Informativo nº 724 do STJ COMENTADO pintando na telinha (do seu computador, notebook, tablet, celular…) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
As concessionárias de serviço público podem efetuar a cobrança pela utilização de faixas de domínio por outra concessionária que explora serviço público diverso, desde que haja previsão no contrato de concessão.
AREsp 1.510.988-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 08/02/2022, DJe 10/02/2022. (Info 724)
Ecovias detém a concessão de algumas rodovias em certo estado da federação. Em uma delas, a empresa CFPL, concessionária dos serviços públicos de energia elétrica, planejava construir uma linha de transmissão de energia. No entanto, Ecovias exigiu que a CFPL pagasse um valor (preço público) pela ocupação temporária das faixas laterais da rodovia, cobrança essa prevista no contrato de concessão em cláusula que permite a obtenção de receitas alternativas decorrente de atividades vinculadas à exploração das faixas marginais.
Porém, CFPL não concorda com a cobrança e sustenta que o art. 2º do Decreto nº 84.398/80 prevê que a ocupação de faixas de domínio de rodovias e a travessia de rodovias por linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica devem ser autorizadas sem ônus para os concessionários de energia elétrica.
Lei n. 8.987/1995:
Art. 11. No atendimento às peculiaridades de cada serviço público, poderá o poder concedente prever, em favor da concessionária, no edital de licitação, a possibilidade de outras fontes provenientes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados, com ou sem exclusividade, com vistas a favorecer a modicidade das tarifas, observado o disposto no art. 17 desta Lei.
Parágrafo único. As fontes de receita previstas neste artigo serão obrigatoriamente consideradas para a aferição do inicial equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
R: Desde que prevista em contrato de concessão, SIM!!!
A Primeira Seção do STJ, no julgamento dos EREsp 985.695/RJ, concluiu que “poderá o poder concedente, na forma do art. 11 da Lei n. 8.987/1995, prever, em favor da concessionária, no edital de licitação, a possibilidade de outras fontes provenientes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados, com ou sem exclusividade, com vistas a favorecer a modicidade das tarifas” (STJ, EREsp 985.695/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Primeira Seção, DJe de 12/12/2014), desde que haja previsão no contrato da concessão de rodovia.
Por oportuno, vale destacar que o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 581.947/RO – Tema 261 da Repercussão Geral (STF, RE 581.947/RO, Rel. Ministro Eros Grau, Pleno, DJe de 21/05/2010) -, não tem o condão de alterar o resultado do julgamento do presente feito. O STF delimitou a controvérsia jurídica, esclarecendo que “o decisum dispõe sobre a impossibilidade de cobrança de taxa, espécie de tributo, pelos municípios em razão do uso do espaço público municipal” por concessionária de fornecimento de energia elétrica, reconhecendo a inconstitucionalidade de cobrança da aludida taxa, pelo Município de Ji-Paraná.
No caso, registrou o acórdão recorrido que consta “no edital e contrato de concessão, a possibilidade de ‘Cobrança pelo uso da faixa de domínio público, inclusive por outras concessionárias de serviço público, permitida pela legislação em vigor’“
As concessionárias de serviço público podem efetuar a cobrança pela utilização de faixas de domínio por outra concessionária que explora serviço público diverso, desde que haja previsão no contrato de concessão.
RECURSO ESPECIAL
Incabível o arbitramento de aluguel em desfavor da coproprietária vítima de violência doméstica, que, em razão de medida protetiva de urgência decretada judicialmente, detém o uso e gozo exclusivo do imóvel de cotitularidade do agressor.
REsp 1.966.556-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/02/2022. (Info 724)
Virso, titular de 2/3 do imóvel por ele utilizado como residência, foi impedido de utilizar e fruir do bem comum indiviso, em virtude de medida protetiva decretada pelo Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar, proibindo a sua aproximação e contato com as vítimas, sendo sua irmã Jurema e sua mãe Creide.
Com isso, Virso teve de se afastar do imóvel, permanecendo as vítimas – inclusive a sua irmã, que é coproprietária na proporção de 1/6 – na posse direta e exclusiva do bem, o que levou o “machão” à propositura de ação de extinção de condomínio cumulada com arbitramento de aluguel em desfavor da recorrida e do seu irmão, este titular da fração restante de 1/6.
O pedido locatício foi acolhido na sentença, mas posteriormente reformado pelo tribunal local, que, por sua vez, o julgou improcedente, sob o argumento precípuo de que foi Virso quem deu azo à proibição da sua utilização do bem de que detém a cotitularidade e, por conseguinte, ao uso exclusivo pela outra condômina (sua irmã) e sua mãe.
Código Civil:
Art. 1.319. Cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou.
Constituição Federal:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
R: Nops!!!
A controvérsia consiste em definir a possibilidade de arbitramento de aluguel, pelo uso exclusivo e gratuito de imóvel comum indiviso por um dos condôminos, em favor de coproprietário que foi privado do uso e gozo do bem devido à decretação judicial de medida protetiva em ação penal proveniente de suposta prática de crime de violência doméstica e familiar contra a mulher.
