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Informativo STJ 720 Comentado


Informativo nº 720 do STJ COMENTADO pintando na telinha (do seu computador, notebook, tablet, celular…) para quem está ligado aqui conosco no Estratégia Carreiras Jurídicas!

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DIREITO ADMINISTRATIVO

1.      (Des)Necessidade de escritura pública para cessão de crédito em precatório

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA

Para a cessão de crédito em precatório, em regra, não há obrigatoriedade que se realize por escritura pública.

RMS 67.005-DF, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 16/11/2021, DJe 19/11/2021. (Info 720)

1.1.  Situação FÁTICA.

Crementina ajuizou mandado de segurança contra o ato supostamente ilegal atribuído ao  Juízo de Direito da Coordenadoria de Conciliação de Precatórios, que, por reputar indispensável a apresentação do original ou da cópia autenticada da escritura pública de cessão de direitos creditícios, indeferiu pedido de habilitação do cessionário.

Porém, o Tribunal de Justiça loca entendeu se tratar de negócio jurídico cuja validade dependeria de forma pública. Inconformada, Crementina interpôs recurso no qual sustenta que a cessão de crédito em precatório pode ser realizada independentemente da concordância do devedor, sem que para isso se exija forma especial ou registro, haja vista a ausência de previsão legal ou constitucional nesse sentido.

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.     Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.

Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

IV – não revestir a forma prescrita em lei;

Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.

Art. 288. É ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1 do art. 654.

Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante.

§ 1 O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.

1.2.2.     Necessária a escritura pública?

R: Noooops!!!!

Trata-se de mandado de segurança interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios que denegou a segurança impetrada em desfavor do MM. Juiz de Direito da Coordenadoria de Conciliação de Precatórios, cuja autoridade, por reputar indispensável a apresentação do original ou da cópia autenticada da escritura pública de cessão de direitos creditícios, indeferiu pedido de habilitação do impetrante/cessionário em precatório.

Primeiramente, sobreleva ressaltar que, em regra, todo e qualquer crédito pode ser objeto de cessão de direito, salvo quando presentes algumas das vedações indicadas no art. 286 do Código Civil.

Também importa frisar que, conforme a jurisprudência do STJ, “a forma do negócio jurídico é o modo pelo qual a vontade é exteriorizada. No ordenamento jurídico pátrio, vigora o princípio da liberdade de forma (art. 107 do CC/2002). Isto é, salvo quando a lei requerer expressamente forma especial, a declaração de vontade pode operar de forma expressa, tácita ou mesmo pelo silêncio (art. 111 do CC/2002)”, sendo certo, ademais, que “a exigência legal de forma especial é questão atinente ao plano da validade do negócio (art. 166, IV, do CC/2002)” (REsp 1.881.149/DF, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 10/6/2021).

Especificamente quanto à cessão de créditos, extrai-se do Código Civil que a necessidade de utilização de instrumento público – ou instrumento particular, revestido das solenidades previstas no art. 654, § 1º, do mesmo diploma substantivo – representa uma EXCEÇÃO à regra geral estabelecida em seu art. 107.

De ser ver, portanto, que a ressalva contida no art. 288 do Código Civil aplica-se tão somente à hipótese em que se pretenda fazer valer determinada cessão de crédito em relação à terceira pessoa, sendo inoponível tal condição de validade em face dos próprios cedente e cessionário.

O mesmo se diga em relação às disposições contidas na Lei Complementar Distrital n. 52/1997 no qual resta evidenciado que o legislador distrital claramente afastou a regra geral acerca da liberdade de forma a que alude o art. 107 do Código Civil, para fins de cessão de precatório, apenas em uma única hipótese: quando se objetivar a compensação de débitos de natureza tributária de competência do Distrito Federal.

Ora, uma vez que o art. 4º, V, da Lei Distrital n. 52/1997 se configura como sendo uma regra de natureza excepcional, impõe-se que sua interpretação deva ocorrer de forma restrita, conforme o clássico brocardo segundo o qual exceptiones sunt strictissimoe interpretationis (“interpretam-se as exceções estritissimamente”).

Acrescenta-se que para denegar a ordem mandamental, o Tribunal a quo fundamentou seu juízo em precedentes deste Superior, fazem remissão ao REsp 1.102.473/RS, julgado pela Corte Especial sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.

Cumpre, então, ressaltar que a incidental referência à expressão “escritura pública”, como contida na segunda tese fixada no precedente indicado, decorreu exclusivamente do fato de que, no caso daqueles autos, a cessão de crédito havia, sim, sido realizada por meio de forma pública, não sendo essa, contudo, a real questão dirimida no repetitivo em apreço.

1.2.3.     Resultado final.

Para a cessão de crédito em precatório, em regra, não há obrigatoriedade que se realize por escritura pública.

2.      Termo inicial do prazo prescricional para ajuizamento da ação de indenização contra o Estado em razão da demora na concessão da aposentadoria

RECURSO ESPECIAL

O termo inicial do prazo prescricional para ajuizamento da ação de indenização contra o Estado em razão da demora na concessão da aposentadoria conta-se a partir do seu deferimento.

REsp 1.840.570-RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 16/11/2021, DJe 23/11/2021. (Info 720)

2.1.  Situação FÁTICA.

Germano, servidor público, requereu sua aposentadoria em 31/05/2002, porém, o ato de aposentação somente foi publicado no dia 18/10/2004, ou seja, mais de 2 anos e 4 meses após a data do pedido, tendo o recorrente permanecido na função compulsoriamente por todo este longo período.

Por sua vez, o Tribunal de Contas da União, somente em 28/06/2016 decidiu por “ordenar o registro do ato”, dando fim ao procedimento administrativo, após 14 anos de tramitação. Foi então que Germano ajuizou ação em face da União por meio da qual requereu o pagamento de uma indenização correspondente à remuneração integral que deveria ter sido auferida no gozo de sua aposentadoria, durante o período da demora injustificada da Administração. Ocorre que tal ação somente foi proposta em 01/11/2016.

A União então alegou a prescrição do direito de ação de Germano por entender que o termo para a contagem prazo prescricional de cinco anos seria contado a partir da data da concessão inicial da aposentadoria (18/10/2004), enquanto o autor da ação entende que o termo inicial deve ser contado do registro da aposentadoria no TCU (28/06/2016).

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.     Questão JURÍDICA.

Decreto n. 20.910/1932:

Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

2.2.2.     Qual o termo inicial a ser considerado?

R: A data do DEFERIMENTO da aposentadoria!!!!

Acerca da prescrição, o artigo 1º do Decreto n. 20.910/1932 consigna que as ações contra a Fazenda Pública prescrevem em 5 (cinco) anos da data do ato ou fato da qual se originaram. O disposto no artigo 189 do Código Civil também estabelece que a prescrição se inicia no momento da VIOLAÇÃO do direito sobre o qual se funda a ação. Assim, como regra, a prescrição começa a correr desde que a pretensão teve origem, pois, segundo a doutrina, “o maior fundamento da existência do próprio direito é a garantia de pacificação social”.

O STF, ao julgar o Tema de Repercussão Geral 445/STF, fixou a tese no sentido de que “[e]m atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas.” (STF. Plenário. RE 636.553/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 19/2/2020).

Cuida-se, portanto, de prazo prescricional para a Administração Pública vir anular ou revogar o ato de aposentadoria por ela concedida ao servidor, correndo o referido prazo não da concessão do benefício, mas do seu registro junto ao Tribunal de Contas da União, ou seja, trata-se da pretensão da Administração Pública contra o administrado.

No caso, o que se examina é a pretensão, não da Administração Pública, mas do administrado de discutir o direito de indenização por dano material pela suposta demora na concessão de sua aposentadoria, ou seja, matéria completamente DIVERSA da tratada pelo STF no Tema de Repercussão Geral n. 445/STF.

Nesse contexto, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado ocorre no momento em que constatada a lesão e os seus efeitos, ou seja, a partir do deferimento do pedido voluntário de aposentaria do servidor, conforme o princípio da actio nata.

2.2.3.     Resultado final.

O termo inicial do prazo prescricional para ajuizamento da ação de indenização contra o Estado em razão da demora na concessão da aposentadoria conta-se a partir do seu deferimento.

DIREITO CIVIL

3.      Obrigação de alimentos e interesse processual do alimentante em exigir contas da detentora da guarda do alimentando

RECURSO ESPECIAL

O alimentante não possui interesse processual em exigir contas da detentora da guarda do alimentando.

REsp 1.767.456-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/11/2021. (Info 720)

3.1.  Situação FÁTICA.

Vando ajuizou ação de prestação de contas em face de Suzete aduzindo que se divorciou da requerida, que ficou com a guarda do filho do ex-casal, Carlinhos. Por meio da ação, Vando buscava a prestação de contas da requerida (sua ex-mulher) pela administração da verba alimentar devida ao filho nos últimos dois anos.

O Juiz de Primeiro Grau indeferiu a ação em razão da carência de ação, sentença esta posteriormente reformada pelo Tribunal Local. Conforme o Tribunal, ao rejeitar a legitimidade do genitor para propor ação de prestação de contas, bem como requerer a restituição de eventuais valores apurados em favor dos menores seria declarar morto o texto normativo, bem como colaborar com o enriquecimento ilícito da parte que emprega, de forma indevida, os alimentos prestados.

