Informativo nº 728 do STJ COMENTADO pintando na telinha (do seu computador, notebook, tablet, celular…) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!
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DIREITO ADMINISTRATIVO 1. (Im)Possibilidade da homologação judicial de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRRAVO EM RECURSO ESPECIAL É possível a homologação judicial de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal. EAREsp 102.585-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 09/03/2022. (Info 728) 1.1. Situação FÁTICA. O MPE ajuizou ação civil pública na qual narra que Sanep e a Intranscol firmaram contrato para execução de serviços de coleta, transporte e destinação final de lixo domiciliar e urbano, que sofreu aditamento para inclusão de serviços já previstos da avença original avaliados em aproximadamente R$ 7 mil/mês. Ou seja, o recolhimento nos balneários já estava previsto no contrato não havendo qualquer motivo para que a contratada incluísse os respectivos custos para calcular o preço da parcela a ser acrescida ao preço antes ajustado. Assim agindo, a contratada calculou o preço do serviço acrescido considerando que utilizaria mais um veículo compactador, mais um motorista e mais quatro operários, quando, na verdade, a coleta de lixo seria feita com os mesmos caminhões e funcionários que faziam o serviço nos balneários. A sentença condenatória foi combatida por meio de diversos recursos até que, após alteração promovida pelo “pacote anticrime”, surgiu a possibilidade de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa. Iniciou-se então a discussão acerca da possibilidade da homologação judicial de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal. 1.2. Análise ESTRATÉGICA. 1.2.1. Questão JURÍDICA. Lei n. 8.429/1992: Art. 17. A ação para a aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), salvo o disposto nesta Lei. § 10-A. Havendo a possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias. Art. 17-B. O Ministério Público poderá, conforme as circunstâncias do caso concreto, celebrar acordo de não persecução civil, desde que dele advenham, ao menos, os seguintes resultados: 1.2.2. Possível a homologação do acordo em fase recursal? R: Yeap!!! A controvérsia diz respeito à possibilidade da homologação judicial de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal, em decorrência da alteração advinda com a Lei n. 13.964/2019, denominada “Pacote Anticrime”, que alterou o § 1º do art. 17 da Lei n. 8.429/1992, in verbis : 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta Lei. O referido diploma legal também introduziu o § 10-A ao art. 17 da LIA, com a seguinte redação: Havendo a possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias. A partir do panorama normativo antes mencionado, a jurisprudência da Primeira Turma do STJ vem possibilitando a homologação de tais avenças em sede recursal.Não é demais ressaltar que a Lei n. 14.230/2021, que alterou significativamente o regramento da improbidade administrativa, incluiu o art. 17-B à Lei n. 8.429/1992, trazendo previsão normativa explícita quanto à possibilidade do acordo em exame até mesmo no momento da execução da sentença . 1.2.3. Resultado final. É possível a homologação judicial de acordo de não persecução cível no âmbito da ação de improbidade administrativa em fase recursal. DIREITO CIVIL 2. (I)Licitude dos descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários RECURSO ESPECIAL São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. REsp 1.863.973-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 09/03/2022. (Tema 1085) (Info 728) 2.1. Situação FÁTICA. Creosvalda promoveu ação de obrigação de fazer contra o Banco Brasa, tendo por propósito obstar que a instituição financeira demandada promovesse, para a quitação das parcelas de empréstimos bancários contratados, o desconto de quantia superior a 30% de seus rendimentos líquidos em conta corrente na qual recebe seu salário. O pedido foi julgado procedente pelo juiz de primeiro grau, decisão mantida pelo Tribunal local que entendeu admissível a limitação dos descontos diante do caráter alimentar do salário. Inconformado, o Banco interpôs recurso especial no qual sustenta que Creosvalda firmou contrato no qual ficou estabelecido o desconto em conta corrente, inexistindo nenhuma ilegalidade de seu teor. Ressaltou que o desconto dos valores existentes na conta corrente, a fim de quitar as parcelas de empréstimos, com expressa previsão contratual nesse sentido, decorre da explícita manifestação de vontade da mutuária, inexistindo ilegalidade em tal ajuste. 2.2. Análise ESTRATÉGICA. 2.2.1. Questão JURÍDICA. Lei n. 10.820/2003: Art. 1o Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. § 1o O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para. I – a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou II – a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. 2.2.2. Possível o desconto na conta recebedora de salários? R: SIM, desde que haja previsão contratual!!! A controvérsia está em definir se, no bojo de contrato de mútuo bancário comum, em que há expressa autorização do mutuário para que o pagamento se dê por meio de descontos mensais em sua conta-corrente, é aplicável ou não, por analogia, a limitação de 35% (trinta e cinco por cento) prevista na Lei n. 10.820/2003, que disciplina o contrato de crédito consignado em folha de pagamento (chamado empréstimo consignado). O empréstimo consignado apresenta-se como uma das modalidades de empréstimo com menores riscos de inadimplência para a instituição financeira mutuante, na medida em que o desconto das parcelas do mútuo dá-se diretamente na folha de pagamento do trabalhador regido pela CLT, do servidor público ou do segurado do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, sem nenhuma ingerência por parte do mutuário/correntista, o que, por outro lado, em razão justamente da robustez dessa garantia, reverte em taxas de juros significativamente menores em seu favor, se comparado com outros empréstimos. Uma vez ajustado o empréstimo consignado em folha de pagamento, não é dado ao mutuário, por expressa disposição legal, revogar a autorização concedida para que os descontos afetos ao mútuo ocorram diretamente em sua folha de pagamento, a fim de modificar a forma de pagamento ajustada. Nessa modalidade de empréstimo, a parte da remuneração do trabalhador comprometida à quitação do empréstimo tomado não chega nem sequer a ingressar em sua conta-corrente, não tendo sobre ela nenhuma disposição. Sob o influxo da autonomia da vontade, ao contratar o empréstimo consignado, o mutuário não possui nenhum instrumento hábil para impedir a dedução da parcela do empréstimo a ser descontada diretamente de sua remuneração, em procedimento que envolve apenas a fonte pagadora e a instituição financeira. É justamente em virtude do modo como o empréstimo consignado é operacionalizado que a lei estabeleceu um limite, um percentual sobre o qual o desconto consignado em folha não pode exceder. Revela-se claro o escopo da lei de, com tal providência, impedir que o tomador de empréstimo, que pretenda ter acesso a um crédito relativamente mais barato na modalidade consignado, acabe por comprometer sua remuneração como um todo, não tendo sobre ela nenhum acesso e disposição, a inviabilizar, por consequência, sua subsistência e de sua família. Diversamente, nas demais espécies de mútuo bancário, o estabelecimento (eventual) de cláusula que autoriza o desconto de prestações em conta-corrente, como forma de pagamento, consubstancia uma faculdade dada às partes contratantes, como expressão de sua vontade, destinada a facilitar a operacionalização do empréstimo tomado, sendo, pois, passível de revogação a qualquer tempo pelo mutuário . Nesses empréstimos, o desconto automático que incide sobre numerário existente em conta-corrente decorre da própria obrigação assumida pela instituição financeira no bojo do contrato de conta-corrente de administração de caixa, procedendo, sob as ordens do correntista, aos pagamentos de débitos por ele determinados, desde que verificada a provisão de fundos a esse propósito. Registre-se, inclusive, não se afigurar possível – consideradas as características intrínsecas do contrato de