Amigos e amigas de todo o BRASIL-SIL-SIL. Aqui no Estratégia Carreiras Jurídicas você não perde nada (Só ganha!). Informativo 672 do STJ COMENTADO.
Sumário
1. Cobertura de segundo habitacional obrigatório.. 3
3. Exposição pornográfica não autorizada. 8
4. Desmembramento de imóvel urbano e adjudicação compulsória. 9
5. Averbação da sentença negatória de filiação.. 11
6. Embargos de terceiro e compromisso de compra e venda. 13
7. Embargos de terceiro para desconstituir averbação de protesto.. 15
8. Extinção da execução por incorreção do valor da causa e honorários. 17
9. Transmissão de direitos hereditários e transmissão da posse. 21
10. Notificação premonitório no despejo.. 23
11. Penhorabilidade dos valores de empréstimo consignado.. 25
12. Incidência de IPI no deslocamento de mercadoria. 28
13. Creditamento de PIS e Cofins extensível a PJs não vinculadas ao REPORTO.. 29
14. Prazo prescricional letra de câmbio não aceita. 32
15. Termo inicial do prazo de monitoramento da recuperação judicial 34
16. Ajuizado de Execução Fiscal e interesse de habilitação na falência. 38
17. Responsabilidade civil por morte de paciente. 40
18. Termo inicial do prazo prescricional no crime de falsidade ideológica. 42
19. Inaplicabilidade da insignificância no estelionato por médico 44
20. Acórdão confirmatória da condenação e interrupção da prescrição.. 45
21. Injúria e ausência de dolo específico.. 46
22. Delegação da produção de prova oral a autoridade estrangeira. 48
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.. 51
23. Medida socioeducativa e prazo prescricional 52
24. Extinção de internação por processo-crime superveniente. 53
PARA TESTAR SEU CONHECIMENTO… 54
25.1. Questões objetivas: CERTO ou ERRADO. 55
RECURSO ESPECIAL
Os vícios estruturais de construção estão cobertos pelo seguro habitacional obrigatório vinculado ao crédito imobiliário concedido pelo Sistema Financeiro da Habitação – SFH, ainda que só se revelem depois da extinção do contrato.
REsp 1.804.965-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 27/05/2020, DJe 01/06/2020
João comprou uma casa no Sistema Financeiro da Habitação. Ao contratar a operação de crédito imobiliário (financiamento), de mochila veio um seguro habitacional. Só que, a residência, como é comum de acontecer, veio com vícios, que causaram danos não exclusivamente em razão do decurso do tempo e da utilização normal da coisa, mas de defeitos estruturais de construção, a que João não deu causa, nem poderia de qualquer modo evitar, e que, evidentemente, apenas se agravam com o decurso do tempo e a utilização normal da coisa.
Cinge-se a controvérsia a definir se os prejuízos resultantes de sinistros relacionados a esses vícios estruturais estão acobertados pelo seguro habitacional obrigatório…
Em virtude da mutualidade ínsita ao contrato de seguro, o risco coberto é previamente delimitado e, por conseguinte, limitada é também a obrigação da seguradora de indenizar. Mas o exame dessa limitação NÃO pode perder de vista a própria CAUSA do contrato de seguro, que é a garantia do interesse legítimo do segurado.
Assim como tem o segurado o dever de veracidade nas declarações prestadas, a fim de possibilitar a correta AVALIAÇÃO do risco pelo segurador, a boa-fé objetiva impõe ao segurador, na fase pré-contratual, o dever, dentre outros, de dar informações claras e objetivas sobre o contrato, para permitir que o segurado compreenda, com exatidão, o verdadeiro alcance da garantia contratada, e, nas fases de execução e pós-contratual, o dever de evitar subterfúgios para tentar se eximir de sua responsabilidade com relação aos riscos previamente determinados.
Esse dever de informação do segurador ganha maior importância quando se trata de um contrato de adesão — como, em regra, são os contratos de seguro —, pois se trata de circunstância que, por si só, torna VULNERÁVEL a posição do segurado.
A necessidade de se assegurar, na interpretação do contrato, um padrão mínimo de qualidade do consentimento do segurado, implica o reconhecimento da abusividade formal das cláusulas que desrespeitem ou comprometam a sua livre manifestação de vontade, como parte vulnerável.
No âmbito do SFH, o seguro habitacional ganha conformação diferenciada, uma vez que integra a política nacional de habitação, destinada a facilitar a aquisição da casa própria, especialmente pelas classes de menor renda da população, tratando-se, pois, de contrato obrigatório que visa à proteção da família e à salvaguarda do imóvel que garante o respectivo financiamento imobiliário, resguardando, assim, os recursos públicos direcionados à manutenção do sistema.
A partir dessa perspectiva, infere-se que uma das justas expectativas do segurado, ao aderir ao seguro habitacional obrigatório para aquisição da casa própria pelo SFH, é a de receber o bem imóvel próprio e adequado ao uso a que se destina. E a essa expectativa legítima de garantia corresponde a de ser devidamente indenizado pelos prejuízos suportados em decorrência de danos originados na vigência do contrato e geradores dos riscos cobertos pela seguradora, segundo o previsto na apólice, como razoavelmente se pressupõe ocorrer com os vícios estruturais de construção.
A interpretação fundada na boa-fé objetiva, contextualizada pela função socioeconômica que desempenha o contrato de seguro habitacional obrigatório vinculado ao SFH, leva a concluir que a restrição de cobertura, no tocante aos riscos indicados, deve ser compreendida como a exclusão da responsabilidade da seguradora com relação aos riscos que resultem de atos praticados pelo próprio segurado ou do uso e desgaste natural e esperado do bem, tendo como baliza a expectativa de vida útil do imóvel, porque configuram a atuação de forças normais sobre o prédio.
R: SIM.
Os vícios estruturais de construção provocam, por si mesmos, a atuação de forças anormais sobre a edificação, na medida em que, se é fragilizado o seu alicerce, qualquer esforço sobre ele (que seria naturalmente suportado, acaso a estrutura estivesse íntegra) é potencializado, do ponto de vista das suas consequências, porque apto a ocasionar danos NÃO esperados na situação de normalidade de fruição do bem.
Desse modo, à luz dos parâmetros da boa-fé objetiva e da função social do contrato, que os vícios estruturais de construção estão acobertados pelo seguro habitacional, cujos efeitos devem se prolongar no tempo, mesmo APÓS a conclusão do contrato, para acobertar o sinistro concomitante à vigência deste, ainda que só se revele depois de sua extinção (vício oculto).
No caso de imóvel adquirido pelo Sistema Financeiro de Habitação – SFH e adesão ao seguro habitacional obrigatório, os vícios estruturais de construção (vícios ocultos) são de responsabilidade da seguradora, mesmo após extinção do contrato, em vista da dos boa-fé objetiva e da função social do contrato.
RECURSO ESPECIAL
Incidem juros e correção monetária sobre a avaliação do conteúdo econômico de cotas sociais de empresa objeto de partilha em divórcio que, após a separação do casal, sob a administração exclusiva de um dos ex-cônjuges, encerrou suas atividades comerciais.
REsp 1.689.220-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020
João e Maria se divorciaram. Como eram sócios em uma pessoa jurídica, o valor das cotas sociais foi avaliado na partilha do divórcio. Maria teve reconhecido o direito à metade do valor integralizado das cotas empresariais em debate.
João ficou na administração exclusiva das cotas e encerrou as atividades da empresa após a separação. Na hora de se realizar o pagamento, Maria disse que tal valor deveria ser atualizado monetariamente e sobre ele incidir juros! João Pirou!!!
Então, cinge-se a controvérsia a saber se incidem juros e correção monetária, desde a citação até a data do efetivo pagamento, na forma do artigo 389 do Código Civil de 2002, sobre o valor da avaliação de cotas empresariais apurado conforme sua importância ao tempo da separação de fato dos ex-cônjuges.
CC, Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao reconhecer a possibilidade de partilha, em ação de divórcio, da expressão econômica resultante de cotas empresariais que integraram o patrimônio comum construído na vigência do relacionamento outrora estabelecido entre as partes, independentemente da natureza da sociedade.
R: ABSOLUTAMENTE.
Tendo em vista o encerramento das atividades da empresa após a separação do então casal, constatada na data da avaliação, o objeto partilhado consiste, em última instância, no próprio capital investido na sociedade à época do relacionamento, devidamente atualizado.
O encerramento da empresa NÃO deve impor ao ex-cônjuge, que ficou privado do patrimônio relativo às mencionadas cotas, o ônus de arcar com os prejuízos decorrentes da administração exclusiva, incabível o afastamento dos juros no pagamento das perdas e danos sobre o valor financeiro do mencionado bem sob pena de, ao assim o fazer, cristalizar indevido desequilíbrio na divisão de bens pactuada quando da partilha.
