada (teoria do fato consumado/consolidado).
O STJ entende que em demandas envolvendo interesse de criança, como no caso, a solução da controvérsia deve sempre observar o princípio do melhor interesse do menor, introduzido em nosso sistema jurídico como corolário da doutrina da proteção integral, consagrada pelo art. 227 da Constituição Federal, o qual deve orientar a atuação tanto do legislador quanto do aplicador da norma jurídica, vinculando-se o ordenamento infraconstitucional aos seus contornos (STJ, HC 776.461/SC, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 29/11/2022, DJe 1º/12/2022).
A norma do art. 36, III, “b”, da Lei n. 8.112/1990 não pode ser aplicada de maneira subsidiária aos membros do Ministério Público da União.
PROCESSO SOB SEGREDO DE JUSTIÇA
Não há usurpação de competência do Tribunal de Justiça local quanto à supervisão de investigação contra detentor de prerrogativa de foro no âmbito de inquéritos civis e ações de improbidade administrativa.
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 24/4/2023, DJe 27/4/2023. (Info 774)
Membro do MP instaurou Procedimento Preparatório para apurar irregularidades configuradoras de improbidade administrativa supostamente cometidas pelo prefeito local. Expirado o prazo de vigência do referido procedimento, este foi convertido em Inquérito Civil Público.
O prefeito acusado afirma que a denúncia que culminou em sua condenação pela prática do delito previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/1993 foi oferecida sem prévia instauração de inquérito policial (IP) ou de procedimento investigatório criminal (PIC), tendo sido instruída com a cópia do referido Inquérito Civil Público, em uma manobra processual para se usurpar a competência do Tribunal de Justiça local na supervisão das investigações, em violação ao princípio do juiz natural.
R: Nooops!!!!!
A controvérsia consiste em definir se houve usurpação de competência do Tribunal de Justiça local ao não determinar a instauração de inquérito policial (ou procedimento de investigação criminal) em investigação para apurar suposto ato de improbidade administrativa praticado por prefeito – detentor de prerrogativa de foro.
No caso, o representante ministerial instaurou Procedimento Preparatório para apurar irregularidades configuradoras de improbidade administrativa. Expirado o prazo de vigência do referido procedimento, este foi convertido em Inquérito Civil Público.
No entanto, o acusado reafirma que a denúncia que culminou em sua condenação pela prática do delito previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/1993 foi oferecida sem prévia instauração de inquérito policial (IP) ou de procedimento investigatório criminal (PIC), tendo sido instruída com a cópia do referido Inquérito Civil Público, em uma manobra processual para se usurpar a competência do Tribunal de Justiça local na supervisão das investigações, em violação ao princípio do juiz natural.
De fato, a inicial acusatória, que deu origem à Ação Penal, não foi precedida de prévia instauração de IP ou de PIC. Apoiou-se em elementos extraídos no Inquérito Civil Público.
Em que pese as razões do acusado, é plenamente legítimo “o oferecimento de denúncia com escólio em inquérito civil público” (APn 527/MT, relatora Ministra Eliana Calmon, Corte Especial, julgado em 6/3/2013, DJe de 17/4/2013), não sendo o inquérito policial ou o procedimento investigativo criminal pressuposto necessário à propositura da ação penal.
Portanto, embora o investigado exercesse cargo com foro privilegiado, não havia nenhum ato de investigação criminal iniciado na origem, mas apenas o inquérito de natureza civil. Não havendo que se falar, até aquele momento, em usurpação da competência do Tribunal de Justiça local quanto à supervisão da investigação, uma vez que “não existe foro privilegiado por prerrogativa de função para o processamento e julgamento da ação civil pública de improbidade administrativa” (AgRg na AIA 32/AM, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, DJe 13/5/2016).
Não há usurpação de competência do Tribunal de Justiça local quanto à supervisão de investigação contra detentor de prerrogativa de foro no âmbito de inquéritos civis e ações de improbidade administrativa.
RECURSO ESPECIAL
É possível o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação na hipótese de danos individuais decorrentes do exercício de atividade de exploração de potencial hidroenergético causadora de impacto ambiental, em virtude da caracterização do acidente de consumo.
REsp 2.018.386-BA, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 10/5/2023, DJe 12/5/2023. (Info 774)
Crementina, pescadora, ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais em face de Vetor Energias em virtude da ocorrência de supostos danos causados em razão da instalação de Usina Hidrelétrica.
Na ação, alegou que a atividade desenvolvida pelas sociedades empresárias de produção de energia elétrica, apresenta defeito que ultrapassa os limites do ato de exploração de potencial hidroelétrico a ponto de causar danos materiais e morais em razão do impacto causado no desenvolvimento da atividade pesqueira e de mariscagem.
Ao julgar o tema, o Tribunal local entendeu pela não aplicabilidade do CDC e pela competência de uma das varas cíveis do local, em vez de uma das varas de relação de consumo.
Código de Defesa do Consumidor:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final,
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.
CC/2002:
Art. 83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:
I – as energias que tenham valor econômico;
R: Yeaph!!!!
A controvérsia consiste em definir o juízo competente para processar e julgar ação de indenização por danos materiais e morais em virtude da ocorrência de supostos danos decorrentes de atividade de exploração de complexo hidroelétrico, o que demanda que se verifique se as vítimas de supostos danos podem ser consideradas consumidores por equiparação (bystander).
Na hipótese, sustenta-se que a atividade desenvolvida pelas sociedades empresárias de produção de energia elétrica, apresenta defeito que ultrapassa os limites do ato de exploração de potencial hidroelétrico a ponto de causar danos materiais e morais em razão do impacto causado no desenvolvimento da atividade pesqueira e de mariscagem.