A jurisprudência do STJ, alicerçada no art. 1.319 do Código Civil de 2002 (equivalente ao art. 627 do revogado Código Civil de 1916), assenta que a utilização ou a fruição da coisa comum indivisa com exclusividade por um dos coproprietários, impedindo o exercício de quaisquer dos atributos da propriedade pelos demais consortes, enseja o pagamento de indenização àqueles que foram privados do regular domínio sobre o bem, tal como o percebimento de aluguéis.
Contudo, impor à vítima de violência doméstica e familiar obrigação pecuniária consistente em locativo pelo uso exclusivo e integral do bem comum, na dicção do art. 1.319 do CC/2002, constituiria proteção insuficiente aos direitos constitucionais da dignidade humana e da igualdade, além de ir contra um dos objetivos fundamentais do Estado brasileiro de promoção do bem de todos sem preconceito de sexo, sobretudo porque serviria de desestímulo a que a mulher buscasse o amparo do Estado para rechaçar a violência contra ela praticada, como assegura a Constituição Federal em seu art. 226, § 8º, a revelar a desproporcionalidade da pretensão indenizatória em tais casos.
Ao ensejo, registre-se que a interpretação conforme a constituição de lei ou ato normativo, atribuindo ou excluindo determinado sentido entre as interpretações possíveis em alguns casos, não viola a cláusula de reserva de plenário, consoante já assentado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 572.497 AgR/RS, Rel. Min. Eros Grau, DJ 11/11/2008, e no RE 460.971, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 30/3/2007 (ambos reproduzindo o entendimento delineado no RE 184.093/SP, Rel. Moreira Alves, publicado em 29/4/1997).
Outrossim, a imposição judicial de uma medida protetiva de urgência – que procure cessar a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher e implique o afastamento do agressor do seu lar – constitui motivo legítimo a que se limite o domínio deste sobre o imóvel utilizado como moradia conjuntamente com a vítima, não se evidenciando, assim, eventual enriquecimento sem causa, que legitime o arbitramento de aluguel como forma de indenização pela privação do direito de propriedade do agressor.
Portanto, afigura-se descabido o arbitramento de aluguel, com base no disposto no art. 1.319 do CC/2002, em desfavor da coproprietária vítima de violência doméstica, que, em razão de medida protetiva de urgência decretada judicialmente, detém o uso e gozo exclusivo do imóvel de cotitularidade do agressor, seja pela desproporcionalidade constatada em cotejo com o art. 226, § 8º, da CF/1988, seja pela ausência de enriquecimento sem causa (art. 884 do CC/2002).
Incabível o arbitramento de aluguel em desfavor da coproprietária vítima de violência doméstica, que, em razão de medida protetiva de urgência decretada judicialmente, detém o uso e gozo exclusivo do imóvel de cotitularidade do agressor.
RECURSO ESPECIAL
A inexistência de responsabilidade solidária por fato do produto entre os fornecedores da cadeia de consumo impede a extensão do acordo feito por um réu em benefício do outro.
REsp 1.968.143-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/02/2022. (Info 724)
Creiton ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais em desfavor de Koca Kola Indústrias Ltda., Lion Alimentos e Bebidas Ltda. e Senvio Distribuidora S.A., tendo em vista a ingestão de um “suco Lion” contendo um corpo estranho. Após a citação das rés e apresentação das contestações, Creiton firmou acordo com a ré Senvio ocasião em que, após a homolagação do acordo, o feito foi extinto apenas em relação à empresa.
Ao tomarem ciência desse fato, as rés restantes pleitearam a extensão do acordo firmado, nos termos do art. 844, § 3º, do Código Civil, ao argumento de que o suposto objeto da demanda decorre de fato único, qual seja, a ingestão de bebida contendo corpo estranho, e que este fato já foi reparado através da indenização paga por meio de acordo realizado entre a Creiton e a ré Senvio, e que o caso trata de relação de consumo, cuja responsabilidade é solidária.
Código Civil:
Art. 844. A transação não aproveita, nem prejudica senão aos que nela intervierem, ainda que diga respeito a coisa indivisível.
§ 3 o Se entre um dos devedores solidários e seu credor, extingue a dívida em relação aos co-devedores.
Código de Defesa do Consumidor:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – sua apresentação;
II – o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III – a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.
§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:
I – que não colocou o produto no mercado;
II – que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:
I – o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
II – o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;
III – não conservar adequadamente os produtos perecíveis.
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
R: Nooops!!!
Cinge-se a controvérsia a definir se o acordo firmado por um dos réus, em ação indenizatória ajuizada com base no Código de Defesa do Consumidor, deve aproveitar aos demais corréus, a teor do que dispõe o § 3º do art. 844 do Código Civil, ao fundamento de se tratar de responsabilidade solidária.
O caso trata de ingestão parcial de produto contaminado, tendo em vista que a parte consumiu parte de um suco contendo um corpo estranho em seu interior.
