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Sumário
1. Copropriedade anterior à sucessão e direito real de habitação.. 3
2. Securitização de créditos condominais, FIDCs, cessão de créditos e subrogação.. 4
4. Exclusão de ex-empregado de plano de saúde empresarial 8
5. Obrigatoriedade de guarda e fornecimento de informações pessoais pelos provedores de internet. 11
6. Pedido de resolução de contrato e quebra antecipada de contrato em alienação fiduciária. 14
8. (Des)Necessidade de ação autônoma para prestação de contas em ação de busca e apreensão.. 20
11. (Im)Possibilidade de reconvenção da reconvenção.. 27
12. Ação de prestação de contas e CPC/1973. 29
13. Termo inicial da contagem de juros de mora quando da pluralidade de réus. 32
15. Recuperação Judicial e competência. 37
16. Prisão preventiva e obrigatoriedade de revisão nonagesimal 40
PARA TESTAR SEU CONHECIMENTO… 42
17.1. Questões objetivas: CERTO ou ERRADO. 42
EMBARGOS EM RECURSO ESPECIAL
A copropriedade anterior à abertura da sucessão impede o reconhecimento do direito real de habitação
EREsp 1.520.294-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 26/08/2020, DJe 02/09/2020
Joselito e Josefa contraíram matrimônio em 20 de outubro de 2007. Cleiton já era proprietário de imóvel que havia adquirido conjuntamente com seu filho em abril de 2000.
Após o óbito de Joselito, Josefa ajuizou ação na qual pretende reconhecer o direito real de habitação como cônjuge supérstite. A questão chegou até o STJ que, em recurso especial, entendeu que: “na hipótese de copropriedade anterior ao óbito – que difere daquela adquirida com o falecimento do proprietário – não se pode falar em direito real de habitação ao cônjuge supérstite.”
Inconformada, Josefa interpôs embargos de divergência onde alegou divergência jurisprudencial.
R: NÃO.
O direito real de habitação possui como finalidade precípua garantir o direito à moradia ao cônjuge/companheiro supérstite, preservando o imóvel que era destinado à residência da família, QUALQUER que fosse o regime de bens adotado.
Trata-se de instituto intrinsecamente ligado à sucessão, razão pela qual os direitos de propriedade originados da transmissão da herança sofrem mitigação temporária em prol da manutenção da posse exercida pelos membros do casal.
Hipóteses distintas e que não podem ser objeto de interpretação extensiva, visto que o direito real de habitação já é oriundo de EXCEÇÃO imposta pelo legislador, são aquelas referentes à existência de copropriedade anterior com terceiros do imóvel vindicado, visto que estranhos à relação sucessória que ampararia o direito em debate.
Como pontuado pela Ministra Nancy Andrighi, relatora do REsp 1.184.492/SE, a causa do direito real de habitação é tão somente “a solidariedade interna do grupo familiar que prevê recíprocas relações de ajuda“. Entendimento diverso possibilitaria, inclusive, a instituição de direito real de habitação sobre imóvel de propriedade de terceiros estranhos à sucessão, o que contraria a mens legis acima exposta.
A copropriedade anterior à abertura da sucessão impede o reconhecimento do direito real de habitação.
RECURSO ESPECIAL
Na atividade de securitização de créditos condominiais, os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) valem-se do instituto da cessão de créditos e, ao efetuarem o pagamento das cotas condominiais inadimplidas, sub-rogam-se na mesma posição do condomínio cedente, com todas as prerrogativas legais a ele conferidas.
REsp 1.570.452-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020
Em ação de cobrança de cotas condominiais proposta por Condomínio Edifício Linda contra o Espólio de Cleide, o réu foi condenado a pagar o débito. Ocorre que o débito foi cedido, em fase de execução, à G5 Precatórios Ltda, que requereu a penhora do imóvel e prosseguimento da execução.
O juízo de primeiro grau determinou que a cessionária dos créditos, G5 Precatórios Ltda, promovesse a habilitação do crédito que lhe foi cedido no respectivo inventário.
No julgamento do subsequente agravo de instrumento, a decisão agravada foi integralmente confirmada, fato que levou a G5 a interpor recurso especial no qual sustentou que a cessão de crédito opera a transmissão da obrigação sem que ocorra a extinção ou modificação de sua natureza e conteúdo e ainda que o cessionário pode prosseguir com a execução iniciada pelo cedente sem que tenha que levar o crédito à habilitação em concurso de credores.
Cinge-se a discussão à definição da natureza do crédito na hipótese de cessão.
Código Civil:
Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
Art. 287. Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios
Lei n. 11.101/2005:
Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:
§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.
R: NÃO.
O Tribunal de origem entendeu que, com a cessão de crédito, o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) passou a ser um credor comum, devendo habilitar seu crédito no inventário para recebimento dos respectivos valores. O recorrente defende que a natureza do crédito não se altera com a cessão, devendo, assim, o cessionário prosseguir na execução já iniciada.
Analisando questão distinta, mas que também perpassa pela interpretação dos arts. 286 e 287 do Código Civil, o STJ já decidiu que “(…) não se transmitem ao cessionário (…) os direitos acessórios indissociáveis da pessoa do cedente, decorrentes de sua condição personalíssima, salvo, naturalmente, se o cessionário detiver a mesma condição pessoal do cedente”.
Contudo, o Supremo Tribunal Federal, após reconhecer a existência de repercussão geral da matéria atinente à “transmudação da natureza de precatório alimentar em normal em virtude de cessão do direito nele estampado” (Tema n. 361/STF), decidiu que a cessão de crédito NÃO implica a alteração da sua natureza.
Semelhante situação ocorre no caso analisado, haja vista que a transmutação da natureza do crédito cedido viria em prejuízo dos próprios condomínios, que se valem da cessão de seus créditos como meio de obtenção de recursos financeiros necessários ao custeio das despesas de conservação da coisa, desonerando, assim, os demais condôminos que mantêm as suas obrigações em dia.
Ressalta-se, por último, que, quando o legislador pretende modificar a natureza do crédito cedido, ele assim o faz EXPRESSAMENTE, a exemplo da disposição contida no § 4º do art. 83 da Lei n. 11.101/2005, segundo o qual “Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.”
Na atividade de securitização de créditos condominiais, os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) valem-se do instituto da cessão de créditos e, ao efetuarem o pagamento das cotas condominiais inadimplidas, sub-rogam-se na mesma posição do condomínio cedente, com todas as prerrogativas legais a ele conferidas.
RECURSO ESPECIAL
É válida hipoteca firmada na vigência do CC/2002 exclusivamente por cônjuge casado sob o regime da separação total de bens na vigência do CC/1916.
REsp 1.797.027-PB, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/09/2020, DJe 18/09/2020
Adriele ajuizou ação de nulidade de garantia hipotecária em face de Banco do Nordeste. A sentença julgou procedente o pedido, para declarar a nulidade da hipoteca do imóvel dado em garantia pelos cônjuges das recorridas por ocasião da celebração de contrato de cédula de crédito industrial com o recorrente.
Em acórdão, o Tribunal de Justiça local entendeu pela desnecessidade de consentimento do cônjuge e consequente validade da hipoteca realizada. No entanto, o mesmo tribunal acolheu os embargos declaratórios de Adriele e com efeito infringente, reformou o acórdão que havia dado provimento à apelação do recorrente, mantendo-se, pois, a sentença de procedência do pedido de nulidade da hipoteca.
Inconformado, Banco do Nordeste interpôs recurso especial no qual fundamentou que o contrato que deu origem à hipoteca foi celebrado pelos cônjuges das recorridas na vigência do CC/2002, que dispensa a autorização conjugal na hipótese, razão pela qual seria irrelevante que os casamentos das recorridas com os contratantes tenham sido celebrados, sob o regime de separação total de bens, na vigência do CC/1916.
Código Civil de 1916:
Art. 235. O marido não pode, sem consentimento da mulher, qualquer que seja o regime de bens:
I. Alienar, hipotecar ou gravar de onus real os bens imóveis, ou seus direitos reais sobre imóveis alheio
Código Civil 2002:
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
Art. 2.039. O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n o 3.071, de 1 o de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido.
R: SIM.
