Informativo nº 760 do STJ COMENTADO saindo do forno (quentinho) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!
EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIAS
Compete à Justiça Comum o julgamento de controvérsia envolvendo direitos de servidor contratado para exercer cargo em comissão regido pela CLT.
EDcl no AgInt no CC 184.065-SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 25/10/2022, DJe 4/11/2022. (Info 760)
Tadeu foi nomeado para exercer cargo em comissão no Município Pagonada. A lei municipal que trata do tema prevê a aplicação da CLT aos servidores comissionados. Tadeu trabalhou dessa forma por quatro anos, quando foi dispensado do cargo.
Ocorre que algumas verbas rescisórias não foram pagas, razão pela qual Tadeu ajuizou reclamatória trabalhista. O juiz do trabalho declinou da competência, por entender que caberia à Justiça Comum o julgamento.
R: Justiça COMUM!!!
Quanto à competência para julgamento de controvérsia envolvendo direitos de servidor contratado para exercer cargo em comissão, o Supremo Tribunal Federal, provocado por meio de reclamação, entendeu que a competência continua com a Justiça Comum mesmo se o servidor ocupante de cargo em comissão for regido pela CLT.
Nesse sentido: “(…) 1. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que sejam vinculados a ele por relação jurídico-administrativa. 2. O eventual desvirtuamento da designação temporária para o exercício de função pública, ou seja, da relação jurídico-administrativa estabelecida entre as partes, não pode ser apreciado pela Justiça do Trabalho. 3. A existência de pedido de condenação do ente local ao pagamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS não torna a Justiça do Trabalho competente para o exame da ação. (…)” Rcl 7.039 AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 8/5/2009.
Compete à Justiça Comum o julgamento de controvérsia envolvendo direitos de servidor contratado para exercer cargo em comissão regido pela CLT.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA
A vantagem pecuniária estabelecida no art. 3º da Lei n. 6.932/1996 do Estado da Bahia não pode ser aplicada em relação aos integrantes do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia.
RMS 58.436-BA, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 4/10/2022, DJe 9/11/2022. (Info 760)
O SINDICONTAS (Sindicato dos Servidores do Tribunal de Contas do Estado e dos Municípios) impetrou MS alegando que os servidores do Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE/BA) que exercem as mesmas atribuições dos servidores do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM/BA) recebem a CET (art. 3º da Lei Estadual 6.932/96), o que, segundo o impetrante, violaria o princípio da isonomia.
A gratificação em questão foi revogada quando da instituição de uma outra gratificação de produtividade e, mesmo após uma nova norma prevendo compatibilidade de recebimento das duas gratificações, os servidores do TCM/BA não voltaram a receber a primeira gratificação.
R: Noops!!!!
Defendem os recorrentes a tese de que a legislação baiana garantiu por lei a isonomia entre as carreiras (dos servidores estaduais e municipais), pelo que não se aplicariam, no particular, os óbices da Súmula 339/STF e da Súmula Vinculante 37.
Todavia, os artigos nos quais a parte demandada ancora sua pretensão reclamam exegese diversa.
O art. 3º da Lei n. 6.932/1996 dispõe que a “Gratificação por Condições Especiais de Trabalho – CET somente poderá ser concedida no limite máximo de 125% (cento e vinte e cinco por cento) e na forma que for fixada em regulamento, com vistas a […]”.
Entretanto, a referida lei local “autoriza o reajustamento da remuneração e proventos dos servidores públicos, civis e militares, da administração direta, das autarquias e das fundações do serviço público estadual […]” (ementa da Lei n. 6.932/1996). Ou seja, o diploma legal, quanto ao reajustamento de remuneração e proventos, limitou-se a tratar da carreira dos servidores estaduais, não abrangendo a dos municipais. O Estatuto do Servidor Público do Estado da Bahia, por sua vez, rege que “o vencimento do cargo observará o princípio da isonomia, quando couber, e acrescido das vantagens de caráter individual, será irredutível, ressalvadas as relativas à natureza ou ao local de trabalho” (art. 53). Isto é, o princípio da isonomia foi mencionado no diploma legal que rege a carreira dos servidores estaduais, sem ter equiparado aquela à carreira dos servidores municipais.
A Lei n. 4.824/1989, também mencionada pela parte recorrente como garantidora da isonomia, estabelece que a “Lei que conceder aumento de remuneração aos servidores da Assembleia Legislativa e do Tribunal de Contas do Estado da Bahia deverá incluir o pessoal do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia” (art. 42).
O que este último diploma assegura, na verdade, “diz respeito apenas ao momento para a concessão de reajuste da remuneração dos servidores, que deve ser estendido aos seus associados“. Não há como, com base no referido comando normativo, entender pela completa isonomia entre a carreira dos servidores do Tribunal de Contas do Estado e a dos serventuários do Tribunal de Contas dos Municípios.
Assim, ainda que a legislação, a qual impedia o recebimento acumulado da Gratificação de Produtividade com a Gratificação por Condições Especiais de Trabalho ou Pelo Regime de Tempo Integral, tenha sido revogada, para que os substituídos passassem a receber esta última vantagem, eles precisariam ser beneficiários da gratificação desde sempre, o que não era o caso.
A vantagem pecuniária estabelecida no art. 3º da Lei n. 6.932/1996 do Estado da Bahia não pode ser aplicada em relação aos integrantes do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia.
AGRAVO INTERNO NA PETIÇÃO
Não há previsão legal acerca do ajuizamento de embargos de divergência contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça proferido em pedido de tutela provisória para agregar efeito suspensivo a conflito de competência.
AgInt na Pet 14.925-TO, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 11/10/2022, DJe 17/10/2022. (Info 760)
Creiton ajuizou ação em face de Craudio. Ocorre que já corria outra ação com o mesmo objeto em outra vara, gerando um conflito positivo de competência. Creiton foi quem suscitou o conflito de competência, pretendendo que fosse declarada a competência de sua preferência. Como não obteve êxito nesse intento, buscou tutela provisória no STJ, buscando efeito suspensivo.
O STJ julgou inepta a via escolhida por Creiton que, incansável, interpôs embargos de divergência alegando existir julgados em sentido contrário no próprio STJ.