O conceito de consumidor está previsto no art. 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que o define como toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
A legislação consumerista, ao tratar da responsabilidade pelo fato do produto e do serviço, ampliou o conceito para abranger todas as vítimas do evento danoso. Trata-se da figura do consumidor por equiparação (bystander), prevista no art. 17 do CDC.
A equiparação, no entanto, aplica-se apenas nas hipóteses de fato do produto ou serviço, nas quais, segundo a doutrina, “a utilização do produto ou serviço é capaz de gerar riscos à segurança do consumidor ou de terceiros, podendo ocasionar um evento danoso, denominado de ‘acidente de consumo'”.
Como já entendeu o STJ, “o defeito (arts. 12 a 17 do CDC) está vinculado a um acidente de consumo, um defeito exterior que ultrapassa o objeto e provoca lesões, gerando risco à segurança física e psíquica do consumidor. O vício (arts. 18 a 25 do CDC), por sua vez, causa prejuízo exclusivamente patrimonial e é intrínseco ao produto ou serviço, tornando-o impróprio para o fim que se destina ou diminuindo-lhe as funções, mas sem colocar em risco a saúde ou segurança do consumidor” (AgRg no REsp 1.000.329/SC, Quarta Turma, julgado em 10/8/2010, DJe 19/8/2010).
No âmbito jurisprudencial, o STJ admite, nos termos do art. 17 do CDC, a existência da figura do consumidor por equiparação nas hipóteses de danos ambientais.
Desse modo, na hipótese de danos individuais decorrentes do exercício de atividade empresarial destinada à fabricação de produtos ou prestação de serviços, é possível, em virtude da caracterização do acidente de consumo, o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação, o que atrai a incidência das disposições do Código de Defesa do Consumidor.
Observa-se, não obstante, que os danos alegados decorrem do processo de produção de energia elétrica como um todo, isto é, da própria atividade desenvolvida, o que, a teor dos arts. 12 e 14 do CDC, é suficiente para atrair a disciplina normativa da responsabilidade por fato do produto ou do serviço e a caracterização da figura do consumidor por equiparação.
Não se pode olvidar, nesse contexto, que a atividade empresarial desenvolvida, na espécie, destina-se à produção de um verdadeiro produto, pois, nos termos do inciso I do art. 83 do CC/2002, as energias que tenham valor econômico possuem natureza jurídica de bem móvel.
Além disso, pouco ou nada importa perquirir se a energia produzida é utilizada pelas próprias rés, se é distribuída ao cidadão como usuário final ou se é entregue a alguma entidade da Administração Pública para posterior distribuição. Isso porque, em qualquer das hipóteses, observa-se que as recorridas exploram o complexo hidroelétrico em prol da atividade empresarial por elas desenvolvida.
É possível o reconhecimento da figura do consumidor por equiparação na hipótese de danos individuais decorrentes do exercício de atividade de exploração de potencial hidroenergético causadora de impacto ambiental, em virtude da caracterização do acidente de consumo.
RECURSO ESPECIAL
O direito de tapagem disposto do art. 1.297 do Código Civil prevê o direito ao compartilhamento de gastos decorrentes da construção de muro comum aos proprietários lindeiros.
REsp 2.035.008-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 2/5/2023, DJe 5/5/2023. (Info 774)
Virso adquiriu uma casa ao lado do imóvel de Nirso. Ocorre que a divisa dos imóveis era demarcada por uma simples cerca. Virso, rapaz que prefere uma privacidade maior, resolveu construir um muro na divisória dos imóveis, ato contra o qual não se opôs Nirso.
Construído o muro, Virso resolveu cobrar 50% do valor dos gastos de seu vizinho. Este não concordou com o pagamento, pois nada fora acordado previamente. Inconformado, Virso ajuizou ação de cobrança, mas o TJ local entendeu que só caberia o pagamento se comprovada a anuência anterior.
CC:
Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas.
§ 1 o Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e conservação.
R: Yeaph!!!!
Cinge-se a controvérsia a determinar se é necessário o prévio acordo de vontades para que o proprietário de imóvel confinante possa ser compelido a concorrer para as despesas de construção de tapumes divisórios.
Se o tapume é feito na divisa, a presunção legal é de que é comum e não particular (CC, art. 1.297, § 1º). O interesse do que fez o tapume nada tem que ver com a intenção do confrontante de adquirir-lhe ou não a meação. O seu interesse é o de receber a metade das despesas a que o seu confrontante está obrigado por expressa disposição de lei. Aceitar a tese de que, construindo o tapume sem prévio acordo ou sem sentença, a parte estaria renunciando ao direito ao ressarcimento que a lei lhe assegura, equivale a presumir uma doação de seu direito, ao vizinho. Mas doação é negócio SOLENTE, que não se pode presumir, por isso mesmo.
É claro que, tomando a iniciativa unilateral de erguer o muro ou a cerca, correrá a parte o risco de ver sua obra impugnada pelo vizinho, quanto a custo e natureza, na contestação do feito, ao ensejo em que postular a indenização pela metade dos gastos. Mas, se a prova acabar por demonstrar que o tapume foi normalmente feito segundo as posturas municipais ou os costumes do lugar, e por custo razoável, só mesmo por um capricho ou um formalismo injustificável será possível negar ao autor o reembolso da metade das despesas feitas. De acordo com a doutrina, é o condomínio forçado estabelecido sobre as obras de confins de prédios contíguos, o que justifica a obrigação dos proprietários em contribuir com as despesas do tapume comum.