O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que “a presença de corpo estranho em alimento industrializado excede aos riscos comumente esperados pelo consumidor em relação a esse tipo de produto, caracterizando-se, portanto, como um defeito, a permitir a responsabilização do fornecedor. De fato, no atual estágio de desenvolvimento da tecnologia – e do próprio sistema de defesa e proteção do consumidor -, é razoável esperar que um alimento, após ter sido processado e transformado industrialmente, apresente, ao menos, adequação sanitária, não contendo em si substâncias, partículas ou patógenos agregados durante o processo produtivo e de comercialização, com potencialidade lesiva à saúde do consumidor” (REsp n. 1.899.304/SP, Segunda Seção, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, DJe de 4/10/2021).
Em outras palavras, a Segunda Seção da Corte Superior decidiu que a existência de corpo estranho em produtos alimentícios, como no caso, configura hipótese de fato do produto (defeito), previsto nos arts. 12 e 13 do Código de Defesa do Consumidor, não se tratando de vício do produto (CDC, art. 18 e seguintes).
Essa diferenciação é importante para analisar a existência ou não de solidariedade entre as rés.
É que, em relação à responsabilidade por vício do produto ou serviço, o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor não faz qualquer diferenciação entre os fornecedores, estabelecendo a responsabilidade SOLIDÁRIA de todos eles.
Percebe-se que a regra geral acerca da responsabilidade pelo fato do produto é objetiva e solidária entre o fabricante, o produtor, o construtor e o importador, a teor do art. 12 do CDC. Ou seja, todos os fornecedores que integram a cadeia de consumo irão responder conjuntamente independentemente de culpa.
Ocorre que, ao tratar da responsabilidade do comerciante pelo fato do produto, o Código de Defesa do Consumidor disciplinou de forma diversa, estabelecendo a responsabilidade SUBSIDIÁRIA, conforme se verifica do disposto no art. 13, incisos I a III, do CDC.
Isto é, o comerciante somente será responsabilizado pelo fato do produto ou serviço quando o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados (incisos I e II) ou quando não conservar adequadamente os produtos perecíveis (inciso III).
Em conclusão, inexistindo responsabilidade solidária não há que se falar em extensão do acordo feito por um réu em benefício do outro, tendo em vista a inaplicabilidade da regra do art. 844, § 3º, do Código Civil.
A inexistência de responsabilidade solidária por fato do produto entre os fornecedores da cadeia de consumo impede a extensão do acordo feito por um réu em benefício do outro.
RECURSO ESPECIAL
A demanda de complementação de aposentadoria nos termos da Portaria n. 966/1947 do Banco do Brasil configura pretensão de outro benefício previdenciário, sendo hipótese de reconhecimento da prescrição do fundo de direito.
REsp 1.668.676-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 08/02/2022. (Info 724)
Euclides ajuizou ação declaratória cumulada com cobrança contra o Banco do Brasil objetivando a condenação do réu a pagar-lhes complementação de aposentadoria, nos termos da Circular nº 966, de 9/5/47, com as alterações subsequentes, sem prejuízo do benefício pago pela PREVI, porque este foi objeto de constituição de reserva financeira custeada com a participação dos aposentados.
O Juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido, ao reconhecer prescrita a pretensão inicial e, com base no art. 487, II, do NCPC, extinguiu o processo, com julgamento de mérito. Euclides então apelou ao TJ local, mas a apelação não foi provida sob o fundamento de que o prazo prescricional de vinte anos previso no CC/16 já teria sido superado quando do ajuizamento da ação (2005), uma vez que o termo inicial para tanto teria iniciado em de 15/4/1967, quando da qual a PREVI (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil) foi criada e passou a gerir a complementação dos benefícios de aposentadoria antes realizada diretamente pelo Banco do Brasil.
Euclides então interpôs recurso especial no qual sustentou que, em 1997, o Banco e a Previ entabularam um novo acordo, acompanhado de um aditivo, e que veio a novar a obrigação daquele com os aposentados, logo, o termo inicial do prazo prescricional seria esta última data, razão pela qual requereu o afastamento da prescrição vintenária.
Súmula 85/STJ:
Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.
R: Já era!!!
A controvérsia consiste em decidir sobre o termo inicial do prazo prescricional para o exercício da pretensão de cobrança de complementação de aposentadoria privada de ex-funcionários do Banco do Brasil S/A, bem como sobre o direito ao recebimento da referida verba, nos termos da Portaria n. 966, de 06/05/1947, sem prejuízo do benefício pago pela Previ.
No que tange à prescrição, apesar da alegação de que se trata de obrigação de trato sucessivo, em que a violação do direito se renova a cada mês, tem-se que a pretensão diz respeito ao próprio direito material à complementação de aposentadoria e não apenas aos seus efeitos pecuniários, atingindo o fundo de direito, e, por isso, a contagem do prazo se inicia a partir da sua efetiva violação, não se aplicando, pois, a súmula 85/STJ.
Como a supressão do benefício deu-se com a implementação do novo regramento jurídico noticiado na Circular n. 351/1966, qual seja, 15/4/1967, data de início da contagem do prazo prescricional, pois foi quando se deu ciência da supressão, pelo Banco do Brasil S/A, do direito à complementação de aposentadoria nos moldes do que estabelecia a Portaria n. 966, de 15/04/1947.