Código de Processo Civil:
Art. 1.043. É embargável o acórdão de órgão fracionário que:
I – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo os acórdãos, embargado e paradigma, de mérito;
III – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo um acórdão de mérito e outro que não tenha conhecido do recurso, embora tenha apreciado a controvérsia;
§ 1º Poderão ser confrontadas teses jurídicas contidas em julgamentos de recursos e de ações de competência originária.
§ 2º A divergência que autoriza a interposição de embargos de divergência pode verificar-se na aplicação do direito material ou do direito processual.
§ 3º Cabem embargos de divergência quando o acórdão paradigma for da mesma turma que proferiu a decisão embargada, desde que sua composição tenha sofrido alteração em mais da metade de seus membros.
§ 4º O recorrente provará a divergência com certidão, cópia ou citação de repositório oficial ou credenciado de jurisprudência, inclusive em mídia eletrônica, onde foi publicado o acórdão divergente, ou com a reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores, indicando a respectiva fonte, e mencionará as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados.
R: Nooops!!!!
De acordo com o art. 266 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, “cabem embargos de divergência contra acórdão de Órgão Fracionário que, em recurso especial, divergir do julgamento atual de qualquer outro Órgão Jurisdicional deste Tribunal”.
O art. 1.043 do Código de Processo Civil também regula as hipóteses de cabimento dos embargos de divergência, previstos para impugnar acórdão proferido em recurso extraordinário ou especial.
O acórdão embargado, no caso, não foi proferido em recurso especial, mas em pedido de tutela provisória, cuja decisão não desafia os embargos de divergência, não previstos para tal hipótese.
Nesse sentido é o entendimento do STJ: “somente é possível a interposição dos embargos de divergência contra acórdão que aprecia recurso especial ou recurso extraordinário,na dicção clara do art. 1.043, caput e incisos I e III, do Código de Processo Civil; o art. 266, caput, do RISTJ também é claro ao limitar tal modalidade recursal aos recursos especiais.” (EDv nos EDcl na SEC n. 3.687/EX, relator Ministro Humberto Martins, Corte Especial, julgado em 18/10/2017, DJe de 27/10/2017).
Por fim, ressalte-se que, em tema de recursos, vigora o princípio da TIPICIDADE, de modo que cada recurso é cabível nas hipóteses taxativamente previstas.
Não há previsão legal acerca do ajuizamento de embargos de divergência contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça proferido em pedido de tutela provisória para agregar efeito suspensivo a conflito de competência.
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
A indicação de julgado simples e isolado não ostenta a natureza jurídica de “súmula, jurisprudência ou precedente” para fins de aplicação do art. 489, § 1º, VI, do CPC.
AREsp 1.267.283-MG, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 27/09/2022, DJe 26/10/2022. (Info 760)
Creosvaldo ajuizou ação em face do Município requerendo o recebimento de certo Creosvaldo ajuizou ação em face do Município requerendo o recebimento de certo valor. A ação foi julgada improcedente, o que levou Creosvaldo a interpor apelação. Antes do julgamento, Creosvaldo peticionou informando que o TJ teria julgado caso idêntico: colacionou o acórdão alegadamente em confronto com a decisão recorrida.
O acórdão do TJ manteve a improcedência e nada disse sobre o julgado colacionado. Inconformado, Creosvaldo interpôs embargos declaratórios alegando a deficiência da fundamentação, uma vez que não houve manifestação sobre o “precedente.
CPC:
Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II – os enunciados de súmula vinculante;
III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º , quando decidirem com fundamento neste artigo.
§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.
R: Noops!!!!
O art. 489, § 1º, VI, do CPC entende que há negativa de prestação jurisdicional quando o órgão julgador “deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento”.
No caso, a parte interessada, antes da oposição de embargos de declaração, indicou um ÚNICO acórdão do Tribunal de origem supostamente em confronto com a decisão recorrida, por tratar de mesma questão.
Logo, a indicação de julgado simples e isolado não ostenta a natureza jurídica de “súmula, jurisprudência ou precedente” para fins de aplicação do art. 489, § 1º, VI, do CPC.
Não é jurisprudência, porque essa pressupõe multiplicidade de julgamentos no mesmo sentido, raciocínio que, de boa lógica, também exclui a hipótese de considerar um caso isolado como súmula de entendimento.
Também não se pode considerar que a expressão “precedente” abrange o julgamento de qualquer acórdão. Isso porque a interpretação SISTEMÁTICA do Código de Processo Civil, notadamente a leitura do art. 927, que dialoga diretamente com o 489, evidencia que “precedente” abarca somente os casos julgados na forma qualificada pelo primeiro comando normativo citado, não tendo o termo abarcado de maneira generalizada nenhuma decisão judicial.
A proteção conferida pelo Código de Processo Civil contra decisões-surpresa não pode inviabilizar que o juiz conheça do direito alegado e determine a exegese a ser aplicada ao caso.
Hipótese em que a causa foi decidida nos limites do objeto da ação, não podendo ter causado surpresa à parte se era uma das consequências previsíveis do julgamento.
Sobre o tema, o STJ já entendeu que não se pode falar em decisão-surpresa quando o magistrado, diante dos limites da causa de pedir, do pedido e do substrato fático delineado nos autos, realiza a tipificação jurídica da pretensão no ordenamento jurídico posto, aplicando a lei adequada à solução do conflito, ainda que as partes não a tenham invocado (iura novit curia) e independentemente de ouvi-las, até porque a lei deve ser de conhecimento de todos, não podendo ninguém se dizer surpreendido com a sua aplicação (AgInt no AREsp 2.028.275/MS, rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 29/6/2022).
A indicação de julgado simples e isolado não ostenta a natureza jurídica de “súmula, jurisprudência ou precedente” para fins de aplicação do art. 489, § 1º, VI, do CPC.
RECURSO ESPECIAL
Não cabe novo recurso especial contra o acórdão que julga agravo interno em face de decisão de inadmissibilidade fundada na aplicabilidade de precedente qualificado do Supremo Tribunal Federal que tem o condão de impedir o seguimento não apenas de recurso extraordinário como também de recurso especial.
REsp 2.028.321-RN, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 06/12/2022. (Info 760)
Crementina ajuizou ação rescisória no tribunal local. O pedido foi julgado improcedente. Inconformada, Crementina interpôs recursos especial e extraordinário. Os dois foram inadmitidos pelo tribunal local, com fundamento no art. 1.030, I, b, do CPC. Isso porque o acórdão estaria em harmonia com a tese fixada pelo STF em repercussão geral. Após agravar internamente, e não conseguir reverter a decisão (destrancar os recursos), Crementina então interpôs novo recurso especial.