3.2.  Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.     Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 1.583.  A guarda será unilateral ou compartilhada. 

§ 5º  A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos.

Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.

Parágrafo único.  O direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente. 

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

3.2.2.     Há interesse processual?

R: Para a 3ª Turma do STJ, NÃO!!!

Conforme estabelecido nos arts. 1.583, § 5º, e 1.589, do CC de 2002, ao genitor que não detém a guarda do filho é garantido o direito de fiscalizar o cumprimento, pelo outro genitor, dos aspectos pessoais e econômicos da guarda, como a educação, a saúde física e psicológica, o lazer e o desenvolvimento de modo geral do filho, o que refoge ao verdadeiro objeto da ação de prestação de contas.

A possibilidade de se buscar informações a respeito do bem-estar do filho e da boa aplicação dos recursos devidos a título de alimentos em nada se comunica com o dever de entregar uma planilha aritmética de gastos ao alimentante, que não é credor de nada.

O procedimento especial da ação de prestação de contas está previsto nos artigos 914 a 919 do Código de Processo Civil de 1973 e nos arts. 550 a 553 do Código de Processo Civil de 2015, que preveem, nesse caso, apenas a ação de exigir contas. Tal rito faculta àquele que detiver o direito de exigir contas de terceiro ou, ainda, a obrigação de prestá-las, a utilização do rito específico para averiguação de eventual crédito ou até mesmo de débito. Em outras palavras, a referida ação pode ser proposta por quem deveria receber um balanço da administração de bens alheios, mas não a recebeu, bem como por aquele que as deveria prestar a outrem, porém se negou a fazê-lo.

A ação de alimentos apresenta PECULIARIEDADES que se dissociam da lógica da ação de prestação de contas. A verba alimentar, uma vez transferida ao alimentante, ingressa definitivamente no patrimônio do alimentando. O detentor da guarda tem, indubitavelmente, o dever de utilizar o montante da melhor forma possível em favor do beneficiário. Contudo, ainda que se discorde da aplicação dos recursos, não há falar em devolução da quantia utilizada pelo credor, ante o princípio da irrepetibilidade que norteia as regras do direito de família, em especial, com relação aos alimentos.

Por outro lado, o suposto direito de exigir o adequado emprego dos valores repassados pressuporia a análise da utilização matemática da pensão alimentícia, o que não é plausível. Ademais, seria imprescindível analisar todas as circunstâncias fáticas acerca da qualidade de vida do alimentando, consoante a condição social e econômica da família de forma global, o que não se coaduna com os fundamentos lógicos e jurídicos da ação de prestação de contas.

Há PRESUNÇÃO de que as verbas recebidas tenham sido utilizadas para a manutenção da comunidade familiar, abrangendo o custeio de alimentação, saúde, vestuário, educação, lazer, entre outros. Excepcionalmente, admite-se o ajuizamento de ação revisional ou ação de modificação da guarda ou suspensão do poder familiar, quando presente a suspeita de abuso de direito no exercício desse poder.

Não se está a negar a possibilidade do abuso do direito (art. 187 do Código Civil de 2002) no Direito de Família, especialmente no que tange ao desvio ou má gestão da verba alimentar destinada à prole. Todavia, existindo a intenção de prejudicar os filhos por meio de temerária administração dos alimentos é necessário que se acione o judiciário para a avaliação concreta do melhor interesse da criança ou adolescente, num contexto global. Permitir ações de prestação de contas significaria incentivar ações infindáveis e muitas vezes infundadas acerca de possível malversação dos alimentos, alternativa não plausível e pouco eficaz no Direito de Família.

Dessa forma, eventual desconfiança sobre tais informações, em especial do destino dos alimentos que paga, não se resolve por meio de planilha ou balancetes pormenorizadamente postos, de forma matemática e objetiva, mas com ampla análise de quem subjetivamente detém melhores condições para manter e criar uma criança em um ambiente saudável, seguro e feliz, garantindo-lhe a dignidade tão essencial no ambiente familiar.

3.2.3.     Resultado final.

O alimentante não possui interesse processual em exigir contas da detentora da guarda do alimentando.

ATENÇÃO!!! DIVERGÊNCIA ENTRE TURMAS DO STJ!!!!

O alimentante pode propor/tem interesse processual na ação de exigir contas contra a guardiã do alimentado para obtenção de informações acerca da destinação da pensão alimentícia?

Para a 3ª Turma do STJ: NÃOPara a 4ª Turma do STJ: SIM
O alimentante não possui interesse processual em exigir contas da detentora da guarda do alimentando. STJ. 3ª Turma. REsp 1.767.456-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/11/2021 (Info 720).O genitor pode propor ação de prestação de contas em face do outro genitor relativamente aos valores decorrentes de pensão alimentícia. STJ. 4ª Turma. REsp 1.911.030-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 01/06/2021 (Info 699).

4.      (Im)Possibilidade de o condomínio residencial proibir a locação de unidade autônoma por curto período de tempo.

RECURSO ESPECIAL

O condomínio que possui destinação exclusivamente residencial pode proibir a locação de unidade autônoma por curto período de tempo.

REsp 1.884.483-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/11/2021. (Info 720)

4.1.  Situação FÁTICA.

Tião ajuizou ação contra o Condomínio Granada Residence visando à anulação de assembleia condominial na qual foi aprovada, entre outras, a proposta de proibir a locação de unidades autônomas por prazo inferior a 90 dias. O magistrado de primeiro grau reconheceu a procedência do pedido formulado na demanda e declarou nula a deliberação da Assembleia Geral Extraordinária, no tocante à limitação do prazo de locação de unidades autônomas.

Porém, o Tribunal de Justiça local deu provimento à apelação interposta pelo condomínio réu para julgar improcedente o pedido formulado na ação ao fundamento de que a ‘locação’ por meio de “plataformas digitais” configuraria hospedagem, e por isso viola as normas dos artigos 1.228, § 1º (‘O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais’), e 1.336, inciso IV do Código Civil (‘São deveres do condômino dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes”.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.     Questão JURÍDICA.

Lei n. 4.591/1964:

Art. 19. Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interêsses, condicionados, umas e outros às normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos.

Código Civil:

Art. 1.336. São deveres do condômino:

IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

4.2.2.     Possível a proibição de locação por curto período?

R: Yeaph!!!!

Inicialmente cumpre salientar que a disponibilização de imóveis para uso de terceiros por meio de plataformas digitais de hospedagem, a depender do caso concreto, pode ser enquadrada nas mais variadas hipóteses existentes no ordenamento jurídico, sobretudo em função da constante expansão das atividades desenvolvidas por empresas do gênero, sempre em busca de maiores lucros e maiores condições de sobrevivência no mercado mundial.

Nessa medida, somente a partir dos elementos fáticos delineados em cada hipótese submetida à apreciação judicial – considerados aspectos relativos ao tempo de hospedagem, ao grau de profissionalismo da atividade, à destinação exclusiva do imóvel ao ocupante ou o seu compartilhamento com o proprietário, à destinação da área em que ele está inserido (se residencial ou comercial), à prestação ou não de outros serviços periféricos, entre outros – é que se afigura possível enquadrar determinada atividade em alguma das hipóteses legais, se isso se mostrar relevante para a solução do litígio.

Diversa é a hipótese em que o conflito se verifica na relação entre o proprietário do imóvel que o disponibiliza para uso de terceiros e o próprio condomínio no qual o imóvel está inserido, atingindo diretamente os interesses dos demais condôminos. Nessa específica hipótese, impõe-se observar as regras relativas ao condomínio edilício, previstas no Código Civil.

O art. 19 da Lei n. 4.591/1964 assegura aos condôminos o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionado às normas de boa vizinhança, podendo usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos.

O art. 1.336, IV, do CC/2002, por seu turno, prescreve ser DEVER do condômino dar à sua parte exclusiva a mesma destinação que tem a edificação, utilizando-a de maneira a preservar o sossego, a salubridade, a segurança e os bons costumes.

Assim, chega-se à conclusão de que a exploração econômica de unidades autônomas mediante locação por curto ou curtíssimo prazo, caracterizadas pela eventualidade e pela transitoriedade, não se compatibiliza com a destinação exclusivamente residencial atribuída ao condomínio.

Não há, portanto, nenhuma ilegalidade ou falta de razoabilidade na restrição imposta pelo condomínio, a quem cabe decidir acerca da conveniência ou não de permitir a locação das unidades autônomas por curto período, tendo como embasamento legal o art. 1.336, IV, do CC/2002, observada a destinação prevista na convenção condominial.

4.2.3.     Resultado final.

O condomínio que possui destinação exclusivamente residencial pode proibir a locação de unidade autônoma por curto período de tempo.

5.      (Im)Possibilidade de usucapião de imóvel vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, ainda que em situação de abandono

RECURSO ESPECIAL

Não é possível usucapião de imóvel vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, ainda que em situação de abandono.

REsp 1.874.632-AL, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/11/2021, DJe 29/11/2021. (Info 720)

5.1.  Situação FÁTICA.

Um Conjunto residencial foi construído de forma vinculada ao Sistema Financeiro de Habitação. Porém, nem todas as unidades/apartamentos foram vendidas e algumas foram abandonadas pela CEF e pela empresa responsável pela alienação dos imóveis.