Adotar-se o entendimento diverso significaria tornar letra morta o dispositivo citado. O dever jurídico só existiria caso houvesse o acordo e, existente este, seria o bastante, supérflua a norma legal. O anterior concerto servirá para que se tenha como indiscutível que as obras são necessárias e para fazer incontroverso o respectivo valor. Se o confinante, entretanto, se opõe à realização de trabalhos de conservação, efetivamente reclamados, não será só por isso que ficará livre de concorrer para as despesas. Não se terá, porém, como indispensável, deixando ao alvedrio da parte concorrer ou não para a construção e conservação das cercas.
O direito de tapagem disposto do art. 1.297 do Código Civil prevê o direito ao compartilhamento de gastos decorrentes da construção de muro comum aos proprietários lindeiros.
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
A existência de cláusula/contrato de seguro relacionado à cédula de crédito rural não retira os atributos de exequibilidade próprios do título.
AgInt no AREsp 2.144.537-GO, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/4/2023, DJe 20/4/2023. (Info 774)
Banco Brasa firmou cédula rural pignoratícia com Creosvaldo. No título, constava que, ocorrendo a inadimplência da parte segurada, o Banco poderia acionar o seguro e pleitear a liquidação do sinistro a fim de receber a indenização e liquidar o débito, ainda que parcialmente.
Creosvaldo, mais liso que jundiá ensaboado, sustenta que a instituição financeira não pode vir cobrar dele em caso de inadimplemento, já que tal pretensão estaria condicionada à liquidação do sinistro junto à seguradora, mediante a apuração da ocorrência ou não do evento coberto pelas cláusulas contratuais. Em suma, de acordo com a defesa de Creosvaldo, comprovada a existência do seguro agrícola com a comunicação do sinistro, não haveria a exigibilidade do título enquanto não efetivada a sua liquidação pela instituição financeira junto a seguradora.
Decreto-lei n. 167/67:
Art. 10. A cédula de crédito rural é título civil, líquido e certo, transferível e de livre negociação, exigível pelo seu valor ou pelo valor de seu endosso, além dos juros, da comissão de fiscalização, se houver, e das demais despesas feitas pelo credor para a segurança, a regularidade e a realização de seu direito creditório.
Código de Processo Civil:
Art. 125. É admissível a denunciação da lide, promovida por qualquer das partes:
II – àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem for vencido no processo.
R: De jeito nenhum!!!!
Discute-se a respeito da inexigibilidade de cédula de crédito rural, tendo em vista a necessidade de sua liquidação, uma vez que pelo menos parte do seu valor seria coberto por seguro agrícola contratado pelo devedor, estando a pretensão “condicionada à liquidação do sinistro junto à seguradora, mediante a apuração da ocorrência ou não do evento coberto pelas cláusulas contratuais, quando então poderá exigir, total ou parcialmente o seu crédito”.
O entendimento pacífico do STJ é na linha de ser a cédula de crédito rural título líquido, certo e exigível por força do art. 10 do Decreto-lei n. 167/67. O fato de existir contrato de seguro atrelado ao título não interfere na sua exequibilidade, e decisão contrária a este entendimento pode incorrer em error in judicando.
No caso, o credor foi apenas o estipulante do referido ajuste, sendo-lhe conferida a FACULDADE – não obrigação – de empreender todos os atos relacionados à liquidação do sinistro, caso assim lhe aprouvesse, mas não uma imposição sem a qual a cédula rural perderia suas características de liquidez, certeza e exigibilidade.
A existência do seguro autoriza, por parte do beneficiário, a realização da denunciação da lide (art. 125, II, do Código de Processo Civil), providência que poderia ter sido realizada pelo recorrido, porém não existe a necessidade de prévio acionamento do seguro para posterior liquidação da cédula rural.
A existência de cláusula/contrato de seguro relacionado à cédula de crédito rural não retira os atributos de exequibilidade próprios do título.
RECURSO ESPECIAL
Não é cabível promover a liquidação do título executivo judicial coletivo em foro aleatório, sem nenhuma relação com as comarcas de domicílio dos beneficiários, ainda que se trate do foro de domicílio do substituto processual extraordinário, sob pena de afronta ao princípio do Juiz natural.
REsp 1.866.440-AL, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 9/5/2023. (Info 774)
O Instituto dos Poupadores, associação privada, promoveu, na comarca de Maceió, a liquidação do título executivo judicial constituído em Ação Civil Pública que tramitara perante Vara Cível de Brasília, em que fora condenado o Banco do Brasil S.A. ao pagamento expurgos inflacionários decorrentes de plano econômico. O TJ local reconheceu a incompetência do Juízo de primeiro grau.
Inconformada, a associação interpôs recursos nos quais sustenta a competência da comarca de Maceió/AL para processamento e julgamento da liquidação de sentença coletiva, pois seria o domicílio do substituto processual dos poupadores e, também, da instituição financeira devedora, ainda que os substituídos residam em outra unidade da federação.
Código de Processo Civil:
Art. 711. Aplicam-se ao regulador de avarias os arts. 156 a 158 , no que couber.
Art. 781. A execução fundada em título extrajudicial será processada perante o juízo competente, observando-se o seguinte:
I – a execução poderá ser proposta no foro de domicílio do executado, de eleição constante do título ou, ainda, de situação dos bens a ela sujeitos;
II – tendo mais de um domicílio, o executado poderá ser demandado no foro de qualquer deles;
III – sendo incerto ou desconhecido o domicílio do executado, a execução poderá ser proposta no lugar onde for encontrado ou no foro de domicílio do exequente;
IV – havendo mais de um devedor, com diferentes domicílios, a execução será proposta no foro de qualquer deles, à escolha do exequente;
V – a execução poderá ser proposta no foro do lugar em que se praticou o ato ou em que ocorreu o fato que deu origem ao título, mesmo que nele não mais resida o executado.