R: Nooops!!!!
O caso concreto trata de uma ação rescisória que foi devidamente julgada e que teve o seu acórdão desafiado por via de recurso especial e de recurso extraordinário.
Ao proceder ao exame de admissibilidade de ambos, o Tribunal da origem aplicou a técnica de julgamento que consiste na verificação de que o Supremo Tribunal Federal enfrentou a controvérsia – direito à nomeação por candidato aprovado em concurso público como excedente (cadastro de reserva) – sob o regime da repercussão geral e sendo assim não apenas o recurso extraordinário deve ser obstado como também o recurso especial, isso porque o precedente qualificado deve prevalecer.
Em seguida a isso foram interpostos agravo em recurso especial e agravo em recurso extraordinário, mas no lugar de se determinar o processamento deles, com a remessa aos respectivos Tribunais, houve uma nova decisão monocrática em razão da qual se compreendeu que como a razão de inadmissibilidade estava fundada na aplicação de precedente qualificado o recurso cabível era o agravo interno em ambos os casos, e desse modo não se conheceu de ambos os agravos em recurso especial e em recurso extraordinário.
Isso ensejou uma nova impugnação, dessa feita de agravo interno, e é justamente o acórdão prolatado em tal recurso, no qual se manteve o teor da decisão de não conhecimento, que vem ao exame do Superior Tribunal de Justiça mediante novo recurso especial interposto, o que já indica o descabimento aventado inicialmente.
A sistemática do processamento do recurso especial não contempla previsão em razão da qual uma vez trancado o seu processamento, e obstada na origem a remessa do consequente agravo, haja a interposição de um novo recurso especial com a finalidade única de destravar o agravo.
Não há no sistema recursal essa possibilidade de atuação “CIRCULAR” da parte, nem se admitira hipoteticamente que em havendo a negativa de seguimento ao presente apelo raro houvesse um segundo agravo em recurso especial para destrancar o seu processamento.
Essa hipótese de cabimento é INEXISTENTE, e quando muito há duas outras soluções processuais possíveis para a hipótese sob exame, quais sejam, ou a reclamação, conforme admitido, por exemplo, no AgInt na Rcl n. 43.030/SP (Relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 16/8/2022, DJe de 18/8/2022) e na Rcl n. 41.229/DF (Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 11/5/2022, DJe de 17/5/2022), ou ainda uma ação rescisória em se considerando que a decisão na origem supostamente fundara-se na aplicação de precedente qualificado, e aqui se teria a hipótese do art. 966, inciso V, § 5.º, do CPC/2015
Não cabe novo recurso especial contra o acórdão que julga agravo interno em face de decisão de inadmissibilidade fundada na aplicabilidade de precedente qualificado do Supremo Tribunal Federal que tem o condão de impedir o seguimento não apenas de recurso extraordinário como também de recurso especial.
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
Em se tratando de exceção de pré-executividade acolhida para excluir sócio do polo passivo de execução fiscal, o proveito econômico corresponde ao valor da dívida executada, devendo ser esta a base de cálculo dos honorários advocatícios de sucumbência com aplicação do art. § 3º do art. 85 do CPC/2015.
AREsp 2.231.216-SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 06/12/2022, DJe 9/12/2022. (Info 760)
A União ajuizou execução fiscal em face da empresa VN Materiais e dos sócios Nirso e Virso. O valor cobrado na ação era de R$ 500 mil. Virso apresentou exceção de pré-executividade na qual alegou ilegitimidade passiva para constar na ação, uma vez que seu nome não constava na Certidão de Dívida Ativa. O juiz acolheu a alegação de Virso e o excluiu da execução, bem como condenou a União ao pagamento de honorários de sucumbência sobre o valor do proveito econômico da causa. No entender do juízo, a base de cálculo seria 1/3 do valor cobrado, uma vez que eram três os executados (a empresa, Nirso e Virso).
O advogado de Nirso então interpôs recurso sustentando que o proveito econômico obtido seria o valor total da cobrança, ou seja, R$ 500 mil e sobre este valor deveriam ser arbitrados os percentuais.
CPC/2015:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:
I – mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;
II – mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;
III – mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;
IV – mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;
V – mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.
§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
CTN:
Art. 124. São solidariamente obrigadas:
I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;
II – as pessoas expressamente designadas por lei.
Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.
R: Deve ser considerado o valor da dívida executada!!!
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1.076, a depender da presença da Fazenda Pública, reservou a utilização do art. 85, § 8º, do CPC/2015, fixação por equidade, para quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.
Também foi estabelecida uma sequência OBJETIVA na fixação da verba, devendo a fixação ser calculada subsequentemente sobre o valor (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa.
Em se tratando de exceção de pré-executividade acolhida para excluir do polo passivo a parte recorrente, o proveito econômico corresponde ao valor da dívida executada, tendo em vista o potencial danoso que o feito executivo possuiria na vida patrimonial do executado caso a demanda judicial prosseguisse regularmente, devendo ser esta a base de cálculo dos honorários advocatícios de sucumbência.
Observe-se que, a despeito da relação jurídica de responsabilidade de caráter solidário previsto no art. 124 do CTN, que obriga cada um dos devedores a se comprometer pelo total da dívida, tal relação não afasta o direito de regresso daquele que pagou em relação aos demais.
Assim, na hipótese de recebimento de honorários, o proveito econômico é o valor da dívida dividido pelo número de executados, devendo incidir os percentuais das gradações do § 3º do art. 85 do CPC/2015.
Em se tratando de exceção de pré-executividade acolhida para excluir sócio do polo passivo de execução fiscal, o proveito econômico corresponde ao valor da dívida executada, devendo ser esta a base de cálculo dos honorários advocatícios de sucumbência com aplicação do art. § 3º do art. 85 do CPC/2015.
RECURSO ESPECIAL
O arbitramento de honorários advocatícios em caso de exclusão de litisconsorte, ainda no início do trâmite processual, sem qualquer oposição do autor, deve observar a regra do art. 338, parágrafo único, do CPC/2015.