Tempos depois, várias famílias de baixa renda passaram a ocupar os imóveis abandonados com intenção de ali residir. Uma das famílias então ajuizou ação de usucapião por meio da qual intenta adquirir a propriedade do imóvel que ali ocupa.

5.2.  Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.     Questão JURÍDICA.

Constituição Federal de 1988:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 3º Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Código Civil:

Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião.

5.2.2.     Possível a usucapião de imóvel vinculado ao SFH?

R: Nooops!!!

A doutrina e a jurisprudência, seguindo o disposto no § 3º do art. 183 e no parágrafo único do art. 191 da Constituição Federal de 1988, bem como no art. 102 do Código Civil e no enunciado da Súmula n. 340 do Supremo Tribunal Federal, entendem pela absoluta impossibilidade de usucapião de bens públicos.

O imóvel vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível.

Na eventual colisão de direitos fundamentais, como o de moradia e o da supremacia do interesse público, deve prevalecer, em regra, este último, norteador do sistema jurídico brasileiro, porquanto a prevalência dos direitos da coletividade sobre os interesses particulares é pressuposto lógico de qualquer ordem social estável.

Mesmo o eventual abandono de imóvel público não possui o condão de alterar a natureza jurídica que o permeia, pois não é possível confundir a usucapião de bem público com a responsabilidade da Administração pelo abandono de bem público. Com efeito, regra geral, o bem público é INDISPONÍVEL.

No caso, é possível depreender que o imóvel foi adquirido com recursos públicos pertencentes ao Sistema Financeiro Habitacional, com capital 100% (cem por cento) público, destinado à resolução do problema habitacional no país, não sendo admitida, portanto, a prescrição aquisitiva.

Eventual inércia dos gestores públicos, ao longo do tempo, não pode servir de justificativa para perpetuar a ocupação ilícita de área pública, sob pena de se chancelar ilegais situações de invasão de terras.

Por fim, não se pode olvidar, ainda, que os imóveis públicos, mesmo desocupados, possuem finalidade específica (atender a eventuais necessidades da Administração Pública) ou genérica (realizar o planejamento urbano ou a reforma agrária). Significa dizer que, aceitar a usucapião de imóveis públicos, com fundamento na dignidade humana do usucapiente, é esquecer-se da dignidade dos destinatários da reforma agrária, do planejamento urbano ou de eventuais beneficiários da utilização do imóvel, segundo as necessidades da Administração Pública.

5.2.3.     Resultado final.

Não é possível usucapião de imóvel vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, ainda que em situação de abandono.

6.      Provedores de internet e dever de fornecimento dos dados cadastrais dos responsáveis pela publicação de vídeos com ofensas à memória de pessoas falecidas

RECURSO ESPECIAL

Os provedores de conexão à internet devem fornecer os dados cadastrais (nome, endereço, RG e CPF) dos usuários responsáveis por publicação de vídeos no Youtube com ofensas à memória de pessoa falecida.

REsp 1.914.596-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/11/2021. (Info 720)

6.1.  Situação FÁTICA.

Após o assassinato da Vereadora Marielle Franco, foram publicados diversos vídeos na plataforma Youtube com informações ofensivas a respeito daquela. Inconformada, a irmã da vítima ajuizou ação contra o proprietário do Youtube requerendo a retirada dos vídeos.

Inicialmente, a tutela foi deferida. A autora ação requereu então que fosse ordenada a quebra do sigilo de dados e que os provedores de internet fossem oficiados para informar os dados dos usuários que postaram os vídeos combatidos, pedido este negado pelo Tribunal de Justiça local que fundamentou o indeferimento no fato de que tal pedido não constava na ação original e que os provedores não eram partes do processo.

6.2.  Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.     Os provedores devem fornecer os dados?

R: Yeaph!!!!

A resolução da controvérsia passa pela análise primeira dos conceitos apresentados na Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet – MCI), notadamente quanto ao dever de guarda dos dados pelos provedores de internet – provedores de aplicação e de conexão ou acesso – e a responsabilidade pela guarda dos referidos dados.

Tendo em vista as distinções entres as modalidades de provedores de internet, ou seja, provedores de aplicação, e os provedores de conexão, cumpre analisar a responsabilidade atribuída a cada modalidade.

O STJ consagrou entendimento de que aos provedores de aplicação é exigida a guarda dos dados de conexão (nestes incluído o respectivo IP), enquanto aos provedores de conexão cumpre a guarda de dados pessoais do usuário.

No caso, os pedidos formulados traduzem a finalidade do provimento judicial, qual seja, a preservação da honra e memória da falecida, mediante a retirada de vídeos ou matérias ofensivas do ar, bem como a obtenção de dados para futura (e eventual) responsabilização pessoal dos usuários responsáveis pela divulgação dos fatos ofensivos e inverídicos, circunstâncias que se encontram demonstradas pelas razões apresentadas na petição inicial.

Estando presentes indícios de ilicitude na conduta dos usuários que inseriram os vídeos na rede mundial de computadores e, ainda, por ser o pedido específico, voltado tão apenas a obtenção dos dados dos referidos usuários – a partir dos IPs apresentados -, a privacidade do usuário, no caso concreto, não prevalece.

Nessa linha de intelecção, considerando o regramento aplicável à matéria, a natureza dos elementos pretendidos – restritos, frise-se, ao fornecimento dos dados cadastrais dos usuários (nome, endereço, identidade) -, assim como o entendimento recente do STJ que reconhece a obrigação do provedor de acesso à internet de fornecer os dados cadastrais dos usuários de atos ilícitos, conclui-se pela possibilidade de que os provedores de conexão ou provedores de acesso forneçam os dados pleiteados, ainda que não tenham integrado a relação processual em que formulado o requerimento.

É oportuno ainda destacar que as medidas em debate não confrontam com as determinações visando à proteção do sigilo trazida pela Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei n. 13.790/2018).

A doutrina ressalta a inafastabilidade da apreciação pelo Poder Judiciário nas hipóteses em que os dados pessoais possam servir como elemento para o exercício de direitos em demandas em geral (judiciais, administrativos e arbitrais). Assim, a LGPD não exclui a possibilidade da quebra de sigilo.

Por fim, a prestação das informações pelas respectivas concessionárias de serviço público (provedores de conexão de internet) deverá observar estritamente ao regramento previsto pela lei referida, nos termos dos arts. 23 e seguintes.

6.2.2.     Resultado final.

Os provedores de conexão à internet devem fornecer os dados cadastrais (nome, endereço, RG e CPF) dos usuários responsáveis por publicação de vídeos no Youtube com ofensas à memória de pessoa falecida.

DIREITO ELEITORAL

7.      Desfiliação partidária e multa estatutária

RECURSO ESPECIAL

A multa estatutária por desfiliação partidária não decorre automaticamente da filiação e da consequente submissão às regras do estatuto, sendo imprescindível o documento de aquiescência assinado pelo candidato.

REsp 1.796.737-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/11/2021. (Info 720)

7.1.  Situação FÁTICA.

O Partido Renovador Trabalhista Brasileiro – PRTB ajuizou ação de cobrança em desfavor de Cícero, pleiteando a cobrança da multa por desfiliação partidária prevista no art. 85, X, do Estatuto Interno do PRTB, no valor equivalente a 12 (doze) meses do seu salário, uma vez que este requereu a desfiliação durante seu mandato como deputado federal.

No âmbito da sentença, o Juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido, ao fundamento de não ter sido juntado ao feito documento indispensável, qual seja, o termo de ciência e concordância subscrito pelo réu, a respeito da possibilidade de aplicação de tal penalidade.

7.2.  Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.     Questão JURÍDICA.

Constituição Federal:

Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos

§ 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e provisórios e sobre sua organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações nas eleições majoritárias, vedada a sua celebração nas eleições proporcionais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.  

Lei n. 9.096/1995:

Art. 14. Observadas as disposições constitucionais e as desta Lei, o partido é livre para fixar, em seu programa, seus objetivos políticos e para estabelecer, em seu estatuto, a sua estrutura interna, organização e funcionamento.

Art. 15. O Estatuto do partido deve conter, entre outras, normas sobre:

V – fidelidade e disciplina partidárias, processo para apuração das infrações e aplicação das penalidades, assegurado amplo direito de defesa;

CPC/2015:

Art. 373. O ônus da prova incumbe:

I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;

Art. 434. Incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações.

Parágrafo único. Quando o documento consistir em reprodução cinematográfica ou fonográfica, a parte deverá trazê-lo nos termos do caput , mas sua exposição será realizada em audiência, intimando-se previamente as partes.

7.2.2.     Necessária a comprovação da aquiescência pelo candidato?

R: Yeaph!!!!

A Constituição Federal, em seu art. 17, § 1º, assegura aos partidos políticos “autonomia para definir sua estrutura interna e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e provisórios e sobre sua organização e funcionamento […], devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária”.

A esse respeito, dispõe a Lei n. 9.096/1995 (regente dos partidos políticos) que, observadas as disposições constitucionais e da respectiva lei, a agremiação é livre “para estabelecer, em seu estatuto, a sua estrutura interna, organização e funcionamento” (art. 14), podendo conter, no estatuto, normas sobre “fidelidade e disciplina partidárias, processo para apuração das infrações e aplicação das penalidades, assegurado amplo direito de defesa” (art. 15, V).