Conceitualmente, o art. 2.039 do CC/2002, ao estabelecer uma regra de transição quanto ao regime de bens, teve por finalidade específica disciplinar as relações familiares entre os cônjuges na perspectiva patrimonial, ditando o modo pelo qual se dará, por exemplo, a partilha de seus bens por ocasião da dissolução do vínculo conjugal, bem como a possibilidade de alteração motivada e judicial do regime de bens posteriormente consagrada pela jurisprudência desta Corte.
Dessa forma, a referida regra de direito transitório não deve influenciar, na perspectiva da definição da legislação aplicável, as hipóteses em que deveria ser dada a autorização conjugal, pois esse instituto, a despeito de se relacionar com o regime de bens, é, na realidade, uma condição de eficácia do negócio jurídico cuja validade se examina.
Assim, em se tratando de casamento celebrado na vigência do CC/1916 sob o regime da separação convencional de bens, somente aos negócios jurídicos celebrados na vigência da legislação revogada é que se poderá aplicar a regra do art. 235, I, do CC/1916, que previa a necessidade de autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca, independentemente do regime de bens.
Contudo, aos negócios jurídicos celebrados após a entrada em vigor do CC/2002, deverá ser aplicada a regra do art. 1.647, I, do CC/2002, que prevê a dispensa de autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca quando o regime de bens for o da separação absoluta, ainda que se trate de casamento celebrado na vigência da legislação civil revogada.
É válida hipoteca firmada na vigência do CC/2002 exclusivamente por cônjuge casado sob o regime da separação total de bens na vigência do CC/1916.
RECURSO ESPECIAL
Ex-empregado mantido no plano de saúde por mais de dez anos após a demissão, por liberalidade do ex-empregador e com assunção de custeio integral do serviço, não poderá ser excluído da cobertura do seguro.
REsp 1.879.503-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/09/2020, DJe 18/09/2020
Jaime, ex-empregado da empresa Unipar, ajuizou ação de obrigação de fazer e indenizatória em face de sua ex-empregadora e de Brasa Saúde, pretendendo o restabelecimento de seu plano de saúde, ao qual se manteve vinculado, juntamente com sua esposa, por mais de 10 anos após o rompimento do vínculo empregatício.
O Juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, determinando que os réus forneçam, à parte autora, a possibilidade de migração para o plano individual, observando-se as mesmas condições existentes no plano de saúde coletivo unilateralmente rescindido, desprovido de qualquer carência.
A questão chegou ao STJ por meio de recurso especial das rés. A Unipar alega a violação do art. 30, §1º da Lei 9.656 de 1998, ao determinar que Jaime fique eternamente vinculado ao plano da empregadora, muito além do prazo máximo de 24 (vinte e quatro) meses estabelecido no referido dispositivo.
Por sua vez, Brasa Saúde sustenta que: “tendo em vista que o art. 3º da Resolução [Consu 19/1999] prevê a disponibilização de planos individual ou familiar somente para as operadoras que mantenham esse tipo de plano e, considerando que a seguradora demandada não comercializa mais esse tipo de seguro, devidamente autorizada pela ANS, não há que se falar em obrigar a seguradora a disponibilizar um produto que não mais comercializa”.
Cinge-se a controvérsia a definir a obrigação de o ex-empregador em manter, com base na proteção da confiança, o plano de saúde oferecido ao ex-empregado, transcorridos mais de 10 anos do rompimento do vínculo empregatício.
Código Civil:
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Lei n. 9.656/1998:
Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.
§ 1o O período de manutenção da condição de beneficiário a que se refere o caput será de um terço do tempo de permanência nos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o, ou sucessores, com um mínimo assegurado de seis meses e um máximo de vinte e quatro meses.
R: SIM.
Não se nega que o art. 30, § 1º, da Lei n. 9.656/1998 permite que o ex-empregado demitido e seu grupo familiar se mantenham no plano de saúde coletivo empresarial, após o rompimento do vínculo empregatício, pelo período de um terço do tempo de permanência como beneficiários, com um mínimo assegurado de seis meses e um máximo de vinte e quatro meses.
Há, no entanto, uma circunstância relevante na hipótese, o empregado e sua esposa permaneceram, depois da demissão do primeiro, vinculados ao mesmo plano, nas mesmas condições, por mais dez anos, tendo, apenas, assumido o custeio integral do serviço, circunstância que, segundo o Tribunal de origem, é apta “a despertar no autor a confiança legítima na manutenção vitalícia do benefício“. O desate da controvérsia exige, portanto, a análise desse cenário à luz da chamada responsabilidade pela CONFIANÇA.
CONFIANÇA, a propósito, é, na lição doutrinária, “a face subjetiva do princípio da boa-fé”; “é a legítima expectativa que resulta de uma relação jurídica fundada na boa-fé”; e, por isso, segundo a doutrina, “frustração é o sentimento que ocupa o lugar de uma expectativa não satisfeita”.
A responsabilidade pela confiança constitui, portanto, uma das vertentes da boa-fé objetiva, enquanto princípio limitador do exercício dos direitos subjetivos, e coíbe o exercício abusivo do direito, o qual, no particular, se revela como uma espécie de não-exercício abusivo do direito, de que é exemplo a supressio.
A supressio, por usa vez, indica a possibilidade de se considerar suprimida determinada obrigação contratual na hipótese em que o não exercício do direito correspondente, pelo credor, gerar no devedor a legítima expectativa de que esse não exercício se prorrogará no tempo.
Implica, assim, a redução do conteúdo obrigacional pela inércia qualificada de uma das partes, ao longo da execução do contrato, em exercer determinado direito ou faculdade, criando para a outra a percepção válida e plausível – a ser apurada casuisticamente – de ter havido a renúncia àquela prerrogativa.
Convém ressaltar, nessa toada, que o abuso do direito – aqui caracterizado pela supressio – é qualificado pelo legislador como espécie de ato ilícito (art. 187 do CC/2002), no qual, em verdade, não há desrespeito à regra de comportamento extraída da lei, mas à sua valoração; o agente atua conforme a legalidade estrita, mas ofende o elemento teleológico que a sustenta, descurando do dever ético que confere a adequação de sua conduta ao ordenamento jurídico.
Sob essa ótica, verifica-se que o ex-empregado e sua esposa se mantiveram vinculados ao contrato de plano de saúde por 10 anos, superando – e muito – o prazo legal que autorizava a sua exclusão, o que, evidentemente, despertou naqueles a justa expectativa de que não perderiam o benefício oferecido pelo ex-empregador.
E, de fato, o exercício reiterado dessa liberalidade, consolidado pelo decurso prolongado do tempo, é circunstância apta a criar a confiança na renúncia do direito de excluir o ex-empregado e seu grupo familiar do contrato de plano de saúde, de tal modo que, esse exercício agora, quando já passados 10 anos, e quando os beneficiários já contavam com idade avançada, gera uma situação de desequilíbrio inadmissível entre as partes, que se traduz no indesejado sentimento de frustação. Diante desse panorama, o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a exclusão do ex-empregado e sua esposa do plano de saúde coletivo empresarial.
Ex-empregado mantido no plano de saúde por mais de dez anos após a demissão, por liberalidade do ex-empregador e com assunção de custeio integral do serviço, não poderá ser excluído da cobertura do seguro.
RECURSO ESPECIAL
Os provedores de aplicações de internet não são obrigados a guardar e fornecer dados pessoais dos usuários, sendo suficiente a apresentação dos registros de número IP.
REsp 1.829.821-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/08/2020, DJe 31/08/2020
Claudiomiro ajuizou ação de obrigação de fazer em face de Brasil Online Ltda em que pleiteava o fornecimento dos dados pessoais dos titulares de algumas contas do serviço de e-mail mantido pela provedora.
O Juízo de 1º grau julgou procedente a demanda, condenando a ré a fornecer os dados pessoais (RG, CPF, endereço e nome) da proprietária de certa conta de e-mail. O Tribunal de Justiça local manteve a sentença.
Inconformada, a provedora interpôs recurso especial no qual sustentou a violação aos artigos 5°, 6° e 10 do Marco Civil da Internet (Lei n°12.965/2012).