REsp 1.935.852-GO, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por maioria, julgado em 4/10/2022, DJe 10/11/2022. (Info 760)
Tadeu ajuizou ação em face de Creisson. Este, em contestação, alegou sua ilegitimidade passiva, sustentando que a ação deveria ser ajuizada em face de Creiton.
Tadeu concordou com a alegação e, em decisão interlocutória, o juiz determinou a retificação do polo passivo para excluir Creisson e incluir Creiton. Na mesma decisão, condenou Tadeu ao pagamento de honorários de 3% sobre o valor da causa com fundamento no art. 338 do CPC.
Inconformado, Creisson interpôs recurso por entender que os honorários devidos deveriam observar o patamar mínimo de 10% previsto no art. 85, §2º da mesma norma.
CPC/2015:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I – o grau de zelo do profissional;
II – o lugar de prestação do serviço;
III – a natureza e a importância da causa;
IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
Art. 338. Alegando o réu, na contestação, ser parte ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo invocado, o juiz facultará ao autor, em 15 (quinze) dias, a alteração da petição inicial para substituição do réu.
Parágrafo único. Realizada a substituição, o autor reembolsará as despesas e pagará os honorários ao procurador do réu excluído, que serão fixados entre três e cinco por cento do valor da causa ou, sendo este irrisório, nos termos do art. 85, § 8º .
R: Entre 3% e 5% do valor da causa!!!!
Cinge-se a discussão à fixação dos honorários advocatícios em caso de julgamento parcial do mérito, excluindo-se da lide litisconsorte considerada parte ilegítima na relação processual.
A regra do § 2º do art. 85 do CPC/2015 determina que os honorários advocatícios sejam fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.
Já a disposição do § 8º do referido dispositivo legal prescreve que, nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
Efetivamente, a Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.746.072/PR, decidiu que os honorários advocatícios de sucumbência devem ser fixados, via de regra, sobre o valor do proveito econômico obtido ou, não sendo possível quantificar o proveito econômico do vencedor da demanda, sobre o valor atualizado da causa.
Excepcionalmente, poderão ser fixados por apreciação equitativa, havendo ou não condenação, nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico, ou em que o valor da causa for muito baixo.
Entretanto, no caso, trata-se de fixação de honorários advocatícios em caso de exclusão de litisconsorte, ainda no início do trâmite processual, sem oposição alguma da autora.
Sobreleva o recente julgado desta Terceira Turma concluir que o juiz, ao reconhecer a ilegitimidade ad causam de um dos litisconsortes passivos e excluí-lo da lide, não está obrigado a fixar, em seu benefício, honorários advocatícios sucumbenciais mínimos de 10% sobre o valor da causa.
Afastada a impossibilidade de fixação dos honorários advocatícios abaixo do mínimo legal previsto na regra geral do art. 85, § 2º, do CPC, a verba deve ser majorada, em razão da possibilidade de distinção, com fundamento no art. 338 do CPC/2015.
O arbitramento de honorários advocatícios em caso de exclusão de litisconsorte, ainda no início do trâmite processual, sem qualquer oposição do autor, deve observar a regra do art. 338, parágrafo único, do CPC/2015.
PROCESSO SOB SEGREDO DE JUSTIÇA
A procuração juntada em outro processo conexo ou incidental, não apensado ao principal, não produz efeito em favor do recorrente no Superior Tribunal de Justiça.
Processo sob segredo judicial, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/11/2022, DJe 21/11/2022. (Info 760)
Craudio, representado pelo Dr. Creisson, ajuizou ação em face de Creosvaldo. A ação foi julgada improcedente em primeiro grau, razão pela qual Craudio recorreu. Ocorre que, ao interpor agravo no STJ, Dr. Creisson esqueceu de juntar a procuração.
O recurso não foi conhecido em razão da falta de procuração. Em novo agravo, Dr. Creisson alegou a existência de procuração no processo principal.
CPC/2015:
Art. 76. Verificada a incapacidade processual ou a irregularidade da representação da parte, o juiz suspenderá o processo e designará prazo razoável para que seja sanado o vício.
§ 2º Descumprida a determinação em fase recursal perante tribunal de justiça, tribunal regional federal ou tribunal superior, o relator:
I – não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente;
R: Nooops!!!
O art. 76, § 2º, I, do CPC/2015 prevê que não se conhece do recurso quando a parte recorrente, apesar de intimada, deixa de sanar vício na representação processual no prazo fixado.
A alegação da existência de procuração nos autos principais pelo recorrente não é capaz de sanar o vício.
A jurisprudência do STJ é no sentido de que “a procuração juntada em outro processo conexo ou incidental, não apensado, não produz efeito em favor do recorrente neste Tribunal Superior. O entendimento uniforme é de que cabe ao recorrente diligenciar, nos autos do recurso a ser julgado nesta Corte, a regularidade da representação processual mediante a juntada do respectivo instrumento de mandato e da cadeia de substabelecimentos existente, passada ao subscritor da peça recursal. Sem isso, não se pode, de fato, conhecer do recurso” (AgInt nos EAREsp 416.557/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 28/9/2016, DJe 07/10/2016).
A procuração juntada em outro processo conexo ou incidental, não apensado ao principal, não produz efeito em favor do recorrente no Superior Tribunal de Justiça.
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS
É manifestamente incabível pedido de reconsideração em face de acórdão, bem como o seu recebimento como embargos de declaração ante a inadmissibilidade da incidência do princípio da fungibilidade recursal quando constatada a ocorrência de erro inescusável.
RCD no AgRg no HC 746.844-SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 8/11/2022, DJe 11/11/2022. (Info 760)
Nirso impetrou Habeas Corpus, o que foi denegado, motivando novo HC, impetrado desta vez no STJ. Novamente, a ordem foi denegada. Nirso então protocolou pedido de reconsideração reiterando os argumentos iniciais, requerendo a concessão da ordem e subsidiariamente seu recebimento como embargos declaratórios.
R: Nooops!!!!
Afigura-se descabido formular pedido de reconsideração contra acórdão, ante à ausência de previsão legal ou regimental, só se vislumbrando a sua possibilidade em face de decisão monocrática.
Deve ser destacado, ainda, ser inviável a incidência do princípio da fungibilidade recursal, a fim de receber o pedido como embargos de declaração, diante da existência de erro inescusável, conforme entendimento assente no STJ (AgRg nos EDcl no AgRg no HC 570.813/RJ, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 15/9/2020, DJe de 21/9/2020).