R: Obviamente que NÃO!!!
A controvérsia está em definir se o foro de domicílio do substituto processual é competente para processar e julgar a liquidação de sentença coletiva.
Depreende-se dos autos que determinada associação privada promoveu, na comarca de Maceió, a liquidação do título executivo judicial constituído em Ação Civil Pública que tramitara perante a 12ª Vara Cível de Brasília, em que fora condenado o Banco do Brasil S.A. aos expurgos inflacionários de 42,72% decorrentes de plano econômico. A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Alagoas reconheceu a incompetência do Juízo de primeiro grau.
O voto condutor do aresto a quo destacou que nenhum dos beneficiários representados pelo instituto agravado no processo em trâmite na primeira instância é domiciliado na cidade de Maceió ou qualquer outra cidade do Estado de Alagoas, sendo incontroverso o fato de que todos eles possuem domicílio no Estado de São Paulo.
A despeito de se oportunizar ao consumidor que promova a liquidação no foro de seu domicílio ou no foro em que o título executivo judicial foi proferido, não caberia, de outro lado, a eleição de uma comarca aleatória, sem nenhuma justificativa plausível.
Quanto ao tema, importante destacar que a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso especial repetitivo, que versava sobre o cumprimento individual da sentença proferida no julgamento da Ação Civil Pública pela 12ª Vara Cível de Brasília/DF, possibilitou o ajuizamento do cumprimento de sentença tanto no Distrito Federal quanto no domicílio dos beneficiários da referida decisão coletiva.
Portanto, o entendimento prevalente no STJ é de que a competência poderá ser do foro em que prolatada a decisão da ação civil pública ou do domicílio dos beneficiários ou seus sucessores, e não do local de domicílio de legitimado extraordinário.
A competência da Comarca de Maceió não pode ser amparada nos arts. 46, 53, III, b, 516, parágrafo único, 711 e 781 do Código de Processo Civil, ao argumento de que o banco também teria domicílio naquela Comarca.
Isso porque, conforme exposto, a competência territorial para processar e julgar a execução coletiva está subordinada à regra legal específica, não sendo aplicáveis as regras gerais do Código de Processo Civil de 2015, haja vista que a fixação da competência territorial em função de um dos domicílios do réu deverá ser observada somente quando a agência ou sucursal esteja diretamente relacionada com o dano, o que não se observa na hipótese.
Não é cabível promover a liquidação do título executivo judicial coletivo em foro aleatório, sem nenhuma relação com as comarcas de domicílio dos beneficiários, ainda que se trate do foro de domicílio do substituto processual extraordinário, sob pena de afronta ao princípio do Juiz natural.
RECURSO ESPECIAL
O conhecimento técnico ou científico de juiz sobre determinado mercado imobiliário não pode ser equiparado às regras de experiência comum previstas no art. 375 do Código de Processo Civil, sendo indispensável a realização de perícia para avaliar bem imóvel objeto de penhora.
REsp 1.786.046-RJ, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 9/5/2023. (Info 774)
RDR ajuizou ação de execução em face de Associação Úrsula. No curso da execução, foi penhorado imóvel avaliado pelo perito em certo valor, cujo laudo foi homologado pelo juiz da causa. A associação interpôs recurso alegando que o imóvel valeria no mínimo três vezes mais, inclusive tendo juntado laudos de penhora realizados na Justiça do Trabalho neste valor. O TJ local houve por bem majorar o valor da avaliação em 50%, invocando para tanto o art. 375 do CPC, que autoriza o juiz a valer-se das regras da experiência comum para julgar o feito.
Inconformada, Úrsula interpôs recurso alegando que o valor do bem deveria ser necessariamente fixado por nova perícia, não sendo lícito ao juiz valer-se das regras da experiência para essa finalidade.
Código de Processo Civil:
Art. 375. O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.
R: Com certeza!!!!
Discute-se nos autos se o imóvel penhorado para pagamento da dívida deve ser avaliado necessariamente por perícia ou se, ao contrário, pode seu valor ser fixado pelo próprio julgador com base nas máximas da experiência de que trata o art. 375 do Código de Processo Civil.
As regras (ou máximas) da experiência designam um conjunto de juízos que podem ser formulados pelo homem médio a partir da observação do que normalmente acontece. Reúnem proposições muito variadas, que vão desde conhecimentos científicos consolidados como o de que corpos metálicos dilatam no calor até convenções mais ou menos generalizadas, como a de que as praias são mais frequentadas aos finais de semana.
Muito embora constituam um conhecimento próprio do juiz, não se confundem com o conhecimento pessoal que ele tem a respeito de algum fato concreto, em relação ao qual, exige-se, de qualquer forma, a produção de prova específica, sob o crivo do contraditório.
Conquanto se possa admitir que o julgador, por conhecer o mercado imobiliário de determinada região e também o imóvel penhorado, pudesse saber o seu real valor, não há como afirmar que essa seja uma informação de conhecimento público.
Impossível sustentar, nesses termos, que bem imóvel possa ser avaliado sem produção de prova pericial, pelo próprio julgador, com base no art. 375 do CPC.
O conhecimento técnico ou científico de juiz sobre determinado mercado imobiliário não pode ser equiparado às regras de experiência comum previstas no art. 375 do Código de Processo Civil, sendo indispensável a realização de perícia para avaliar bem imóvel objeto de penhora.