Lei nº 12.965/2014:
Art. 3º A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios:
IV – preservação e garantia da neutralidade de rede;
Decreto n. 8.771/2016:
Art. 13. Os provedores de conexão e de aplicações devem, na guarda, armazenamento e tratamento de dados pessoais e comunicações privadas, observar as seguintes diretrizes sobre padrões de segurança:
§ 2º Tendo em vista o disposto nos incisos VII a X do caput do art. 7º da Lei nº 12.965, de 2014 , os provedores de conexão e aplicações devem reter a menor quantidade possível de dados pessoais, comunicações privadas e registros de conexão e acesso a aplicações, os quais deverão ser excluídos:
Constituição Federal de 1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
R: NÃO.
Inicialmente cumpre salientar que de acordo com os precedentes deste STJ, não se pode considerar de risco a atividade desenvolvida pelos provedores de conteúdo e sequer é possível exigir a fiscalização prévia das informações disponibilizadas em aplicações de internet.
Por outro lado, o STJ exige que o provedor tenha o cuidado de propiciar meios para que se possa identificar cada um desses usuários, coibindo o anonimato e atribuindo a cada manifestação uma autoria certa e determinada.
Portanto, espera-se que o provedor adote providências que, conforme as circunstâncias específicas de cada caso, estiverem ao seu alcance para permitir a identificação dos usuários de determinada aplicação de internet.
Ainda que não exija os dados pessoais dos seus usuários, o provedor de conteúdo, que registra o número de protocolo na internet (IP) dos computadores utilizados para o cadastramento de cada conta, mantém um meio razoavelmente eficiente de rastreamento dos seus usuários, medida de segurança que corresponde à diligência média esperada dessa modalidade de provedor de serviço de internet.
A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é consolidada no sentido de – para adimplir sua obrigação de identificar usuários que eventualmente publiquem conteúdos considerados ofensivos por terceiros – é suficiente o fornecimento do número IP correspondente à publicação ofensiva indicada pela parte.
Os endereços IPs, ressalte-se, são essenciais na arquitetura da internet, que permite a bilhões de pessoas e dispositivos se conectarem à rede, permitindo que trocas de volumes gigantescos de dados sejam operadas com sucesso. Assim, quando se trata de investigações civis ou criminais que necessitam identificar a autoria de ilícitos ocorridos na Internet, trata-se de informação essencial, a fim de permitir localizar o terminal e, por consequência, a pessoal que o utilizava para a realização de ilícitos. Por isso, determinou-se um dever de guarda e armazenamento de um conjunto de informações utilizadas pelos usuários na internet, entre eles, o número IP.
No Marco Civil da Internet, há duas categorias de dados que devem ser obrigatoriamente armazenados: os registros de conexão e os registros de acesso à aplicação. A previsão legal para guarda desses dados objetiva facilitar a identificação de usuários da internet pelas autoridades competentes e mediante ordem judicial, porque a responsabilização dos usuários é um dos princípios do uso da internet no Brasil, conforme o art. 3º, VI, da mencionada lei. Essa distinção entre as duas categorias de agentes, provedores de conexão e de aplicação, visa garantir a privacidade e a proteção da vida privada dos cidadãos usuários da Internet. Diminui-se, assim, a quantidade de dados pessoais que cada um dos atores da internet possui, como forma de prevenção ao abuso da posse dessas informações.
No art. 13, § 2º, do Decreto n. 8.771/2016 também fica estabelecido que os provedores de aplicações de internet “devem reter a menor quantidade possível de dados pessoais”, o que reforça a inexigibilidade jurídica do armazenamento e fornecimento de dados que não sejam os registros de acesso, expressamente apontados pelo Marco Civil da Internet como os únicos que os provedores de aplicações devem guardar e, eventualmente, fornecer em juízo.
É certo que a limitação dos dados a serem obrigatoriamente guardados pelos provedores de aplicações de internet tem uma razão de ser, que é a tutela jurídica da intimidade e da privacidade, consagrada no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, foi expressamente encampada pelo Marco Civil da Internet, que assegura como direitos dos usuários da rede a proteção à privacidade.
Os provedores de aplicações de internet não são obrigados a guardar e fornecer dados pessoais dos usuários, sendo suficiente a apresentação dos registros de número IP.
RECURSO ESPECIAL
Configura quebra antecipada do contrato (antecipatory breach) o pedido de resolução do contrato de compra e venda com pacto de alienação fiduciária em garantia por desinteresse do adquirente, mesmo que ainda não tenha havido mora no pagamento das prestações.
REsp 1.867.209-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/09/2020, DJe 30/09/2020
Adão adquiriu um imóvel em novembro de 2011 da Imobiliária Assis, a ser pago em 120 parcelas mensais. Em 2016, Adão, então adimplente, ajuizou ação de resolução de contrato com pedido de devolução dos valores pagos na qual sustentou que havia pago 60 parcelas, porém sua situação financeira teria se alterado com o tempo e não poderia mais honrar os pagamentos.
O Juízo de primeiro grau julgou improcedentes os pedidos do autor. Em apelação, o Tribunal de Justiça local deu parcial provimento para determinar a resolução do contrato mediante retenção de 20% das quantias pagas em favor da Imobiliária.
Inconformada, a Imobiliária interpôs recurso especial no qual sustentou que o contrato firmado estaria garantido fiduciariamente, devendo prevalecer as normas específicas previstas para tanto, e não o Código de Defesa do Consumidor.
Lei n. 9.514/1997:
Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.
§ 1o Se no primeiro leilão público o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI e do parágrafo único do art. 24 desta Lei, será realizado o segundo leilão nos quinze dias seguintes.
§ 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais.
§ 4º Nos cinco dias que se seguirem à venda do imóvel no leilão, o credor entregará ao devedor a importância que sobejar, considerando-se nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias, depois de deduzidos os valores da dívida e das despesas e encargos de que tratam os §§ 2º e 3º, fato esse que importará em recíproca quitação, não se aplicando o disposto na parte final do art. 516 do Código Civil.
Código de Defesa do Consumidor:
Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.
R: SIM.
O procedimento disciplinado nos arts. 26 e 27 da Lei n. 9.514/1997 trata, do inadimplemento do adquirente (devedor fiduciante).
O inadimplemento é pressuposto para a consolidação da propriedade na pessoa do credor fiduciário e para submissão do bem à venda mediante leilão.
O inadimplemento aqui NÃO pode ser interpretado restritivamente ao mero inadimplemento das prestações, ou, em outras palavras, à não realização do pagamento no tempo, modo e lugar convencionados (mora). Deve ele ser entendido, também, como o comportamento que se mostra contrário à manutenção do contrato ou ao direito do credor fiduciário, aí incluindo-se a pretensão declarada do adquirente de resolver o negócio que se vê respaldado pela alienação fiduciária em garantia, postulando ao Judiciário a suspensão da exigibilidade das prestações a que vinculado.
A figura bem se compatibiliza com o instituto da QUEBRA ANTECIPADA (ou antecipatory breach na common law), segundo o qual há inadimplemento, mesmo antes do vencimento, quando o devedor pratica atos abertamente contrários ao cumprimento do contrato, como a pretensão de resolução da avença.
No contrato de compra e venda celebrado, em que presente alienação fiduciária em garantia, há de ser acatada a possibilidade de resolução do contrato pelo desinteresse do adquirente em permanecer com o bem, mas a devolução dos valores pagos pelo autor não se dará na forma do art. 53 do CDC, em que, ressarcidas as despesas do vendedor mediante a retenção de parte do pagamento, devolve-se o restante ao adquirente.
A devolução dos valores pagos deverá observar o procedimento estabelecido nos arts. 26 e 27 da Lei n. 9.514/1997, pelo qual, resolvido o contrato de compra e venda, consolida-se a propriedade na pessoa do credor fiduciário, para, então, submeter-se o bem a leilão, na forma dos §§1º e 2º do art. 27, satisfazendo-se o débito do devedor demandante ainda inadimplido e solvendo-se as demais dívidas relativas ao imóvel, para devolver-se o que sobejar ao adquirente, se sobejar.
Assim, a formulação pelo adquirente de pedido de resolução do contrato de compra e venda com pacto de alienação fiduciária em garantia sem a imputação de culpa ao vendedor, mas por conveniência do adquirente, representa quebra antecipada do contrato e, assim, satisfaz o requisito para a incidência dos arts. 26 e 27 da Lei n. 9.514/1997.