É manifestamente incabível pedido de reconsideração em face de acórdão, bem como o seu recebimento como embargos de declaração ante a inadmissibilidade da incidência do princípio da fungibilidade recursal quando constatada a ocorrência de erro inescusável.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL
As pessoas físicas titulares de serviços notariais e de registro não se enquadram na definição de sujeito passivo da contribuição para o salário-educação.
AgInt no REsp 2.011.917-PR, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 9/11/2022, DJe 11/11/2022. (Info 760)
Maurício, aluno do ECJ, foi aprovado no concurso de notário. Assumiu a serventia, contratou empregados e recolhia seus impostos de maneira regular. Tudo ia bem, até que um dia a Receita Federal passou a exigir que Maurício também recolhesse o salário-educação à alíquota de 2,5% sobre a remuneração paga aos seus empregados.
Maurício discordou da cobrança e impetrou MS requerendo que fosse declarada a desnecessidade pagar o salário-educação. Conforme Maurício, a contribuição ao salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, o que não o enquadraria como contribuinte.
Lei 9.424/96:
Art 15. O Salário-Educação, previsto no art. 212, § 5º, da Constituição Federal e devido pelas empresas, na forma em que vier a ser disposto em regulamento, é calculado com base na alíquota de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o total de remunerações pagas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, assim definidos no art. 12, inciso I, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
R: Nooops!!!!
Na forma da jurisprudência do STJ, firmada sob o rito dos recursos repetitivos, “a contribuição para o salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, assim entendidas as firmas individuais ou sociedades que assumam o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, em consonância com o art. 15 da Lei 9.424/96, regulamentado pelo Decreto 3.142/99, sucedido pelo Decreto 6.003/2006” (STJ, REsp 1.162.307/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 3/12/2010).
Nos termos, ainda, da jurisprudência do STJ “a definição do sujeito passivo da obrigação tributária referente à contribuição ao salário-educação foi realizada pelo art. 1º, § 3º, da Lei 9.766/98, pelo art. 2º, § 1º, do Decreto 3.142/99 e, posteriormente, pelo art. 2º, do Decreto 6.003/2006. Sendo assim, em havendo lei específica e regulamento específico, não se aplica à contribuição ao salário-educação o disposto no parágrafo único do art. 15 da Lei 8.212/91, que estabelece a equiparação de contribuintes individuais e pessoas físicas a empresas no que diz respeito às contribuições previdenciárias” (STJ, REsp 1.812.828/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 31/8/2022).
Com relação às pessoas físicas titulares de serviços notariais e de registro, o STJ já proclamou que elas não se enquadram na definição de sujeito passivo da contribuição para o salário-educação, ao fundamento de que “o art. 178 da CF/69 indica como sujeito passivo da contribuição para o salário-educação as empresas comerciais, industriais e agrícolas. O Tabelionato de Notas é uma serventia judicial, que desenvolve atividade estatal típica, não se enquadrando como empresa” (STJ, REsp 262.972/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJU 27/5/2002).
As pessoas físicas titulares de serviços notariais e de registro não se enquadram na definição de sujeito passivo da contribuição para o salário-educação.
RECURSO ESPECIAL
Na apuração do resultado de votação em assembleia geral de credores, somente serão computados os votos daqueles que efetivamente se manifestaram pela aprovação ou rejeição do plano de recuperação, não se considerando a abstenção para qualquer efeito.
REsp 1.992.192-SC, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 6/12/2022. (Info 760)
A empresa Quebradeira requereu recuperação judicial. Foi apresentado plano de recuperação e, eventualmente, o juízo recuperacional convocou a Assembleia Geral. Após a votação, alguns credores passaram a questionar como deveriam ser computados os votos daqueles que, embora presentes, decidiram se abster.
Uma parte dos credores sustentava que deveriam ser computados como favoráveis ao plano de recuperação, enquanto outra parte entendia que a abstenção deveria ser computada como voto contrário.
Lei n. 11.101/2005:
Art. 42. Considerar-se-á aprovada a proposta que obtiver votos favoráveis de credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembléia-geral, exceto nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial nos termos da alínea a do inciso I do caput do art. 35 desta Lei, a composição do Comitê de Credores ou forma alternativa de realização do ativo nos termos do art. 145 desta Lei.
Art. 45. Nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar a proposta.
§ 1º Em cada uma das classes referidas nos incisos II e III do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembléia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes.
§ 2º Nas classes previstas nos incisos I e IV do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor de seu crédito.
§ 3º O credor não terá direito a voto e não será considerado para fins de verificação de quorum de deliberação se o plano de recuperação judicial não alterar o valor ou as condições originais de pagamento de seu crédito.
Código Civil:
Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.
R: Nooops!!!!
Cinge-se a controvérsia a determinar como devem ser consideradas as abstenções para apuração do resultado de votação em assembleia geral de credores, no âmbito de recuperação judicial.
Conforme dispõem os arts. 42 e 45 da Lei n. 11.101/2005, a aprovação da proposta do plano de recuperação judicial apresentada pelo devedor exige a obtenção de “votos favoráveis de credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembleia-geral”.
No entanto, diante da lacuna na lei quanto à qualificação do credor que, apesar de presente na assembleia geral, se abstém do exercício do seu direito de voto, não se mostra viável compreender, que aquele que não manifesta sua posição, independentemente do motivo, anuiu com o plano proposto, de modo a computar sua abstenção como apta a compor a aprovação do plano de recuperação judicial.
Nessa hipótese, não se apresenta possível a aplicação do disposto no art. 111 do Código Civil de 2002 que estabelece: “O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa“, porquanto a Lei n. 11.101/2005 impõe a necessidade de votação favorável da maioria dos credores, ou seja, é imprescindível a declaração de vontade expressa favorável para a aprovação do plano de recuperação.
Desse modo, não é possível conferir-se uma interpretação extensiva ao artigo 45 da Lei n. 11.101/05 para atribuir à abstenção a qualidade de voto “positivo (sim)”, porquanto a lei de regência exige a manifestação expressa e favorável dos credores, para efeito de aprovação do plano recuperacional, sendo inviável a mera presunção de anuência.