Nessa linha de intelecção, ressai incontroversa a legitimidade da previsão estatutária de incidência de multa por desfiliação partidária no curso do mandato, tal como previsto no art. 85, X, do Estatuto do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro – PRTB, como uma medida de desestímulo à infidelidade partidária.

Da leitura dessa norma, extrai-se que a penalidade pecuniária consistente no pagamento de valor correspondente a 12 (doze) meses do salário do candidato eleito possui dois requisitos, a saber: i) a aquiescência expressa do candidato com a cobrança da penalidade, mediante a assinatura do mencionado formulário; e ii) a sua desfiliação do partido no curso do respectivo mandato.

É incontroverso, na espécie, que: a) não foi juntado “documento que comprove a concordância expressa do Réu com o pagamento da multa em questão”; e b) “o Réu era, ao tempo da sua eleição para o cargo de Deputado Federal, bem como que, no curso do seu mandato eletivo, “requereu a desfiliação do referido partido político, conforme comprova o pedido de desfiliação.

Segundo a exegese desse dispositivo estatutário, é da concordância incontestável do candidato a mandato eletivo que surge o vínculo obrigacional do pagamento da penalidade, não decorrendo automaticamente da filiação e da consequente submissão do candidato às regras do estatuto.

Nesse contexto, afigura-se IMPRESCINDÍVEL. ao acolhimento do pedido de cobrança em voga, a prova INCONTESTÁVEL da anuência com o pagamento da multa pelo candidato a mandato eletivo, revelando-se descabida a presunção de prova nesse sentido.

Em tal linha argumentativa, sobressai que o documento devidamente assinado não é conditio sine qua non ao registro da candidatura de filiado ao PRTB e à sua efetiva participação nas eleições gerais, de forma que a disputa eleitoral, embora possa ser considerada um indício, é insuficiente a evidenciar, indene de dúvida, a totalidade do fato probando.

Portanto, estando ausente a prova inequívoca do direito alegado pelo partido político de incidência da multa por desfiliação partidária estabelecida no art. 85, X, do Estatuto do PRTB, de rigor a improcedência da tutela condenatória, em observância ao disposto nos arts. 373, I, e 434 do CPC/2015.

7.2.3.     Resultado final.

A multa estatutária por desfiliação partidária não decorre automaticamente da filiação e da consequente submissão às regras do estatuto, sendo imprescindível o documento de aquiescência assinado pelo candidato.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

8.      Reclamação pelo descumprimento de decisão do STJ e desnecessidade da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação

RECLAMAÇÃO

A Reclamação com base na alegação de descumprimento de decisão proferida pelo STJ em caso concreto independe, para sua admissibilidade, da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC

Rcl 41.894-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 24/11/2021. (Info 720)

8.1.  Situação FÁTICA.

Lúcia ajuizou ação em face de EletroPaulo (concessionária dos serviços de energia elétrica) em razão da morte de seu marido, decorrente de choque elétrico após rompimento de cabos de alta tensão que se encontravam na via pública após queda de árvore. O pedido foi julgado improcedente nas duas primeiras instâncias, que entenderam inexistente o nexo causal.

Inconformada, Lúcia interpôs recurso especial e o Ministro Relator decidiu monocraticamente que o feito retornasse à origem para prosseguimento da demanda sob a premissa de que o nexo causal não fora quebrado. O TJ local desconsiderou a decisão do STJ e manteve o decidido no acórdão recorrido. Ocorre que, antes mesmo que tal decisão fosse publicada, Lúcia ingressou com reclamação no STJ.

8.2.  Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.     Questão JURÍDICA.

CPC:

Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:

§ 5º É inadmissível a reclamação;

II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias.  

Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá;

II – encaminhar o processo ao órgão julgador para realização do juízo de retratação, se o acórdão recorrido divergir do entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça exarado, conforme o caso, nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos;   

8.2.2.     Necessário aguardar a publicação para ingressar com a reclamação?

R: Noooops!!!!

Cinge-se a controvérsia a analisar a alegação de inadmissibilidade de conhecimento de reclamação constitucional ao argumento de que, no caso concreto, o acórdão teria sido publicado e que as reclamantes deveriam ter interposto, antes, Recurso Especial. Somente após o juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC, a Reclamação seria admissível, conforme preveria, a contrário sensu, o § 5º, inciso II, do art. 988 do CPC.

No entanto, o juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC, tem aplicação quando “o acórdão recorrido divergir do entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça exarado, conforme o caso, nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos.” Não é o que ocorre na espécie, onde o reclamante alega descumprimento da decisão proferida pelo STJ no caso concreto, não de acórdão proferido sob o regime dos recursos repetitivos. Não haveria oportunidade para que o Tribunal local se retratasse.

Nem mesmo eventuais Embargos de Declaração teriam aptidão para reformar o acórdão reclamado, já que o Tribunal a quo, não se omitiu sobre a decisão do STJ. A reforma do novo acórdão do Tribunal de Justiça só seria viável com o julgamento de mais um Recurso Especial, razão pela qual está esgotada a instância ordinária.

Outrossim, o desrespeito à autoridade da decisão do STJ ocorreu com a prolação do acórdão pelo Tribunal local e independe da intimação das partes por meio da imprensa oficial.

8.2.3.     Resultado final.

A Reclamação com base na alegação de descumprimento de decisão proferida pelo STJ em caso concreto independe, para sua admissibilidade, da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC

9.      (Des)Necessidade de apresentação nominal do rol de filiados para o ajuizamento de Ação Civil Pública por associação

RECURSO ESPECIAL

É desnecessária a apresentação nominal do rol de filiados para o ajuizamento de Ação Civil Pública por associação.

REsp 1.325.857-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 30/11/2021. (Info 720)

9.1.  Situação FÁTICA.

O Instituto de Defesa dos Consumidores ajuizou ação civil pública em face do Banco CobroMesmo com o objetivo de declarar a nulidade da tarifa cobrada do consumidor na liquidação antecipada de dívidas. A ação foi inicialmente julgada procedente e a sentença mantida pelo Tribunal local.

Inconformado, Cobromesmo interpôs recurso especial no qual sustenta que o Instituto de Defesa dos Consumidores deveria ter juntado a lista com os nomes de todas as pessoas que estão associadas naquele momento, bem como a autorização dos associados, tudo na forma do que teria sido decidido pelo STF no RE 573232/SC.

9.2.  Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.     Questão JURÍDICA.

CDC:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I – erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II – ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III – erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

Art. 105. Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), os órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor.

CF/1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXI – as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;

9.2.2.     Necessária a juntada da lista nominal dos associados?

R: Nooops!!!

Cinge-se a controvérsia na verificação da legitimidade das associações para propor ação civil pública, tendo em vista a não apresentação do rol de seus filiados.

Outrossim, faz-se INDISPENSÁVEL estudo detido da tese firmada pela Suprema Corte, no julgamento do RE 573.232/SC, relativa à necessidade de apresentação de nominata de associados para ajuizamento de ações coletivas.

É que a análise proposta permitirá desvendar se tal exigência refere-se apenas às ações coletivas ordinárias, ou se também as ações civis públicas devem obediência àquela condicionante.

Salutar é a investigação sobre a que título a associação atua no processo, se em substituição ou representação dos associados, resposta que orientará a definição da obrigatoriedade ou não da apresentação do rol de possíveis beneficiários da demanda, sob pena de indeferimento da inicial.

Sobre o tema, é o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça: “Independentemente de autorização especial ou da apresentação de ré/ação nominal de associados, as associações civis, constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos pelo CDC, gozam de legitimidade ativa para a propositura de ação coletiva. (Superior Tribunal de Justiça, Terceira Turma, REsp. 805277/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 23/09/2008, DJe 08/10/2008)

Referindo-se à específica atuação das associações, a doutrina elucida a questão, diferenciando os institutos da representação e substituição processual, nos seguintes termos: “A distinção entre representação e substituição processual é clássica, e ambas estão relacionadas com a não coincidência entre o titular do direito material e aquele que defende esse direito em juízo. Ocorre representação quando o representante age em nome do representado, na tutela do direito deste; já na substituição processual o substituto age em nome próprio, na defesa do direito do substituído. Na hipótese de atuação judicial de entidade associativa a título de representante, o ente vai a juízo em nome e no interesse dos associados, de modo que há necessidade de apresentar autorização prévia para essa atuação e os efeitos da sentença ficam circunscritos aos representados. Trata-se da previsão do art. 5, inc. XXI, da Constituição Federal. Trata-se de legitimação ordinária. Já na substituição processual, o que ocorre é uma atuação pelo ente coletivo que tem como função precípua a defesa dos interesses comuns do grupo de substituídos; daí a desnecessidade de autorização expressa e pontual dos seus membros para a sua atuação em juízo, como também ocorre com a tradicional legitimidade extraordinária dos sindicatos. E daí, também, a extensão dos efeitos da sentença a todos os substituídos, aplicando-se as regras da coisa julgada próprias dos processos coletivos (arts. 103 e 105 do CDC). Neste caso, a legitimação é extraordinária.”

A atuação das associações em processos coletivos pode se verificar de duas maneiras: (a) por meio da ação coletiva ordinária, hipótese de representação processual, com base no permissivo contido no artigo 5º, inciso XXI, da CF/1988; ou (b) ou na ação civil pública, agindo a associação nos moldes da substituição processual prevista no Código de Defesa do Consumidor e na Lei da Ação Civil Pública.