RECURSO ESPECIAL
A competência para julgamento de ação de indenização por danos morais, decorrente de ofensas proferidas em rede social, é do foro do domicílio da vítima, em razão da ampla divulgação do ato ilícito.
REsp 2.032.427-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 27/4/2023, DJe 4/5/2023. (Info 774)
Creosvaldo ofendeu Crementina em uma rede social. Inconformada, Crementina ajuizou ação por meio da qual pretendia a condenação de Creosvaldo ao pagamento de danos morais. A ação foi ajuizada no foro do domicílio de Crementina, mas o juízo local entendeu que a competência seguiria a regra geral do art. 46 do CPC, que prevê que as ações devem ser propostas no foro do domicílio do réu.
Código de Processo Civil:
Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu.
Art. 53. É competente o foro:
IV – do lugar do ato ou fato para a ação:
a) de reparação de dano;
R: Juízo do FORO DO DOMÍCILIO DA VÍTIMA!!!
O Tribunal de origem consignou que ações fundadas em direito pessoal devem ser propostas no domicílio do réu, ponderando que o ilícito praticado pela internet não constaria do rol das exceções à regra da competência (art. 46 do Código de Processo Civil).
Contudo, o STJ firmou o entendimento de que, havendo divulgação de ofensas por redes sociais, a competência para julgamento da ação é do foro do domicílio da vítima, em razão da ampla divulgação do ato ilícito. Nesse sentido: (REsp n. 1.347.097/SE, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 3/4/2014, DJe de 10/4/2014 e AgRg no Ag 808.075/DF. Relator Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma, DJe 17/12/2007).
Da mesma forma, no julgamento do Conflito de Competência n. 154.928/SP, decidiu-se que “a competência para apreciar as demandas que envolvam danos morais por ofensas proferidas na internet é o local em que reside e trabalha a pessoa prejudicada, local de maior repercussão das supostas ofensas“.
Apesar de os precedentes citados terem sido proferidos sob a égide do Código de Processo Civil de 1973 (art. 100, V, “a”), o art. 53, IV, “a”, do atual Código reproduziu idêntica norma processual.
A competência para julgamento de ação de indenização por danos morais, decorrente de ofensas proferidas em rede social, é do foro do domicílio da vítima, em razão da ampla divulgação do ato ilícito.
RECURSO ESPECIAL
A via processual adequada para a retomada, pelo proprietário, da posse direta de imóvel locado é a ação de despejo, na forma do art. 5º da Lei n. 8.245/1991, não servindo para esse propósito o ajuizamento de ação possessória.
REsp 1.812.987-RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 27/4/2023, DJe 4/5/2023. (Info 774)
Creiton ajuizou ação de reintegração de posse em face de Creosvalda, com o intuito de reaver imóvel de propriedade de seu falecido pai. Ocorre que o imóvel estava locado para Creosvalda.
O tribunal local, apesar de afirmar que a ação correta seria a de despejo, manteve a sentença por entender ser dever do magistrado apreciar o pedido do autor, em razão do princípio da mihi factum, dabo tibi ius (dá-me os fatos que lhe darei o direito).
Inconformada, Creosvalda interpôs recurso especial no qual sustenta que, não obstante o reconhecimento da existência da relação locatícia que impunha a propositura de ação de despejo e não a ação de reintegração de posse, deixou-se de considerar a inadequação da via eleita.
Lei n. 8.245/1991:
Art. 5º Seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo.
CPC/2015:
Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados.
R: Ação de DESPEJO!!!!
A controvérsia cinge-se à possibilidade de conhecimento de ação possessória de reintegração de posse ajuizada para reaver o imóvel alugado, ao invés da ação de despejo, que, por força de expressa disposição na Lei n. 8.245/1991, é a via judicial adequada para a retomada do bem locado: Art. 5º Seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo.
O art. 554 do CPC/2015 prevê a fungibilidade entre as ações possessórias – reintegração de posse (que decorre de esbulho), manutenção de posse (decorrente de turbação) e interdito proibitório (em razão de ameaça à posse de alguém) -, isso porque todas as três têm como aspecto relevante unicamente a posse, enquanto fato, sem referência a prévio direito obrigacional ou contratual.
Por outro lado, na ação de despejo há uma relação contratual locatícia subjacente, de onde derivam diversos direitos e deveres do locador e do locatário, podendo daí resultar em uma situação de posse indevida.
Embora o pedido da reintegração de posse e da ação de despejo seja a posse legítima do bem imóvel, tratam-se de pretensões judiciais com natureza e fundamento jurídico DISTINTOS pois, enquanto a primeira baseia-se na situação fática possessória da coisa, a segunda se fundamenta em prévia relação contratual locatícia, regida por norma ESPECIAL, o que consequentemente impossibilita sua fungibilidade.
Ao se permitir o ajuizamento de ação possessória em substituição da ação de despejo, nega-se vigência ao conjunto de regras especiais da Lei de Locação, tais como prazos, penalidades e garantias processuais.
A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, havendo comprovada relação locatícia, a pretensão de retomada do bem imóvel deve ocorrer por rito próprio, pelo ajuizamento da ação de despejo.
A via processual adequada para a retomada, pelo proprietário, da posse direta de imóvel locado é a ação de despejo, na forma do art. 5º da Lei n. 8.245/1991, não servindo para esse propósito o ajuizamento de ação possessória.
RECURSO ESPECIAL
O ICMS compõe a base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), quando apurados na sistemática do lucro presumido.
REsp 1.767.631-SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Rel. para acórdão Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, por maioria, julgado em 10/5/2023. (Tema 1008). (Info 774)
Cerâmica CTT ajuizou ação por meio da qual intentava ter reconhecido o direito à exclusão de valores de ICMS nas bases de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL quando apuradas pela sistemática do lucro presumido. Para a empresa, haveria bitributação, estando ela a pagar imposto sobre imposto.