conta-corrente – à instituição financeira, no desempenho de sua obrigação contratual de administrador de caixa, individualizar a origem dos inúmeros lançamentos que ingressam na conta-corrente e, uma vez ali integrado, apartá-los, para então sopesar a conveniência de se proceder ou não a determinado pagamento, de antemão ordenado pelo correntista. Essa forma de pagamento não consubstancia indevida retenção de patrimônio alheio, na medida em que o desconto é precedido de expressa autorização do titular da conta-corrente, como manifestação de sua vontade, por ocasião da celebração do contrato de mútuo. Tampouco é possível equiparar o desconto em conta-corrente a uma dita constrição de salários, realizada por instituição financeira que, por evidente, não ostenta poder de império para tanto. Afinal, diante das características do contrato de conta-corrente, o desconto, devidamente avençado e autorizado pelo mutuário, não incide, propriamente, sobre a remuneração ali creditada, mas sim sobre o numerário existente, sobre o qual não se tece nenhuma individualização ou divisão. Ressai de todo evidenciado, assim, que o mutuário tem em seu poder muitos mecanismos para evitar que a instituição financeira realize os descontos contratados, possuindo livre acesso e disposição sobre todo o numerário constante de sua conta-corrente . Não se encontra presente nos empréstimos comuns, com desconto em conta-corrente, o fator de discriminação que justifica, no empréstimo consignado em folha de pagamento, a limitação do desconto na margem consignável estabelecida na lei de regência, o que impossibilita a utilização da analogia, com a transposição de seus regramentos àqueles. Refoge, pois, da atribuição jurisdicional, com indevida afronta ao Princípio da Separação do Poderes, promover a aplicação analógica de lei à hipótese que não guarda nenhuma semelhança com a relação contratual legalmente disciplinada. Não se pode conceber, sob qualquer ângulo que se analise a questão, que a estipulação contratual de desconto em conta-corrente, como forma de pagamento em empréstimos bancários comuns, a atender aos interesses e à conveniência das partes contratantes, sob o signo da autonomia da vontade e em absoluta consonância com as diretrizes regulamentares expedidas pelo Conselho Monetário Nacional, possa, ao mesmo tempo, vilipendiar direito do titular da conta-corrente, o qual detém a faculdade de revogar o ajuste ao seu alvedrio, assumindo, naturalmente, as consequências contratuais de sua opção. A pretendida limitação dos descontos em conta-corrente, por aplicação analógica da Lei n. 10.820/2003, tampouco se revestiria de instrumento idôneo a combater o endividamento exacerbado, com vistas à preservação do mínimo existencial do mutuário. Essa pretensão, além de subverter todo o sistema legal das obrigações – afinal, tal providência, a um só tempo, teria o condão de modificar os termos ajustados, impondo-se ao credor o recebimento de prestação diversa, em prazo distinto daquele efetivamente contratado, com indevido afastamento dos efeitos da mora, de modo a eternizar o cumprimento da obrigação, num descabido dirigismo contratual -, não se mostraria eficaz, sob o prisma geral da economia, nem sequer sob o enfoque individual do mutuário, ao controle do superendividamento. Tal proceder, sem nenhum respaldo legal, importaria numa infindável amortização negativa do débito, com o aumento mensal e exponencial do saldo devedor, sem que haja a devida conscientização do devedor a respeito do dito “crédito responsável”, o qual, sob a vertente do mutuário, consiste na não assunção de compromisso acima de sua capacidade financeira, sem que haja o comprometimento de seu mínimo existencial. Além disso, a generalização da medida – sem conferir ao credor a possibilidade de renegociar o débito, encontrando-se ausente uma política pública séria de “crédito responsável”, em que as instituições financeiras, por outro lado, também não estimulem o endividamento imprudente – redundaria na restrição e no encarecimento do crédito, como efeito colateral. Por fim, a prevenção e o combate ao superendividamento, com vistas à preservação do mínimo existencial do mutuário, não se dão por meio de uma indevida intervenção judicial nos contratos, em substituição ao legislador. A esse relevante propósito, sobreveio – na seara adequada, portanto – a Lei n. 14.181/2021, que alterou disposições do Código de Defesa do Consumidor, para “aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. 2.2.3. Resultado final. São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. 3. (In)Admissibilidade da penhora do bem de família para saldar o débito originado de contrato de empreitada global celebrado para promover a construção do próprio imóvel RECURSO ESPECIAL Admite-se a penhora do bem de família para saldar o débito originado de contrato de empreitada global celebrado para promover a construção do próprio imóvel. REsp 1.976.743-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022, DJe 11/03/2022. (Info 728) 3.1. Situação FÁTICA. Obra Construções promoveu ação de cobrança em desfavor de Craudio, a qual estava fundada em dois cheques utilizados para pagamento de dívida oriunda de contrato de empreitada firmado para construção do próprio imóvel residencial. Em cumprimento de sentença, o juiz indeferiu o pedido de reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel em nome de Craudio, por se enquadrar em hipótese de exceção à impenhorabilidade de bem de família. Craudio então interpôs recurso especial no qual sustenta que o dispositivo que prevê a exceção à regra de impenhorabilidade deveria ser interpretado restritivamente, englobando apenas o titular do crédito decorrente do financiamento destinado à aquisição ou à construção do imóvel; isto é, o agente financeiro. Aduziu ainda que o valor devido ao credor, objeto do cumprimento de sentença, refere-se à aquisição de materiais de construção e prestação de serviços, de modo que não se enquadraria na exceção legal. 3.2. Análise ESTRATÉGICA. 3.2.1. Questão JURÍDICA. Lei n. 8.009/1990: Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. 3.2.2. Possível a penhora do bem de família? R: Yeaph!!!! As regras que estabelecem hipóteses de impenhorabilidade não são absolutas . O próprio art. 3º da Lei n. 8.009/1990 prevê uma série de EXCEÇÕES à impenhorabilidade, entre as quais está a hipótese em que a ação é movida para cobrança de crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato (inciso II). A controvérsia reside sobre a aplicação desse dispositivo legal à dívida relativa ao contrato de empreitada global, por meio do qual o empreiteiro se obriga a construir a obra e a fornecer os materiais. O STJ já se manifestou, em diversas oportunidades, no sentido de que a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990 se aplica à dívida oriunda do contrato de compra e venda do imóvel. O fundamento central dessa conclusão está relacionado ao intuito do legislador ao prever a exceção legal ora tratada, que foi de evitar que aquele que contribuiu para a aquisição ou construção do imóvel ficasse impossibilitado de receber o seu crédito.A Terceira Turma decidiu que a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990 também incide à hipótese de dívida contraída para aquisição de terreno sobre o qual o devedor edificou, com recursos próprios, a casa que serve de residência da família . Nesse cenário, é nítida a preocupação do legislador no sentido de impedir a deturpação do benefício legal, vindo a ser utilizado como artifício para viabilizar a aquisição, melhoramento, uso, gozo e/ou disposição do bem de família sem nenhuma contrapartida, à custa de terceiros. Portanto, a dívida relativa a contrato de empreitada global, porque viabiliza a construção do imóvel, está abrangida pela exceção prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/1990. 3.2.3. Resultado final. Admite-se a penhora do bem de família para saldar o débito originado de contrato de empreitada global celebrado para promover a construção do próprio imóvel. 