A Terceira Turma, ao julgar o REsp n. 1.537.107/PR, teve a oportunidade de debater hipótese em que se partilhou a valorização decorrente da administração da empresa que, nos anos seguintes à separação do então casal, experimentou crescimento financeiro a ser dividido por força da reconhecida copropriedade das cotas, não podendo o recorrente apartar a sua ex-cônjuge do SUCESSO da sociedade” (Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 25/11/2016).
Assim, diante do encerramento das atividades negociais, resta ao devedor suprir o valor integralizado outrora alocado na empresa e por ele gerido exclusivamente, convertendo-o nos autos em perdas e danos aptos a representar os direitos patrimoniais sobre as cotas sociais então devidas à recorrida. Por esse motivo, correta a avaliação que inclua não só a obrigação principal, mas também seus acessórios, ou seja, juros e correção monetária.
No caso de partilha, em divórcio, das cotas sociais de empresa que ficou sob administração exclusiva de um dos cônjuges, devem incidir juros e correção monetária sobre a avaliação das referidas quotas.
RECURSO ESPECIAL
Na exposição pornográfica não consentida, o fato de o rosto da vítima não estar evidenciado de maneira flagrante é irrelevante para a configuração dos danos morais.
REsp 1.735.712-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020
Joselito filmou Firmina enquanto ela se vestia (nudez parcial). Com o fim do relacionamento, para se vingar do que lhe incomodava, Joselito colocou o vídeo na internet. Cuidou para que o rosto de Firmina não fosse mostrado, mas a ela avisou para que ela soubesse do que ocorria e se sentisse envergonhada.
Firmada procurou um advogado e tacou uma ação de danos morais em Joselito.
Lei n. 12.965/2014, Art. 21. O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.
R: SIM.
A exposição pornográfica não consentida, da qual a pornografia de vingança é uma espécie, constituiu uma grave lesão aos direitos de personalidade da pessoa exposta indevidamente, além de configurar uma grave forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma contundente pelos meios jurídicos disponíveis. Assim, não há como descaracterizar um material pornográfico apenas pela ausência de nudez total.
O fato de o rosto da vítima NÃO estar evidenciado nas fotos de maneira flagrante é IRRELEVANTE para a configuração dos danos morais, uma vez que a mulher vítima da pornografia de vingança sabe que sua intimidade foi indevidamente desrespeitada e, igualmente, sua exposição não autorizada lhe é humilhante e viola flagrantemente seus direitos de personalidade.
O art. 21 do Marco Civil da Internet NÃO abarca somente a nudez total e completa da vítima, tampouco os “atos sexuais” devem ser interpretados como somente aqueles que envolvam conjunção carnal. Deve-se fazer uma interpretação ampliativa, não restritiva, do termo. Isso porque o combate à exposição pornográfica não consentida – que é a finalidade deste dispositivo legal – pode envolver situações distintas e não tão óbvias, mas que geram igualmente dano à personalidade da vítima.
Exposição pornográfica não consentida, ainda que o rosto da vítima não evidenciado, causa lesão aos direitos de personalidade, com a configuração de danos morais.
RECURSO ESPECIAL
A averbação do desmembramento de imóvel urbano é condição indispensável para a procedência da ação de adjudicação compulsória.
REsp 1.851.104-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020
Questão muito comum é a seguinte: pessoal sai vendendo imóvel dentro de loteamento sem que tenha sido feito o desmembramento dos lotes. Cumprido o contrato de promessa de compra e venda pelos adquirentes, eles buscam na justiça a adjudicação compulsória antes mesmo de o bem ter uma matrícula individualizada junto ao CRI. Pode o juiz julgar o pleito procendete?
Lei n. 6.766/1979, artigo 37 “é vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado” (Lei de parcelamento do solo urbano).
R: NEGATIVO!
Segundo previsto no Decreto-Lei n. 58/1937, julgada PROCEDENTE a ação de adjudicação compulsória, a sentença valerá como título para transcrição no cartório de registro de imóveis respectivo.
Assim, se o imóvel de cuja escritura se exige a outorga NÃO tem matrícula própria, individualizada no registro de imóveis, eventual sentença que substitua a declaração de vontade do promitente vendedor torna-se INÓCUA, pois insuscetível de transcrição.
A ação de adjudicação compulsória, classificada como ação de execução em sentido lato, NÃO se limita a condenar, dispensando execução típica posterior. Por isso a existência de imóvel registrável é condição específica da ação de adjudicação compulsória, de modo que a averbação do desmembramento de imóvel urbano, devidamente aprovado pela prefeitura municipal, é formalidade que antecede necessariamente o registro de área fracionada.
Mesmo que cumprido o contrato de compra e venda pelo adquirente, é inviável a procedência da ação de adjudicação compulsória antes do desmembramento de imóvel (condição indispensável), com a averbação do bem em matrícula individualizada junto ao Cartório de Registro de Imóveis.
RECURSO em MANDADO DE SEGURANÇA
A averbação de sentença proferida em ação negatória de filiação não consubstancia, em si, um direito subjetivo autônomo das partes litigantes, tampouco se confunde com o direito personalíssimo ali discutido.
RMS 56.941-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020
Armandinho propôs ação negatória de filiação, a qual foi julgada procedente. Acontece que, por falha do serviço judiciário, houve a mera expedição, mas não o encaminhamento, do mandado de averbação ao Ofício do Registro Civil das Pessoas Naturais. A questão é saber se se impõe à parte interessada o manejo de específica ação para esse propósito e se há algum prazo para a realização desde pedido de registro da sentença. Poder-se-ia indagar as partes podem escolher não realizar o registro do dedido em sentença?
CC, Art. 10. Far-se-á averbação em registro público:
I – das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento, o divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal;
II – dos atos judiciais ou extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação;
R: EFEITO da sentença.
A averbação de sentença transitada em julgado, a qual DECLARA ou RECONHECE determinado estado de filiação — como se dá nas ações negatórias de maternidade/paternidade, em caso de procedência —, constitui consequência legal obrigatória do que restou declarado e reconhecido judicialmente, o que se dá, ordinariamente, de ofício.
Aliás, nos termos do art. 10, inciso II, do Código Civil, FAR-SE-Á a averbação de registro público dos atos judiciais e extrajudiciais que declararem ou reconhecerem a filiação. A lei NÃO deixa margem para discricionariedade (ou dúvida)!
A averbação constitui ato acessório destinado a modificar o teor constante do registro, em virtude de determinação judicial, conferindo-lhe, em atenção ao princípio da veracidade, que rege o registro público, publicidade e segurança jurídica.
NÃO existe nenhuma faculdade conferida às partes envolvidas a respeito de proceder ou não à referida averbação, como se tal providência constituísse, em si, um direito personalíssimo delas.
NÃO há, pois, como CONFUNDIR o exercício do direito subjetivo de ação de caráter personalíssimo, como o é a pretensão de desconstituir estado de filiação, cuja prerrogativa é exclusiva das pessoas insertas nesse vínculo jurídico (pai/mãe e filho), com o ato acessório da averbação da sentença de procedência transitada em julgado, que se afigura como mera consequência legal obrigatória.
Pretensão de desconstituir estado de filiação. | Ato acessório da averbação da sentença que altera o estado de filiação. |
PRERROGATIVA é exclusiva das pessoas. | EFEITO automático da sentença. |
DIREITO POTESTATIVO | DETERMINAÇÃO LEGAL |
Na eventualidade de tal proceder não ser observado a providência de averbação da sentença, por essa razão, não se submete a qualquer prazo, seja ele decadencial ou prescricional.
A sentença de procedência de ação negatória de filiação transitada em julgado determina a averbação. Não há que falar em direito subjetivo e personalíssimo do registro do ato (apenas da propositura da demanda). Trata-se o registro de consequência legal obrigatória (art. 10, II, do Código Civil).
RECURSO ESPECIAL
É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse indireta advinda do compromisso de compra e venda, ainda que desprovido de registro, de imóvel adquirido na planta que se encontra em fase de construção.
REsp 1.861.025-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020
Caso mais comum do mundo hoje em dia!
Mariazinha assina compromisso de compra e venda de imóvel “adquirido” na planta que se encontra em fase de construção. Depois esse bem, que ainda está em nome de terceiro (normalmente a construtora), é penhorado em demanda judicial.
Mariazinha opõe embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda, o qual, detalhe, não foi levado a registro. Só que (atenção), ela ainda não ingressou no bem porque ele está em construção. Há posse?
CPC, Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.
STJ, Súmula 84: É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.
R: SIM.
Para a oposição de embargos de terceiro, além de ostentar a qualidade de terceiro, o embargante deve ser senhor ou possuidor da coisa ou do direito que tenha sofrido constrição judicial, nos termos do art. 674 do CPC/2015.