Constituição Federal:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
b) a receita ou o faturamento
R: Aparentemente, SIM!!!!
O lucro presumido, como a própria expressão sugere, constitui modalidade de tributação do Imposto sobre a renda de pessoa jurídica (IRPJ) e da Contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) que envolve presunções em matéria tributária. Utiliza-se a receita bruta como parâmetro a ser considerado para aplicação do percentual destinado à apuração do lucro presumido, que é a base de cálculo sobre o qual incidirá a alíquota, alcançando-se, assim, o valor devido.
Diante da circunstância de que a receita representa, portanto, a grandeza que, em última análise, serve para o cálculo dos tributos em exame, busca-se na espécie, em essência, a observância da ratio decidendi do Tema 69/STF, a fim de que seja afastado de sua composição o ICMS.
Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, sob o regime da repercussão geral, nos autos do RE 574.706/PR, decidiu, em caráter definitivo, por meio de precedente vinculante, que os conceitos de faturamento e receita, contidos no art. 195, I, “b”, da Constituição Federal, para fins de incidência da Contribuição ao PIS e da COFINS, não albergam o ICMS, considerado aquele destacado na nota fiscal, pois os valores correspondentes a tal tributo estadual não se incorporaram ao patrimônio dos contribuintes.
Foi firmada a seguinte tese da repercussão geral: “O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS” (Tema 69/STF).
Ocorre que esse entendimento deve ser aplicado tão somente à Contribuição ao PIS e à COFINS, porquanto realizado exclusivamente à luz do art. 195, I, “b”, da Constituição Federal, sendo indevida a extensão indiscriminada dessa compreensão para outros tributos, tais como o IRPJ e CSLL.
A fim de corroborar a referida afirmação, basta ver que a própria Suprema Corte, ao julgar o Tema 1048/STF, concluiu pela constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) – a qual inclusive é uma contribuição social, mas de caráter substitutivo, que também utiliza a receita como base de cálculo.
Observe-se, portanto, que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Tema 1048/STF, tratou a CPRB como benefício fiscal, notadamente quando passou a ser modalidade facultativa de tributação. A ratio decidendi do mencionado caso paradigma traz consigo uma relevante peculiaridade: para o STF, a facultatividade do regime impede a aplicação pura e simples da tese fixada no julgamento do Tema 69/STF da repercussão geral, porquanto caracterizaria a criação incabível de um terceiro gênero de tributação mais benéfico.
Salienta-se que quando do julgamento do Tema 1048/STF, o Ministro Marco Aurélio (então relator do recurso extraordinário) desenvolveu voto no sentido de que o alcance e a definição dos institutos de receita e faturamento extraídos do julgamento do Tema 69/STF deveriam se aplicar de maneira ampla. Para o eminente Ministro, “admitir a volatilidade dos institutos previstos na Lei Maior com base no regime fiscal ao qual submetido o contribuinte implica interpretar a Constituição Federal a partir da legislação comum, afastando a supremacia que lhe é própria”.
Ocorre que essa linha de pensamento (que agora se confunde com a pretensão recursal analisada) foi expressamente debatida e vencida.
Isto é, o próprio Supremo, ao interpretar seu precedente (Tema 69/STF), entendeu que esse seria inaplicável às hipóteses em que se oferecesse benefício fiscal ao contribuinte, vale dizer, não se aplicaria quando houvesse facultatividade quanto ao regime de tributação, exatamente o que acontece no caso.
Ressalte-se que, para a Contribuição ao PIS e a COFINS, a receita constitui a própria base de cálculo, enquanto para o IRPJ e a CSLL, apurados na sistemática do lucro presumido, representa apenas parâmetro de tributação, sendo essa outra distinção relevante.
Com efeito, o Tema 69/STF apresenta-se aplicável tão somente à Contribuição ao PIS e à COFINS. Não há que falar na adoção de “tese filhote” para albergar outros tributos, disciplinados por normas jurídicas próprias. Por conseguinte, não há inconstitucionalidade na circunstância de o ICMS integrar a receita como base imponível das demais exações.
Nesse ponto, é importante ressaltar que, diante da orientação dessa última tese (Tema 69/STF), a Primeira Turma, à unanimidade, ao julgar o REsp 1.599.065/DF (Rel. Ministra Regina Helena Costa, julgado em 9/11/2021, DJe 2/12/2021), excluiu da base de cálculo das referidas contribuições os valores auferidos por empresas prestadoras de serviço de telefonia pelo uso de suas estruturas para interconexão e roaming, porquanto não se incorporam ao patrimônio do contribuinte, por força da legislação de regência.
Cabe rememorar, porém, que, naquela hipótese, a discussão se deu justamente no âmbito da Contribuição ao PIS e da COFINS, ou seja, os mesmos tributos tratados no Tema 69/STF da repercussão geral e à luz dos atos normativos de natureza infraconstitucional que tratam do serviço de roaming e interconexão. Daí a observância daquela ratio decidendi, que, como visto, não pode ser reproduzida no presente caso.
Em outras palavras, extrai-se dos julgados acima referidos que o próprio Supremo Tribunal Federal compreende que não foi excluído, em caráter definitivo e automático, o ICMS do conceito constitucional de receita para todos os fins tributários.
O ICMS compõe a base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), quando apurados na sistemática do lucro presumido.
RECURSO ESPECIAL
A entrega da Declaração de Débito e Créditos Tributários Federais – DCTF constitui crédito tributário, que pode ser cobrado após a compensação ser considerada não declarada pela autoridade competente, sendo afastada, portanto, a decadência.