Resolvido o contrato, a devolução dos valores adimplidos pelo adquirente deverá observar o quanto disposto no §4º do art. 27 da Lei n. 9.514/1997, segundo o qual, uma vez exitoso o 1º ou o 2º leilão, “o credor entregará ao devedor a importância que sobejar, considerando-se nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias, depois de deduzidos os valores da dívida e das despesas e encargos de que tratam os §§ 2º e 3º, fato esse que importará em recíproca quitação (…)”.
Configura quebra antecipada do contrato (antecipatory breach) o pedido de resolução do contrato de compra e venda com pacto de alienação fiduciária em garantia por desinteresse do adquirente, mesmo que ainda não tenha havido mora no pagamento das prestações.
RECURSO ESPECIAL
Não é possível o reconhecimento de ofício do direito ao recebimento de indenização por benfeitorias úteis ou necessárias em ação possessória.
REsp 1.836.846-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020
A Companhia de Habitação Popular ajuizou ação de resolução de contrato c/c reintegração de posse com pedido de antecipação de tutela c/c indenização por danos materiais em face de Aparecida. Alegou que firmou, segundo as normas do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), “Contrato de Compromisso de Compra e Venda de Bem Imóvel” com a ré, a qual se comprometeu a pagar 120 prestações mensais.
Ocorre que Aparecida se tornou inadimplente a partir da 5ª prestação do contrato e não realizou nenhuma ação para quitar as prestações vencidas, não obstante a existência de notificação extrajudicial em novembro de 2014. Ainda, alegou que, nos termos do contrato, o inadimplemento das prestações nos prazos e valores acordados resulta na resolução do negócio jurídico.
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para resolver o contrato e reintegrar a Companhia a posse do imóvel, porém também reconheceu (de ofício) o direito da ré ao recebimento de indenização das benfeitorias, não obstante a ausência de pedido, cujo valor seria apurado em liquidação de sentença, na modalidade arbitramento.
O acórdão deu parcial provimento ao recurso da autora para determinar que somente deveriam ser indenizadas as benfeitorias necessárias. Inconformada, a Companhia interpôs recurso especial no qual sustentou a ocorrência de julgamento fora dos limites do pedido, ao reconhecer a existência de indenização (pela realização de benfeitorias) em benefício da recorrida que não foi pleiteada nos autos.
Código Civil:
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
Código de Processo Civil 2015:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: I – assegurar às partes igualdade de tratamento;
Art. 141. O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.
Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
R: SIM.
Inicialmente, é imperioso ressaltar que os arts. 1.219 e 1.220 do Código Civil versam sobre o direito à indenização das benfeitorias, bem como de eventual exercício do direito de retenção.
A legislação dispõe que o possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como tem a faculdade de levantar as benfeitorias voluptuárias se não lhe forem pagas, desde que o faça sem deteriorar a coisa. A configuração da boa-fé ainda permite o exercício do direito de retenção pelo valor das benfeitorias úteis ou necessárias.
R: NÃO. Houve julgamento extra petita.
Os arts. 141 e 492 do CPC/2015 se reportam ao princípio dispositivo (ou da CONGRUÊNCIA ou da ADSTRIÇÃO), segundo o qual o juiz irá julgar o mérito da ação nos limites propostos, sendo proibido conhecer de questões não alegadas a cujo respeito a legislação exigir iniciativa da parte.
Ademais, o referido princípio se encontra umbilicalmente ligado ao dever de tratamento isonômico das partes pelo juiz (art. 139, I, do CPC/2015), de maneira que esse não pode agir de ofício para sanar ou corrigir eventual omissão de qualquer das partes na prática de ato processual de incumbência exclusiva.
NÃO é possível, na hipótese, afastar a ocorrência de julgamento extra petita (fora do pedido) da indenização por benfeitorias ainda que por meio de interpretação lógica e sistemática, pois, não houve apresentação de contestação (em razão de revelia), bem como não ocorreu a formulação de pedido posterior nesse sentido.
Apesar do entendimento de que a indenização por benfeitorias passou a ser consequência lógica da resolução do contrato de compra e venda, a formulação de pedido não restou afastada. Esta Corte Superior, ao julgar o REsp 764.529/RS (3ª Turma, DJe 09/11/2010), apenas afastou o instituto da preclusão, de modo a possibilitar a formulação de pedido após a contestação. A jurisprudência do STJ, portanto, não excepciona a formulação de pedido referente à indenização das benfeitorias, somente o momento do requerimento e a forma como esse é realizado.
Por fim, o entendimento da ocorrência de julgamento extra petita não afasta o direito de pleitear indenização por eventuais realizações de benfeitorias, pois o prazo prescricional da referida pretensão indenizatória apenas tem início com o trânsito em julgado da ação de rescisão do contrato de compra e venda do imóvel (AgRg no AREsp 726.491/MS, 3ª Turma, DJe 09/11/2016).
Não é possível o reconhecimento de ofício do direito ao recebimento de indenização por benfeitorias úteis ou necessárias em ação possessória.
RECURSO ESPECIAL
Há necessidade de ajuizamento de ação autônoma para pleitear a prestação de contas relativa à venda extrajudicial em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente.
REsp 1.866.230-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020
Cobrobem S.A. ajuizou ação de busca e apreensão de veículo alienado fiduciariamente em desfavor de Mariana. A sentença julgou procedente o pedido, para declarar rescindido o contrato e para consolidar nas mãos do recorrido o domínio e a posse plenos e exclusivos do bem.
Mariana interpôs embargos de declaração, os quais foram acolhidos para determinar que: “poderá o réu oportunamente, se o caso, forte no art. 2º, caput, in fine, do Decreto Lei 911/69, propor ação de prestação de contas autônoma em desfavor do autor (…)”.
O Tribunal de Justiça local negou provimento à apelação de Mariana por entender a impossibilidade de a autora exigir prestação de contas no mesmo processo diante do pedido e procedimento específicos para tal finalidade.
Inconformada, Mariana interpôs então recurso especial no qual sustenta a possibilidade da efetivação da prestação de contas nos próprios autos da ação de busca e apreensão, não havendo necessidade de ajuizamento de ação autônoma para tanto. Alegou ainda que a exigência de ajuizamento de ação autônoma de prestação de contas viola os princípios da legalidade, da economia processual e da razoável duração do processo e que tal prestação de contas seria direito do devedor fiduciante.
Decreto Lei n. 911/1969:
Art. 2o No caso de inadimplemento ou mora nas obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, o proprietário fiduciário ou credor poderá vender a coisa a terceiros, independentemente de leilão, hasta pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, salvo disposição expressa em contrário prevista no contrato, devendo aplicar o preço da venda no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao devedor o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas
Art. 3o O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2o do art. 2o, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário
§ 8o A busca e apreensão prevista no presente artigo constitui processo autônomo e independente de qualquer procedimento posterior.
Saca só! Nas hipóteses de inadimplemento ou mora nas obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária, caso o credor opte pelo ajuizamento da ação de busca e apreensão, tem-se que, uma vez apreendido o bem, promover-se-á a sua venda extrajudicial, nos moldes do que dispõe o art. 2º do Decreto Lei n. 911/1969.
Efetivada a venda, apura-se o saldo entre o produto da venda e o montante da dívida e encargos, procedendo-se a prestação de contas ao devedor; havendo sobra, o credor deverá entregá-la ao devedor ou, ao contrário, remanescendo saldo devedor, o devedor continua responsável pelo pagamento.
R: SIM.
As questões concernentes à venda extrajudicial do bem, imputação do valor alcançado no pagamento do débito e apuração acerca de eventual saldo remanescente em favor do devedor NÃO podem ser discutidas, incidentalmente, no bojo da ação de busca e apreensão que, como se sabe, visa tão somente à consolidação da propriedade do bem no patrimônio do credor fiduciário.
Por fim, vale frisar que o art. 3º, § 8º do Decreto-Lei n. 911/1969 expressamente define que a busca e apreensão constitui processo autônomo e independente de qualquer procedimento posterior, e que a obrigatoriedade da prestação de contas foi inovação trazida pela Lei n. 13.043/2014 a qual, não obstante não fosse expressa anteriormente à sua edição, já era reconhecida como de interesse do devedor fiduciante quando da venda extrajudicial do bem.
Há necessidade de ajuizamento de ação autônoma para pleitear a prestação de contas relativa à venda extrajudicial em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente.