No caso analisado, vale dizer que a ação proposta na origem tem como escopo a defesa de direitos e interesses homogêneos de uma universalidade de consumidores que, embora também sejam, ontologicamente, direitos individuais, mereceram tratamento especial do ordenamento jurídico, que se expressa pela legitimação extraordinária do substituto processual.

Com base em todo exposto, verifica-se a IMPOSSIBILIDADE de, no caso em análise, incidir o entendimento firmado no RE 573.232/SC, em sede de repercussão geral.

Isto porque, o precedente da Corte Suprema se direcionou EXCLUSIVAMENTE às demandas coletivas em que as Associações autoras atuam por representação processual, não tendo aplicação aos casos em que agem em substituição.

Dessarte, na pretensão deduzida na presente demanda, DIVERSAMENTE do julgamento do STF, a atuação da entidade autora deu-se, de forma inequívoca, no campo da substituição processual, sendo desnecessária a apresentação nominal do rol de seus filiados para ajuizamento da ação.

9.2.3.     Resultado final.

É desnecessária a apresentação nominal do rol de filiados para o ajuizamento de Ação Civil Pública por associação.

10.  (I)Legitimidade do locatário do imóvel cuja propriedade foi consolidada nas mãos do credor fiduciário diante da inadimplência do devedor fiduciante para responder pela taxa de ocupação

RECURSO ESPECIAL

O locatário do imóvel cuja propriedade foi consolidada nas mãos do credor fiduciário diante da inadimplência do devedor fiduciante (antigo locador do bem) não é parte legítima para responder pela taxa de ocupação, prevista no art. 37-A da Lei n. 9.514/1997.

REsp 1.966.030-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/11/2021, DJe 30/11/2021. (Info 720)

10.1.                   Situação FÁTICA.

Nerso celebrou com o Banco Cobromesmo um contrato de alienação fiduciária para compra de um imóvel residencial. Infelizmente, Nerso não conseguiu pagar as prestações combinadas e o banco ajuizou ação de cobrança. Diante da inadimplência do devedor fiduciário e da inércia destes após a intimação para a purga da mora, o banco consolidou a propriedade do imóvel para si e, após a realização de dois leilões infrutíferos, concedeu ao devedor a quitação integral da dívida.

Porém, ao tentar investir-se na posse do imóvel, Cobromesmo ficou sabendo que o bem havia sido locado para Caetano. O banco então notificou Caetano para que deixasse o imóvel, o que só ocorreu 246 dias depois da notificação.  Em razão do atraso, Cobromesmo ajuizou ação em face de Caetano por meio da qual cobra valor referente à taxa de ocupação.

10.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1. Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.514/1997:

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

§ 7o Se o imóvel estiver locado, a locação poderá ser denunciada com o prazo de trinta dias para desocupação, salvo se tiver havido aquiescência por escrito do fiduciário, devendo a denúncia ser realizada no prazo de noventa dias a contar da data da consolidação da propriedade no fiduciário, devendo essa condição constar expressamente em cláusula contratual específica, destacando-se das demais por sua apresentação gráfica.

Art. 37-A.  O devedor fiduciante pagará ao credor fiduciário, ou a quem vier a sucedê-lo, a título de taxa de ocupação do imóvel, por mês ou fração, valor correspondente a 1% (um por cento) do valor a que se refere o inciso VI ou o parágrafo único do art. 24 desta Lei, computado e exigível desde a data da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciante até a data em que este, ou seus sucessores, vier a ser imitido na posse do imóvel.     

Parágrafo único.  O disposto no caput deste artigo aplica-se às operações do Programa Minha Casa, Minha Vida, instituído pela Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR).

10.2.2.  A taxa de ocupação pode ser cobrada de Caetano?

R: Noooops!!!!

A controvérsia cinge-se em saber se o locatário do imóvel, objeto de alienação fiduciária celebrada entre o banco (autor da ação de cobrança) e terceiros, como garantia das obrigações decorrentes de cédula de crédito bancário, é parte legítima para responder pela taxa de ocupação prevista no art. 37-A da Lei n. 9.514/1997 (com a redação dada pela Lei n. 10.931/2004), exigida pela instituição financeira em razão da ocupação indevida do bem após a consolidação da propriedade para si e a notificação para que o locador procedesse à devolução do imóvel, no prazo que estipulou.

A taxa de ocupação tem por fundamento a posse INJUSTA exercida pelo devedor fiduciante a partir do momento em que consolidada a propriedade no patrimônio do credor, sendo sua finalidade compensar o legítimo proprietário do imóvel – o credor fiduciário, ou quem vier a sucedê-lo – pela ocupação ilegítima.

Nesse contexto, observa-se que os sujeitos da relação jurídica apta a ensejar a cobrança da taxa de ocupação prevista no art. 37-A da Lei n. 9.514/1997 estão expressos na norma e são apenas os sujeitos originários do ajuste – fiduciante e fiduciário -, ou aqueles que sucederam o credor na relação contratual.

No caso, a parte consolidou a propriedade do imóvel para si e, após a realização de dois leilões infrutíferos, concedeu ao devedor a quitação integral da dívida, tornando-se proprietário pleno do bem. Em seguida, ao tentar investir-se na posse do imóvel, tomou ciência de que, em razão de um contrato de locação firmado com o então devedor-fiduciante, o bem estava sendo ocupado por um terceiro.

No entanto, cabe anotar que a cessão da posse do imóvel objeto de alienação fiduciária, por meio da celebração de contrato de locação com terceiros, é uma faculdade assegurada ao devedor fiduciante, pois a lei lhe confere, “enquanto adimplente, a livre utilização por sua conta e risco do imóvel objeto da alienação fiduciária” (art. 24, V, da Lei n. 9.514/1997).

Assim, havendo anuência do credor fiduciário, a locação deve ser respeitada, passando o credor a figurar na relação locatícia como sucessor do locador, e os valores que o credor poderá cobrar do ocupante do imóvel, após a consolidação da propriedade são aqueles decorrentes do contrato de locação.

Por outro lado, não havendo essa anuência, inexiste qualquer vínculo entre o locatário e o credor fiduciário, que poderá, apenas, denunciar a locação, nos termos do disposto nos arts. 27, § 7º, da Lei n. 9.514/1997.

Desse modo, o locatário do imóvel cuja propriedade foi consolidada nas mãos do credor fiduciário diante da inadimplência do devedor fiduciante (antigo locador do bem) não é parte legítima para responder pela taxa de ocupação, prevista no art. 37-A da Lei n. 9.514/1997, por não fazer parte da relação jurídica que fundamenta a cobrança da taxa em questão.

10.2.3. Resultado final.

O locatário do imóvel cuja propriedade foi consolidada nas mãos do credor fiduciário diante da inadimplência do devedor fiduciante (antigo locador do bem) não é parte legítima para responder pela taxa de ocupação, prevista no art. 37-A da Lei n. 9.514/1997.

DIREITO DO CONSUMIDOR

11.  Contestação de autenticidade de assinatura e ônus probatório

RECURSO ESPECIAL

Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade (CPC, arts. 6º, 369 e 429, II ).

REsp 1.846.649-MA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 24/11/2021. Tema 1061. (Info 720)

11.1.                   Situação FÁTICA.

Vozinaldo contratou um empréstimo consignado junto ao Banco Brasa no qual ficou acordado que seria descontado mensalmente o percentual de 10% do valor do seu benefício previdenciário por cinco anos. No entanto, algum tempo depois, o banco passou a descontar 30% do valor do benefício, o que deixou Vozinaldo em situação financeira bastante complicada.

Inconformado, o idoso ajuizou ação em face do Banco, que, por sua vez, juntou ao processo dois contratos de empréstimos consignados supostamente assinados pelo autor. Vozinaldo afirma que o primeiro contrato efetivamente foi assinado por ele, mas contestou a assinatura do segundo contrato.

11.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1. Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

Art. 373. O ônus da prova incumbe:

I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;

II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

§ 2º A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.

§ 3º A distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer por convenção das partes, salvo quando:

I – recair sobre direito indisponível da parte;

II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

§ 4º A convenção de que trata o § 3º pode ser celebrada antes ou durante o processo.

Art. 429. Incumbe o ônus da prova quando:

I – se tratar de falsidade de documento ou de preenchimento abusivo, à parte que a arguir;

II – se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento.

11.2.2. A quem cabe comprovar a autenticidade da assinatura?

R: Ao Banco/Instituição Financeira!!!

Inicialmente cumpre salientar que para a resolução desta controvérsia deve-se limitar a discussão aos casos em que há contestação da assinatura do contrato, pois, diversamente da hipótese em que se contesta a veracidade do próprio documento (art. 429, I, do CPC/2015), aqui se impugna apenas parte dele, isto é, a aposição da assinatura (art. 429, II, do CPC/2015).

Segundo a doutrina, “o ônus da prova da falsidade documental compete à parte que a arguiu (art. 429, I, CPC), mas se a falsidade apontada disser respeito à assinatura lançada no documento, o ônus da prova caberá a quem o produziu (art. 429, II, CPC)”.

Assim, a parte que produz o documento é aquela por conta de quem se elaborou, porquanto responsável pela formação do contrato, sendo quem possui a capacidade de justificar ou comprovar a presença da pessoa que o assinou.