REsp 1.826.743-RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 9/5/2023. (Info 774)
PagonadaSA recebeu cessão dos créditos e em idos de 2000 transmitiu a respectiva Declaração de Débito e Créditos Tributários Federais – DCTF referentes aos créditos de PIS e COFINS, requerendo compensação com créditos de terceiros. A receita se recusou a processar tais pedidos, com fundamento no impedimento de utilização de créditos de terceiros. Pagonada então impetrou MS e conseguiu ordem judicial determinando o processamento.
Em 2012 (a coisa demooooora), o MS foi julgado em favor da Fazenda Nacional, rechaçando-se a compensação de débitos próprios com créditos de terceiros. A Receita então apontou que as compensações seriam consideradas NÃO DECLARADAS, nos termos do art. 74, § 12, II, “b” e “d”, e no § 13, da Lei n. 9.430/1996.
No despacho administrativo, a autoridade fiscal fez constar que a hipótese não comportava a possibilidade de apresentação de manifestação de inconformidade. Realizadas as intimações cabíveis sem o consequente pagamento dos créditos tributários, a Fazenda Nacional promoveu a inscrição em dívida ativa e a respectiva cobrança judicial, na qual foram opostos os embargos à execução fiscal que alegam a ocorrência da DECADÊNCIA.
Lei n. 9.430/1996:
Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.
§ 9o É facultado ao sujeito passivo, no prazo referido no § 7o, apresentar manifestação de inconformidade contra a não-homologação da compensação.
§ 10. Da decisão que julgar improcedente a manifestação de inconformidade caberá recurso ao Conselho de Contribuintes.
§ 12. Será considerada não declarada a compensação nas hipóteses:
II – em que o crédito:
b) refira-se a “crédito-prêmio” instituído pela art. 1o do Decreto-Lei no 491, de 5 de março de 1969;
d) seja decorrente de decisão judicial não transitada em julgado; ou
R: Com certeza!!!
Trata-se, na origem, de embargos à execução fiscal opostos com o intuito de obstar a cobrança de créditos tributários relacionados a pedidos de compensação com créditos de terceiro advindos de ação ordinária cujo objeto era o ressarcimento de créditos de IPI na aquisição de insumos utilizados na fabricação e exportação de produtos industrializados.
Após a cessão dos créditos em seu favor, a contribuinte transmitiu, em 29/3/2000 e 13/12/2000, Declaração de Débito e Créditos Tributários Federais – DCTF referente aos créditos tributários de Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, atrelados a pedidos de compensação. Entretanto, os pedidos foram processados somente em virtude da determinação judicial oriunda de mandado de segurança para que fosse admitida a compensação com créditos de terceiros.
Em 2012, a discussão originada em mandado de segurança encerrou-se a favor da Fazenda Nacional, oportunidade em que foi rechaçada a compensação de débitos próprios com créditos de terceiros. Com o trânsito em julgado, a Receita Federal do Brasil analisou os pedidos de compensação apresentados pela agravante, com fundamento no impedimento de utilização de créditos de terceiros, apontando, ainda, que as compensações seriam consideradas não declaradas, nos termos do art. 74, § 12, II, “b” e “d”, e no § 13, da Lei n. 9.430/1996. No despacho administrativo, a autoridade fiscal fez constar que a hipótese não comportava a possibilidade de apresentação de manifestação de inconformidade, prevista no art. 74, §§ 9º e 10, da Lei n. 9.430/1996. Realizadas as intimações cabíveis, sem o consequente pagamento dos créditos tributários, a Fazenda Nacional promoveu a inscrição em dívida ativa e a respectiva cobrança judicial, na qual foram opostos os embargos à execução fiscal de onde se origina o presente caso.
O Tribunal a quo proferiu acórdão anulando a Certidão de Dívida Ativa – CDA sob a justificativa de que a autoridade administrativa tem o dever de verificar a regularidade dos créditos compensados e emitir decisão fundamentada acerca do requerimento do contribuinte, dando oportunidade de oferecimento de impugnação administrativa, em respeito ao princípio do contraditório.
A Fazenda Nacional interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, a, da Constituição Federal, alegando que o acórdão de origem violou o art. 1°, § 2°, do Decreto-Lei n. 1.737/1959; o art. 5° do Decreto-Lei n. 2.124/1984 e o art. 38, parágrafo único, da Lei n. 6.830/1980, porque teria ocorrido a renúncia ao direito de discutir administrativamente o crédito tributário. Após julgamento monocrático do recurso especial, a contribuinte interpôs agravo interno.
Em suas razões recursais, a agravante afirma que não impetrou o mandado de segurança para discutir o crédito tributário, mas para garantir que os seus pedidos de compensação fossem operacionalizados.
De fato, possui razão a agravante ao afirmar que não ajuizou ação para discutir o crédito tributário, alegação que corresponde às razões recursais apresentadas pela Fazenda Nacional, que defende a renúncia à discussão administrativa decorrente do mandado de segurança impetrado com a finalidade de operacionalizar seus pedidos de compensação com crédito de terceiro, sem o óbice imposto pela Instrução Normativa n. 41/2000.
Nesse contexto, não há que se falar em discussão administrativa quando a matéria objeto de eventual manifestação de inconformidade foi antecipada no mérito do mandado de segurança, ainda que este tenha sido impetrado por terceiro em benefício da agravante, com o devido trânsito em julgado a favor da Fazenda Nacional. Ou seja, a discussão já havia sido definida pelo Poder Judiciário. Carece de sentido, portanto, a afirmação contida no acórdão de origem, no sentido de ter sido negado o direito ao contraditório e à ampla defesa na esfera administrativa.