Frise-se que a posse que permite a oposição dos embargos de terceiro é tanto a direta (o sujeito está dentro do bem, fazendo uso dele) quanto a indireta (derivada do domínio, ainda que não se faça uso do corpus naquele momento). E, diferentemente do que ocorre nas ações possessórias, a insurgência do terceiro embargante não se dá contra a regularidade, ou não, do ato de turbação ou esbulho que lhe impôs, mas contra a afirmação de que o bem constrito está na esfera de responsabilidade patrimonial do executado.
Faz-se de suma importância relembrar o enunciado da Súmula 84 do STJ, que preceitua que é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda, ainda que desprovido de registro.
Na hipótese, o imóvel adquirido ainda estava em fase de construção, razão pela qual o instrumento particular de compra e venda deve ser considerado para comprovação da posse, admitindo-se, por via de consequência, a oposição dos embargos de terceiro.
É possível a oposição de embargos de terceiro com passe em compromisso de compra e venda desprovido de registro, ainda que a posse direta não tenha sido concretizada por se tratar de imóvel em construção. Aplicação da Súmula 84/STJ.
RECURSO ESPECIAL
Não são cabíveis embargos de terceiro para desconstituir decisão judicial que permite a averbação de protesto contra a alienação de bens na matrícula do imóvel.
REsp 1.758.858-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 25/05/2020
José estava cabreiro que Arnaldo poderia alienar seus bens e prejudicar direitos creditícios futuros. Para evitar tal evento (e que os adquirentes alegassem boa-fé e desconhecimento), José fez pedido judicial para a averbação do protesto contra a alienação de bens na matrícula do imóvel, o que foi deferido.
Um terceiro que adquiriu o imóvel apresentou embargos de terceiro contra essa decisão. Cinge-se a controvérsia ao cabimento desses embargos na hipótese.
CPC, Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro.
§ 1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor.
§ 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos:
I – o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843;
II – o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução;
III – quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte;
IV – o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos.
R: Não.
Os embargos de terceiro são remédio processual à disposição do terceiro prejudicado por um esbulho judicial, o qual se configura quando a atuação jurisdicional alcança bens que excedam os limites patrimoniais da obrigação exigida.
Entretanto, o protesto é medida judicial destinada a comprovar ou documentar uma manifestação formal de vontade do promovente, o qual busca, por meio de referido procedimento, COMUNICAR a terceiros interessados sua intenção de fazer atuar no mundo jurídico uma determinada pretensão. Desse modo, o protesto, por si mesmo, não modifica relações jurídicas, servindo apenas ao desiderato de dar publicidade a uma comunicação de intenções do promovente.
Portanto, a averbação do protesto contra a alienação de bens na matrícula do imóvel não cumpre outro propósito senão o de dar a efetiva publicidade da manifestação de vontade do promovente, sem diminuir ou acrescentar direitos das partes interessadas, tampouco constituir efetivo óbice à negociação ou à escrituração da compra e venda.
Os embargos de terceiro destinam-se à desconstituição de uma apreensão judicial de um bem e, com efeito, NÃO são o procedimento adequado à obtenção do registro da escritura da compra e venda de imóvel, uma vez que ausente o esse pressuposto essencial de seu cabimento.
Como a decisão judicial que permite a averbação de protesto na matrícula de um imóvel dá mera publicidade da manifestação de vontade do promovente, estão ausentes quaisquer efeitos sobre as relações jurídicas e direitos, não se admitindo embargos de terceiro para atacar tal ato.
RECURSO ESPECIAL
Nos casos em que o acolhimento da pretensão não tenha correlação com o valor da causa ou não se observe proveito econômico com a extinção sem resolução do mérito da execução fiscal, os honorários de sucumbência devem ser arbitrados por apreciação equitativa, com observância dos critérios dos §§ 2º e 8º do art. 85 do CPC/2015.
REsp 1.776.512-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 22/05/2020
Trata-se de caso em que a execução fiscal foi extinta sem julgamento de mérito, mantendo-se hígida a cobrança do tributo, que poderá ser repetida, desde que sanado o vício. O juiz arbitrou honorários por equidade, mas os advogados piraram, entendendo que o juiz deveria aplicar 20% do valor do tributo exigido (o que seria uma bolada!), conforme expressa disposição legal. E aí?
CPC, Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
[…]
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I – o grau de zelo do profissional;
II – o lugar de prestação do serviço;
III – a natureza e a importância da causa;
IV – o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
[…]
§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
R: Pode.
O CPC/2015, em seu art. 85, estabelece novos parâmetros objetivos para a fixação da verba honorária, com a estipulação de percentuais mínimos e máximos sobre a dimensão econômica da demanda (§ 2º), inclusive nas causas envolvendo a Fazenda Pública (§ 3º), de modo que, na maioria dos casos, a avaliação subjetiva dos critérios legais a serem observados pelo magistrado servirá apenas para que ele possa justificar o percentual escolhido dentro do intervalo permitido.
Interpretando as regras do art. 85 do CPC/2015, a Segunda Seção, no julgamento do REsp 1.746.072/PR, pacificou o entendimento de que a fixação de honorários de sucumbência deve seguir a seguinte ordem de preferência:
Tem-se que o “valor da condenação” e o “proveito econômico obtido” foram erigidos como base de cálculo para a fixação dos honorários de sucumbência, como referido pelo art. 85, §§ 2° e 3°, do CPC/2015. Para o caso das execuções fiscais, essas bases de cálculo, em regra, têm correlação com o crédito tributário e os encargos legais constantes da certidão de dívida ativa (art. 6°, § 4º, da Lei 6.830/1980).
Dito isso, o conceito do “proveito econômico obtido” com o provimento jurisdicional, à semelhança do que ocorre com o “valor da condenação“, deve guardar relação direta com o bem da vida controvertido, de sorte que o desmembramento da lide em diversas ações não venha a acarretar perplexidade na aplicação dos honorários, segundo o art. 85 do CPC/2015.
Para o caso das execuções fiscais, há situações jurídicas que implicam o acolhimento da pretensão do devedor sem que algum proveito econômico seja obtido, NÃO havendo impacto no crédito inscrito em dívida ativa (valor originário, juros e demais encargos), o qual poderá continuar sendo cobrado, ou novamente cobrado, do mesmo devedor e/ou dos demais responsáveis, se o exercício da pretensão executória ainda estiver dentro do prazo fixado pela lei.
Nesses casos, embora seja possível o arbitramento da verba honorária, deve-se reconhecer que o proveito econômico ou o valor da causa não poderão ser utilizados como parâmetro único para essa providência, pois a extinção da execução NÃO interfere na subsistência do crédito tributário cobrado, o qual, a depender do resultado da ação conexa em que está sendo discutido, ainda poderá ser exigido em sua totalidade.
Não há, em verdade, um proveito econômico imediato alcançado pela parte devedora, e sim uma transferência, um diferimento da discussão relativa ao bem da vida controvertido. E esse tempo ganho com o não pagamento do tributo, de fato, é inestimável, pois o sucesso da pretensão do devedor não terá, em tese, nenhum impacto sobre o cálculo do débito inscrito em dívida ativa, já que atualizável na forma da lei.
Não se trata de afirmar que o proveito econômico obtido com a sentença de extinção da execução não é mensurável, o que atrairia a regra do art. 85, § 4°, III, do CPC/2015 (erige como base de cálculo subsidiária para honorários o valor atualizado da causa). Trata-se de afirmar que é INEXISTENTE ou IRRISÓRIO o proveito econômico alcançado com a extinção da execução sem julgamento do mérito, uma vez que a obrigação tributária, o crédito tributário e a existência de relação jurídica tributária (bens da vida controvertidos) ainda são discutidos em sede de ações conexas, só se observando algum proveito econômico com o julgamento definitivo daquelas ações.
Também NÃO é o caso de se negar vigência ao § 6° do art. 85 do CPC/2015 que determina, como anotado acima, a aplicação dos critérios previstos nos §§ 2º e 3º, independentemente de qual seja o conteúdo da decisão. Antes, busca-se evitar a indevida aplicação em DUPLICIDADE da nova tarifação dos honorários sucumbenciais estabelecida pelo legislador.
Na linha do que foi acima desenvolvido, a extinção da execução fiscal sem julgamento de mérito NÃO tem impacto no crédito tributário, NÃO havendo proveito econômico auferível da sentença, uma vez que ainda possível a cobrança do crédito na eventualidade da exclusão da causa suspensiva da exigibilidade, de modo que a verba honorária deve seguir os critérios do § 2º, mediante apreciação equitativa do juiz, conforme autorizado pelo § 8º do art. 85 do CPC/2015.
Execução fiscal. Extinção sem resolução do mérito. Pretensão que não tem correlação com o valor da causa ou que não permita estimar eventual proveito econômico. Honorários advocatícios. Equidade. Art. 85, §§ 2º e 8º do CPC/2015.