A demanda de complementação de aposentadoria nos termos da Portaria n. 966/1947 do Banco do Brasil configura pretensão de outro benefício previdenciário, sendo hipótese de reconhecimento da prescrição do fundo de direito.
RECLAMAÇÃO
É cabível condenação em honorários advocatícios no julgamento de reclamação indeferida liminarmente na qual a parte comparece espontaneamente para apresentar defesa.
Rcl 41.569-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 09/02/2022. (Info 724)
Bravo Advogados firmou contrato de prestação de serviços de assessoria tributária com a PagoNada S/A. A relação azedou e ambas as partes moveram ação uma contra a outra: (i) a PagoNada S/A moveu ação de rescisão contratual, cumulada com indenização, na qual afirmava que o serviço advocatício não teria sido prestado, já que não foram obtidas compensações judiciais transitadas em julgado, deixando, por isso, de pagar os valores acordados, e (ii) a Bravo Adv mandou bala em ação de execução de título extrajudicial, cobrando as parcelas vencidas do contrato de prestação de serviços.
A ação de rescisão chegou ao STJ por meio de recurso no qual foi decidido que a obrigação advocatícia contratada era de meio, isto é, estava restrita ao pedido de compensação administrativa em benefício da Desbrave, e havia sido efetivamente cumprida. O processo retornou ao Tribunal local para análise das demais questões pendentes.
O Tribunal local acolheu os embargos de declaração de PagoNada para fixar o valor da causa em R$ 868.062,31 e os honorários em 10% desse valor em seu favor. Bravo então interpôs reclamação para a cassação da decisão do Tribunal de origem que violou, no seu entender, a autoridade do STJ.
Passou-se então a ser discutida a possibilidade de condenação em honorários advocatícios no julgamento de reclamação indeferida liminarmente na qual a parte comparece espontaneamente para apresentar defesa.
Código de Processo Civil:
Art. 331. Indeferida a petição inicial, o autor poderá apelar, facultado ao juiz, no prazo de 5 (cinco) dias, retratar-se.
§ 1º Se não houver retratação, o juiz mandará citar o réu para responder ao recurso.
§ 2º Sendo a sentença reformada pelo tribunal, o prazo para a contestação começará a correr da intimação do retorno dos autos, observado o disposto no art. 334 .
§ 3º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença.
Art. 989. Ao despachar a reclamação, o relator:
III – determinará a citação do beneficiário da decisão impugnada, que terá prazo de 15 (quinze) dias para apresentar a sua contestação.
R: Yeaph!!!
Com a vigência do Código de Processo Civil de 2015, a jurisprudência se firmou no sentido de que a reclamação possui natureza de ação, prevendo o artigo 989, III, do referido Código, a angularização da relação processual, com a citação do beneficiário, que passou a ter um tratamento semelhante ao da parte, podendo promover a defesa de seus interesses, com a consequente condenação ao pagamento de honorários de acordo com a sucumbência.
Assim, na hipótese de indeferimento inicial da reclamação, é firme a jurisprudência do STJ no sentido de que a relação processual não se aperfeiçoou, não sendo cabível a condenação em honorários.
É preciso diferenciar, porém, o simples indeferimento da inicial daquelas situações em que o reclamante ingressa com recurso contra a decisão que indefere a petição inicial ou contra a que julga o pedido improcedente liminarmente.
Com efeito, de acordo com o artigo 331 do CPC/2015, nas hipóteses em que a petição inicial é indeferida e contra essa decisão é interposta apelação, não havendo reconsideração, o réu é citado ou, se já tiver comparecido aos autos, é intimado para apresentar defesa e, sendo mantida a decisão, é cabível a condenação em honorários.
Assim, trazendo a situação para a reclamação, uma vez interposto recurso contra decisão que liminarmente indeferiu a petição inicial, não sendo o caso de reconsideração, o beneficiário que comparecer aos autos, apresentando contrarrazões, faz jus ao recebimento de honorários advocatícios.
É cabível condenação em honorários advocatícios no julgamento de reclamação indeferida liminarmente na qual a parte comparece espontaneamente para apresentar defesa.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Nas ações de improbidade administrativa, a competência da Justiça Federal é definida em razão da presença das pessoas jurídicas de direito público previstas no art. 109, I, da Constituição Federal na relação processual, e não em razão da natureza da verba federal sujeita à fiscalização da Tribunal de Contas da União.
CC 174.764-MA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 09/02/2022. (Info 724)
Município de Água Doce do Maranhão/MA ajuizou ação de improbidade administrativa contra Nerso, em razão de irregularidades na prestação de contas de verbas federais decorrentes de convênio firmado com o PRONAT. Foi então suscitado conflito de competência para o STJ decidir a quem caberia o julgamento.
Constituição Federal:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
VI – os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;
R: Nooops!!!!
No caso, o ente municipal ajuizou ação de improbidade administrativa, em razão de irregularidades na prestação de contas de verbas federais decorrentes de convênio.