4. (I)Legalidade da cláusula contratual que confere à gravadora a propriedade dos masters de obra musical RECURSO ESPECIAL É legal a cláusula contratual que confere à gravadora a propriedade dos masters de obra musical. REsp 1.727.950-RJ, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022. (Info 728) 4.1. Situação FÁTICA. Tião ajuizou nova ação contra a EMO Music pretendendo a extinção dos contratos celebrados entre as partes em razão do descumprimento contratual e, bem assim, a devolução das fitas masters de diversos Long Plays (LP’s). Subsidiariamente, pleiteou acesso irrestrito e por tempo indeterminado às matrizes de seu repertório original. O juiz de primeira instância julgou improcedentes os pedidos, sob o entendimento de que os masters teriam sido contratualmente adquiridos pela EMO, não havendo obstáculo jurídico à reprodução e exploração econômica daqueles fonogramas originais. Inconformado, Tião interpôs recurso especial no qual sustenta impossível conferir interpretação extensiva aos contratos entabulados, em seu prejuízo, para enquadrar referidas avenças como uma compra e venda de fitas masters. 4.2. Análise ESTRATÉGICA. 4.2.1. Questão JURÍDICA. Lei n. 9.610/1998: Art. 5º Para os efeitos desta Lei, considera-se: IX – fonograma – toda fixação de sons de uma execução ou interpretação ou de outros sons, ou de uma representação de sons que não seja uma fixação incluída em uma obra audiovisual; 4.2.2. A cláusula é legal? R: Yeaph!!!! A Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.098.626/RJ, reconheceu que a gravadora violou os direitos morais de músico ao modificar os fonogramas primitivos para comercialização das canções em Compact Disks (CD’s) . Justamente por isso, a condenou a pagar indenização por danos morais e materiais, proibindo-a, também, de produzir e comercializar a obra indevidamente alterada. O acórdão transitado em julgado não restringiu, todavia, a produção e comercialização de novos Long Plays (LP’s) contendo as versões originais da obra musical. O master , como muitas vezes, por metonímia, é designado o resultado final do processo de criação da matriz a ser copiada em vinil, CD ou fita magnética, constitui um fonograma nos termos do art. 5º, IX, da Lei n. 9.610/1998: considera-se fonograma – toda fixação de sons de uma execução ou interpretação ou de outros sons, ou de uma representação de sons que não seja uma fixação incluída em uma obra audiovisual.Isso é fundamental, porque o direito autoral distingue de forma muito clara o corpus misticum , que é a criação autoral propriamente dita, isto é, a obra imaterial fruto do espírito criativo humano; e o corpus mechanicum , que é, simplesmente, o meio físico no qual ela se encontra materializada . Assim, malgrado a distinção técnico-qualitativa existente entre a matriz e as cópias que dela podem ser extraídas, constituem ambas, em última análise, bens corpóreos (corpus mechanicum ) e, nessa condição, podem ser alienadas . Não se vislumbra, por isso, nenhuma ilegalidade flagrante na cláusula contratual que conferiu a propriedade dos masters à gravadora. O direito moral do autor, intangível e imprescritível, não pode suplantar o direito da sociedade de usufruir das manifestações das culturas populares tão caras a qualquer nação. 4.2.3. Resultado final. É legal a cláusula contratual que confere à gravadora a propriedade dos masters de obra musical. 5. Plano de saúde contratado na segmentação hospitalar sem obstetrícia e dever da operadora de cobrir parto de urgência, por complicações no processo gestacional RECURSO ESPECIAL A operadora de plano de saúde tem o dever de cobrir parto de urgência, por complicações no processo gestacional, ainda que o plano tenha sido contratado na segmentação hospitalar sem obstetrícia. REsp 1.947.757-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022, DJe 11/03/2022. (Info 728) 5.1. Situação FÁTICA. Crementina ajuizou ação de responsabilidade civil em face de MedSaúde com fundamento na recusa indevida de cobertura e realização de parto de urgência. Conforme narra Crementina, ela teria contratado plano de saúde na segmentação hospitalar sem obstetrícia quando, por complicações no processo gestacional, foi necessário realizar parto de urgência, cujas despesas a operadora do plano não quis cobrir. A sentença condenou MedSaúde ao pagamento de indenização por danos morais, mas o Tribunal local reduziu o montante da indenização por entender que Crementina tinha ciência da falta de cobertura para o parto e ainda assim tentou atendimento pelo plano. 5.2. Análise ESTRATÉGICA. 5.2.1. Questão JURÍDICA. Lei n. 9.656/1998: Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: I – de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; II – de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional; III – de planejamento familiar. Parágrafo único. A ANS fará publicar normas regulamentares para o disposto neste artigo, observados os termos de adaptação previstos no art. 35. CDC: Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade. Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido. § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. 5.2.2. O plano deve cobrir o parto? R: Yeaph!!!! A Lei n. 9.656/1998 autoriza a contratação de planos de saúde nas segmentações ambulatorial, hospitalar (com ou sem obstetrícia) e odontológica, estabelecendo as exigências mínimas para cada cobertura assistencial disponibilizada aos beneficiários.Tratando-se de plano de saúde hospitalar sem obstetrícia, a cobertura MÍNIMA está vinculada à prestação de serviços em regime de internação hospitalar , sem limitação de prazo e EXCLUÍDOS os procedimentos obstétricos. A hipótese em análise, entretanto, apresenta a PECULIARIDADE de se tratar de um atendimento de URGÊNCIA decorrente de complicações no processo gestacional. Nessa situação, a Lei n. 9.656/1998 (art. 35-C) e a Resolução CONSU n. 13/1998, estabelecem, observada a abrangência do plano hospitalar contratado e as disposições legais e regulamentares pertinentes, a obrigatoriedade de cobertura, razão pela qual a negativa de cobertura por parte da operadora de plano de saúde se mostra indevida . Ademais, o art. 4º da Resolução CONSU n. 13/1998 garante, ainda, os atendimentos de urgência e emergência quando se referirem ao processo gestacional e estabelece que, caso haja necessidade de assistência médica hospitalar decorrente da condição gestacional de pacientes com plano hospitalar sem cobertura obstétrica ou com cobertura obstétrica que ainda esteja cumprindo período de carência, deverá a operadora de plano de saúde, obrigatoriamente, cobrir o atendimento prestado nas mesmas condições previstas para o plano ambulatorial. Além disso, a Resolução Normativa da ANS n. 465/2021 que, ao atualizar o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, o qual estabelece a cobertura assistencial obrigatória a ser garantida nos planos privados de assistência à saúde, assenta que o plano hospitalar compreende os atendimentos realizados em todas as modalidades de internação hospitalar e os atendimentos de urgência e emergência, garantindo a cobertura da internação hospitalar por período ilimitado de dias. Diante desse arcabouço normativo, e considerando a abrangência do plano hospitalar contratado e as disposições legais e regulamentares pertinentes, conclui-se que não há que falar em exclusão de cobertura do atendimento de parto de urgência, incluindo o direito à internação sem limite de dias ou a cobertura de remoção, o que, conforme consta dos autos, não se verifica na hipótese. Sobre tema, a orientação adotada pela jurisprudência do STJ é a de que “a recusa indevida de cobertura, pela operadora de plano de saúde, nos casos de urgência ou emergência, enseja reparação a título de dano moral, em razão do agravamento ou aflição psicológica ao beneficiário, ante a situação vulnerável em que se encontra” (AgInt no AgInt no REsp 1.804.520-SP, Quarta Turma, DJe de 02/04/2020). O CDC estabelece a responsabilidade solidária daqueles que participam da introdução do serviço no mercado por eventuais prejuízos causados ao consumidor (art. 7º, parágrafo único e art. 14). Desse modo, no caso, existe responsabilidade solidária entre a operadora de plano de saúde e o hospital conveniado, pela reparação dos prejuízos sofridos em decorrência da má prestação dos serviços, configurada, na espécie, pela negativa indevida de cobertura e não realização do atendimento médico-hospitalar de urgência de que necessitava a beneficiária. 