RECURSO ESPECIAL
A cessão de direitos hereditários sobre bem singular viabiliza a transmissão da posse, que pode ser objeto de tutela específica na via dos embargos de terceiro.
REsp 1.809.548-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020
Mário adquiriu direitos hereditários sobre imóvel pertencente a espólio, cedidos a terceiros antes de terminada a partilha com a anuência daquelas que se apresentavam como únicas herdeiras.
Só que, para variar, deu problema! Depois Mário foi surpreendido com a notícia de que havia o reconhecimento de outros dois sucessores por sentença proferida em ação de investigação de paternidade cumulada com petição de herança.
Ele busca a comprovação da propriedade/posse do imóvel objeto de penhora, por meio de embargos de terceiro.
Art. 677. Na petição inicial, o embargante fará a prova sumária de sua posse ou de seu domínio e da qualidade de terceiro, oferecendo documentos e rol de testemunhas.
§ 1º É facultada a prova da posse em audiência preliminar designada pelo juiz.
§ 2º O possuidor direto pode alegar, além da sua posse, o domínio alheio.
§ 3º A citação será pessoal, se o embargado não tiver procurador constituído nos autos da ação principal.
§ 4º Será legitimado passivo o sujeito a quem o ato de constrição aproveita, assim como o será seu adversário no processo principal quando for sua a indicação do bem para a constrição judicial.
CPC, Art. 678. A decisão que reconhecer suficientemente provado o domínio ou a posse determinará a suspensão das medidas constritivas sobre os bens litigiosos objeto dos embargos, bem como a manutenção ou a reintegração provisória da posse, se o embargante a houver requerido.
Parágrafo único. O juiz poderá condicionar a ordem de manutenção ou de reintegração provisória de posse à prestação de caução pelo requerente, ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente.
O Código Civil de 2002 dispõe: “Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública”. Só que o § 2º do mesmo artigo dispõe que “É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente”.
Então, como regra, pode ceder os direitos hereditários como um TODO (parcela da herança), mas a cessão de bem um bem singular é INEFICAZ.
ATENTE-SE aos detalhes!
R: Procedentes.
Embora CONTROVERTIDA a matéria, tanto na doutrina como na jurisprudência dos tribunais, o fato de não ser a cessão de direitos hereditários sobre bem individualizado eivada de nulidade, mas apenas ineficaz em relação aos coerdeiros que com ela não anuíram, é o quanto basta para, na via dos embargos de terceiro, assegurar à cessionária a manutenção de sua posse.
A cessão de direitos hereditários de bem determinado não possui qualquer nulidade. Trata-se de negócio jurídico válido, mas com eficácia condicionada que não impede a transmissão da posse. Assim, viável a defesa da propriedade/posse via embargos de terceiro.
RECURSO ESPECIAL
A notificação premonitória constitui pressuposto processual para ação de despejo em locação por denúncia vazia de contrato por prazo indeterminado.
REsp 1.812.465-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020
Gertrudes alugou imóvel com contrato por prazo de 3 anos, depois do que a locação passou a ter prazo indeterminado. Segundo ela, sempre pagou os aluguéis em dia. Em uma bela manhã de verão, enquanto degustava seu café na varanda, recebeu um oficial de justiça, o qual a citou de ação de DESPEJO (denúncia vazia: saia da casa porque é minha e não quero indicar o motivo). Ela pirou os coco, dizendo que jamais recebera notificação premonitória a autorizar tal ação.
Lei n. 8.245/1991, Art. 46. Nas locações ajustadas por escrito e por prazo igual ou superior a trinta meses, a resolução do contrato ocorrerá findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso.
§ 1º Findo o prazo ajustado, se o locatário continuar na posse do imóvel alugado por mais de trinta dias sem oposição do locador, presumir – se – á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e condições do contrato.
§ 2º Ocorrendo a prorrogação, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo, concedido o prazo de trinta dias para desocupação.
R: Absolutamente!
A notificação premonitória para o encerramento do contrato de locação por denúncia vazia é OBRIGATÓRIA e, assim, não seria permitido ao locador ajuizar uma ação de despejo sem ser conferido ao locatário o aviso prévio de que trata o art. 46, § 2º, da Lei do Inquilinato.
A necessidade da referida notificação, previamente ao ajuizamento da ação de despejo, encontra fundamentos em uma série de motivos práticos e sociais e tem a finalidade precípua de reduzir os impactos negativos que necessariamente surgem com a efetivação do despejo.
A doutrina aponta uma EXCEÇÃO para a ocorrência da notificação premonitória, que é o ajuizamento da ação de despejo nos 30 (trinta) dias subsequentes ao término do prazo do contrato de locação. Somente nessa hipótese a citação da ação de despejo poderia substituir a notificação premonitória.
Assim, em se tratando de contrato por prazo indeterminado, caso a ação de despejo seja ajuizada sem a prévia notificação, deverá ser extinto o processo, sem a resolução do mérito, por falta de condição essencial ao seu normal desenvolvimento.
Locação residencial. Contrato por prazo indeterminado. Denúncia vazia. Ação de despejo. Notificação premonitória. Obrigatoriedade.
RECURSO ESPECIAL
São penhoráveis os valores oriundos de empréstimo consignado, salvo se o mutuário comprovar que os recursos são necessários à de sua manutenção e de sua família.
REsp 1.820.477-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 27/05/2020
Malaquias tinha umas dívidas na praça. Ele não pagava e não pagava e não pagava. Só que um dia Malaquias pegou um empréstimo consignado e quando foi sacar a quantia (para seu deleite), percebeu que nada havia na conta (para seu desespero). Ele foi reclamar na justiça que o valor era impenhorável, pois como consignado, trata-se de verdadeiro adiantamento de salário.
CPC, Art. 831. A penhora deverá recair sobre tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal atualizado, dos juros, das custas e dos honorários advocatícios.
CPC, Art. 833. São impenhoráveis:
I – os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II – os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
III – os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
IV – os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º ;
V – os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado;
VI – o seguro de vida;
VII – os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;
IX – os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;
X – a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;
XI – os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei;
XII – os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra.
R: Como regra, SIM.
No empréstimo consignado, o mutuário (devedor) recebe determinada quantia do mutuante (instituição financeira ou cooperativa de crédito) e, em contrapartida, ocorre a diminuição do salário, devido aos descontos efetuados diretamente na folha de pagamento.
Assim, essa modalidade de empréstimo compromete a renda do trabalhador, do pensionista ou do aposentado, podendo reduzir seu poder aquisitivo e prejudicar sua subsistência. Em razão disso, a jurisprudência uniforme desta Corte Superior sedimentou a legalidade na limitação dos descontos efetuados em folha de pagamento do mutuário.
Porém, ainda que as parcelas do empréstimo contratado sejam descontadas diretamente da folha de pagamento do mutuário, a origem desse valor NÃO é salarial, pois NÃO se trata de valores decorrentes de prestação de serviço, motivo pelo qual não possui, em regra, natureza alimentar.
Não há norma legal que atribua expressamente a verba derivada de empréstimo consignado a proteção da impenhorabilidade.
Conclusão em sentido contrário provocaria a ampliação do rol TAXATIVO previsto no art. 833 do cpc/2015, tendo em vista que o empréstimo pessoal, ainda que na modalidade consignada, não encontra previsão no referido dispositivo. Por constituir exceção ao princípio da responsabilidade patrimonial (art. 831 do CPC/2015), NÃO se admite interpretação extensiva.
Por tais motivos, os valores decorrentes de empréstimo consignado, em regra, NÃO são protegidos pela impenhorabilidade, por NÃO estarem abrangidos pelas expressões vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, conforme a primeira parte do inciso IV art. 833 do CPC/2015.
A proteção da impenhorabilidade ocorre somente se o mutuário (devedor) comprovar que os recursos oriundos do empréstimo consignado são necessários à sua manutenção e à de sua família. Essa interpretação decorre do disposto no citado art. 833, IV, do CPC/2015: “destinadas ao sustento do devedor e de sua família”.
Não há impenhorabilidade do empréstimo consignado (descontado do salário), exceto se se comprovar a necessidade da verba para a manutenção própria e da família.
RECURSO ESPECIAL
Havendo mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade, permanecendo o produto sob o domínio do contribuinte, não haverá incidência do IPI.
REsp 1.402.138-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 22/05/2020
A empresa Produzimus S/A transferiu bens que estavam em um estabelecimento (em uma cidade) para outro estabelecimento (filial) de sua propriedade (em outra cidade). Os fiscais de imposto, rapidinho, realizaram cobrança de tributo, alegando que houve a saída de produtos do estabelecimento, o que daria ensejo à cobrança de IPI.