A competência para processar e julgar ações de ressarcimento ao erário e de improbidade administrativa, relacionadas à eventuais irregularidades na utilização ou prestação de contas de repasses de verbas federais aos demais entes federativos, estava sendo dirimida por esta Corte Superior sob o enfoque das Súmulas 208/STJ (“Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita à prestação de contas perante órgão federal”) e 209/STJ (“Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal”).
O art. 109, I, da Constituição Federal prevê, de maneira geral, a competência cível da Justiça Federal, delimitada objetivamente em razão da efetiva presença da União, entidade autárquica ou empresa pública federal, na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes na relação processual. Estabelece, portanto, competência ABSOLUTA em razão da pessoa (ratione personae), configurada pela presença dos entes elencados no dispositivo constitucional na relação processual, independentemente da natureza da relação jurídica litigiosa.
Por outro lado, o art. 109, VI, da Constituição Federal dispõe sobre a competência penal da Justiça Federal, especificamente para os crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesse da União, entidades autárquicas ou empresas públicas. Assim, para reconhecer a competência, em regra, bastaria o simples interesse da União, inexistindo a necessidade da efetiva presença em qualquer dos polos da demanda.
Nesse contexto, a aplicação dos referidos enunciados sumulares, em processos de natureza cível, tem sido mitigada no âmbito deste Tribunal Superior. A Segunda Turma afirmou a necessidade de uma distinção (distinguishing) na aplicação das Súmulas 208 e 209 do STJ, no âmbito cível, pois tais enunciados provêm da Terceira Seção deste Superior Tribunal, e versam hipóteses de fixação da competência em matéria penal, em que basta o interesse da União ou de suas autarquias para deslocar a competência para a Justiça Federal, nos termos do inciso IV do art. 109 da CF. Logo adiante concluiu que a competência da Justiça Federal, em matéria cível, é aquela prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, que tem por base critério objetivo, sendo fixada tão só em razão dos figurantes da relação processual, prescindindo da análise da matéria discutida na lide (REsp 1.325.491/BA, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 05/06/2014, DJe 25/06/2014).
Assim, nas ações de ressarcimento ao erário e improbidade administrativa ajuizadas em face de eventuais irregularidades praticadas na utilização ou prestação de contas de valores decorrentes de convênio federal, o simples fato das verbas estarem sujeitas à prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União, por si só, não justifica a competência da Justiça Federal.
O Supremo Tribunal Federal já afirmou que o fato dos valores envolvidos transferidos pela União para os demais entes federativos estarem eventualmente sujeitos à fiscalização do Tribunal de Contas da União não é capaz de alterar a competência, pois a competência cível da Justiça Federal exige o efetivo cumprimento da regra prevista no art. 109, I, da Constituição Federal.
Igualmente, a mera transferência e incorporação ao patrimônio municipal de verba desviada, no âmbito civil, não pode impor de maneira absoluta a competência da Justiça Estadual. Se houver manifestação de interesse jurídico por ente federal que justifique a presença no processo, (v.g. União ou Ministério Público Federal) regularmente reconhecido pelo Juízo Federal nos termos da Súmula 150/STJ, a competência para processar e julgar a ação civil de improbidade administrativa será da Justiça Federal.
Em síntese, é possível afirmar que a competência cível da Justiça Federal é definida em razão da presença das pessoas jurídicas de direito público previstas no art. 109, I, da CF na relação processual, seja como autora, ré, assistente ou oponente e não em razão da natureza da verba federal sujeita à fiscalização da Corte de Contas da União.
No caso, não figura em nenhum dos pólos da relação processual ente federal indicado no art. 109, I, da Constituição Federal, o que afasta a competência da Justiça Federal para processar e julgar a referida ação. Ademais, não existe nenhuma manifestação de interesse em integrar o processo por parte de ente federal e o Juízo Federal consignou que o interesse que prevalece restringe-se à órbita do Município autor, o que atrai a competência da Justiça Estadual para processar e julgar a demanda.
Nas ações de improbidade administrativa, a competência da Justiça Federal é definida em razão da presença das pessoas jurídicas de direito público previstas no art. 109, I, da Constituição Federal na relação processual, e não em razão da natureza da verba federal sujeita à fiscalização da Tribunal de Contas da União.
RECURSO ESPECIAL
Até a edição da EC 103/2019, é admissível, aos servidores públicos, a conversão do tempo de serviço especial em comum objetivando a contagem recíproca de tempo de serviço.
REsp 1.592.380-SC, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 08/02/2022, DJe 10/02/2022. (Info 724)
Crementina, servidora pública, intentava a conversão de tempo de serviço especial em comum por meio de certidão de tempo de contribuição expedida neste sentido. Sua pretensão foi negada administrativamente, razão pela qual ajuizou ação judicial com o mesmo objetivo.
Ocorre que, decorrido o processo, houve uma decisão monocrática que deu provimento ao recurso especial da autarquia previdenciária para reconhecer a impossibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum para fins de contagem recíproca.
Inconformada, Crementina interpôs agravo regimental alegando que tal conversão seria possível se referente aos períodos trabalhados antes da vigência da EC 103/2019 (Reforma Previdenciária).