RECURSO ESPECIAL
É aplicável ao INSS a multa prevista no art. 334, § 8°, do CPC/2015, quando a parte autora manifestar interesse na realização da audiência de conciliação e a autarquia não comparecer no feito, mesmo que tenha manifestando seu desinteresse previamente.
REsp 1.769.949-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 08/09/2020, DJe 02/10/2020
Genésio ajuizou ação em face do INSS com pedido de tutela de urgência. Em 10.10.2016 o juízo de primeiro grau proferiu decisão deferindo o pedido de tutela de urgência requerido e designou a realização de audiência de conciliação para 30.11.2016.
Intimado desta decisão em 26.10.2016, o INSS manifestou seu desinteresse na realização da referida audiência dentro do prazo previsto pelo artigo 334, § 5° do CPC. Ocorre que a parte autora manifestou interesse na audiência de conciliação.
Ante a ausência do representante da autarquia, o juízo aplicou a multa por considerar ato atentatório à dignidade da Justiça e sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.
Inconformada, a autarquia interpôs agravo de instrumento, ao qual foi negado provimento pelo Tribunal Regional Federal. Da decisão, houve interposição de recurso especial no qual defendeu a inaplicabilidade da multa, vez que o não comparecimento na audiência foi justificado, apresentado manifestação anteriormente informando ausência de interesse na audiência.
Código de Processo Civil 2015:
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;
Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência
§ 4º A audiência não será realizada:
I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;
II – quando não se admitir a autocomposição.
§ 8º O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.
CPC 1973:
Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
IV – tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes
R: SIM.
A nova legislação processual civil instrumentaliza a denominada Justiça Multiportas, incentivando a solução consensual dos conflitos, especialmente por meio das modalidades de conciliação e mediação.
Em seus artigos iniciais, o Código de Processo Civil prescreve que o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos (art. 3º, § 2° do CPC/2015), recomendando que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução harmoniosa de conflitos sejam estimulados por Juízes, Advogados, Defensores Públicos e Membros do Ministério Público (art. 3°, § 3° do CPC/2015), inclusive no curso do processo judicial (art. 139, V do CPC/2015).
Reafirmando esse escopo, o CPC/2015, em seu art. 334, estabelece a OBRIGATORIEDADE da realização de audiência de conciliação ou de mediação após a citação do réu. Excepcionando a sua realização, tão somente, na hipótese de o direito controvertido não admitir autocomposição ou na hipótese de ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual (art. 334, § 4° do CPC/2015).
O caráter obrigatório da realização dessa audiência de conciliação é a grande mudança da nova Lei Processual Civil, mas o INSS, contudo, intenta repristinar a regra de 1994, que estabelecia ser optativa a audiência de conciliação (art. 125, IV do CPC/1973 com redação dada pela Lei n. 8.952/1994), retirando o efeito programado e esperado pela legislação processual civil adveniente.
No caso analisado, o INSS manifestou desinteresse na realização da audiência, contudo, a parte autora manifestou o seu interesse, o que torna obrigatória a realização da audiência de conciliação, com a indispensável presença das partes.
Assim, não comparecendo o INSS à audiência de conciliação, inevitável a aplicação da multa prevista no art. 334, § 8° do CPC/2015, que estabelece que o não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da Justiça e será sancionado com multa de até 2% da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado. Qualquer interpretação passadista desse dispositivo será um retrocesso na evolução do Direito pela via jurisdicional e um desserviço à Justiça.
É aplicável ao INSS a multa prevista no art. 334, § 8°, do CPC/2015, quando a parte autora manifestar interesse na realização da audiência de conciliação e a autarquia não comparecer no feito, mesmo que tenha manifestando seu desinteresse previamente.
RECURSO ESPECIAL
É desnecessária a inclusão dos parentes colaterais do de cujus no polo passivo da ação de reconhecimento e dissolução de união estável post mortem.
REsp 1.759.652-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/09/2020, DJe 25/09/2020
Bernadete ajuizou da ação de reconhecimento e dissolução de união estável post mortem em face de Bruno. O Juízo de primeiro grau determinou a emenda da petição inicial para a inclusão de litisconsortes necessários (parentes colaterais do falecido).
Por discordar da decisão interlocutória, Bernadete interpôs agravo de instrumento, ao qual foi negado provimento pelo Tribunal de Justiça local.
Inconformada, a autora interpôs então recurso especial no qual sustentou a desnecessidade de inclusão dos herdeiros colaterais na presente demanda de reconhecimento e dissolução de união estável sob os seguintes fundamentos: a)os herdeiros colaterais não concorrem na herança em razão da flagrante inconstitucionalidade do art. 1.790, do Código Civil; b) os herdeiros colaterais não possuem interesse direto na formação do convencimento do juízo quanto à existência da união estável invocada; c) a legitimidade dos herdeiros colaterais deve ser discutida nos autos do inventário.
Código Civil:
Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
R: NÃO.
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar os Recursos Extraordinários 646.721/RS e 878.694/MG, ambos com repercussão geral reconhecida, fixou a tese de que “é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”.
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, após o reconhecimento da INCONSTITUCIONALIDADE da distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, os parentes colaterais, tais como irmãos, tios e sobrinhos, são herdeiros de quarta e última classe na ordem de vocação hereditária, herdando apenas na ausência de descendentes, ascendentes e cônjuge ou companheiro, em virtude da ordem legal de vocação hereditária.
Verifica-se que, apesar de não haver dúvida de que os parentes colaterais da falecida possuem interesse no resultado da ação de reconhecimento e dissolução de união estável, esse interesse não é direto e imediato, mas apenas REFLEXO, não os qualificando como litisconsortes passivos necessários, pois, nessa demanda movida contra o espólio, não há nenhum pedido contra eles dirigido. Em outras palavras, os parentes colaterais não possuem relação jurídica de direito material com a convivente supérstite, sendo que somente serão eventual e reflexamente atingidos pela decisão.
Ademais, é TEMEROSO adotar o posicionamento de que quaisquer pessoas que compõem a vocação hereditária possuem legitimidade passiva necessária em ações de reconhecimento e dissolução de união estável pelo simples fato de que poderão, em tese, ser impactadas em futuro e distinto processo, devendo a referida vocação ser examinada em seara própria.
Dessa forma, o interesse dos parentes colaterais da falecida serve apenas para qualificá-los à habilitação voluntária no processo como assistentes simples do espólio.
Anota-se que a presente nota informativa vem retificar o que fora publicado no Informativo n. 678 e para tal transcreve-se trecho do voto do Exmo. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino: “Eminentes Colegas. Prefacialmente, destaco que a apresentação do presente voto, nesta sessão de julgamento, decorre da existência de evidente erro material contido no acórdão anteriormente publicado, tendo em vista que o referido julgado não retratou o entendimento firmado na sessão de julgamento ocorrida em 23.06.2020”.
Lembra do que foi consignado no Info 678?
“A questão PROCESSUAL posta, como já aludido, situa-se em torno da necessidade de inclusão, no polo passivo da demanda de reconhecimento e dissolução de união estável, dos parentes colaterais da falecida como seus possíveis herdeiros para a hipótese de não reconhecimento da união estável alegada. Assim, caracterizado o litisconsórcio necessário, indispensável a inclusão no polo passivo da demanda de reconhecimento e dissolução de união estável dos possíveis herdeiros do de cujus em face de seu evidente interesse jurídico no desenlace da lide. Pois, na hipótese de não reconhecimento da união estável, os parentes colaterais serão os herdeiros legítimos do de cujus (art. 1829, IV, c/c o art. 1.839 do CC/2002)”.
ESQUECE!!!!
É desnecessária a inclusão dos parentes colaterais do de cujus no polo passivo da ação de reconhecimento e dissolução de união estável post mortem.
RECURSO ESPECIAL
É admissível a reconvenção sucessiva, também denominada de reconvenção à reconvenção, desde que a questão que justifique a propositura tenha surgido na contestação ou na primeira reconvenção.
REsp 1.690.216-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020
Djalma ajuizou a ação de cobrança e arbitramento de honorários advocatícios em face de Rubens. Rubens apresentou contestação e ainda reconvenção na qual alegou que na verdade ele seria credor de Djalma.