A sede arrecadatória do Fisco não tem fim…
CTN, Art. 46. O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador: I – o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira; II – a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do artigo 51; III – a sua arrematação, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão. Parágrafo único. Para os efeitos deste imposto, considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo.
STJ, Súmula 166 – Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.
R: Nã-na-ni-na-NÃO.
O aspecto MATERIAL do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI alberga dois momentos distintos e necessários:
a) industrialização, que consiste, nos termos do art. 4º do Decreto n. 7.212/2010 (Regulamento do IPI), na operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para o consumo, tal como transformação, beneficiamento, montagem, acondicionamento ou reacondicionamento e renovação;
b) transferência de propriedade ou posse do produto industrializado, que deve ser onerosa.
A SAÍDA do estabelecimento a que refere o art. 46, II, do CTN, que caracteriza o aspecto temporal da hipótese de incidência, pressupõe, logicamente, a MUDANÇA de titularidade do produto industrializado.
Se houver mero deslocamento para outro estabelecimento ou para outra localidade, permanecendo o produto sob o domínio do contribuinte, NÃO haverá incidência do IPI.
Essa compreensão se alinha ao pacífico entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, consolidado em relação ao ICMS, que se aplica, guardada as devidas peculiaridades, ao tributo sob exame, nos termos da Súmula 166 do STJ.
A saída do estabelecimento do contribuinte, para fins de Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, exige a mudança de titularidade, não bastando o mero deslocamento do produto para prestação de serviços.
RECURSO ESPECIAL
O benefício fiscal consistente em permitir a manutenção de créditos de PIS e Cofins, ainda que as vendas e revendas realizadas pela empresa não tenham sido oneradas pela incidência dessas contribuições no sistema monofásico, é extensível às pessoas jurídicas não vinculadas ao REPORTO.
REsp 1.861.190-RS, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, por maioria, julgado em 26/05/2020, DJe 29/05/2020
Sempre que há dificuldades de fiscalização em operações realizadas pelas empresas, o Fisco determina que a tributação para tais operações seja diferenciada, concentrando a tributação nos fabricantes e importadores, de modo a reduzir o fluxo de informações e permitir ao Fisco o processo facilitado de fiscalização. Esse é o caso da tributação monofásica, estabelecido para o recolhimento certos produtos em que há PIS e da COFINS.
Só que a Lei n. 11.033, de 21 de dezembro de 2004, ao disciplinar o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária – REPORTO, instituiu benefícios fiscais como a suspensão da contribuição ao PIS e da Cofins, convertendo-se em operação, inclusive de importação, sujeita à alíquota zero após o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados da data da ocorrência do respectivo fato gerador, das vendas e importações realizadas aos beneficiários do REPORTO (art. 14, § 2º).
Que ótimo, não? Para ficar melhor ainda, a legislação aplicável assegura a manutenção dos créditos existentes de PIS e da Cofins dessas revendas não tributadas. QUE MARAVILHA!
A pergunta é: e quando houver revenda de produtos por pessoas jurídicas não participantes do regime do REPORTO, elas também poderão manter o creditamento das operações anteriores ou terão de estornar esses valores?
As Leis ns. 10.637/02 e 10.833/03, ao regerem o sistema não cumulativo da contribuição ao PIS e da Cofins, expressamente definem as situações nas quais é possível realizar o creditamento do imposto recolhido nas operações anteriores.
De igual forma, excluem do direito ao crédito o valor da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, QUANDO revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota zero, isentos ou não alcançados pela contribuição (vide informativo 670 do STJ).
A legislação aplicável assegura a MANUTENÇÃO dos créditos existentes de contribuição ao PIS e da Cofins (recolhidos previamente), ainda que a revenda (para FRENTE) não seja tributada.
Desse modo, permite-se àquele que efetivamente adquiriu créditos dentro da sistemática da não cumulatividade NÃO seja obrigado a estorná-los ao efetuar vendas submetidas à suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência da contribuição ao PIS e da Cofins.
R: SIM.
Tal tratamento se aplica também às operações realizadas por pessoas jurídicas não beneficiárias do regime do REPORTO, porquanto a legislação NÃO traz limitação expressa, além de não vincular as vendas de que trata às efetuadas na forma do art. 14 da mesma lei.
A análise conjunta do art. 3º, § 2º, II, de ambas as Leis ns. 10.637/2002 e 10.833/2003, com o comando contido no art. 17 da Lei n. 11.033/2004, impõe a conclusão segundo a qual este, por tratar-se de dispositivo legal posterior e que regula inteiramente a matéria de que cuidam aqueles, revogou-os tacitamente, a teor do art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB.
Assim, a vedação legal então existente para a utilização de créditos na tributação monofásica foi afastada por dispositivo legal que expressamente autoriza o crédito de contribuição ao PIS e da Cofins na hipótese.
É possível o aproveitamento de créditos (benefício fiscal concedido pela Lei n. 11.033/2004), com extensão às empresas não vinculadas ao Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária – REPORTO, no caso de PIS e Cofins (tributação pelo sistema monofásico).
RECURSO ESPECIAL
Na letra de câmbio não aceita não há obrigação cambial que vincule o sacado e assim, o sacador somente tem ação extracambial contra o sacado não aceitante, cujo prazo prescricional não sofre as interferências do protesto do título de crédito.
REsp 1.748.779-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2020, DJe 25/05/2020
Para pagamento de uma dívida, Joãozinho emitiu uma letra de câmbio e colocou Creosvaldo como aceitante e ele mesmo como tomador (beneficiário). Acontece que quando apresentado o título a Creosvaldo, este não o aceitou.
Joãozinho não fez a letra circular, tendo meramente a levado protesto e depois moveu ação cambial contra Creosvaldo, alegando que o protesto da letra interromperia o prazo prescricional da dívida originária.
A discussão está em se determinar se o protesto da letra não aceita e que não circulou tem o condão de interromper o prazo prescricional da dívida que serviu de causa subjacente para a emissão do título de crédito e se o aceitante (que recusou o pagamento) poderia ser cobrado em ação cambial.
CC, Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á: […] III – por protesto cambial.
R: NOPS.
É necessário estabelecer o efetivo alcance do artigo 202, inciso III, do diploma material civil, a fim de se afastar equívocos interpretativos que poderiam conduzir a efeitos indesejados pela norma.
Deve-se entender que a prescrição interrompida pelo protesto cambial se refere, conforme aduz a doutrina, única e exclusivamente à “ação cambiária, regra que se aplica por não existir na legislação cambiária norma sobre a matéria”.
De fato, por força do princípio da autonomia das relações cambiais, segundo o qual a relação jurídica causal que enseja a emissão do título e a relação cambiária são completamente distintas, não estando, nos termos da doutrina, “o cumprimento das obrigações assumidas por alguém no título vinculado a outra obrigação qualquer, mesmo ao negócio que deu lugar ao nascimento do título”, a interrupção da prescrição deve atingir unicamente a ação cambiária (não a ação pela dívida originária).
O prazo prescricional da ação cambial interrompida pelo protesto se refere àquela que pode ser exercitada pelo portador contra o responsável principal e os devedores indiretos.
Trata-se de decorrência do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra, que é regra especial em relação ao Código Civil quanto ao tema e que estabelece, em seu caput, o prazo de 3 anos para a ação contra o aceitante e, em sua alínea primeira, o prazo de um ano para as ações do portador contra os endossantes e contra o sacador, a contar da data do protesto feito em tempo útil, e do art. 71 do referido diploma legislativo, segundo o qual “a interrupção da prescrição só produz efeito em relação à pessoa para quem a interrupção foi feita”.
Portanto, nas letras de câmbio sacadas na vigência do Código Civil/2002 e nas quais NÃO tenha havido aceite pelo sacado, seu protesto somente produz efeito interruptivo sobre o prazo prescricional sobre as ações cambiárias do portador sobre o sacador e, na hipótese de ter ocorrido sua circulação, sobre os demais devedores indiretos.
R: Não senhor(a).
A ação cambial somente pode ser dirigida ao RESPONSÁVEL PRINCIPAL e, eventualmente, aos DEVEDORES indiretos do título, entre os quais não se enquadra o sacado não aceitante.
Dessa forma, na letra de câmbio não aceita, NÃO há obrigação cambial que vincule o sacado e, assim, o SACADOR somente tem ação extracambial contra o sacado não aceitante. Lembrando que o prazo prescricional NÃO sofre as interferências do protesto do título de crédito.
Letra de câmbio. Declaração unilateral do sacador. Aceite. Eventualidade. Facultatividade. Sacado não aceitante. Relação cambial. Inexistência. Protesto. Não interferência sobre o prazo prescricional da ação extracambial.
RECURSO ESPECIAL
Nos casos em que há aditamento ao plano de recuperação judicial, o termo inicial do prazo bienal de que trata o artigo 61, caput, da Lei n. 11.101/2005 deve ser a data da concessão da recuperação judicial.