Por fim, ao credor que, presente na assembleia geral, se abstém de votar, deve ser conferido o mesmo tratamento dado ao credor ausente, ou seja, não pode compor o quorum de deliberação, seja pelo valor do crédito seja pelo número de credores, pois a abstenção não pode influenciar no resultado da deliberação pela aprovação ou rejeição da proposta.
Na apuração do resultado de votação em assembleia geral de credores, somente serão computados os votos daqueles que efetivamente se manifestaram pela aprovação ou rejeição do plano de recuperação, não se considerando a abstenção para qualquer efeito.
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS
A Lei n. 13.964/2019, ao promover alterações na Lei de Execução Penal, apenas afastou o caráter hediondo ou equiparado do tráfico privilegiado, nada dispondo sobre os demais dispositivos da Lei de Drogas.
AgRg no HC 754.913-MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 6/12/2022. (Info 760)
Creitinho foi condenado pelo crime de tráfico de drogas. Já na execução da pena, sua defesa requereu que fosse excluída a classificação de delito assemelhado a hediondo e que Creitinho tivesse direito aos benefícios da execução penal aplicáveis aos condenados por crime comum.
Fundamentou o pedido na tese de que não haveria norma específica que preveja o crime de tráfico de drogas como hediondo ou equiparado.
Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLIII – a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;
Lei n. 7.210/1984:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006.
R: Afff!!!!
A equiparação a hediondo do delito de tráfico de drogas decorre de previsão constitucional constante no art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, que trata com mais rigor os crimes de maior reprovabilidade.
Ocorre que a Lei n. 13.964/2019, conhecida como “Pacote Anticrime”, ao promover alterações na Lei de Execução Penal, apenas afastou o caráter hediondo ou equiparado do tráfico privilegiado, previsto no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, nada dispondo sobre os demais dispositivos da Lei de Drogas.
Assim dispõe o art. 112, § 5º, da Lei n. 7.210/1984, incluído pela Lei n. 13.964/2019: “Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: […] § 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006“.
A Lei n. 13.964/2019, ao promover alterações na Lei de Execução Penal, apenas afastou o caráter hediondo ou equiparado do tráfico privilegiado, nada dispondo sobre os demais dispositivos da Lei de Drogas.
HABEAS CORPUS
A abordagem policial em estabelecimento comercial, ainda que a diligência tenha ocorrido quando não havia mais clientes, é hipótese de local aberto ao público, que não recebe a proteção constitucional da inviolabilidade do domicílio.
HC 754.789-RS, Rel. Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 6/12/2022. (Info 760)
Em uma investigação criminal, a polícia recebeu uma ligação anônima afirmando que uma carga furtada estaria na borracharia de Tião. Os policiais diligenciaram no local indicado. Aguardaram até não mais ter clientes nas dependências do estabelecimento, quando abordaram o acusado, que, de pronto, indicou o local em que estocada a res furtiva.
Após a condenação, a defesa de Tião impetrou HC alegando que a denúncia anônima não seria razão suficiente para a violação de “domicílio” de Tião.
Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XI – a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
R: Não né…
Nos termos do art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal, “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
Consoante decidido no RE 603.616/RO, pelo Supremo Tribunal Federal, “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que, dentro da casa, ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil, e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados”.
Todavia, no caso, verifica-se que os policiais afirmaram que “havia uma investigação em andamento relativa a um roubo de carga, tendo sido veiculada denúncia anônima dando conta de que parte do carregamento subtraído estava nas dependências da borracharia pertencente ao réu, diante do que procederam à diligência local“.
Em razão de haver investigações em curso, relativa ao roubo de uma carga, os policiais diligenciaram no local indicado. Aguardaram até não mais ter clientes nas dependências do estabelecimento, quando abordaram o acusado, que, de pronto, indicou o local em que estocada a res furtiva.
Portanto, a abordagem policial foi realizada em um imóvel no qual funcionava estabelecimento comercial, e, mesmo que a diligência tenha ocorrido quando não havia mais clientes, no horário em que o proprietário iria fechar a borracharia, a hipótese passa a ser de local aberto ao público.
Desse modo, como se trata de estabelecimento comercial – em funcionamento e aberto ao público – não pode receber a proteção que a Constituição Federal confere à casa. Assim, não há violação à garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio, a caracterizar a ocorrência de constrangimento ilegal.
A abordagem policial em estabelecimento comercial, ainda que a diligência tenha ocorrido quando não havia mais clientes, é hipótese de local aberto ao público, que não recebe a proteção constitucional da inviolabilidade do domicílio.
HABEAS CORPUS
O simples fato de o acusado ter antecedente por tráfico de drogas não autoriza a realização de busca domiciliar, porquanto desacompanhado de outros indícios concretos e robustos de que, nesse momento específico, ele guarda drogas em sua residência. (1) Mesmo se ausente coação direta e explícita sobre o acusado, as circunstâncias de ele já haver sido preso em flagrante pelo porte da arma de fogo em via pública e estar detido, sozinho – sem a oportunidade de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos -, diante de dois policiais armados, poderiam macular a validade de eventual consentimento para a realização de busca domiciliar, em virtude da existência de um constrangimento ambiental/circunstancial. (2)
HC 762.932-SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 22/11/2022, DJe 30/11/2022. (Info 760)
Policiais receberam uma denúncia anônima segundo a qual Creitinho estava com uma arma de fogo em via pública, razão por que o abordaram e encontraram a referida arma. Depois disso, decidiram ir até a sua residência e entraram no imóvel com a suposta autorização do rapaz, oportunidade em que soltaram cães farejadores de drogas, sob a justificativa de que o réu tinha um antecedente por tráfico. Naturalmente, foram encontradas drogas.
Sua defesa impetrou HC alegando a nulidade da busca na casa bem como a coação no suposto consentimento para tanto.
Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XI – a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
Código Civil:
Art. 152. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.
Estatuto do Desarmamento:
Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido
Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente.
Código de Defesa do Consumidor:
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
R: Nooops!!!!
O art. 5º, XI, da Constituição Federal consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, ao dispor que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.
O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral (Tema 280), que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE n. 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010).