Lei n. 6.226/1975:
Art. 4º Para efeitos desta Lei, o tempo de serviço ou de atividades, conforme o caso, será computado de acordo com a legislação pertinente, observadas as seguintes normas:
I – Não será admitida a contagem de tempo de serviço em dobro ou em outras condições especiais;
Lei n. 8.213/1991:
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I – não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
CPC/2015:
Art. 1.040. Publicado o acórdão paradigma:
I – o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior;
II – o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior;
III – os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior;
IV – se os recursos versarem sobre questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.
§ 1º A parte poderá desistir da ação em curso no primeiro grau de jurisdição, antes de proferida a sentença, se a questão nela discutida for idêntica à resolvida pelo recurso representativo da controvérsia.
§ 2º Se a desistência ocorrer antes de oferecida contestação, a parte ficará isenta do pagamento de custas e de honorários de sucumbência.
§ 3º A desistência apresentada nos termos do § 1º independe de consentimento do réu, ainda que apresentada contestação.
R: Yeaph!!!
No caso pretende-se a conversão de tempo especial em comum, com ulterior emissão de certidão por tempo de contribuição, para se utilizar do tempo de serviço exercido no Regime Geral da Previdência Social – RGPS na aposentadoria no Regime Próprio de Previdência Social – RPPS.
Contudo, a jurisprudência do STJ, por meio do julgamento do EREsp n. 524.267/PB, relator Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 24/3/2014, sedimentou o entendimento de que, objetivando a contagem recíproca de tempo de serviço, não se admite a conversão do tempo de serviço especial em comum, em razão da expressa vedação legal (arts. 4º, I, da Lei n. 6.226/1975 e 96, I, da Lei n. 8.213/1991).
Ocorre que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 1.014.286 (Tema 942), com repercussão geral reconhecida, encerrado na sessão de 31/8/2020, enfrentou essa questão jurídica, firmando tese contrária à fixada pela Terceira Seção do STJ, para reconhecer que “até a edição da EC 103/2019, não havia impedimento à aplicação, aos servidores públicos, das regras do RGPS para a conversão do período de trabalho em condições nocivas à saúde ou à integridade física em tempo de atividade comum“.
Dessa forma, é forçoso realinhar o entendimento do STJ e, nos termos do art. 1.040 do CPC/2015, fazer a devida adequação ao decidido pelo Supremo Tribunal Federal, no Tema n. 942.
Até a edição da EC 103/2019, é admissível, aos servidores públicos, a conversão do tempo de serviço especial em comum objetivando a contagem recíproca de tempo de serviço.
CONFLITO DE COMPETÊNCIAS
O crime de injúria praticado pela internet por mensagens privadas, as quais somente o autor e o destinatário têm acesso ao seu conteúdo, consuma-se no local em que a vítima tomou conhecimento do conteúdo ofensivo.
CC 184.269-PB, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 09/02/2022. (Info 724)
Cleide, servidora pública federal, foi chamada de “bobalhona” e “bocó” por meio de aplicativo de mensagens em razão de suas funções. Em investigação na qual se apura a prática de injúria, o Juízo da Vara Federal de Caipora-RS declinou de sua competência, entendendo que, tendo sido o delito praticado por meio da internet, seria competente o Juízo do local onde inserido o conteúdo na rede mundial de computadores, logo a competência seria do Juízo da Vara Federal de Caramuru-PB.
O Juízo de Caramuru, aduziu que o delito teria sido praticado por meio de aplicativo de troca de mensagens privadas entre usuários, não tendo sido disponibilizada publicação passível de visualização por terceiros. Assim, como o acesso à mensagem de áudio com o conteúdo ofensivo era possível apenas à vítima Cleide, o delito se consumou no local onde dela se tomou conhecimento. Foi suscitado então conflito de competência.
R: O juízo do local em que a vítima tomou conhecimento do conteúdo ofensivo!!!
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que no caso de delitos contra a honra praticados por meio da internet, o local da consumação do delito é aquele onde incluído o conteúdo ofensivo na rede mundial de computadores.
Contudo, tal entendimento diz respeito aos casos em que a publicação é possível de ser visualizada por terceiros, indistintamente, a partir do momento em que veiculada por seu autor.
Na situação em análise, embora tenha sido utilizada a internet para a suposta prática do crime de injúria, o envio da mensagem de áudio com o conteúdo ofensivo à vítima ocorreu por meio de aplicativo de troca de mensagens entre usuários em caráter privado, denominado instagram direct, no qual somente o autor e o destinatário têm acesso ao seu conteúdo, não sendo acessível para visualização por terceiros, após a sua inserção na rede de computadores.
Portanto, no caso, aplica-se o entendimento geral de que o crime de injúria se consuma no local onde a vítima tomou conhecimento do conteúdo ofensivo.
O crime de injúria praticado pela internet por mensagens privadas, as quais somente o autor e o destinatário têm acesso ao seu conteúdo, consuma-se no local em que a vítima tomou conhecimento do conteúdo ofensivo.
RECURSO EM HABEAS CORPUS
É ilegal a requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público.