REsp 1.853.347-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/05/2020, DJe 11/05/2020
A empresa Quasifalindus S/A pediu recuperação judicial. Após o plano ter sido aprovado, devido a circunstâncias supervenientes, houve aditamento ao plano de recuperação judicial, o que foi aceito pelos credores.
A questão então é definir se o termo inicial do prazo bienal de acompanhamento do judiciário da recuperação (art. 61, caput, da Lei n. 11.101/2005) deve ser: (a) a data da concessão da recuperação judicial; ou (b) a data em que foi homologado o aditivo ao plano.
Lei 11.101/2005, Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência […].
Lei 11.101/2005, Art. 56. Havendo objeção de qualquer credor ao plano de recuperação judicial, o juiz convocará a assembléia-geral de credores para deliberar sobre o plano de recuperação.
Lei 11.101/2005, Art. 61. Proferida a decisão prevista no art. 58 desta Lei, o devedor permanecerá em recuperação judicial até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até 2 (dois) anos depois da concessão da recuperação judicial.
§ 1º Durante o período estabelecido no caput deste artigo, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência, nos termos do art. 73 desta Lei.
§ 2º Decretada a falência, os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação judicial.
Realmente, a Lei n. 11.101/2005 NÃO prevê a possibilidade de que, após a aprovação do plano de recuperação judicial, sejam apresentados aditivos ou mesmo um novo plano para aprovação dos credores.
O art. 53 da LRF determina que o credor apresente o plano de recuperação judicial no prazo de 60 (sessenta) dias e, no caso de haver objeção de algum dos credores, que seja convocada assembleia geral de credores para deliberar a respeito de seus termos (art. 56 da LRF).
É certo que, na assembleia de credores, o plano poderá sofrer modificações, fruto das negociações ali desenvolvidas, e, caso haja concordância do devedor e inexistência de diminuição unicamente dos direitos garantidos aos credores ausentes, o plano será aprovado (também podendo ocorrer sua rejeição com a decretação da quebra). E, uma vez aprovado o plano de recuperação judicial, a lei de regência NÃO mais cuida da possibilidade de novas deliberações acerca de seu conteúdo.
Na prática, a situação é diferente e tanto a doutrina como a jurisprudência vêm admitindo aditivos ao plano por situações que somente se mostraram depois, teve de ser modificado, o que foi admitido pelos credores.
A LRF estabeleceu, em seu art. 61, caput, o prazo de 2 (dois) anos para o devedor permanecer em recuperação judicial, que se inicia com a concessão da recuperação judicial (art. 58 da LRF) e que se encerra com o cumprimento de todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até 2 (dois) anos do termo inicial.
É preciso esclarecer, desde logo, que o fato de a recuperação judicial se encerrar no prazo de 2 (dois) anos NÃO significa que o plano não possa prever prazos mais alongados para o cumprimento das obrigações, mas, sim, que o cumprimento somente será acompanhado pelo Judiciário, pelo Ministério Público e pelo administrador judicial nessa fase, para depois estar sob a fiscalização única dos credores.
Trata-se de uma PRESUNÇÃO do legislador, como ensina a doutrina, de “que o devedor que se submeteu a todos os percalços do pedido de recuperação, que preencheu todas as exigências legais, que cumpriu suas obrigações por dois anos consecutivos, certamente terá atingido uma situação na qual deverá cumprir todas as obrigações assumidas”. Passada a tempestade, ele se vira…
Algumas situações, entretanto, NÃO foram antevistas pelo legislador na aplicação do art. 61 da LRF, mas foram se apresentando na prática, como:
O estabelecimento de um prazo de supervisão judicial agrega ao processo de recuperação um qualificativo de transparência indispensável para angariar a confiança dos credores, facilitando as negociações organizadas, o cumprimento do stay period e a aprovação dos planos de recuperação judicial.
Sob essa perspectiva, era essencial que o legislador estabelecesse um prazo mínimo de efetiva fiscalização judicial da recuperação judicial, durante o qual o credor se veria confortado pela exigência do cumprimento dos requisitos para concessão da recuperação judicial e pela possibilidade direta de convolação da recuperação judicial em falência, no caso de descumprimento das obrigações (art. 61, § 1, da LRF), com a revogação da novação dos créditos (art. 61, § 2, da LRF).
Por outro lado, a fixação de um prazo máximo para o encerramento da recuperação judicial também se mostra indispensável para afastar os efeitos negativos de sua perpetuação, como o aumento dos custos do processo, a dificuldade de acesso ao crédito e a judicialização das decisões que cabem aos agentes de mercado, passando o juiz a desempenhar o papel de muleta para o devedor e garante do credor.
Assim, alcançado o principal objetivo do processo de recuperação judicial, que é a aprovação do plano de recuperação judicial, e encerrada a fase inicial de sua execução, quando as propostas passam a ser executadas, a empresa deve retornar à normalidade, de modo a lidar com seus credores sem intermediação.
Nesse cenário, (i) NÃO parece possível a redução do prazo de fiscalização judicial, ainda que a previsão esteja inserida em cláusula de plano de recuperação judicial aprovado pelos credores, pois contraria o art. 61 da LRF e a própria sistemática estabelecida pelo legislador.
Ainda dentro dessa lógica, (ii) o termo inicial para a fiscalização deve levar em conta o início da fase de execução do plano de recuperação judicial, com a adoção de providências para o cumprimento das obrigações assumidas.
No caso da (iii) apresentação de aditivos ao plano de recuperação judicial, o pressuposto é de que o plano estava sendo cumprido. Assim, NÃO há propriamente uma ruptura da fase de execução.
Dessa forma, NÃO há justificativa para a modificação do termo inicial da contagem do prazo bienal do artigo 61 da LRF. Decorridos 2 (dois) anos da concessão da recuperação judicial, ela deve ser encerrada, seja pelo cumprimento das obrigações estabelecidas para esse período, seja pela eventual decretação da falência.
O termo inicial do prazo bienal previsto no art. 61, caput, da Lei n. 11.101/2005 conta-se da data da concessão da recuperação judicial, sendo irrelevantes a existência de termos aditivos para esse fim.
RECURSO ESPECIAL
O ajuizamento de execução fiscal em momento anterior à decretação da quebra do devedor não enseja o reconhecimento da ausência de interesse processual do ente federado para pleitear a habilitação do crédito correspondente no processo de falência.
REsp 1.857.055-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020
A Fazenda Pública ajuizou execução fiscal contra a sociedade Nonopagus Ltda. Pouco depois houve a decretação quebra da empresa. A União se habilitou na falência, movimento que foi questionado pela massa falida, ao argumento de que como a execução fiscal já está em trâmite, a Fazenda não teria interesse de agir.
Lei n. 6.830/1980, Art. 29 – A cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata, liquidação, inventário ou arrolamento.
CTN, Art. 187. A cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento.
R: A Fazenda.
O STJ vem entendendo que os conteúdos normativos dos arts. 187 do CTN e 29 da Lei n. 6.830/1980 NÃO representam óbices à habilitação de créditos tributários no concurso de credores da falência; tratam eles, na verdade, de uma prerrogativa do ente público em poder optar entre receber o pagamento de seu crédito pelo rito da execução fiscal, ou mediante habilitação nos autos da falência.
Malgrado a prerrogativa de cobrança do crédito tributário via execução fiscal, inexiste óbice para que o Fisco (no exercício de juízo de conveniência e oportunidade) venha a requerer a habilitação de seus créditos nos autos do procedimento falimentar, submetendo-se à ordem de pagamento prevista na Lei n. 11.101/2005, o que implicará renúncia a utilizar-se do rito previsto na Lei n. 6.830/1980, ante o descabimento de garantia dúplice” (REsp 1.466.200/SP, Quarta Turma, DJe 12/2/2019).
Escolhendo, portanto, o ente estatal um dos ritos à sua disposição, ocorre a RENÚNCIA da utilização do outro — ou a paralisação de sua tramitação, especialmente, como se verifica na hipótese, no caso de a ação executiva ter sido ajuizada anteriormente à quebra —, na medida em que NÃO se pode admitir bis in idem.
Nesse contexto, NÃO há como extinguir o incidente que objetiva tal escolha, sob argumento de que o ente federativo carece de interesse processual.
Como é sabido, para o reconhecimento da existência de interesse de agir, é necessária a confluência de dois elementos: a UTILIDADE e a NECESSIDADE do pronunciamento judicial.
Na hipótese, constata-se que o instrumento processual eleito pela recorrente é apto a ensejar o resultado por ela pretendido, o que traduz a UTILIDADE da jurisdição; por outro, além de o incidente de habilitação de crédito constituir o único meio à disposição do Fisco para alcançar sua pretensão, verifica-se que a massa falida opôs resistência ao pedido deduzido em juízo, o que configura a NECESSIDADE da atuação do Judiciário.