5.2.3. Resultado final. A operadora de plano de saúde tem o dever de cobrir parto de urgência, por complicações no processo gestacional, ainda que o plano tenha sido contratado na segmentação hospitalar sem obstetrícia. DIREITO PROCESSUAL CIVIL 6. Juntada nos autos de simples manifestação da União informando o envio de ofício antes do despacho determinando a citação e comparecimento espontâneo RECURSO ESPECIAL A juntada nos autos de simples manifestação da União informando o envio de ofício, antes de despacho determinando a sua citação para responder a ação, não configura comparecimento espontâneo apto a suprir a falta de citação. REsp 1.904.530-PE, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022. (Info 728) 6.1. Situação FÁTICA. Jurema, menor de idade, ajuizou ação em face da União, Estado e Município, pleiteando fornecimento de suplementação alimentar, em razão de ser portadora da doença de Crohn e não possuir recursos financeiros para tanto. A liminar foi deferida e posteriormente confirmada com a procedência da ação, condenando o Estado ao devido fornecimento e a União ao repasse de verba para a aquisição da respectiva suplementação. A União manifestou-se nos autos tão somente para informar que teria enviado ofício ao Ministério da Saúde para o cumprimento da decisão liminar e, posteriormente, foi proferido despacho no juízo monocrático determinando a citação dos réus para responder a ação, o que não foi feito. Iniciou-se então o debate entre as partes acerca da possibilidade de reconhecimento da manifestação configurar comparecimento espontâneo ao processo apto a suprir a falta de citação. 6.2. Análise ESTRATÉGICA. 6.2.1. A manifestação supriu a falta de citação? R: Nooops!!!! Na origem foi ajuizada ação por menor, tendo como réus a União, Estado e Município, pleiteando fornecimento de suplementação alimentar, em razão de ser portadora da doença de Crohn e não possuir recursos financeiros para tanto. A liminar foi deferida e posteriormente confirmada com a procedência da ação, condenando o Estado ao devido fornecimento e a União ao repasse de verba para a aquisição da respectiva suplementação. Cinge-se a controvérsia a discutir a validade da sentença em razão de a União não ter sido citada para responder a ação. Na hipótese, a União manifestou-se nos autos tão somente para informar que teria enviado ofício ao Ministério da Saúde para o cumprimento da decisão liminar e, posteriormente, foi proferido despacho no juízo monocrático determinando a citação dos réus para responder a ação, o que não foi feito. Diante da cronologia processual acima narrada, não há como se reconhecer o suprimento da citação, haja vista que a simples manifestação da União informando o envio de ofício não configura comparecimento espontâneo ao processo. É INAFASTÁVEL a conclusão de que houve quebra de legítima expectativa da União de que seria citada para oferta da contestação, mormente tendo em conta o despacho exarado após sua manifestação sobre a tutela antecipada, em que se determinou a expedição da citação. Conclui-se que a situação não se enquadra no entendimento jurisprudencial de que o comparecimento espontâneo da parte nos autos supre a eventual falta de citação . 6.2.2. Resultado final. A juntada nos autos de simples manifestação da União informando o envio de ofício, antes de despacho determinando a sua citação para responder a ação, não configura comparecimento espontâneo apto a suprir a falta de citação. 7. (In)Competência do TJDFT para processar e julgar mandado de segurança impetrado contra ato do Controlador-Geral do Distrito Federal RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não tem competência para processar e julgar mandado de segurança impetrado contra ato do Controlador-Geral do Distrito Federal. RMS 57.943-DF, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022. (Info 728) 7.1. Situação FÁTICA. Call Tecno impetrou mandado de segurança contra ato do Controlador-Geral do Distrito Federal no qual alega que figurou como investigada em autos de procedimento administrativo, iniciado por ordem da autoridade coatora, a fim de apurar eventuais irregularidades em relação a contratos firmados entre o Distrito Federal e a Call Tecno. Ao final a autoridade processante aplicou a penalidade de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração, nos termos do art. 87, IV c/c art. 88, II e III, da Lei n. 8.666/1993. O Relator deferiu a tutela provisória requerida no mandado de segurança; e o Distrito Federal interpôs agravo interno, suscitando a incompetência absoluta da 2ª Câmara Cível para processar e julgar o mandado de segurança. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios deu provimento ao agravo interno, reconhecendo a competência absoluta da Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal para processar e julgar o mandamus . Call Tecno então interpôs recurso ordinário no qual sustenta que Leis Distritais conferem o status de Secretário de Estado do Controlador-Geral do Distrito Federal. 7.2. Análise ESTRATÉGICA. 7.2.1. Questão JURÍDICA. Lei Federal n. 11.697/2008: Art. 8o Compete ao Tribunal de Justiça: I – processar e julgar originariamente: c) os mandados de segurança e os habeas data contra atos do Presidente do Tribunal e de qualquer de seus órgãos e membros, do Procurador-Geral da Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, dos Juízes do Distrito Federal e dos Territórios, do Governador do Distrito Federal, dos Governadores dos Territórios, do Presidente do Tribunal de Contas do Distrito Federal e de qualquer de seus membros, do Procurador-Geral do Distrito Federal e dos Secretários de Governo do Distrito Federal e dos Territórios; Art. 26. Compete ao Juiz da Vara da Fazenda Pública processar e julgar: III – os mandados de segurança contra atos de autoridade do Governo do Distrito Federal ou de entidade autárquica ou fundacional distrital ou empresa pública distrital, ressalvada a competência originária do Tribunal de Justiça. 7.2.2. Competência do TJDFT? R: Nooooops!!!!! O art. 8º, I, c, da Lei Federal n. 11.697/2008, Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal – LOJDF, prevê a competência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios para julgar mandado de segurança contra atos de SECRETÁRIOS de Governo do DF . Por sua vez, o art. 26 da mesma Lei Federal (LOJDF) dispõe que compete ao Juiz da Vara da Fazenda Pública processar e julgar: “III – os mandados de segurança contra atos de autoridade do Governo do Distrito Federal e de sua administração descentralizada”.Até a edição do Decreto Distrital n. 36.236/2015, coexistiam os órgãos da Secretaria de Estado de Transparência e Controle – STC e da Controladoria-Geral do Distrito Federal – CGDF, ambos como integrantes do Sistema de Correição do Distrito Federal – SICOR/DF, com a finalidade de prevenir e apurar irregularidades no Poder Executivo – Lei n. 4.938/2012 . Quando da edição do referido ato, a Secretaria de Estado da Transparência foi renomeada para Controladoria-Geral do Distrito Federal (art. 8º, § 1º). Ocorre que este órgão já existia, situação que leva ao entendimento de que teria havido, na verdade, uma ABSORÇÃO de um órgão por outro. Com isso, verifica-se que a Controladoria-Geral não pode ser considerada uma secretaria para o fim de alteração da competência jurisdicional e deve ser reconhecida a competência absoluta da Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal para processar e julgar o mandamus . 7.2.3. Resultado final. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não tem competência para processar e julgar mandado de segurança impetrado contra ato do Controlador-Geral do Distrito Federal. 8. Duplicidade de coisa jugada e prevalência AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO RECURSO ESPECIAL Nos casos em que já executado o título formado na primeira coisa julgada, ou se iniciada sua execução, deve prevalecer a primeira coisa julgada em detrimento daquela formada em momento posterior. AgInt nos EDcl no REsp 1.930.955-ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022. (Info 728) 8.1. Situação FÁTICA. Em determinada ação coletiva, moveu-se a execução do título formado e transitado em julgado. Porém, em ação distinta, foi movida execução do título formado em momento posterior, relativo a período que havia sido reconhecido como prescrito na primeira execução. Iniciou-se então a discussão acerca de qual dos títulos abrangidos pela coisa julgada deveria prevalecer. 