Dessa maneira, vê-se que a própria lei criou uma exceção à regra geral de distribuição do ônus probatório, disposta no art. 373 do CPC/2015, imputando o ônus a quem produziu o documento se houver impugnação de sua autenticidade.

Assim, aqui não se cuida de inversão do ônus probatório com a imposição de a casa bancária arcar com os custos da perícia, mas sim quanto à imposição legal de a parte que produziu o documento suportar o ônus de demonstrar a veracidade da assinatura constante no contrato e oportunamente impugnada pelo mutuário, o que abrange a produção da perícia grafotécnica.

Oportuno ressaltar, ainda, que não se está a afirmar que o fornecedor, nas relações consumeristas, deverá arcar com a produção da prova pericial em toda e qualquer hipótese, mas apenas que será ônus seu, em regra, demonstrar a veracidade da assinatura aposta no contrato.

Além disso, deve-se atentar ao fato de que as ações repetitivas que justificaram a admissão do IRDR na origem envolviam consumidores pessoas idosas, aposentadas, de baixa renda e analfabetas, os quais, em sua maioria, foram vítimas de fraudes ou práticas abusivas perpetradas por correspondentes bancários. Portanto, a hipótese em apreço não impõe a produção de uma prova diabólica, haja vista que o próprio consumidor, que supostamente teria assinado o contrato, impugna a autenticidade da assinatura e poderá facilmente fornecer o material necessário para a perícia grafotécnica.

Ademais, o Poder Judiciário não pode fechar os olhos para as circunstâncias fáticas que gravitam ao redor da questão jurídica, porquanto tais demandas envolvem, via de regra, pessoas hipervulneráveis, que não possuem condições de arcar com os custos de uma prova pericial complexa, devendo ser imputado tal ônus àquela parte da relação jurídica que detém maiores condições para sua produção.

Por fim, não se olvide que o art. 6º do CPC/2015 prevê expressamente o dever de cooperação entre os sujeitos do processo para que se obtenha uma solução com efetividade, devendo as partes trazer aos autos as alegações e provas capazes de auxiliar, de forma efetiva, na formação do convencimento do Magistrado para o deferimento da produção das provas necessárias.

Logo, havendo impugnação da autenticidade da assinatura constante de contrato bancário por parte do consumidor, caberá à instituição financeira o ônus de provar sua autenticidade, mediante perícia grafotécnica ou outro meio de prova.

11.2.3. Resultado final.

Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade (CPC, arts. 6º, 369 e 429, II ).

DIREITO EMPRESARIAL

12.  Bens alienados em garantia a ao avalista em recuperação judicial e possibilidade de expropriação de outros bens de sua titularidade

RECURSO ESPECIAL

Não pertencendo os bens alienados em garantia ao avalista em recuperação judicial, não podem ser expropriados outros bens de sua titularidade, pois devem servir ao pagamento de todos os credores. (1) Os credores fiduciários estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial somente em relação ao montante alcançado pelos bens alienados em garantia (2)

REsp 1.953.180-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/11/2021, DJe 01/12/2021. (Info 720)

12.1.                   Situação FÁTICA.

Banco Pinha ingressou com pedido de tutela cautelar antecedente unicamente contra FX S.A – Em Recuperação Judicial e Colarte Química S.A., buscando garantir a futura execução de 2 cédulas de crédito bancário, nas quais as requeridas constam como avalistas. Destaca-se que o devedor principal não foi acionado por meio desta ação.

As executadas informaram que ingressaram com pedido de recuperação judicial, tendo sido deferido o seu processamento pelo Juízo competente, motivo pelo qual requereram a suspensão do feito. O Juízo da Vara de expediu ofícios ao Juízo da execução, encaminhando a decisão que deferiu o processamento da recuperação judicial das recorridas/executadas e requerendo o levantamento dos valores bloqueados e a suspensão dos atos expropriatórios relativos ao imóvel de titularidade de Colarte.

Inconformado, o banco argumentou que poderia expropriar os bens penhorados, uma vez que seu crédito é extraconcursal e não se submete aos efeitos da recuperação judicial da avalista.

12.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1. Questão JURÍDICA.

Lei n. 11.101/2005:

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica:     

§ 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal.

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

12.2.2. Possível a expropriação?

R: Nooops!!!

Conforme consignado no julgamento do REsp 1.677.939/SP, “O aval apresenta 2 (duas) características principais, a autonomia e a equivalência. A autonomia significa que a existência, validade e eficácia do aval não estão condicionadas à da obrigação principal. A equivalência torna o avalista devedor do título da mesma forma que a pessoa por ele avalizada. (…) Disso decorre que o credor pode exigir o pagamento tanto do devedor principal quanto do avalista, que não pode apresentar exceções pessoais que aproveitariam o avalizado, nem invocar benefício de ordem.”

Desse modo, se o avalizado for devedor principal, o avalista será tratado como se devedor principal fosse.

Assim, caso os bens alienados em garantia fossem dos avalistas, poderiam ser perseguidos pelo credor fora da recuperação judicial, já que a extraconcursalidade do crédito está diretamente ligada à propriedade fiduciária.

No entanto, sendo os bens alienados em garantia de propriedade do devedor principal, o crédito em relação aos avalistas em recuperação judicial não pode ser satisfeito com outros bens de sua propriedade, que estão submetidos ao pagamento de todos os demais credores.

Os credores fiduciários estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial???

R: Somente em relação ao montante alcançado pelos bens em garantia!!!!

A alienação fiduciária em garantia implica a transferência da propriedade de coisa material ao credor com a finalidade de garantir a obrigação principal. A transferência da propriedade, porém, é resolúvel. Satisfeita a obrigação principal, o bem retorna automaticamente à propriedade do devedor. Na hipótese de inadimplemento, no entanto, o credor poderá retomar a posse do bem para efetivar sua liquidação e saldar a dívida.

Nos termos do artigo 49, § 3º, da Lei n. 11.101/2005, tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva.

Contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, não será permitida a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial. Como se observa da redação do dispositivo legal, busca-se tutelar o direito de propriedade do credor, que poderá retomar a posse do bem, sem se submeter aos efeitos da recuperação judicial, salvo algumas restrições que podem lhe ser impostas se os bens forem essenciais à atividade.

Diante disso, é possível concluir que o que diferencia o credor garantido por alienação fiduciária dos demais credores é a propriedade do bem alienado em garantia. Assim, é o objeto da garantia que traça os limites da extraconcursalidade do crédito.

Em outras palavras, se a alienação do bem dado em garantia for suficiente para quitar o débito, extingue-se a obrigação. Por outro lado, se o valor apurado com a venda do bem não for bastante para extinguir a obrigação, o restante do crédito em aberto não mais poderá ser exigido fora da recuperação judicial do devedor, pois não mais existirá a característica que diferenciava o credor titular da posição de proprietário fiduciário dos demais.

Portanto, o crédito do titular da posição de credor fiduciário será extraconcursal no limite do bem dado em garantia, sobre o qual se estabelece a propriedade resolúvel.

12.2.3. Resultado final.

Não pertencendo os bens alienados em garantia ao avalista em recuperação judicial, não podem ser expropriados outros bens de sua titularidade, pois devem servir ao pagamento de todos os credores. (1) Os credores fiduciários estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial somente em relação ao montante alcançado pelos bens alienados em garantia(2)

DIREITO TRIBUTÁRIO

13.  Credor fiduciário antes da consolidação da propriedade e imissão na posse como sujeito passivo do IPTU

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

O credor fiduciário, antes da consolidação da propriedade e da imissão na posse no imóvel objeto da alienação fiduciária, não pode ser considerado sujeito passivo do IPTU, uma vez que não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 34 do CTN.

AREsp 1.796.224-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 16/11/2021. (Info 720)

13.1.                   Situação FÁTICA.

Suzete celebrou contrato de alienação fiduciária com o Banco Cobromesmo para a aquisição de um imóvel residencial. Ocorre que Suzete não conseguiu pagar as parcelas combinadas, além de não ter pago também o IPTU devido no tempo em que ali residiu.

O banco então ajuizou ação de cobrança, mas antes mesmo da consolidação da propriedade e da imissão na posse no imóvel objeto da alienação fiduciária, o Município no qual o imóvel se localiza notificou o banco para o pagamento do IPTU atrasado.

13.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1. Questão JURÍDICA.

Lei n. 9.514/1997:

Art. 25. Com o pagamento da dívida e seus encargos, resolve-se, nos termos deste artigo, a propriedade fiduciária do imóvel.

§ 1º No prazo de trinta dias, a contar da data de liquidação da dívida, o fiduciário fornecerá o respectivo termo de quitação ao fiduciante, sob pena de multa em favor deste, equivalente a meio por cento ao mês, ou fração, sobre o valor do contrato.

§ 2º À vista do termo de quitação de que trata o parágrafo anterior, o oficial do competente Registro de Imóveis efetuará o      cancelamento do registro da propriedade fiduciária.

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

§ 8o Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.     

Código Civil:

Art. 1.231. A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário.

Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor.

§ 2 Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa.

Art. 1.363. Antes de vencida a dívida, o devedor, a suas expensas e risco, pode usar a coisa segundo sua destinação, sendo obrigado, como depositário:

I – a empregar na guarda da coisa a diligência exigida por sua natureza;

II – a entregá-la ao credor, se a dívida não for paga no vencimento.