Outrossim, a manifestação de inconformidade que poderia vir a ser apresentada pela agravante não poderia ter por finalidade discussão acerca de decadência ou prescrição do crédito tributário, as quais foram apresentadas em sede de embargos à execução fiscal. Nesse ponto, é mister deixar registrado que a manifestação de inconformidade pode ser manejada pelo contribuinte tão somente para questionar os motivos do indeferimento da compensação, não sendo o instrumento hábil para alegações outras acerca do crédito tributário que se pretende compensar.
Noutro viés, no ínterim da discussão no Mandado de Segurança finalizada em 2012, o pedido de compensação foi transformado em PER/DCOMP desde o seu protocolo, para os efeitos previstos no art. 74, § 4º, da Lei n. 9.430/1996. Frise-se que as alterações promovidas no art. 74 da Lei n. 9.430/1996 são aplicáveis aos pedidos de compensação pendentes por expressa disposição legal, de modo que coube à autoridade administrativa observá-las após findo o writ acima mencionado.
Para além do fato de os créditos indicados no pedido de compensação serem de terceiro, situação esta decidida no mandado de segurança, o encontro de contas envolvia crédito-prêmio e indicação de crédito que, à época do pedido frente à Administração, era oriundo de decisão não transitada em julgada. Em tais hipóteses (incluindo neste rol a compensação com créditos de terceiros), a compensação é considerada não declarada, sendo incabível a manifestação de inconformidade, nos termos do art. 74, § 12, II, e no § 13 da Lei n. 9.430/1996. Portanto, ainda que o presente caso não envolvesse renúncia ao direito de discutir na seara administrativa, a agravante não poderia discutir administrativamente a compensação não declarada por meio de manifestação de inconformidade.
Não obstante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ter se firmado no sentido da exigência do lançamento de ofício nas hipóteses em que os pedidos de compensação indeferidos foram apresentados antes 31/10/2003, o presente caso comporta o devido distinguishing. Nesse diapasão, a entrega da DCTF pela agravante constituiu o crédito tributário, que pode ser cobrado após a compensação ser considerada não declarada pela autoridade competente, sendo afastada, portanto, a decadência.
A entrega da Declaração de Débito e Créditos Tributários Federais – DCTF constitui crédito tributário, que pode ser cobrado após a compensação ser considerada não declarada pela autoridade competente, sendo afastada, portanto, a decadência.
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS
A mera sinalização do cão de faro, seguida de abordagem a suposto usuário saindo do local, desacompanhada de qualquer outra diligência investigativa ou outro elemento concreto indicando a necessidade de imediata ação policial, não justifica a dispensa do mandado judicial para o ingresso em domicílio.
AgRg no HC 729.836-MS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 27/4/2023, DJe 02/5/2023. (Info 774)
A PM fazia uma ronda quando encontrou um cidadão em comportamento suspeito. Abordado, o rapaz admitiu que comprou pequena quantidade de droga em uma casa próxima — propriedade de Creitinho.
A PM foi até a residência e lá o cão policial Maradona indicou a existência de drogas nas proximidades. A PM então entrou no domicílio onde encontrou quantidades significativas de drogas em vários cômodos.
Após a sentença condenatória, a defesa de Creitinho impetrou HC no qual alega a nulidade da condenação diante do ingresso forçado no domicílio do Agravante sem fundadas razões e sem o devido mandado judicial.
R: Nooops!!!!
De início, destaca-se que “é pacífico, nesta Corte, o entendimento de que, nos crimes permanentes, tal qual o tráfico de drogas, o estado de flagrância se protrai no tempo, o que não é suficiente, por si só, para justificar busca domiciliar desprovida de mandado judicial, exigindo-se a demonstração de indícios mínimos de que naquele momento, dentro da residência, haveria situação de flagrante delito” (AgRg no AREsp 1.512.826/PR, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 18/2/2020, DJe 27/2/2020).
No caso, o Tribunal de origem consignou que durante abordagem realizada na casa do vizinho do acusado, na qual os policiais utilizavam-se de um cão de faro, o animal sinalizou para a casa do Paciente, ocasião em que este foi abordado e franqueou a entrada dos policiais no imóvel.
Todavia, não há nenhuma comprovação documental de que houve autorização voluntária e livre de coação para o ingresso no domicílio do acusado. Além disso, a palavra dos agentes policiais acerca da suposta autorização não encontra respaldo em nenhum outro elemento probatório, sendo certo que no depoimento extrajudicial do acusado não há registro sobre o seu consentimento.
Ressalta-se que o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que “como forma de não deixar dúvidas sobre a sua legalidade, a prova da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe ao Estado, devendo ser realizada com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato” (HC 728.920/GO, Rel. Ministro Olindo Menezes, Desembargador Convocado do TRF da 1ª Região, Sexta Turma, julgado em 14/6/2022, DJe 20/6/2022).
No mais, a mera sinalização do cão de faro, seguida da abordagem de um suposto usuário – que não foi ouvido em juízo – saindo do local, desacompanhada de qualquer outra diligência investigativa ou outro elemento concreto indicando a necessidade de imediata ação policial naquele momento, não justifica, por si só, a dispensa do mandado judicial para o ingresso em domicílio.
A mera sinalização do cão de faro, seguida de abordagem a suposto usuário saindo do local, desacompanhada de qualquer outra diligência investigativa ou outro elemento concreto indicando a necessidade de imediata ação policial, não justifica a dispensa do mandado judicial para o ingresso em domicílio.
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