Djalma então apresentou reconvenção contra a reconvenção ajuizada por Rubens. O Juízo de primeiro grau não recebeu a reconvenção apresentada pelo autor (Djalma) por falta de amparo legal.
O Tribunal de Justiça local, ao julgar o recurso de agravo de instrumento, inicialmente, destacou que a questão é controvertida, mas decidiu pela impossibilidade de apresentação de reconvenção do autor e fundamentou a decisão no princípio da estabilidade objetiva da demanda. Também destacou que permitir a reconvenção da reconvenção, acarretaria um prolongamento indevido da marcha do processo, ferindo de morte o princípio da celeridade e efetividade processual. Por fim, observou que e a reconvenção somente é cabível se conexa com a ação principal.
Inconformado, Djalma interpôs recurso especial no qual defendeu o cabimento da reconvenção da reconvenção, sob o fundamento de que inexiste qualquer vedação legal à propositura de reconvenção como resposta à reconvenção do requerido, além de que caracterizada a conexão entre os argumentos deduzidos em sua reconvenção e os lançados na reconvenção do demandado, o instrumento processual seria perfeitamente cabível.
Código de Processo Civil 2015:
Art. 343. Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.
§ 1º Proposta a reconvenção, o autor será intimado, na pessoa de seu advogado, para apresentar resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
Art. 702. Independentemente de prévia segurança do juízo, o réu poderá opor, nos próprios autos, no prazo previsto no art. 701 , embargos à ação monitória.
§ 6º Na ação monitória admite-se a reconvenção, sendo vedado o oferecimento de reconvenção à reconvenção.
R: SIM.
Ainda na vigência do CPC/1973, a doutrina se posicionou, majoritariamente, pela admissibilidade da reconvenção à reconvenção, por se tratar de medida não vedada pelo sistema processual, mas desde que a questão que justifica a propositura da reconvenção sucessiva tenha como origem a contestação ou a primeira reconvenção.
Esse entendimento não se modifica na vigência do CPC/2015, pois a nova legislação processual solucionou alguns dos impedimentos apontados ao cabimento da reconvenção sucessiva, como, por exemplo, a previsão de que o autor-reconvindo será intimado para apresentar resposta e não mais contestação (art. 343, §1º) e a vedação expressa de reconvenção à reconvenção apenas na hipótese da ação monitória (art. 702, §6º).
Assim, também na vigência do CPC/2015, é igualmente correto concluir que a reconvenção à reconvenção não é vedada pelo sistema processual, condicionando-se o seu exercício, todavia, ao fato de que a questão que justifica a propositura da reconvenção sucessiva tenha surgido na contestação ou na primeira reconvenção, o que viabiliza que as partes solucionem integralmente o litígio que as envolve no mesmo processo e melhor atende aos princípios da eficiência e da economia processual, sem comprometimento da razoável duração do processo.
É admissível a reconvenção sucessiva, também denominada de reconvenção à reconvenção, desde que a questão que justifique a propositura tenha surgido na contestação ou na primeira reconvenção.
RECURSO ESPECIAL
Se proferida, transitada e executada a sentença que julgou a primeira fase da ação de prestação de contas na vigência do CPC/1973, adquire o vencedor o direito de exigir que sejam elas prestadas e apuradas na forma da lei revogada.
REsp 1.823.926-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/09/2020, DJe 16/09/2020
Vilma ajuizou de prestação de contas ajuizada pelo recorrente em face dos herdeiros de Gastão. O Juízo de primeiro grau, em decisão interlocutória ainda sob a vigência do CPC/1973, concedeu prazo de 30 dias para que a autora se manifestasse sobre as contas apresentadas, inclusive para demonstrar a ausência dos documentos comprobatórios das contas que foram apresentadas.
Em agravo de instrumento, o Tribunal de Justiça local entendeu que, prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar, prosseguindo-se o processo na forma do Capítulo X do Título I, do livro I, da Parte Especial.
Contra tal decisão, a autora interpôs recurso especial no qual sustentou que não teria sido observada a regra processual vigente ao tempo da prolação da sentença e do início da segunda fase da ação de prestação de contas.
Cinge-se a controvérsia a definir se houve a observância das regras do CPC/1973 vigente ao tempo da prolação da sentença e do início da segunda fase da ação de prestação de contas.
Código de Processo Civil 2015:
Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.
R: SIM.
Inicialmente, da análise da regra do art. 14 do CPC/2015, conclui-se que o legislador processual adotou a teoria do ISOLAMENTO dos atos processuais, da qual se extraem elementos balizadores sobre o momento de incidência do novo CPC aos processos em curso, a saber: irretroatividade da lei, aplicação imediata aos processos pendentes, respeito aos atos processuais praticados e às situações jurídicas consolidadas.
Teoria | Qualé que é? |
UNIDADE PROCESSUAL | Embora se desdobre em uma série de atos distintos, o processo apresenta uma unidade = deve-se aplicar uma única lei a cada processo. |
FASES PROCESSUAIS | O processo é encadeado por fases (postulatória, ordinatória, instrutória, decisória, recursal) = mais de uma lei pode reger o processo, desde que respeitadas as fases. |
ISOLAMENTO DOS ATOS PROCESSUAIS | A lei nova não atinge os atos processuais praticados sob a vigência da lei anterior, porém será aplicável aos atos processuais que ainda não foram praticados, pouco importando a fase em que o processo estiver. |
Embora a distinção nem sempre seja simples, na medida em que o processo é uma relação jurídica complexa e dinâmica consistente em sucessivos atos encadeados em busca da tutela jurisdicional, não se pode olvidar que a ação de prestação de contas, enquanto procedimento especial bifásico, possui natureza objetivamente complexa – ou seja, contempla duas espécies distintas de obrigação.
Assim, dado que houve sentença e trânsito em julgado da primeira fase da ação, bem como início da segunda fase da ação, tudo sob a égide do CPC/1973, essa deverá ser a lei regente quanto ao modo de apuração dos débitos, créditos e saldo porventura existentes, na medida em que o recorrente adquiriu o direito de exigi-las na constância da lei revogada.
Registra-se que, mesmo na vigência do CPC/1973, o STJ tem precedentes no sentido de abrandar eventual rigorismo e formalismo exacerbado na prestação de contas, devendo ser observado, em verdade, se são elas claras e inteligíveis, de modo a atingir as finalidades do processo.
Assim, deve-se estabelecer como tese jurídica que, independentemente da nomenclatura adotada, prestação de contas de forma mercantil ou de forma adequada, a efetiva prestação das contas deverá ocorrer de maneira clara e inteligível, de modo a atingir às finalidades dessa ação.
Se proferida, transitada e executada a sentença que julgou a primeira fase da ação de prestação de contas na vigência do CPC/1973, adquire o vencedor o direito de exigir que sejam elas prestadas e apuradas na forma da lei revogada.
RECURSO ESPECIAL
Quando há pluralidade de réus, a data da primeira citação válida é o termo inicial para contagem dos juros de mora.
REsp 1.868.855-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/09/2020, DJe 28/09/2020
Josefina ajuizou ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, em desfavor de Marília e outros. Em sentença, foi reconhecida a ilegitimidade passiva dos demais réus, tendo a recorrida sido isoladamente condenada ao pagamento da importância postulada na petição inicial.
Marília, por sua vez, apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, alegando excesso de execução, uma vez que teria sido considerado como termo inicial para a incidência dos juros de mora a data de sua citação (13/09/2004), ao invés da data da última citação válida ocorrida nos autos originários e relativa a um dos corréus (18/03/2011).
O Juízo de primeiro grau rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença apresentada pela ré, porém o Tribunal de Justiça local deu provimento ao agravo de instrumento por entender que: “Tendo em vista a pluralidade de réus, e não sendo o caso de responsabilidade solidária, o termo inicial dos juros de mora deve ser a última citação válida.”
Inconformada, Vilma interpôs recurso especial no qual sustentou que embora a demanda originária envolvesse vários réus, restando apenas o reconhecimento da obrigação da recorrida e extinto o processo sem resolução do mérito em relação aos demais, para efeito da incidência dos juros de mora, o termo inicial é a data efetiva da citação da ré, e não a data da última citação válida ocorrida nos autos.
Código Civil de 2002:
Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.
Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial.
Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.