Assim, “a prejudicialidade do processo falimentar para a satisfação do crédito tributário NÃO implica a ausência de interesse processual no pedido de habilitação do crédito tributário ou na penhora no rosto dos autos”.
O fato de haver execução fiscal ajuizada anteriormente à decretação da quebra do devedor não retira a possibilidade de habilitação de crédito pela Fazenda na falência, havendo interesse processual na espécie (utilidade e necessidade da pretensão de habilitação).
RECURSO ESPECIAL
Na hipótese de responsabilidade civil de médicos pela morte de paciente em atendimento custeado pelo SUS incidirá o prazo do art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, segundo o qual prescreverá em cinco anos a pretensão de obter indenização.
REsp 1.771.169-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe 29/05/2020
Paciente foi atendido em hospital particular conveniado para realizar atendimentos via SUS. A família entende que houve erro médico e busca reparação (ação de responsabilidade civil contra os doutores). Aplica-se o CDC à causa? Qual o prazo prescricional da ação reparatória?
Segundo estabelecem os arts. 196 e seguintes da CF/1988, a saúde, direito fundamental de todos, é DEVER do Estado, cabendo à iniciativa privada participar, em caráter complementar (art. 4º, § 2º, da Lei n. 8.080/1990), do conjunto de ações e serviços que visem favorecer o acesso universal e igualitário às atividades voltadas a sua promoção, proteção e recuperação, constituindo um sistema único – o SUS.
A participação complementar da iniciativa privada na execução de ações e serviços de saúde se formaliza mediante contrato ou convênio com a administração pública (parágrafo único do art. 24 da Lei n. 8.080/1990), nos termos da Lei n. 8.666/1990 (art. 5º da Portaria n. 2.657/2016 do Ministério da Saúde), utilizando-se como referência, para efeito de remuneração, a Tabela de Procedimentos do SUS (§ 6º do art. 3º da Portaria n. 2.657/2016 do Ministério da Saúde).
R: NÃO.
Quando prestado diretamente pelo Estado, no âmbito de seus hospitais ou postos de saúde, ou quando delegado à iniciativa privada, por convênio ou contrato com a administração pública, para prestá-lo às expensas do SUS, o serviço de saúde constitui serviço público social.
A participação complementar da iniciativa privada — seja das pessoas jurídicas, seja dos respectivos profissionais — na execução de atividades de saúde caracteriza-se como serviço público indivisível e universal (uti universi), o que AFASTA a incidência das regras do CDC.
R: Quinquenal.
Afastada a incidência do art. 27 do CDC, aplica-se na espécie o art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, segundo o qual prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados pelos agentes de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.
“Tal norma (art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997), por ter natureza especial, destinando-se clara e especificamente aos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público ou privado prestadoras de serviços públicos, não foi revogada, expressa ou tacitamente, pelo art. 206, § 3º, V, do CC/2002, de natureza geral”, e de que “o Poder Judiciário, na sua atividade de interpretação e de aplicação da lei, têm considerado o prazo de 5 (cinco) anos mais adequado e razoável para a solução de litígios relacionados às atividades do serviço público, sob qualquer enfoque” (REsp 1.083.686/RJ, Quarta Turma, julgado em 15/08/2017, DJe de 29/08/2017).
No caso de norte de paciente atendido em hospital particular conveniado ao SUS, havendo a prestação de serviço público indivisível e universal (uti universi), não se aplica o CDC, mas sim o art. 1º-C da Lei n. 9.494/1997, de modo que o prazo prescricional para a ação de responsabilidade civil dos médicos é quinquenal.
REVISÃO CRIMINAL
Na falsidade ideológica, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é o momento da consumação do delito e não o da eventual reiteração de seus efeitos.
RvCr 5.233-DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 13/05/2020, DJe 25/05/2020
Josivaldo cometeu crime de falsidade ideológica em 2003 e 2007, quando incluiu (pela primeira vez) sócios “laranja” no contrato social de sua empresa. Só que aí o crime teria prescrito.
O Ministério Público, para afastar a prescrição punitiva, alegava que tais crimes foram reiterados quando, por ocasião das alterações contratuais ocorridas em 21/06/2010, 1°/06/2011 e 26/07/2011, deixou-se de regularizar o nome dos sócios verdadeiramente titulares da empresa, mantendo-se o nome dos “laranjas” (pessoas interpostas).
CP, Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
R: Da consumação do delito.
A falsidade ideológica é crime FORMAL e INSTANTÂNEO, cujos efeitos podem se protrair no tempo. A despeito dos efeitos que possam, ou não, gerar, ela se consuma no momento em que é praticada a conduta.
Diante desse contexto, o termo inicial da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva é o momento da consumação do delito e NÃO o da eventual reiteração de seus efeitos.
NÃO há como se entender que constitui novo crime a OMISSÃO em corrigir informação falsa inserida em documento público, quando o agente teve oportunidade para tanto.
Tampouco há como se entender que a lei pune um crime instantâneo porque ele continua produzindo efeitos depois de sua consumação.
O delito de falsidade ideológica é crime instantâneo, cujos efeitos podem se protrair no tempo. A prescrição da pretensão punitiva tem como termo inicial a consumação do delito.
AGRAVO REGIMENTAL em HABEAS CORPUS
Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de estelionato qualificado por médico que, no desempenho de cargo público, registra o ponto e se retira do hospital.
AgRg no HC 548.869-RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 25/05/2020
Jeremias é médico malandro. Cheio das firulas ele costuma, no desempenho de seu cargo público (médico do hospital universitário), registrar seu ponto e se retirar do local de trabalho (posto de saúde), sem cumprir sua carga horária — imediatamente após bater o ponto. Só que ele foi pego com a boca na botija e acabou denunciado por estelionato.
Indignado, ele bradou: “se todo mundo pode entrar em supermercado e furtar uns chocolates, por que eu também não posso aprontar das minhas?”… ele queria que lhe fosse reconhecido a excludente de tipicidade dematerial do crime bagatelar, com o trancamento de ação penal.
R: De jeito nenhum!
É certo que o princípio da insignificância, inspirado na fragmentariedade do Direito Penal e na leniência da jurisprudência pátria, tem sido aplicado a rodo pra tudo quanto é tipo de crime.
Acontece que a jurisprudência do STJ NÃO tem admitido, nos casos de prática de estelionato qualificado cometido por médicos, a incidência de tal princípio da insignificância, em razão do prejuízo aos cofres públicos, por identificar maior reprovabilidade da conduta delitiva.
Destarte, INCABÍVEL o pedido de trancamento da ação penal, sob o fundamento de inexistência de prejuízo expressivo para a vítima, porquanto, em se tratando de hospital universitário, os pagamentos aos médicos são provenientes de verbas federais.
Médico em hospital público que realiza o registro de ponto e procede a uma fugidinha (imediata saída), sem cumprimento da carga horária, comete em tese estelionato qualificado, para o qual o princípio da insignificância é inaplicável.
AGRAVO REGIMENTAL no AGRAVO em RECURSO ESPECIAL
O acórdão confirmatório da condenação é causa interruptiva da prescrição.
AgRg no AREsp 1.668.298-SP, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020
A jurisprudência desta Corte Superior vinha decidindo no sentido de que o acórdão confirmatório da condenação não é causa interruptiva da prescrição. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, em decisão tomada em plenário, nos autos do HC 176.473/Roraima, que tem como relator o Min. Alexandre de Moraes, em 27/4/2020, fixou tese em sentido inteiramente contrário: é SIM causa interruptiva da prescrição.
CP, Art. 117 – O curso da prescrição interrompe-se: […] IV – pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis.
R: Segue o líder…
O STJ, em recente decisão de Relatoria do Min. Reynaldo Soares da Fonseca, apontou a alteração de entendimento, como se verifica na PET no AgRg no REsp 1.770.678/PA, DJe 30/4/2020.
Assim, deve-se acompanhar o que decidiu o STF: “nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código Penal, o acórdão condenatório sempre interrompe a prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença de 1º grau, seja mantendo, reduzindo ou aumentando a pena anteriormente imposta” (vide Info 965 do STF).
O acórdão confirmatório da condenação é cauda de interrupção do prazo da prescrição da pretensão punitiva.
RECURSO ESPECIAL
A ausência de previsibilidade de que a ofensa chegue ao conhecimento da vítima afasta o dolo específico do delito de injúria, tornando a conduta atípica.
REsp 1.765.673-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 26/05/2020, DJe 29/05/2020
Josefina (sempre aprontando das suas) falou poucas e boas (na verdade muita coisa ruim) sobre Crementina ao telefone. Segundo ela, não imaginava que suas lorotas (ofensas) iriam chegar aos ouvidos da desafeta. Chegaram (Crementina estava ouvindo a tudo de uma extensão do telefone).