Art. 1.365. É nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em garantia, se a dívida não for paga no vencimento.

Parágrafo único. O devedor pode, com a anuência do credor, dar seu direito eventual à coisa em pagamento da dívida, após o vencimento desta.

Art. 1.367.  A propriedade fiduciária em garantia de bens móveis ou imóveis sujeita-se às disposições do Capítulo I do Título X do Livro III da Parte Especial deste Código e, no que for específico, à legislação especial pertinente, não se equiparando, para quaisquer efeitos, à propriedade plena de que trata o art. 1.231.

Art. 1.368-B.  A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)

Parágrafo único.  O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem

CTN:

Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.

13.2.2. O credor fiduciário pode ser considerado sujeito passivo do IPTU?

R: Nana-nina-NÃO!!!

Inicialmente, anote-se que, de acordo com o art. 25 da Lei n. 9.514/1997, a propriedade conferida ao credor fiduciário é RESOLÚVEL. Além disso, nos termos dos arts. 1.231 e 1.367 do Código Civil, essa não é plena e nunca o será.

Com efeito, “a intenção do devedor fiduciante, ao oferecer o imóvel como garantia ao contrato de alienação fiduciária, não é, ao fim e ao cabo, transferir para o credor fiduciário a propriedade plena do bem, diversamente do que ocorre na compra e venda, mas apenas garantir o adimplemento do contrato de financiamento a que se vincula, objetivando que, mediante o pagamento integral da dívida, a propriedade plena do bem seja restituída ao seu patrimônio” (REsp 1.726.733/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe 16/10/2020).

Vê-se, pois, que a propriedade conferida ao credor fiduciário é despida dos poderes de domínio/propriedade (uso, gozo e disposição), sendo a posse indireta por ele exercida desprovida de ânimo de domínio, considerando-se a inexistência do elemento volitivo: a vontade de ter o bem como se seu fosse.

Observe-se que, na eventual hipótese de consolidação da propriedade no nome do credor fiduciário (art. 26, §§, da Lei n. 9.514/1997), a lei determina a obrigatoriedade de este promover a alienação do bem (art. 27 da Lei 9.514/1997 e art. 1.364 do CC/2002), não sendo possível a manutenção da sua propriedade sobre o bem mesmo nas hipóteses de inadimplemento do contrato pelo devedor fiduciante (art. 1.365 do Código Civil).

De mesma forma, o credor fiduciário também não é detentor do domínio útil sobre o imóvel, tendo em vista que esse reserva-se ao devedor fiduciante (arts. 1.361, § 2°, e 1.363 do CC/2002).

Nesse contexto, ganha relevância a previsão feita nos arts. 27, § 8°, da Lei 9.514/1997 e 1.368-B, parágrafo único, do CC/2002, quando declaram que sobre o credor fiduciante recaem todos os encargos (especial atenção dada aos tributos) incidentes sobre o bem apenas com a consolidação da propriedade e após a imissão da posse.

Em relação aos créditos de IPTU, o entendimento do STJ se consolidou no sentido de que consideram-se contribuintes do referido imposto o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título.

Esta é a orientação adotada no julgamento do Recurso Especial repetitivo 1.111.202/SP, quando se definiu que o próprio Município pode, por meio de lei local, escolher no rol do art. 34 do CTN aquele que constará como sujeito passivo da exação.

No entanto, a jurisprudência do STJ, interpretando o art. 34 do CTN, também reconhece não ser possível a sujeição passiva do IPTU ao proprietário despido dos poderes de propriedade, daquele que não detém o domínio útil sobre o imóvel ou do possuidor sem ânimo de domínio, no que se insere o credor fiduciário.

13.2.3. Resultado final.

O credor fiduciário, antes da consolidação da propriedade e da imissão na posse no imóvel objeto da alienação fiduciária, não pode ser considerado sujeito passivo do IPTU, uma vez que não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 34 do CTN.

DIREITO PENAL

14.  Inadimplemento de prestação pecuniária como impeditivo da extinção da punibilidade em caso de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa

RECURSO ESPECIAL

Na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária, pelo condenado que comprovar impossibilidade de fazê-lo, não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade.

REsp 1.785.383-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 24/11/2021, DJe 30/11/2021. (Tema 931) (Info 720)

14.1.                   Situação FÁTICA.

Tadeu foi condenado a uma pena privativa de liberdade e ao pagamento de 100 dias multa. Ele cumpriu o período designado na pena, mas deixou de pagar a sanção pecuniária e alegou a absoluta impossibilidade de fazê-lo em razão de suas parcas condições financeiras.

Dr. Creisson então extinguiu a pena privativa de liberdade pelo seu cumprimento integral, mas determinou que fosse oficiada a Fazenda Pública para cobrança da pena de multa e ressaltou que a extinção da punibilidade somente poderia ser decretada quando Tadeu comprovasse o pagamento dos valores.

14.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

14.2.1. Questão JURÍDICA.

Código Penal:

Art. 51. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será executada perante o juiz da execução penal e será considerada dívida de valor, aplicáveis as normas relativas à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.

CF/88: 

 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

14.2.2. O não pagamento obsta a extinção da punibilidade?

R: Se comprovada a impossibilidade de pagamento, NÃO!!!

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Representativo da Controvérsia n. 1.519.777/SP, assentou a tese de que “[n]os casos em que haja condenação à pena privativa de liberdade e multa, cumprida a primeira (ou a restritiva de direitos que eventualmente a tenha substituído), o inadimplemento da sanção pecuniária não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade”.

Entretanto, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.150/DF, o STF firmou o entendimento de que a alteração do art. 51 do Código Penal, promovida Lei n. 9.268/1996, não retirou o caráter de sanção criminal da pena de multa, de modo que a primazia para sua execução incumbe ao Ministério Público e o seu inadimplemento obsta a extinção da punibilidade do apenado. Tal compreensão foi posteriormente sintetizada em nova alteração do referido dispositivo legal, levada a cabo pela Lei n. 13.964/2019.

Em decorrência do entendimento firmado pelo STF, bem como em face da mais recente alteração legislativa sofrida pelo artigo 51 do Código Penal, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais Representativos da Controvérsia n. 1.785.383/SP e 1.785.861/SP, reviu a tese anteriormente aventada no Tema n. 931, para assentar que, “na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade”.

Ainda consoante o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal julgamento da ADI n. 3.150/DF, “em matéria de criminalidade econômica, a pena de multa desempenha um papel proeminente de prevenção específica, prevenção geral e retribuição”.

Além disso o Supremo Tribunal Federal decidiu pela indispensabilidade do pagamento da sanção pecuniária para o gozo da progressão a regime menos gravoso, “[a] exceção admissível ao dever de pagar a multa é a impossibilidade econômica absoluta de fazê-lo. […] é possível a progressão se o sentenciado, veraz e comprovadamente, demonstrar sua absoluta insolvabilidade. Absoluta insolvabilidade que o impossibilite até mesmo de efetuar o pagamento parcelado da quantia devida, como autorizado pelo art. 50 do Código Penal”.

Não se pode desconsiderar que o cenário do sistema carcerário expõe disparidades sócio-econômicas da sociedade brasileira, as quais ultrapassam o inegável caráter seletivo do sistema punitivo e se projetam não apenas como mecanismo de aprisionamento físico, mas também de confinamento em sua comunidade, a reduzir o indivíduo desencarcerado ao status de um pária social. Outra não é a conclusão a que poderia conduzir – relativamente aos condenados em comprovada situação de hipossuficiência econômica – a subordinação da retomada dos seus direitos políticos e de sua consequente reinserção social ao prévio adimplemento da pena de multa.

Conclui-se que condicionar a extinção da punibilidade, após o cumprimento da pena corporal, ao adimplemento da pena de multa acentuar a já agravada situação de penúria e de indigência dos apenados hipossuficientes e sobreonera pessoas próximas do condenado, impondo a todo o seu grupo familiar privações decorrentes de sua impossibilitada reabilitação social, o que põe sob risco a implementação da política estatal proteção da família (art. 226 da Carta de 1988).

Por fim, extinção da punibilidade, quando pendente apenas o adimplemento da pena pecuniária, reclama para si singular relevo na trajetória do egresso de reconquista de sua posição como indivíduo aos olhos do Estado, ou seja, do percurso de reconstrução da existência sob as balizas de um patamar civilizatório mínimo, a permitir outra vez o gozo e o exercício de direitos e garantias fundamentais.

14.2.3. Resultado final.

Na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária, pelo condenado que comprovar impossibilidade de fazê-lo, não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

15.  Ampla defesa e acesso a notebook na unidade prisional pelo custodiado

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS

Se a defesa técnica teve pleno acesso aos autos da ação penal, anexos e mídias eletrônicas, a negativa de ingresso de notebook na unidade prisional para que o custodiado visualize as peças eletrônicas não configura violação do princípio da ampla defesa.

AgRg no HC 631.960-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 23/11/2021, DJe 26/11/2021. (Info 720)

15.1.                   Situação FÁTICA.

Maurício, bacharel em direito, encontrava-se custodiado na Superintendência da Polícia Federal e requereu ao Tribunal Regional Federal local que lhe fosse garantida a comunicação reservada com seus advogados, fora do parlatório, além do acesso à íntegra dos autos e mídias eletrônicas. O intento do pedido era auxiliar seus advogados na elaboração da sua tese de defesa. Destaca-se que a defesa teve pleno acesso aos autos e anexos da ação penal.