Código de Processo Civil 2015:
Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo:
§ 1º Quando houver mais de um réu, o dia do começo do prazo para contestar corresponderá à última das datas a que se referem os incisos I a VI do caput .
Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
R: A data da primeira citação válida.
A citação válida, como regra geral, constitui em mora o devedor, ressalvadas as hipóteses previstas nos arts. 397 e 398 do CC/2002, nos termos do art. 240, caput, do CPC/2015.
A regra geral, no entanto, pode gerar controvérsias quando dos autos constar uma pluralidade de réus, comumente citados em momentos diversos. A dúvida surge, pois se indaga o momento em que eles estarão constituídos em mora – se a data da primeira citação válida realizada nos autos; se a data da última citação realizada; ou se os juros de mora terão termos iniciais diversos, a depender da data da citação de cada litisconsorte.
Quando se trata de obrigação SOLIDÁRIA, vislumbra-se com mais facilidade que os juros de mora correrão a partir da data da PRIMEIRA citação válida realizada nos autos.
A questão ganha contornos mais nebulosos, contudo, quando a hipótese não versa sobre obrigação solidária.
O Tribunal de origem concluiu que o prazo inaugural para a contagem dos juros de mora deve ser a data da citação válida do último corréu, em virtude da aplicação por analogia do art. 231, § 1º, do CPC/2015.
O referido dispositivo legal determina que, quando haja pluralidade de réus, se aguarde a última citação nos autos para que o prazo de contestação de todos os réus passe a ser contado simultaneamente.
Contudo, diferentemente da conclusão adotada pelo Tribunal de origem, os EFEITOS da citação não podem ser confundidos com o início do prazo para a DEFESA dos litisconsortes. A primeira situação, em verdade, trata da ciência inequívoca do réu sobre a demanda e a sua constituição em mora; a segunda situação, por sua vez, versa sobre o marco temporal de início da fluência do prazo para o oferecimento da defesa (contestação), que é prolongado até a citação do último litisconsorte, na hipótese de haver pluralidade de réus.
Como mesmo consignado no julgamento do AgInt no REsp 1.362.534/DF, “não se aplica, para a constituição em mora, regra processual disciplinadora do termo inicial do prazo para contestar (CPC/73, art. 241, III), em detrimento da regra geral de direito material pertinente (Código Civil, art. 280)”.
Quando há pluralidade de réus, a data da primeira citação válida é o termo inicial para contagem dos juros de mora.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA
Não é cabível a requisição da averbação de inquérito civil no registro imobiliário pelo Ministério Público, com fixação de prazo para o seu cumprimento.
RMS 58.769-RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 15/09/2020, DJe 23/09/2020
O Ministério Público Estadual apurava a existência de um loteamento irregular denominado ‘Bella Vista’, sem licenciamento ambiental e sem rede de coleta e de tratamento de esgoto sanitário, havendo inclusive notificação expedida pelo Instituto Estadual do Ambiente – INEA, determinando a paralisação do empreendimento, por se tratar de atividade potencialmente poluidora.
Visando a assegurar ampla publicidade dos fatos investigados pelo Ministério Público, bem como a proteger terceiros de boa-fé que pudessem vir a adquirir lotes no local, o parquet, oficiou ao Oficial Registrador competente para averbação do referido inquérito civil na matrícula imobiliária pertinente, com fundamento na Lei Federal n.º 6.015/73, art. 167, II, 5, parte final.
Ocorre que o Oficial Registrador informou ao Ministério Público que realizou consulta ao Juiz de Direito sobre a possibilidade de realizar a averbação requisitada pelo MPE, e que o magistrado se manifestou no sentido de que somente o Judiciário poderia determinar a averbação.
O Parquet então impetrou mandado de segurança no qual sustentou que houve violação a direito líquido e certo do MP de dar publicidade ao inquérito civil, protegendo os terceiros de boa-fé, além de não observância, pelos impetrados, do devido procedimento de suscitação de dúvida, regrado pela Lei 6.015/1973.
O Tribunal de Justiça local negou a segurança por entender que a averbação poderia ser requerida por qualquer interessado, mas apenas DETERMINADA pela autoridade judiciária.
Inconformado, o MPE interpôs recurso especial no qual defendeu que o fundamento de que a averbação somente poderia ser determinada por autoridade judiciária não deveria prosperar, cabendo ressaltar, neste sentido, que a intervenção judiciária já tem sido dispensada em diversos atos registrais.
Lei n. 6.015/1973:
Art. 13. Salvo as anotações e as averbações obrigatórias, os atos do registro serão praticados:
I – por ordem judicial;
II – a requerimento verbal ou escrito dos interessados;
III – a requerimento do Ministério Público, quando a lei autorizar.
Art. 198. Tomada a nota da apresentação, e conferido o número de ordem, o oficial verificará a legalidade e a validade do título, procedendo ao registro, se o mesmo estiver em conformidade com a lei, no prazo máximo de dez (10) dias úteis, salvo no caso previsto no parágrafo único do artigo 7º do Decreto-Lei n. 549, de 24 de abril de 1969, em que o prazo será de três (3) dias úteis.
§ 1º O oficial fará essa verificação no prazo improrrogável de cinco (5) dias úteis, e poderá exigir que o apresentante ponha o documento em conformidade com a lei, concedendo-lhe, para isso, prazo razoável.
§ 2º O oficial indicará por escrito a exigência cuja satisfação seja necessária ao registro. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial ou não podendo satisfazê-la, será o título a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimi-la.
§ 3º Em se tratando de propriedade territorial, desapropriada nos termos do Decreto-Lei n. 549, de 24 de abril de 1969, a verificação a que alude o § 1º será feita em quarenta e oito (48) horas.
§ 4º Em se tratando de inscrição de incorporação e de loteamento, a verificação dos memoriais e documentos necessários ao registro será feita em quinze (15) dias úteis.
Art. 199. Prenotado o título, e lançada nele a dúvida, rubricará o oficial todas as suas folhas, remetendo-o ao juízo competente.
Art. 200. No protocolo anotará o oficial, à margem da prenotação, a ocorrência da dúvida.
Art. 201. Estando devidamente fundamentada a dúvida, o Juiz mandará ouvir o apresentante em dez (10) dias, para impugná-la, com os documentos que entender, ouvindo-se após, o Ministério Público, no prazo de cinco (5) dias.
§ 1º Se o interessado, nesse prazo, não impugnar a dúvida, o Juiz mandará arquivá-la. Essa decisão é irrecorrível e dela dar-se-á ciência ao oficial, que cancelará a prenotação, devolvendo os documentos ao interessado.
§ 2º O arquivamento da dúvida não impedirá que ela seja suscitada novamente, no caso de reapresentação do título para registro.
Art. 202. Impugnada a dúvida, o Juiz proferirá a sentença no prazo de cinco (5) dias, com os elementos constantes dos autos.
Parágrafo único. Da sentença poderão interpor recurso de apelação, com ambos os efeitos o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado.
Art. 203. O documento que for objeto de dúvida, decidida esta, será restituído ao interessado, independentemente de traslado.
Art. 204. Julgada improcedente a dúvida, o interessado apresentará de novo os seus documentos, com o respectivo mandado, e o oficial, procederá, desde logo, ao registro, declarando, na coluna de anotações do protocolo, que a dúvida foi julgada improcedente, arquivando-se o mandado ou a cópia da sentença. Se julgada procedente, expedir-se-á mandado ao oficial que cancelará a prenotação.
Art. 205. A denegação do registro não impedirá o uso do processo contencioso competente.
Art. 206. Cessarão automaticamente os efeitos da prenotação, se, decorridos trinta (30) dias do seu lançamento no protocolo, o título não tiver sido registrado, salvo nos casos de processo de dúvida ou de inscrição de instituição de bem de família e de inscrição de memorial de loteamento; casos estes em que o perecimento da prenotação ocorrerá após 30 (trinta) dias da data da publicação do último edital.
Art. 207. Se o documento, uma vez prenotado, não puder ser registrado, ou o apresentante desistir do seu registro, a importância relativa às despesas previstas no artigo 15 será restituída, deduzida a quantia correspondente as buscas e à prenotação.
Constituição Federal de1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
R: NÃO.
Nos termos do art. 13, I, II e III, da Lei n. 6.015/1973, os atos do registro serão praticados por ordem judicial, a requerimento verbal ou escrito dos interessados e a requerimento do Ministério Público, quando a lei autorizar, excetuadas as anotações e averbações obrigatórias.