RHC 82.233-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por maioria, julgado em 09/02/2022. (Info 724)
Benedito foi preso por decreto de prisão exarado pelo Juiz da Vara Criminal competente. Entretanto, sua defesa impetrou habeas corpus no qual sustenta a ilegalidade das provas obtidas mediante requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público.
R: Nooops!!!
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário 1.055.941/SP, em sede de repercussão geral, firmou a orientação de que é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil – em que se define o lançamento do tributo – com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional (Tema 990).
Da leitura desatenta da ementa do julgado, poder-se-ia chegar à conclusão de que o entendimento consolidado autorizaria a requisição direta de dados pelo Ministério Público à Receita Federal, para fins criminais. No entanto, a análise acurada do acórdão demonstra que tal conclusão não foi compreendida no julgado, que trata da Representação Fiscal para fins penais, instituto legal que autoriza o compartilhamento, de ofício, pela Receita Federal, de dados relacionados a supostos ilícitos tributários ou previdenciários após devido procedimento administrativo fiscal.
Assim, a requisição ou o requerimento, de forma direta, pelo órgão da acusação à Receita Federal, com o fim de coletar indícios para subsidiar investigação ou instrução criminal, além de não ter sido satisfatoriamente enfrentada no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.055.941/SP, não se encontra abarcada pela tese firmada no âmbito da repercussão geral em questão. Ainda, as poucas referências que o acórdão faz ao acesso direto pelo Ministério Público aos dados, sem intervenção judicial, é no sentido de sua ilegalidade.
Em um estado de direito não é possível se admitir que órgãos de investigação, em procedimentos informais e não urgentes, solicitem informações detalhadas sobre indivíduos ou empresas, informações essas constitucionalmente protegidas, salvo autorização judicial.
Uma coisa é órgão de fiscalização financeira, dentro de suas atribuições, identificar indícios de crime e comunicar suas suspeitas aos órgãos de investigação para que, dentro da legalidade e de suas atribuições, investiguem a procedência de tais suspeitas. Outra, é o órgão de investigação, a polícia ou o Ministério Público, sem qualquer tipo de controle, alegando a possibilidade de ocorrência de algum crime, solicitar ao COAF ou à Receita Federal informações financeiras sigilosas detalhadas sobre determinada pessoa, física ou jurídica, sem a prévia autorização judicial.
Assim, é ilegal a requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público.
É ilegal a requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público.
HABEAS CORPUS
O requerimento de simples guarda dos registros de acesso a aplicações de internet ou registros de conexão por prazo superior ao legal, feito por autoridade policial, administrativa ou Ministério Público, prescinde de prévia autorização judicial.
HC 626.983-PR, Rel. Min. Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF da 1ª Região), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 08/02/2022. (Info 724)
A defesa de Vianei, investigado por crimes previstos na Lei da Organização Criminosa, impetrou habeas corpus no qual questiona a legalidade das provas obtidas via requerimento de simples guarda dos registros de acesso a aplicações de internet ou registros de conexão por prazo superior ao legal, feito pelo Ministério Público. Conforme a defesa, seria necessária expressa autorização judicial para tanto.
Requereu então a nulidade das provas carreadas aos autos, pois além de obtidas mediantes ” verdadeira medida cautelar” em detrimento do direito à intimidade/privacidade, teria ocorrido o congelamento do conteúdo telemático junto aos provedores de internet, sem autorização judicial.
Lei n. 12.965/2014:
Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas.
§ 1º O provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros mencionados no caput, de forma autônoma ou associados a dados pessoais ou a outras informações que possam contribuir para a identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial, na forma do disposto na Seção IV deste Capítulo, respeitado o disposto no art. 7º § 2º O conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser disponibilizado mediante ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, respeitado o disposto nos incisos II e III do art. 7º .
Art. 13. Na provisão de conexão à internet, cabe ao administrador de sistema autônomo respectivo o dever de manter os registros de conexão, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 1 (um) ano, nos termos do regulamento.
§ 2º A autoridade policial ou administrativa ou o Ministério Público poderá requerer cautelarmente que os registros de conexão sejam guardados por prazo superior ao previsto no caput.
§ 3º Na hipótese do § 2º , a autoridade requerente terá o prazo de 60 (sessenta) dias, contados a partir do requerimento, para ingressar com o pedido de autorização judicial de acesso aos registros previstos no caput.
§ 4º O provedor responsável pela guarda dos registros deverá manter sigilo em relação ao requerimento previsto no § 2º , que perderá sua eficácia caso o pedido de autorização judicial seja indeferido ou não tenha sido protocolado no prazo previsto no § 3º .
Art. 15. O provedor de aplicações de internet constituído na forma de pessoa jurídica e que exerça essa atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos deverá manter os respectivos registros de acesso a aplicações de internet, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 6 (seis) meses, nos termos do regulamento.
§ 2º A autoridade policial ou administrativa ou o Ministério Público poderão requerer cautelarmente a qualquer provedor de aplicações de internet que os registros de acesso a aplicações de internet sejam guardados, inclusive por prazo superior ao previsto no caput, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 13.
Art. 22. A parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juiz que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet.