Tal pedido foi negado pelo magistrado responsável. Inconformado, Maurício impetrou Habeas Corpus no qual sustenta que tal recusa representaria cerceamento à defesa.

15.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

15.2.1. Questão JURÍDICA.

Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

15.2.2. Tudo certo, Arnaldo?

R: Segue o jogo!!!!

A garantia constitucional à ampla defesa, prevista no art. 5º, LV, da Constituição Federal, envolve a defesa em sentido técnico (defesa técnica), realizada pelo advogado, e a defesa em sentido material (autodefesa), por meio de qualquer atividade defensiva desenvolvida pelo próprio acusado, em especial durante seu interrogatório. Contudo, no caso, a restrição ao ingresso de notebook na unidade prisional justificava-se pelo risco de ofensa à segregação prisional.

Ademais, tal restrição não representava obstáculo à ampla defesa, pois as peças processuais relevantes ou de interesse poderiam ter sido impressas e levadas ao preso. Frise-se que, embora o custodiado tenha formação jurídica, sua defesa técnica está sendo patrocinada por advogados habilitados nos autos, os quais tiveram pleno acesso aos autos da ação penal, anexos e mídias eletrônicas. Portanto, assegurado à defesa técnica amplo acesso à integralidade dos elementos probatórios encartados nos autos, já estando o custodiado ciente das imputações descritas na denúncia, não há falar em nulidade processual.

15.2.3. Resultado final.

Se a defesa técnica teve pleno acesso aos autos da ação penal, anexos e mídias eletrônicas, a negativa de ingresso de notebook na unidade prisional para que o custodiado visualize as peças eletrônicas não configura violação do princípio da ampla defesa.

16.  Quebra de cadeia de custódia e seus efeitos

HABEAS CORPUS

A superveniência de sentença condenatória não tem o condão de prejudicar habeas corpus que analisa tese defensiva de que teria havido quebra da cadeia de custódia da prova, ocorrida ainda na fase inquisitorial e empregada como justa causa para a própria ação penal. (1) As irregularidades constantes da cadeia de custódia devem ser sopesadas pelo magistrado com todos os elementos produzidos na instrução, a fim de aferir se a prova é confiável.(2)

HC 653.515-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Rel. Acd. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por maioria, julgado em 23/11/2021. (Info 720)

16.1.                   Situação FÁTICA.

Sebastião foi preso em flagrante pelo crime de tráfico de drogas. A droga apreendida foi enviada para perícia que constatou a total inconformidade em seu envio, uma vez que não fora lacrado e enviado em sacola de supermercado utilizada para transporte de alimentos.

A defesa de Sebastião então requereu o relaxamento da prisão alegando a ilegalidade da prova de materialidade, ante a falta do lacre destacada na perícia. No entanto, o juiz deixou de relaxar a prisão por entender inexistente a ilegalidade. Inconformada, a defesa então impetrou Habeas Corpus alegando a quebra de cadeia de custódia e requerendo a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.

O STJ concedeu liminar para deferir a aplicação de medidas cautelares, mas antes mesmo que pudesse concluir o julgamento, veio a sentença condenatória de primeiro grau determinando a prisão de Sebastião.

16.2.                   Análise ESTRATÉGICA.

16.2.1. Questão JURÍDICA.

CPP:

Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte. 

Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas:     

I – reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial;     

II – isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime;     

III – fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento;     

IV – coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza;     

V – acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento;     

VI – transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;      

VII – recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu;     

VIII – processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;      

IX – armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente;     

X – descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial.     

Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de exames complementares.     

§ 1º Todos vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser tratados como descrito nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza criminal responsável por detalhar a forma do seu cumprimento.     

§ 2º É proibida a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer vestígios de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo tipificada como fraude processual a sua realização.  

16.2.2. A prolação de sentença condenatória prejudicou o Habeas Corpus?

R: Nooops!!!!

A superveniência de sentença condenatória NEM SEMPRE torna prejudicado o habeas corpus, em razão da perda do seu objeto. Como exemplo, no caso concreto, os fatos que subjazem à discussão trazida pela defesa acabaram por lastrear a denúncia e toda a persecução penal, além de haver sido ventilados ainda no limiar do processo e de dizer respeito à própria justa causa para a ação penal.

Ao contrário do que ocorre com a prisão preventiva, por exemplo – que tem natureza rebus sic standibus, isto é, que se caracteriza pelo dinamismo existente na situação de fato que justifica a medida constritiva, a qual deve submeter-se sempre a constante avaliação do magistrado -, o caso dos autos traz hipótese em que houve uma desconformidade entre o procedimento usado na coleta e no acondicionamento de determinadas substâncias supostamente apreendidas com o paciente e o modelo previsto no Código de Processo Penal, fenômeno processual, esse, produzido ainda na fase inquisitorial, que se tornou estático e não modificável e, mais do que isso, que subsidiou a própria comprovação da materialidade e da autoria delitivas.

Assim, a superveniência de sentença condenatória não tem o condão de prejudicar a análise da tese defensiva de que teria havido quebra da cadeia de custódia da prova, ocorrida ainda na fase inquisitorial e empregada como anteparo ao oferecimento da denúncia – ou, de forma mais ampla, como justa causa para a própria ação penal -, máxime quando verificado que a parte alegou a matéria oportuno tempore, isto é, logo após a sua produção e que essa tese já foi devidamente examinada e debatida pela instância de origem.

Quais as consequências processuais da quebra da cadeia de custódia da prova?

As irregularidades devem ser sopesadas com os demais elementos da instrução!!!!

A controvérsia que se estabelece diz respeito às consequências para o processo penal da quebra da cadeia de custódia da prova.

Segundo o disposto no art. 158-A do CPP, “Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte”.

É imperioso salientar que a autenticação de uma prova é um dos métodos que assegura ser o item apresentado aquilo que se afirma ele ser, denominado pela doutrina de princípio da mesmidade.

Com vistas a salvaguardar o potencial epistêmico do processo penal, a Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime) disciplinou – de maneira, aliás, extremamente minuciosa – uma série de providências que concretizam o desenvolvimento técnico-jurídico da cadeia de custódia.

De forma bastante sintética, pode-se afirmar que o art. 158-B do CPP detalha as diversas etapas de rastreamento do vestígio: reconhecimento, isolamento, fixação, coleta, acondicionamento, transporte, recebimento, processamento, armazenamento e descarte. O art. 158-C, por sua vez, estabelece o perito oficial como sujeito preferencial a realizar a coleta dos vestígios, bem como o lugar para onde devem ser encaminhados (central de custódia). Já o art. 158-D disciplina como os vestígios devem ser acondicionados, com a previsão de que todos os recipientes devem ser selados com lacres, com numeração individualizada, “de forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade do vestígio”.

Uma das mais relevantes controvérsias que essa alteração legislativa suscita diz respeito às consequências jurídicas, para o processo penal, da quebra da cadeia de custódia da prova (break on the chain of custody) ou do descumprimento formal de uma das exigências feitas pelo legislador no capítulo intitulado “Do exame de corpo de delito, da cadeia de custódia e das perícias em geral”: essa quebra acarreta a inadmissibilidade da prova e deve ela (e as dela decorrentes) ser excluída do processo? Seria caso de nulidade da prova? Em caso afirmativo, deve a defesa comprovar efetivo prejuízo, para que a nulidade seja reconhecida (à luz da máxima pas de nulitté sans grief)? Ou deve o juiz aferir se a prova é confiável de acordo com todos os elementos existentes nos autos, a fim de identificar se eles são capazes de demonstrar a sua autenticidade e a sua integridade?

Se é certo que, por um lado, o legislador trouxe, nos arts. 158-A a 158-F do CPP, determinações extremamente detalhadas de como se deve preservar a cadeia de custódia da prova, também é certo que, por outro, quedou-se silente em relação aos critérios objetivos para definir quando ocorre a quebra da cadeia de custódia e quais as consequências jurídicas, para o processo penal, dessa quebra ou do descumprimento de um desses dispositivos legais.

Respeitando aqueles que defendem a tese de que a violação da cadeia de custódia implica, de plano e por si só, a inadmissibilidade ou a nulidade da prova, de modo a atrair as regras de exclusão da prova ilícita, parece ser mais adequada aquela posição que sustenta que as irregularidades constantes da cadeia de custódia devem ser sopesadas pelo magistrado com todos os elementos produzidos na instrução, a fim de aferir se a prova é confiável. Assim, à míngua de outras provas capazes de dar sustentação à acusação, deve a pretensão ser julgada improcedente, por insuficiência probatória, e o réu ser absolvido.

16.2.3. Resultado final.

A superveniência de sentença condenatória não tem o condão de prejudicar habeas corpus que analisa tese defensiva de que teria havido quebra da cadeia de custódia da prova, ocorrida ainda na fase inquisitorial e empregada como justa causa para a própria ação penal. (1) As irregularidades constantes da cadeia de custódia devem ser sopesadas pelo magistrado com todos os elementos produzidos na instrução, a fim de aferir se a prova é confiável. (2).

Jean Vilbert

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