Assim, cabe ao Ministério Público requerer a averbação do inquérito civil no Registro Imobiliário e o Oficial Registrador, conforme seu entendimento, pode suscitar dúvida ao Juízo competente, em consonância com o procedimento disciplinado nos arts. 198 a 207 da Lei n. 6.015/1973.
O Parquet, no caso, ao invés de requerer a averbação, REQUISITOU a sua realização, fixando prazo para o seu cumprimento, o que não encontra amparo na legislação.
Em que pese a importância de se dar publicidade à população acerca de eventuais irregularidades em parcelamentos, a fim de proteger terceiros de boa-fé, adquirentes de suas frações, e contribuir para a ordenada ocupação do solo, há que se observar o devido processo legal, assegurado no art. 5º, LIV, da CF, tal como previsto na Lei n. 6.015/1973.
Não é cabível a requisição da averbação de inquérito civil no registro imobiliário pelo Ministério Público, com fixação de prazo para o seu cumprimento.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
É absoluta a competência do local em que se encontra o principal estabelecimento para processar e julgar pedido de recuperação judicial, que deve ser aferido no momento de propositura da demanda, sendo irrelevantes para esse fim modificações posteriores de volume negocial.
CC 163.818-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 23/09/2020, DJe 29/09/2020
Fazendas Eco S.A. requereu recuperação judicial perante o Juízo de Porto Nacional/TO, o qual deferiu o processamento da recuperação. Da decisão, os credores interpuseram vários recursos, e o Juízo decidiu expressamente a questão da competência, reconhecendo-se como órgão competente, em razão de ser a sua comarca o local onde as recuperandas concentravam a maior parte da atividade econômica.
No entanto, ante sucessivas alegações de incompetência, o Juízo de São Mateus reconsiderou e declinou da competência para o Juízo de São Mateus/ES e fundamentou seu novo entendimento na informação de que o administrador do grupo em recuperação judicial residia naquela comarca.
O Juízo de São Mateus declinou de competência por entender que a residência do administrador é irrelevante para fins de fixação da competência do Juízo recuperacional, nos termos do art. 3º da Lei n. 11.101/2005 e suscitou o conflito.
Lei n. 11.101/2005:
Art. 3º É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil.
R: O juízo da comarca onde se localiza o PRINCIPAL estabelecimento.
O Juízo competente para processar e julgar pedido de recuperação judicial é aquele situado no local do principal estabelecimento (art. 3º da Lei n. 11.101/2005), compreendido este como o local em que se encontra “o centro vital das principais atividades do devedor”.
Conceito | O que quer dizer? |
OFICIAL | Domicílio oficial da empresa, indicado no contrato social (sede). |
ECONÔMICO | Local onde ocorre o maior número de negócios da sociedade |
ADMINISTRATIVO | Sede administrativa dos negócios = tomada de decisões (estratégicas, financeiras e operacionais) + contabilidade (livros). |
Embora utilizado o critério em razão do local, a regra legal estabelece critério de competência FUNCIONAL, encerrando hipótese legal de competência absoluta, inderrogável e improrrogável, devendo ser aferido no momento da propositura da demanda – registro ou distribuição da petição inicial.
A utilização do critério funcional tem por finalidade o incremento da eficiência da prestação jurisdicional, orientando-se pela natureza da lide, assegurando coerência ao sistema processual e material.
Destaca-se que, no curso do processo de recuperação judicial, as modificações em relação ao principal estabelecimento, por dependerem exclusivamente de decisões de gestão de negócios, sujeitas ao crivo do devedor, não acarretam a alteração do juízo competente, uma vez que os negócios ocorridos no curso da demanda nem mesmo se sujeitam à recuperação judicial.
Conclusão diversa, no sentido de modificar a competência sempre que haja correspondente alteração do local de maior volume negocial, abriria espaço para manipulações do Juízo natural e possível embaraço do andamento da própria recuperação.
Com efeito, o devedor, enquanto gestor do negócio, detém o direito potestativo de centralização da atividade em locais distintos no curso da demanda, mas não o poder de movimentar a competência funcional já definida. Do contrário, o resultado seria o prolongamento da duração do processo e, provavelmente, a ampliação dos custos e do prejuízo dos credores, distorcendo a razão de ser do próprio instituto da recuperação judicial de empresas.
É absoluta a competência do local em que se encontra o principal estabelecimento para processar e julgar pedido de recuperação judicial, que deve ser aferido no momento de propositura da demanda, sendo irrelevantes para esse fim modificações posteriores de volume negocial.
HABEAS CORPUS
A obrigação de revisar, a cada 90 (noventa) dias, a necessidade de se manter a custódia cautelar (art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal) é imposta apenas ao juiz ou tribunal que decretar a prisão preventiva.
HC 589.544-SC, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 08/09/2020, DJe 22/09/2020
Daniel foi condenado às penas de 13 anos de cana por incurso no art. 158, caput, por quatro vezes, e no art. 158, § 1.º (roubo). Inconformados, apelaram o Ministério Público e a Defesa. O Tribunal de Justiça local, deu razão apenas ao Ministério Público e “readequou a reprimenda” (mandou brasa em mais pena) para 15 aninhos de reclusão.
A defesa de Daniel então impetrou Habeas Corpus no qual narrou que a prisão em flagrante do paciente foi convertida em preventiva na data de 07/05/2019. Por conseguinte, a prisão preventiva foi mantida na sentença condenatória na data de 22/08/2019, ou seja, por um pouco mais de 90 (noventa) dias. Após isso, Daniel teve seu Recurso de Apelação julgado e, ainda, aguarda o julgamento de admissibilidade de seu Recurso Especial e Extraordinário. Porém desde a data da sentença, não foi revista a necessidade de manutenção da prisão preventiva, consoante determina o artigo 316, parágrafo primeiro, do Código de Processo Penal. Requereu então a revogação ou concessão de medidas cautelares diversas da prisão.
Código de Processo Penal:
Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:
§ 1o O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta.
R: NÃO.
A Lei n. 13.964/2019, que deu nova redação ao caput do art. 316 do Código de Processo Penal e lhe acrescentou o parágrafo único. Consoante se infere da literalidade da norma a obrigação de revisar, no prazo assinalado, a necessidade de se manter a custódia cautelar é imposta apenas ao juiz ou tribunal que decretar a prisão preventiva.
Com efeito, a Lei nova atribui ao “órgão emissor da decisão” – em referência expressa à decisão que decreta a prisão preventiva – o dever de reavaliá-la. A inovação legislativa se apresenta como uma forma de evitar o prolongamento da medida cautelar extrema, por prazo indeterminado, sem formação da culpa. Daí o dever de ofício de o juiz ou o tribunal processantes declinarem fundamentos relevantes para manter a segregação provisória.
No entanto, depois de exercido o contraditório e a ampla defesa, com a prolação da sentença penal condenatória, a mesma Lei Processual Penal prevê que “O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta” (§ 1º do art. 387 do Código de Processo Penal), a partir de outra perspectiva acerca da culpa do réu e da necessidade da custódia cautelar.
Encerrada a instrução criminal, e prolatada a sentença ou acórdão condenatórios, a impugnação à custódia cautelar – decorrente, a partir daí, de novo título judicial a justificá-la – continua sendo feita pelas vias ordinárias recursais, sem prejuízo do manejo da ação constitucional de habeas corpus a qualquer tempo.
Pretender o intérprete da Lei nova que essa OBRIGAÇÃO – de revisar, de ofício, os fundamentos da prisão preventiva, no exíguo prazo de noventa dias, e em períodos sucessivos – seja estendida por toda a cadeia recursal, impondo aos tribunais (todos abarrotados de recursos e de habeas corpus) tarefa desarrazoada ou, quiçá, inexequível, sob pena de tornar a prisão preventiva “ilegal”, data maxima venia, é o mesmo que permitir uma contracautela, de modo indiscriminado, impedindo o Poder Judiciário de zelar pelos interesses da persecução criminal e, em última análise, da sociedade.
A obrigação de revisar, a cada 90 (noventa) dias, a necessidade de se manter a custódia cautelar (art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal) é imposta apenas ao juiz ou tribunal que decretar a prisão preventiva.
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