8.2. Análise ESTRATÉGICA. 8.2.1. Qual coisa julgada prevalece? R: A primeira! A Corte Especial do STJ, ao julgar o EAREsp 600.811/SP, firmou o entendimento de que havendo conflito entre coisas julgadas deve prevalecer a última que se formou, desde que não desconstituída por ação rescisória . Contudo, a referida regra deve ser afastada nos casos em que já executado o título formado na primeira coisa julgada, ou se iniciada sua execução, hipótese em que deve prevalecer a primeira coisa julgada em detrimento daquela formada em momento posterior, consoante expressamente consignado na ementa e no voto condutor do referido julgado. Assim, no presente caso houve a execução do título formado na ação coletiva, primeiro a transitar em julgado. Logo, incide a exceção prevista no EAREsp 600.811/SP, devendo prevalecer a primeira coisa julgada formada, razão pela qual se mostra indevida a execução do título formado em momento posterior, ainda que se trate de período diverso, sobre o qual foi reconhecida a prescrição na primeira execução. 8.2.2. Resultado final. Nos casos em que já executado o título formado na primeira coisa julgada, ou se iniciada sua execução, deve prevalecer a primeira coisa julgada em detrimento daquela formada em momento posterior. DIREITO TRIBUTÁRIO 9. Incentivo fiscal outorgado por Estado-membro por meio de desoneração relativa ao ICMS e base de cálculo do IRPJ e CSLL RECURSO ESPECIAL O incentivo fiscal outorgado por Estado-membro por meio de desoneração relativa ao ICMS não integra a base de cálculo do IRPJ e CSLL. REsp 1.222.547-RS, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022. (Info 728) 9.1. Situação FÁTICA. Vonpa Refrescos ajuizou ação por meio da qual pretendia que os ganhos obtidos mediante incentivo fiscal concedido pelo Estado de Santa Catarina, através do Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense – PRODEC, fossem considerados como subvenção para investimento, de modo a não sofrer incidência do imposto de renda e de contribuição social sobre tais valores. Diante do indeferimento do pedido, interpôs sucessivos recursos nos quais sustenta que o Decreto-lei n° 1.598/77, art. 38, § 2º, expressamente prevê que os valores ou vantagens concedidas pelo Poder Público para estimular a implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, não integram o resultado tributável, devendo ser diretamente contabilizados à conta de reserva de capital, não sendo, portanto, alcançado pelo IRPJ e CSLL. 9.2. Análise ESTRATÉGICA. 9.2.1. O incentivo fiscal integra base de cálculo da CSLL e IRPJ? R: Noooops!!!! Inicialmente cumpre salientar, que a integração à base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do montante obtido com o incentivo outorgado impõe a análise da sua natureza. A rigor, cuida-se de desoneração fiscal, uma vez que o Estado efetivamente promoveu alívio fiscal à empresa produtora, desobrigando-a do adimplemento no vencimento em data ordinária, bem ainda de parte dos juros moratórios aplicáveis, e da integralidade da soma relativa à incidência de correção monetária do período . O modelo federativo abraça a concepção segundo a qual a distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de organização estatal e por ela é condicionada. Em sua formulação fiscal, revela-se o princípio federativo um autêntico sobreprincípio regulador da repartição de competências tributárias e, por isso mesmo, elemento informador primário na solução de conflitos nas relações entre a União e os demais entes federados. A Constituição da República atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei complementar. A concessão de incentivo por ente federado, observados os requisitos legais, configura instrumento legítimo de política fiscal para materialização da autonomia consagrada pelo modelo federativo. Desse modo, a tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação. Naturalmente, não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com o princípio da subsidiariedade, que reveste e protege a autonomia dos entes federados.Registre-se que a doutrina, ao analisar a pretensão de que o crédito de ICMS poderia integrar as bases de cálculo do PIS e da COFINS, o tão conhecido Tema n. 69/RG, já afastava tal possibilidade por configurar, também, burla à Federação . No plano jurisprudencial, não há precedentes específicos acerca do incentivo fiscal em tela no âmbito da Primeira Seção e respectivas Turmas. Porém, no que toca à inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ e CSLL, a Primeira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o EREsp n. 1.443.771/RS, assentou que o crédito presumido de ICMS, a par de não se incorporar ao patrimônio da contribuinte, não constitui lucro, base imponível do IRPJ e da CSLL, sob o entendimento segundo o qual a concessão de incentivo por ente federado, observados os requisitos legais, configura instrumento legítimo de política fiscal para materialização da autonomia consagrada pelo modelo federativo. Axiologia da ratio decidendi que afasta, igualmente, a pretensão de caracterização, como renda ou lucro, de montante outorgado no contexto de incentivo fiscal relativo ao ICMS . 9.2.2. Resultado final. O incentivo fiscal outorgado por Estado-membro por meio de desoneração relativa ao ICMS não integra a base de cálculo do IRPJ e CSLL. 10. (I)Legitimidade da submissão de empresas a Regime Especial de Fiscalização RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Atendidos os requisitos previstos em lei, é legítima a submissão de empresas a Regime Especial de Fiscalização, salvo comprovação de que as medidas inviabilizem indevidamente o livre exercício da atividade econômica. RMS 65.714-SE, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022, DJe 03/03/2022. (Info 728) 10.1. Situação FÁTICA. RS Comércio de Frutas impetrou mandado de segurança contra Portaria expedida pelo Secretário da Fazenda do Estado de Sergipe que procedeu à inscrição da empresa impetrante em regime especial de fiscalização e, posteriormente, à baixa cadastral de sua inscrição no cadastro de contribuintes do Estado de Sergipe, o que resultou no encerramento forçado de suas atividades. Ao julgar o pleito, o Tribunal local concedeu a segurança parcial, admitindo a licitude da aplicação do Regime Especial de Tributação por suposta inadimplência, nos termos da Portaria 231/2018 emitida pela SEFAZ/SE, porém, entendeu indevida a “baixa” no CACESE por entender que tal medida configuraria abuso de poder. Inconformada, RS interpôs recurso no qual alega não subsistirem razões lógicas e jurídicas para ser excluída a baixa cadastral e restaurada a sua regularidade no CACESE e, concomitantemente, não ser realizada a exclusão da recorrente do Regime Especial de Fiscalização e suspendido todos os atos administrativos constantes da Portaria em questão. 10.2. Análise ESTRATÉGICA. 10.2.1. Questão JURÍDICA. CF/1988: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. 