Ao julgar o REsp n. 1.574.681/RS (DJe 30/5/2017), a colenda Sexta Turma decidiu, à unanimidade, que não se há de admitir que a mera constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, justifique a medida. Se o próprio juiz só pode determinar a busca e apreensão durante o dia, e mesmo assim mediante decisão devidamente fundamentada, após prévia análise dos requisitos autorizadores da medida, não seria razoável conferir a um servidor da segurança pública total discricionariedade para, a partir de mera capacidade intuitiva, entrar de maneira forçada na residência de alguém e, então, verificar se nela há ou não alguma substância entorpecente. A ausência de justificativas e de elementos seguros a autorizar a ação dos agentes públicos, diante da discricionariedade policial na identificação de situações suspeitas relativamente à ocorrência de tráfico de drogas, pode acabar esvaziando o próprio direito à privacidade e à inviolabilidade de sua condição fundamental.
No referido julgamento, concluiu-se, portanto, que, para legitimar-se o ingresso em domicílio alheio, é necessário tenha a autoridade policial fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida.
No caso, os policiais receberam uma denúncia anônima segundo a qual o acusado estava com uma arma de fogo em via pública, razão por que o abordaram e encontraram a referida arma. Depois disso, decidiram ir até a sua residência e entraram no imóvel com a suposta autorização do paciente, oportunidade em que soltaram cães farejadores de drogas, sob a justificativa de que o réu tinha um antecedente por tráfico.
Não houve referência a prévia investigação, monitoramento ou campanas no local, a afastar a hipótese de que se tratava de averiguação de informações robustas e atuais acerca da existência de drogas naquele lugar. Da mesma forma, não se fez menção a nenhuma atitude suspeita, externalizada em atos concretos, tampouco movimentação de pessoas típica de comercialização de drogas. A denúncia anônima, aliás, nem sequer tratava da presença de entorpecentes no imóvel, mas sim do porte de arma de fogo em via pública distante do domicílio, a qual já havia sido encontrada e apreendida.
O simples fato de o acusado ter um antecedente por tráfico não autorizava a realização de busca domiciliar, porquanto desacompanhado de outros indícios concretos e robustos de que, naquele momento específico, ele guardava drogas em sua residência.
Admitir a validade desse fundamento para, isoladamente, autorizar essa diligência invasiva, implicaria, em última análise, permitir que todo indivíduo que um dia teve algum registro criminal na vida tenha seu lar diuturnamente vasculhado pelas forças policiais, a ensejar, além da inadmissível prevalência do “Direito Penal do autor” sobre o “Direito Penal do fato”, uma espécie de perpetuação da pena restritiva de liberdade, por vezes até antes que ela seja imposta.
Isso porque, mesmo depois de cumprida a sanção penal (ou até antes da condenação), todo sentenciado (ou acusado ou investigado) poderia ter sua residência vistoriada, a qualquer momento, para “averiguação” da existência de drogas, como se a anotação criminal lhe despisse para todo o sempre da presunção de inocência e da garantia da inviolabilidade domiciliar, além de lhe impingir uma marca indelével de suspeição.
As regras de experiência e o senso comum, somados às peculiaridades do caso concreto, não conferem verossimilhança à afirmação dos agentes policiais de que o paciente, depois de ser abordado e preso por porte de arma de fogo em via pública distante de sua residência, sabendo ter drogas em casa, haveria livre e espontaneamente franqueado a realização de buscas no imóvel com cães farejadores, os quais fatalmente encontrariam tais substâncias.
Em verdade, caberia aos agentes que atuam em nome do Estado demonstrar, de modo inequívoco, que o consentimento do morador foi livremente prestado, ou que, na espécie, havia em curso na residência uma clara situação de comércio espúrio de droga, a autorizar, pois, o ingresso domiciliar mesmo sem consentimento válido do morador.
Mesmo se ausente coação direta e explícita sobre o acusado, as circunstâncias de ele já haver sido preso em flagrante pelo porte da arma de fogo em via pública e estar detido, sozinho – sem a oportunidade de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos -, diante de dois policiais armados, poderiam macular a validade de eventual consentimento (caso provado), em virtude da existência de um constrangimento ambiental/circunstancial. Isso porque a prova do consentimento do morador é um requisito necessário, mas não suficiente, por si só, para legitimar a diligência policial, porquanto deve ser assegurado que tal consentimento, além de existente, seja válido, isto é, livre de vícios aptos a afetar a manifestação de vontade.
O art. 152 do Código Civil, ao disciplinar a coação como um dos vícios do consentimento nos negócios jurídicos, dispõe que: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela”. Se, no Direito Civil, que envolve, em regra, direitos patrimoniais disponíveis, em uma relação equilibrada entre particulares, todas as circunstâncias que possam influir na liberdade de manifestação da vontade devem ser consideradas, com muito mais razão isso deve ocorrer no Direito Penal (lato sensu), que trata de direitos indisponíveis de um indivíduo diante do poderio do Estado, em relação manifestamente desigual.
Retomando a situação em análise, uma vez que o acusado já estava preso por porte de arma de fogo em via pública, sozinho, diante de dois policiais armados, sem a opção de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos, não é crível que estivesse em plenas condições de prestar livre e válido consentimento para que os agentes de segurança estendessem a diligência com uma varredura especulativa auxiliada por cães farejadores em seu domicílio à procura de drogas, a ponto de lhe impor uma provável condenação de 5 a 15 anos de reclusão, além da pena prevista para o crime do art. 14 do Estatuto do Desarmamento, no qual já havia incorrido.
A diligência policial, no caso dos autos, a rigor, configurou verdadeira pescaria probatória (fishing expedition) no domicílio do acusado, definida pela doutrina como a “Apropriação de meios legais para, sem objetivo traçado, ‘pescar’ qualquer espécie de evidência, tendo ou não relação com o caso concreto. Trata-se de uma investigação especulativa e indiscriminada, sem objetivo certo ou declarado, que, de forma ampla e genérica, ‘lança’ suas redes com a esperança de ‘pescar’ qualquer prova, para subsidiar uma futura acusação ou para tentar justificar uma ação já iniciada”.
Com efeito, uma vez que a arma de fogo mencionada na denúncia anônima já havia sido apreendida com o paciente em via pública (distante da residência, frise-se) e não existia nenhum indício concreto, nem sequer informação apócrifa, quanto à presença de drogas no interior do imóvel, não havia razão legítima para que os agentes de segurança se dirigissem até o local e realizassem varredura meramente especulativa à procura de entorpecentes com cães farejadores. Cabia-lhes, apenas, diante do encontro da arma de fogo em via pública, conduzir o réu à delegacia para a lavratura do auto de prisão em flagrante.