Parágrafo único. Sem prejuízo dos demais requisitos legais, o requerimento deverá conter, sob pena de inadmissibilidade:
I – fundados indícios da ocorrência do ilícito;
II – justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados para fins de investigação ou instrução probatória; e
III – período ao qual se referem os registros.
CF:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
R: Nooops!!!
Controverte-se sobre a possibilidade de preservação do conteúdo telemático junto aos provedores de internet, a pedido do Ministério Público, sem autorização judicial.
A Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) dispõe que “a guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet”, nela tratados, “bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas” (art. 10).
Mas ressalva que o provedor responsável pela guarda está obrigado a disponibilizar os registros (de conexão e de acesso a aplicações da internet), mediante ordem judicial (art. 10, §§ 1º e 2º), com a finalidade de “formar conjunto probatório em processo judicial cível ou criminal, em caráter incidental ou autônomo” (art.22), a pedido da parte interessada, desde que haja “indícios fundados da ocorrência do ilícito”, “justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados para fins de investigação ou instrução probatória” e “período ao qual se referem os registros” (art. 22, incisos I, II e III).
Trata-se de matéria que recebe tratamento específico da Lei n. 12.965/2014, ao dispor que constitui dever jurídico do administrador do respectivo sistema autônomo manter os registros de conexão, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 1 (um) ano (art. 13); e, do provedor de aplicações de internet, por sua vez, manter os registros de acesso, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 6 (seis) meses (art. 15).
Dispõe, ainda, que a autoridade policial, administrativa ou o Ministério Público poderão requerer cautelarmente que os registros de conexão sejam guardados por prazo superior a 1 (um) ano (art. 13, § 2º), e os registros de acesso a aplicações de internet por prazo superior a 6 (seis) meses (art. 15, § 2º), devendo, nas duas situações, e no prazo de 60 (sessenta) dias, contados do requerimento administrativo, ingressar com o pedido de autorização judicial de acesso aos (dois) registros (arts. 13, § 3º, e 15, § 2º):
Nesse ponto, ao dispor que a autoridade policial, administrativa ou o Ministério Público poderão requerer cautelarmente – que os registros de conexão sejam guardados por prazo superior a 1 (um) ano (art. 13, § 2º), e os registros de acesso a aplicações de internet por prazo superior a 6 (seis) meses (art. 15, § 2º) -, a Lei disse MENOS do que pretendia.
É que, quem requer alguma coisa, pura e simplesmente pode tê-la deferida ou não, e, no caso, até mesmo pelo uso do termo “cautelarmente”, seguido da previsão de pedido judicial de acesso no prazo de 60 (sessenta) dias, contados do requerimento administrativo, sob pena de caducidade, tem-se que o administrador de sistema autônomo e o provedor de aplicações de internet estariam obrigados a atender às solicitações da autoridade policial, administrativa ou do Ministério Público, para que os registros sejam guardados por prazo superior.
Disso se infere que, no caso, o pedido de “congelamento” de dados pelo Ministério Público não precisa necessariamente de prévia decisão judicial para ser atendido pelo provedor, mesmo porque – e esse é o ponto nodal da discussão, visto em face do direito à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes (CF, art. 5º, X, e Lei n. 12.965/2014, art. 10) – não equivale a que o requerente tenha acesso aos dados “congelados” sem ordem judicial.
A jurisprudência do STF tem afirmado que o inciso XII do art. 5º da Constituição protege somente o sigilo das comunicações em fluxo (troca de dados e mensagens em tempo real), e que o sigilo das comunicações armazenadas, como depósito registral, é tutelado pela previsão constitucional do direito à privacidade do inciso X do art. 5º (HC 91.867, Rel. Ministro Gilmar Mendes, 2ª Turma, julgado em 24/04/2012).
Mas, em verdade, a disponibilização ao requerente dos registros de que trata a Lei n. 12.965/2014 (dados intercambiados), em atenção à referida cláusula constitucional, deverá ser precedida de autorização judicial, sendo estabelecido, inclusive, um prazo de 60 dias, contados a partir do requerimento de preservação dos dados, para que o Ministério Público ingresse com esse pedido de autorização judicial de acesso aos registros, sob pena de caducidade (art.13, § 4º).
Por fim, frisa-se que o ato normativo em questão, a fim de viabilizar investigações criminais, que, normalmente, são de difícil realização em ambientes eletrônicos, tornou mais eficiente o acesso a dados e informações relevantes ao possibilitar que o Ministério Público, diretamente, requeira ao provedor apenas a guarda, em ambiente seguro e sigiloso, dos registros de acesso a aplicações de internet. A disponibilização ao requerente dos conteúdos dos registros – dados cadastrais, histórico de pesquisa, todo conteúdo de e-mail e iMessages, fotos, contatos e históricos de localização etc. – deve sempre ser precedida de autorização judicial devidamente fundamentada.
O requerimento de simples guarda dos registros de acesso a aplicações de internet ou registros de conexão por prazo superior ao legal, feito por autoridade policial, administrativa ou Ministério Público, prescinde de prévia autorização judicial.
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