10.2.2. Legítima a inclusão no Regime Especial de Fiscalização? R: Sim, desde que não inviabilize a atividade da empresa!!! Na origem, trata-se de mandado de segurança impetrado perante o Tribunal de Justiça, em face do Secretário da Fazenda do Estado visando impugnar, dentre outros, a inclusão da impetrante no Regime Especial de Fiscalização, na modalidade de prazo especial e sumário de recolhimento do ICMS, motivada por situação de reiterada inadimplência, quanto a baixa de sua inscrição no Cadastro de Contribuintes do Estado. O Tribunal de Justiça denegou os pedidos de sua exclusão do Regime Especial de Fiscalização. No Recurso Ordinário a impetrante sustenta que sua inclusão no Regime Especial de Fiscalização, violam os princípios constitucionais da razoabilidade e do devido processo legal, como também o direito ao livre exercício da atividade econômica, (…) previstos no art. 170, parágrafo único, CF/1988 e nas Súmulas ns. 70, 323 e 547 do Supremo Tribunal Federal. O Superior Tribunal de Justiça, inicialmente, decidia pela ilegitimidade da sujeição de contribuinte a regime especial de fiscalização, ao entendimento de que ele representaria meio coercitivo indireto para pagamento de tributos (AgRg no REsp 734.364/MG, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJe de 29/08/2005; REsp 281.588/MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJe de 02/02/2006).Mais recentemente, a jurisprudência do STJ passou a orientar-se pela possibilidade de imposição de regime especial de fiscalização, desde que haja previsão legal, inadimplemento reiterado de obrigações tributárias e tal regime não configure obstáculo desarrazoado à atividade empresarial, a ponto de coagir o contribuinte ao pagamento de seus débitos tributários, tendo em vista que, para esse mister, possui o Fisco meios próprios . (REsp 1.236.622/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 16/03/2012; RMS 57.784/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 18/11/2019). O Plenário do STF, ao julgar Embargos de Divergência no RE 115.452/SP, entendeu que “o regime especial do ICM, autorizado em lei estadual, porque impõe restrições e limitações à atividade comercial do contribuinte, viola a garantia constitucional da liberdade de trabalho (CF/1967, art.153, § 23; CF/1988, art. 5º, XIII), constituindo forma oblíqua de cobrança do tributo, assim execução política, que a jurisprudência do Supremo Tribunal sempre repeliu (Súmulas ns. 70, 323 e 547)” (STF, RE 115.452 ED-EDv / SP, Rel. Ministro Carlos Veloso, DJU de 05/12/90). No referido julgamento, porém, ficou evidenciada a existência de sanção política, porquanto o regime especial lá em questionamento resultava nas seguintes restrições à atividade empresarial do contribuinte, dentre outras: vedação, aos negociantes compradores, de utilizarem o crédito a que têm direito, quando desacompanhados de guia especial de pagamento de tributo, e retenção de talonários de nota fiscal. No STF também há precedente no sentido de que a imposição de regime especial de fiscalização encontra amparo no Código Tributário Nacional (STF, RE 114.878/SP, Rel. Ministro Célio Borja, Segunda Turma, DJU de 29/04/88). Na Corte Suprema há outros julgados, pela impossibilidade de imposição de regime especial de fiscalização, embora os votos condutores de alguns deles indiquem não ter havido juízo de ponderação sobre os contornos do regime especial de fiscalização, no caso concreto, a restringir ou limitar indevidamente a atividade empresarial do contribuinte (RE 471.800 AgR / MG, Rel. Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe de 07/04/2016). Após os dois precedentes qualificados invocados pela impetrante (STF, RE 565.048 RG / RS, Rel. Ministro Marco Aurélio, DJe de 09/10/2014; ARE 914.045 RG / MG, Rel. Ministro Edson Fachin, DJe de 19/11/2015) – os quais, enfatize-se, não fixaram tese jurídica a respeito de regime especial de fiscalização, embora vedassem a restrição ilegítima à atividade empresarial ou profissional, quando imposta como meio de cobrança indireta de tributos -, a Segunda Turma do STF assentou que “a submissão de contribuinte a regime fiscal diferenciado, em virtude do inadimplemento reiterado não constitui sanção política condenada pela jurisprudência desta Corte, quando não inviabiliza o exercício da atividade empresarial ” (STF, ARE 1.084.307 AgR / SP, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 18/03/2019). Posteriormente aos dois aludidos precedentes, firmados pelo STF, sob o regime de repercussão geral (RE 565.048 e ARE 914.045) e de modo consentâneo com o entendimento neles fixado, a Primeira Turma do STJ proclamou que, “a depender do caso concreto, este Tribunal Superior tem permitido a inclusão de contribuintes/responsáveis em Regimes Especiais de Fiscalização quando habituados a infrações tributárias, não se admitindo, porém, que as medidas fiscais impostas pelo respectivo regime possam inibir a regular atividade empresarial” (STJ, RMS 51.523/CE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 07/08/2017). Também a Segunda Turma desta Corte assentou que “a disciplina do Regime Especial de Fiscalização não constitui medida alternativa ou excludente à cobrança judicial do crédito tributário vencido e não pago, mas sim consiste em medida preventiva, destinada a acompanhar o quotidiano da empresa que possua histórico de inadimplência contumaz, para evitar que novas ocorrências de fatos geradores sejam sucedidas por novos atos omissivos no que se refere ao dever de pagar os respectivos tributos. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ considera legítima a submissão de empresas ao Regime Especial de Fiscalização, excetuando-se apenas a hipótese em que este possua medidas que comprovadamente impliquem indevida restrição à atividade empresarial” (STJ, RMS 57.784/GO, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 18/11/2019). No caso, a impetrante reconhece que se encontra em situação de inadimplência e que possui vários débitos. As informações prestadas pela autoridade impetrada mostraram que (a) “o impetrante, em função do descumprimento de obrigações (principais e acessórias), fora enquadrado na condição de ser fiscalizado de forma minuciosa em razão dos diversos descumprimentos”; (b) “após constatação de vários descumprimentos, fora o impetrante enquadrado nos limites da Portaria 290/2018, que tem finalidade, entre outras coisas, de recebimento de tributo em lapso temporal menor e evitar que se materialize uma concorrência desleal entre contribuintes que cumprem suas obrigações e aqueles que não as cumprem”; (c) “o impetrante insiste em não cumprir suas obrigações, seus débitos (regularmente constituídos) não são pagos e o Estado não pode se manter inerte, ante tais irregularidades”; (d) “no caso em análise, o impetrante acumula débitos tributários e muitas outras infrações, registradas nos sistemas fazendários. E, assim sendo, fora enquadrada nos termos da Portaria n. 290/2018, que encontra amparo nos arts. 194 a 196 do CTN, 26, II, da Lei Complementar n. 87/1996 e 76 da Lei n. 3.796/1996 do Estado de Sergipe, e tem por finalidade fixar prazo para o recolhimento do imposto devido em lapso temporal menor (pagamentos diários do imposto devido), evitar que se materialize uma concorrência desleal entre contribuintes que cumprem suas obrigações e aqueles que não as cumprem, e acompanhar os contribuintes nela especificados, inclusive a impetrante, a qual continuava, reiteradamente, realizando fatos geradores de ICMS, sem recolhimento do tributo, aumentando os débitos tributários já existentes e concorrendo desigualmente com os contribuintes que recolhem os tributos. Conclui-se, por fim, que a impetrante, após reiterados descumprimentos da legislação tributária estadual, não logrou êxito em demonstrar, mediante prova pré-constituída, que o Regime Especial de Fiscalização, na modalidade de prazo especial e sumário de recolhimento do ICMS, seria desarrazoado ou desproporcional ou estaria a inviabilizar indevidamente o livre exercício da sua atividade econômica, não se vislumbrando, assim, a presença de direito líquido e certo, a amparar a concessão do writ, quanto ao aludido Regime Especial de Fiscalização. 10.2.3. Resultado final. Atendidos os requisitos previstos em lei, é legítima a submissão de empresas a Regime Especial de Fiscalização, salvo comprovação de que as medidas inviabilizem indevidamente o livre exercício da atividade econômica. DIREITO PENAL 11. Abrangência da qualificadora deformidade permanente no crime de lesão corporal HABEAS CORPUS A qualificadora prevista no art. 129, § 2º, inciso IV, do Código Penal (deformidade permanente) abrange somente lesões corporais que resultam em danos físicos. HC 689.921-SP, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 08/03/2022, DJe 14/03/2022. (Info 728) 11.1. Situação FÁTICA. Virso foi condenado pelo crime de lesão corporal qualificada pela deformidade permanente causada à vítima. A discussão tem causa no fato de que a deformidade permanente se trata de abalos psicológicos permanentes causados à vítima (Transtorno de Estresse Pós-Traumático), provocando-lhe alteração permanente da personalidade. A defesa de Virso então impetrou Habeas Corpus no qual alega a impossibilidade de se reconhecer a qualificadora da deformidade permanente (art. 129, § 2.º, inciso IV, do Código Penal), porquanto esta estria adstrita às lesões físicas diretamente relacionadas à estética, não se caracterizando quando houver abalos psicológicos permanentes. 