Válido o consentimento pós prisão por porte de arma???
Noopsss!!!
Mesmo se ausente coação direta e explícita sobre o acusado, as circunstâncias de ele já haver sido preso em flagrante pelo porte da arma de fogo em via pública e estar detido, sozinho – sem a oportunidade de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos -, diante de dois policiais armados, poderiam macular a validade de eventual consentimento (caso provado), em virtude da existência de um constrangimento ambiental/circunstancial. Isso porque a prova do consentimento do morador para a realização de busca domiciliar é um requisito necessário, mas não suficiente, por si só, para legitimá-la, porquanto deve ser assegurado que tal consentimento, além de existente, seja válido, isto é, livre de vícios aptos a afetar a manifestação de vontade.
Na doutrina e na jurisprudência norte-americanas, dedicadas há décadas a analisar o tema do consentimento do morador, a compreensão geral é a de que, para ser válido, ele “deve ser inequívoco, específico e conscientemente dado, não contaminado por qualquer truculência ou coerção.
Em Scheneckloth v. Bustamonte, 412 U.S. 218 (1973), a Suprema Corte dos Estados Unidos estabeleceu algumas orientações sobre o significado do termo “consentimento”. Decidiu-se que as buscas mediante consentimento do morador (ou, como no caso, do ocupante do automóvel onde se realizou a busca) são permitidas, “mas o Estado carrega o ônus de provar ‘que o consentimento foi, de fato, livre e voluntariamente dado'”.
O consentimento não é livre quando de alguma forma se percebe uma coação da sua vontade. A Corte indicou que o teste da “totality of circumstances” deve ser aplicado mentalmente, considerando fatores subjetivos, relativos ao próprio suspeito (i.e., se ele é particularmente vulnerável devido à falta de estudos, baixa inteligência, perturbação mental ou intoxicação por drogas ou álcool) e fatores objetivos que sugerem coação (se estava detido, se os policiais estavam com suas armas à vista, ou se lhe disseram ter o direito de realizar a busca, ou exercitaram outras formas de sutil coerção), entre outras hipóteses que poderiam interferir no livre assentimento do suspeito. Em geral, “quando um promotor se apoia no consentimento para justificar a legalidade de uma busca, ele tem o ônus de provar que o consentimento foi, de fato, dado livre e voluntariamente”.
São as seguintes as diretrizes construídas pela Suprema Corte para aferir a validade do ingresso domiciliar por agentes policiais: 1. Número de policiais; 2. Suspeito cercado de policiais; 3. Atitude dos policiais; 4. Exigência da busca; 5. Ameaças ao suspeito; 6. Hora da diligência.
O art. 152 do Código Civil, ao disciplinar a coação como um dos vícios do consentimento nos negócios jurídicos, dispõe que: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela”. De acordo com a doutrina, a declaração de vontade diz respeito à existência do negócio, mas só se poderá considerar válida tal declaração (plano da validade) se assegurada a sua total lisura.
Se, no Direito Civil, que envolve, em regra, direitos patrimoniais disponíveis, em uma relação equilibrada entre particulares, todas as circunstâncias que possam influir na liberdade da manifestação de vontade devem ser consideradas, com muito mais razão isso deve ocorrer no Direito Penal (lato sensu), que trata de direitos indisponíveis de um indivíduo diante do poderio do Estado, em relação manifestamente desigual.
É justamente essa disparidade de forças, aliás, somada à ausência de liberdade negocial concreta, que leva ao frequente reconhecimento da invalidade da manifestação de vontade da parte hipossuficiente no âmbito do Direito do Consumidor, mesmo quando externada por escrito e relativa a direitos disponíveis, em virtude da abusividade de cláusulas impostas pelo lado mais forte, nos termos, por exemplo, do art. 51, IV do Código de Defesa do Consumidor.
Não se pretende, em absoluto, relacionar a invalidade da manifestação de vontade do réu, necessariamente, à constatação de violência policial explícita e dolosa, vale dizer, à existência de coação direta. Conforme se demonstrou acima, com base na jurisprudência da Suprema Corte dos EUA, muitas vezes o constrangimento pode ser causado implicitamente pelo aparato policial ao indivíduo em virtude de circunstâncias objetivas da abordagem em cotejo com as condições pessoais do sujeito interpelado. A coação é circunstancial.
Em outras palavras, não se trata de menoscabar a valorosa atividade policial ou de presumir a prática de abuso por parte dos agentes de segurança pública, mas apenas de se ponderar o receio e a impossibilidade concreta dos cidadãos, em certos contextos fáticos, de contrariar as solicitações feitas por autoridades estatais.
Para auxiliar na compreensão desta ideia, é pertinente lembrar do chamado metus publicae potestatis, consistente no temor do particular diante de uma autoridade pública (em tradução literal “medo do poder público”), figura considerada pela doutrina para distinguir, por exemplo, o crime de extorsão do crime de concussão, tipo penal cujo núcleo “exigir” pode se configurar em razão dessa intimidação contextual/ambiental, a despeito da ausência de violência ou ameaça expressas por parte do funcionário público.
Na hipótese dos autos, uma vez que o acusado já estava preso por porte de arma de fogo em via pública, sozinho, diante de dois policiais armados, sem a opção de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos, não é crível que estivesse em plenas condições de prestar livre e válido consentimento para que os agentes de segurança estendessem a diligência com uma varredura especulativa auxiliada por cães farejadores em seu domicílio à procura de drogas, a ponto de lhe impor uma provável condenação de 5 a 15 anos de reclusão, além da pena prevista para o crime do art. 14 do Estatuto do Desarmamento, no qual já havia incorrido.
O simples fato de o acusado ter antecedente por tráfico de drogas não autoriza a realização de busca domiciliar, porquanto desacompanhado de outros indícios concretos e robustos de que, nesse momento específico, ele guarda drogas em sua residência. (1) Mesmo se ausente coação direta e explícita sobre o acusado, as circunstâncias de ele já haver sido preso em flagrante pelo porte da arma de fogo em via pública e estar detido, sozinho – sem a oportunidade de ser assistido por defesa técnica e sem mínimo esclarecimento sobre seus direitos -, diante de dois policiais armados, poderiam macular a validade de eventual consentimento para a realização de busca domiciliar, em virtude da existência de um constrangimento ambiental/circunstancial. (2)
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