11.2. Análise ESTRATÉGICA. 11.2.1. Questão JURÍDICA. Código Penal: Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano. § 2° Se resulta: IV – deformidade permanente; 11.2.2. Somente abrange danos físicos? R: Yeaph!!! O crime de lesão corporal, conforme a doutrina, consiste “em qualquer dano ocasionado por alguém, sem animus necandi , à integridade física ou a saúde (fisiológica ou mental) de outrem”.Assim, também pratica o referido delito aquele que causa lesão à saúde mental de outrem . Nesses termos, ainda, segundo a doutrina, no ponto: “[m]esmo a desintegração da saúde mental é lesão corporal, pois a inteligência, a vontade ou a memória dizem com a atividade funcional do cérebro, que é um dos mais importantes órgãos do corpo. Não se concebe uma perturbação mental sem um dano à saúde, e é inconcebível um dano à saúde sem um mal corpóreo ou uma alteração do corpo”.A conclusão doutrinária, contudo, tem relação com o tipo penal FUNDAMENTAL do delito de lesão corporal . Com efeito, ao especificamente tratar da qualificadora prevista no art. 129, § 2.º, inciso IV, do Código Penal (deformidade permanente), ressalta-se que ela está relacionada à estética, não devendo ser verificada tão somente com base em um critério puramente objetivo, mas, a um só tempo, objetivo e subjetivo. Nesse sentido, leciona que a qualificadora estará presente quando houver uma deturpação ou vício de forma capaz de causar “uma impressão, se não de repugnância ou de mal-estar, pelo menos de desgosto, de desagrado”. A propósito, ambas as turmas que compõem a Terceira Seção do STJ firmaram o entendimento de que a deformidade permanente deve representar lesão estética de certa monta, capaz de causar desconforto a quem a vê ou ao seu portador, abrangendo, portanto, apenas lesões corporais que resultam em danos físicos . No caso, não incide a mencionada qualificadora, porquanto a vítima, em razão da lesão, “fora cometida de ‘Transtorno de Estresse Pós-Traumático’, provocando-lhe alteração permanente da personalidade”. Registra-se, por oportuno, que a lesão causadora de danos psicológicos pode, a depender do caso concreto, ensejar o reconhecimento de outra qualificadora ou ser considerada como circunstância judicial desfavorável (como ocorreu na situação em análise). 11.2.3. Resultado final. A qualificadora prevista no art. 129, § 2º, inciso IV, do Código Penal (deformidade permanente) abrange somente lesões corporais que resultam em danos físicos. DIREITO PROCESSUAL PENAL 12. Competência para julgamento do de estelionato praticado por meio saque de cheque fraudado CONFLITO DE COMPETÊNCIA O crime de estelionato praticado por meio saque de cheque fraudado compete ao Juízo do local da agência bancária da vítima. CC 182.977-PR, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 09/03/2022, DJe 14/03/2022. (Info 728) 12.1. Situação FÁTICA. Foi instaurado inquérito policial para apurar a prática do crime de estelionato tentado após a vítima procurar a Delegacia de Polícia de Urupês/SP e narrar que, no dia 11/09/2018, houve a tentativa de compensação de um cheque clonado em sua conta corrente, o qual não foi pago pela instituição financeira por insuficiência de fundos. Apurou-se que a cártula foi depositada em agência bancária localizada na cidade de Curitiba/PR. O Juízo de Urupês-SP acatando manifestação ministerial, declinou da competência para a Comarca de Curitiba/PR, sob o argumento de que eventual crime de estelionato se consuma no local e no momento em que o agente obtém vantagem ilícita que, no caso de tentativa, no local em que o agente busca obter a vantagem ilícita (depósito do cheque ou saque do valor). Os autos do inquérito foram distribuídos ao Juízo de Curitiba, o qual suscitou o conflito de competência, por entender que a competência para julgar o delito de tentativa de estelionato cometido por meio de cheque fraudulento é a do local da agência bancária onde foi sacada a cártula, consumando o prejuízo, ou seja, o local onde a vítima possui conta bancária. 12.2. Análise ESTRATÉGICA. 12.2.1. Questão JURÍDICA. Código Penal: Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis Código de Processo Penal: Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção 12.2.2. A quem compete julgar? R: Ao Juízo do local da agência bancária da vítima!! O delito de estelionato, tipificado no art. 171, caput , do Código Penal, consuma-se no lugar onde aconteceu o efetivo prejuízo à vítima . Por essa razão, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no caso específico de estelionato praticado por meio de depósito em dinheiro ou transferência de valores, firmara a compreensão de que a competência seria do Juízo onde se auferiu a vantagem ilícita em prejuízo da vítima, ou seja, o local onde se situava a conta que recebeu os valores depositados. Sobreveio a Lei n. 14.155/2021, que incluiu o § 4.º no art. 70 do Código de Processo Penal e criou hipótese específica de competência no caso de crime de estelionato praticado mediante depósito, transferência de valores ou cheque sem provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado. Diante da modificação legislativa, não mais subsiste o entendimento firmado por esta Corte Superior, devendo ser reconhecida a competência do Juízo do domicílio da vítima.Contudo, a hipótese em análise não foi expressamente prevista na nova legislação, visto que não se trata de cheque emitido sem provisão de fundos ou com pagamento frustrado, mas de tentativa de saque de cártula falsa, em prejuízo de correntista. Sobre o tema, destaque-se que “(…) 3. Há que se diferenciar a situação em que o estelionato ocorre por meio do saque (ou compensação) de cheque clonado, adulterado ou falsificado, da hipótese em que a própria vítima, iludida por um ardil, voluntariamente, efetua depósitos e/ou transferências de valores para a conta corrente de estelionatário. Quando se está diante de estelionato cometido por meio de cheques adulterados ou falsificados, a obtenção da vantagem ilícita ocorre no momento em que o cheque é sacado, pois é nesse momento que o dinheiro sai efetivamente da disponibilidade da entidade financeira sacada para, em seguida, entrar na esfera de disposição do estelionatário. Em tais casos, entende-se que o local da obtenção da vantagem ilícita é aquele em que se situa a agência bancária onde foi sacado o cheque adulterado, seja dizer, onde a vítima possui conta bancária . (….)” (AgRg no CC 171.632/SC, Rel. Ministro Reynaldo Sores da Fonseca, Terceira Seção, DJe 16/06/2020). Assim, aplica-se o entendimento pela competência do Juízo do local do eventual prejuízo, que ocorre com a autorização para o saque do numerário no local da agência bancária da vítima. 12.2.3. Resultado final. O crime de estelionato praticado por meio saque de cheque fraudado compete ao Juízo do local da agência bancária da vítima. 13. (In)Admissibilidade da concessão da prisão domiciliar às presas dos regimes fechado RECURSO EM HABEAS CORPUS Excepcionalmente, admite-se a concessão da prisão domiciliar às presas dos regimes fechado quando verificado pelo juízo da execução penal, no caso concreto, a proporcionalidade, adequação e necessidade da medida, e que a presença da mãe seja imprescindível para os cuidados da criança ou pessoa com deficiência, não sendo caso de crimes praticados por ela mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes. RHC 145.931-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 09/03/2022. (Info 728) 13.1. Situação FÁTICA. Jurema foi condenada a uma pena de 9 anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico. Sua defesa impetrou Habeas Corpus no qual alegava a ameaça de coação da liberdade de locomoção decorrente do início da execução da sentença condenatória. Conforme a defesa de Jurema, esta reside em município que fica a 200 km de distância do presídio mais próximo com capacidade para presas do sexo feminino, fato que impossibilitaria o seu contato para amamentação e demais cuidados ao recém-nascido. Requereu então o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime domiciliar. 13.2. Análise ESTRATÉGICA. 13.2.1. Questão JURÍDICA. CPP: Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que: I – não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; II – não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente. Art. 318-B. A substituição de que tratam os arts. 318 e 318-A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 deste Código. LEP: Art. 82. Os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso. § 1° A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal. Art. 83. O estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá contar em suas dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva. § 2o Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade. Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I – condenado maior de 70 (setenta) anos; 13.2.2. Possível o cumprimento da pena em regime domiciliar? R: SIM, desde que verificado pelo juízo da execução penal, no caso concreto, a proporcionalidade, adequação e necessidade da medida, e que a presença da mãe seja IMPRESCINDÍVEL para os cuidados da criança ou pessoa com deficiência, não sendo caso de crimes praticados por ela mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes!!! A Suprema Corte, no julgamento do HC Coletivo n. 143.641/SP, concedeu a ordem “para determinar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar […] de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, […] excetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas” (HC 143.641/SP, Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma do STF, DJe 9/10/2018). Nesse mesmo sentido, o CPP (com as alterações promovidas pela Lei n. 13.769/2018) passou a prever a substituição da prisão preventiva por domiciliar à mulher gestante, mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, desde que não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça e o delito não tenha sido cometido o crime contra seu filho ou dependente, facultando, ainda, a aplicação de medidas cautelares (arts. 318-A e 318-B do CPP). No entanto, a execução de condenação definitiva em prisão domiciliar, em regra, somente era admitida ao reeducando do regime aberto, desde que seja maior de 70 anos, portador de doença grave, ou mulher gestante ou mãe de menor ou deficiente físico ou mental (art. 117 da LEP). Porém, excepcionalmente, admite-se a concessão do benefício às presas dos regimes fechado e semiaberto quando verificado pelo juízo da execução penal, no caso concreto – em juízo de ponderação entre o direito à segurança pública e a aplicação dos princípios da proteção integral da criança e da pessoa com deficiência -, que tal medida seja proporcional, adequada e necessária e que a presença da mãe seja imprescindível para os cuidados da criança ou pessoa com deficiência, salvo se a periculosidade e as condições pessoais da reeducanda indiquem que o benefício não atenda os melhores interesses da criança ou pessoa com deficiência. Outrossim, “a jurisprudência desta Corte tem se orientado no sentido de que deve ser dada uma interpretação extensiva tanto ao julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus coletivo n. 143.641, que somente tratava de prisão preventiva de mulheres gestantes ou mães de crianças de até 12 anos, quanto ao art. 318-A do Código de Processo Penal, para autorizar também a concessão de prisão domiciliar às rés em execução provisória ou definitiva da pena, ainda que em regime fechado” (Rcl 40.676/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, DJe 1º/12/2020).Essa possibilidade, concessão de prisão domiciliar regulada no art. 117 da LEP, em qualquer momento do cumprimento da pena, ainda que em regime fechado, desde que excepcionalidade do caso concreto imponha, tem sido reconhecida por esta Corte Superior . Também a Suprema Corte “tem admitido, em situações absolutamente excepcionais, a concessão de prisão domiciliar a regimes mais severos de execução penal, a exemplo das ordens implementadas nas hipóteses em que o condenado estiver acometido de doença grave, a demandar tratamento específico, incompatível com o cárcere ou impassível de ser oferecido pelo Estado” (AgR na AP 996, Ministro Edson Fachin, Segunda Turma, DJe 29/9/2020). Outrossim, também deve-se levar em conta a ineficiência estatal em disponibilizar vaga à reeducanda em estabelecimento prisional próprio e adequado à sua condição pessoal, dotados de assistência médica pré-natal e pós-parto, berçários e creches para seus filhos (arts. 82, § 1º, e 83, § 2º, da LEP) 13.2.3. Resultado final. Excepcionalmente, admite-se a concessão da prisão domiciliar às presas dos regimes fechado quando verificado pelo juízo da execução penal, no caso concreto, a proporcionalidade, adequação e necessidade da medida, e que a presença da mãe seja imprescindível para os cuidados da criança ou pessoa com deficiência, não sendo caso de crimes praticados por ela mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes. 14. Prisão preventiva e suficiência de cautelares específicas HABEAS CORPUS Não se justifica a prisão preventiva se, considerando o modus operandi dos delitos, a imposição da cautelar de proibição do exercício da medicina e de suspensão da inscrição médica, e outras que o Juízo de origem entender necessárias, forem suficientes para prevenção da reiteração criminosa e preservação da ordem pública. HC 699.362-PA, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Rel. Acd. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma, por maioria, julgado em 08/03/2022. (Info 728) 14.1. Situação FÁTICA. Um médico foi denunciado pelo MP pela suposta prática dos crimes de violação sexual mediante fraude e estupro de vulnerável e teve sua prisão preventiva decretada notadamente em razão do modus operandi empregado — o agente, valendo-se da condição de médico especialista na área de ginecologia, da confiança e respeito que sua profissão concede e da vulnerabilidade das mulheres pelo desconhecimento dos procedimentos ginecológicos de praxe, com prejuízo da livre manifestação da vontade da vítima, praticou atos libidinosos, o que revelaria a periculosidade do agente e a gravidade concreta da conduta. A defesa do médico então impetrou Habeas Corpus no qual alega ser injustificada a prisão e que esta deveria ser convertida em cautelares diversas previstas no art. 319 do CPP. 14.2. Análise ESTRATÉGICA. 14.2.1. Questão JURÍDICA. CPP: Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. § 1º A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o ). § 2º A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada. 14.2.2. Justificável a prisão preventiva? R: Não quando a imposição da cautelar de proibição do exercício da medicina e de suspensão da inscrição médica, e outras que o Juízo de origem entender necessárias, forem suficientes para prevenção da reiteração criminosa e preservação da ordem pública!!! A custódia prisional é providência extrema que deve ser determinada quando demonstrados o fumus commissi delicti e o periculum libertatis , na forma do art. 312 do CPP. Em razão de seu caráter excepcional, somente deve ser imposta quando incabível a substituição por outra medida cautelar menos gravosa, conforme disposto no art. 282, § 6º, do CPP. Entretanto, se o modo de atuação do agente estiver diretamente relacionado ao exercício da profissão médica para perpetração dos crimes de violação sexual mediante fraude, a imposição da cautelar de proibição do exercício da medicina e de suspensão da inscrição médica, somada a outras medidas cautelares pertinentes, são SUFICIENTES para prevenção da reiteração criminosa e preservação da ordem pública . Nesse aspecto, é firme a jurisprudência do STJ no sentido de que a custódia prisional “somente se justifica na hipótese de impossibilidade que, por instrumento menos gravoso, seja alcançado idêntico resultado acautelatório” (RHC n. 113.671/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 30/08/2019). Por óbvio, não se está a minimizar a gravidade das condutas imputadas, porém há que se reconhecer que, uma vez ausentes os requisitos necessários para a prisão preventiva, sua manutenção caracteriza verdadeira antecipação de pena. 14.2.3. Resultado final. Não se justifica a prisão preventiva se, considerando o modus operandi dos delitos, a imposição da cautelar de proibição do exercício da medicina e de suspensão da inscrição médica, e outras que o Juízo de origem entender necessárias, forem suficientes para prevenção da reiteração criminosa e preservação da ordem pública.