Pois bem. Crementina disse que ficou extremamente abalada — moveu queixa-crime pelo delito de injúria.
A defesa de Jose Josefina lito alegou que ela jamaix quis injuriar, tanto que não teve o dolo de que os comentários chegassem a Crementina e não tinha como prever que estava sendo pega em uma armadilha (a da extensão do telefone). Por isso ausente o dolo (a intenção) de atingir a honra subjetiva, elemento fundamental para a configuração do crime.
CP, Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
§ 1º – O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
§ 2º – Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
R: NÃO.
O cerne da questão diz respeito (1) ao momento da consumação e (2) ao dolo específico exigido no tipo do art. 140, § 3º, do Código Penal.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assenta que o momento da CONSUMAÇÃO do delito de injúria acontece quando a vítima toma conhecimento da ofensa.
Ademais, o tipo penal em questão exige que a ofensa seja dirigida ao ofendido com a INTENÇÃO (dolo específico) de menosprezá-lo, ofendendo-lhe a honra subjetiva (o conceito que a vítima tem de si mesma).
Honra SUBJETIVA | Honra OBJETIVA |
Sentimento pessoal de íntimo; apreço por si mesmo no que se refere aos atributos físicos, morais ou intelectuais (autoestima, amor próprio). | Bom nome, reputação social, a imagem e a dignidade da vítima perante terceiros. |
Consuma quando a VÍTIMA é cientificada das ofensas | Consuma quando TERCEIROS ficam sabendo |
No caso, as palavras injuriosas foram proferidas por meio telefônico, NÃO sendo previsível que a vítima estivesse ouvindo o teor da conversa pela extensão telefônica.
Como a injúria se consuma com a ofensa à honra SUBJETIVA de alguém, não há falar em dolo específico no caso em que a vítima não era o interlocutor na conversa telefônica e, acidentalmente, tomou conhecimento do seu teor.
Injúria racial. Artigo 140, § 3º, do Código Penal. Conversa telefônica. Conhecimento acidental da vítima. Ofensa à honra subjetiva. Ausência de dolo específico. Atipicidade da conduta.
RECURSO em HABEAS CORPUS
O ato de delegação da condução e direção de produção de prova oral à autoridade estrangeira, a fim de que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, não encontra qualquer tipo de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial.
RHC 102.322-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 22/05/2020
No caso, o Tribunal de Grande Instância de Paris, França, solicitou cooperação jurídica em matéria penal, na modalidade auxílio direto, a fim de que fossem realizadas diversas diligências no Brasil, dentre as quais a oitiva do Recorrente e busca e apreensão no seu endereço, para subsidiar investigação pela prática dos crimes de falsificação e uso de documento falso, apropriação indébita, receptação, corrupção e lavagem de dinheiro.
O pedido da autoridade francesa foi embasado no Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal entre o Brasil e a França (Decreto n. 3.324/1999), na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção e na Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional.
O pleito foi encaminhado ao Ministério da Justiça do Brasil, que o remeteu ao Procurador-Geral da República, o qual, por sua vez, designou Procurador da República atuante na Cidade do Rio de Janeiro para a execução das diligências. O Membro do Ministério Público Federal requereu o deferimento das medidas assecuratórias ao Juízo da Vara Federal do Rio de Janeiro, no que foi atendido.
As diligências foram cumpridas. Contra essa decisão foi impetrado o writ, buscando a declaração de nulidade dos atos praticados pelo referido Juízo, oriundos do pedido de auxílio direto requerido pela Justiça francesa, em razão da ausência de exequatur pelo Superior Tribunal de Justiça no pedido de cooperação jurídica internacional e pelo fato de que na audiência designada todas as perguntas teriam sido formuladas direta e exclusivamente pela Autoridade Judiciária francesa.
R: Negativo…
Mister levar em consideração a natureza do pedido de cooperação internacional para o deslinde da questão, uma vez que a (1) carta rogatória e o (2) auxílio direto, apesar de conviverem no ordenamento jurídico como sistemas de cooperação internacional em matéria penal, são institutos com ritos e procedimentos DIVERSOS, principalmente, em razão das normas aplicáveis e da origem da decisão que ensejou o pedido estrangeiro.
DIFERENÇAS |
Na CARTA ROGATÓRIA passiva, há decisão judicial oriunda da Justiça rogante que precisa ser executada e cumprida no Estado rogado, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça o juízo de delibação, contudo SEM ADENTRAR-SE NO MÉRITO DA DECISÃO oriunda do país estrangeiro. |
No AUXÍLIO DIRETO passivo, há um pedido de assistência do Estado alienígena diretamente ao Estado rogado, para que este preste as informações solicitadas ou provoque a Justiça Federal para JULGAR a providência requerida (medida acautelatórias), conforme o caso concreto. Tudo isso baseado em Acordo ou Tratado Internacional de cooperação. |
In casu, NÃO há decisão judicial estrangeira a ser submetida ao juízo delibatório do Superior Tribunal de Justiça. O caso foi de pedido de assistência direta, o qual, por exigir pronunciamento judicial, foi submetido ao crivo da Justiça Federal nacional, que examinou amplamente o mérito do pedido.
Assim não há que falar em exequatur.
R: Negativo de novo…
Outra das insurgências consiste na nulidade da oitiva do recorrente, porque todas as perguntas teriam sido formuladas direta e exclusivamente pela Autoridade Judiciária francesa que acompanhava o Membro do Ministério Público Federal nomeado para realizar as diligências.
Pois bem. O Tribunal local afastou a alegação de nulidade da produção da prova em razão de o sistema persecutório da França ser muito diverso do sistema persecutório brasileiro. Tal fundamento, todavia, é inteiramente IRRELEVANTE para delimitação da existência, ou não, de ofensa à soberania nacional, dado que, independentemente das funções desempenhadas pelo Juiz de Instrução francês, quando comparado ao brasileiro, o que importa é o fato de tratar-se de autoridade pública estrangeira.
A Defesa tem razão ao questionar a legalidade da oitiva do recorrente, pois breve análise da gravação de vídeo da mencionada audiência é capaz de comprovar a veracidade da alegação de que as autoridades estrangeiras dirigiram e conduziram, por cerca de cinco horas seguidas, o ato de produção de prova oral.
É dizer: ao limitar-se a dar início ao ato de produção de prova, com posterior atribuição da palavra e da condução das perguntas às autoridades estrangeiras, o membro do Ministério Público Federal, ao qual foi confiada a realização do mencionado ato, desobedeceu ordem expressa da Procuradoria Geral da República, a qual fez constar a exigência de que a autoridade brasileira não apenas estivesse presente durante todo ato, como também o dirigisse.
R: Pode…
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, na Carta Rogatória n. 5.480/FR, também já houve a oportunidade de salientar que a presença de agentes públicos estrangeiros é permitida “sem que interfiram, direta ou indiretamente, na direção da audiência”.
Essa é a melhor interpretação a ser dada aos dispositivos do Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal entre o Brasil e a França (Decreto n. 3.324/1999), os quais demonstram nítida preocupação com os limites dos atos de cooperação ali previstos, a bem da preservação da soberania dos Estados requerente e requerido.
Em termos simples: o ato de delegação, expressa ou tácita, da condução e direção de produção de prova oral por autoridade estrangeira, a fim de que esta proceda diretamente à inquirição da testemunha ou do investigado, NÃO encontra qualquer tipo de respaldo constitucional, legal ou jurisprudencial.
Por conseguinte, trata-se de ato eivado de nulidade absoluta, por ofensa à soberania nacional, o qual NÃO pode produzir efeitos em investigações penais que estejam dentro das atribuições das autoridades brasileiras.
A cooperação jurídica internacional mediante auxílio direto, demanda que o ato delegado de condução de produção de prova oral seja realizado pela autoridade brasileira. Em caso de realização direta por autoridade estrangeira, há nulidade absoluta.
AGRAVO REGIMENTAL no RECURSO ESPECIAL
Tratando-se de medida socioeducativa aplicada sem termo, o prazo prescricional deve ter como parâmetro a duração máxima da internação (3 anos), e não o tempo da medida, que poderá efetivamente ser cumprida até que o socioeducando complete 21 anos de idade.
AgRg no REsp 1.856.028-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 19/05/2020
Joselito, adolescente, teve aplicada em favor de si medida socioeducativa sem prazo (semi-liberdade). Ele ficou se esquivando do cumprimento por longo tempo, até que falou com seu advogado e apresentou defesa dizendo que a medida já havia prescrito. Cabe prescrição nesse caso? Qual o parâmetro?
STJ, Súmula 338 – A prescrição penal é aplicável nas medidas sócio-educativas.
R: Sem dúvidas.
Nos termos do enunciado n. 338 da Súmula do STJ, a prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas.
R: 3 anos.
A jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que, uma vez aplicada medida socioeducativa sem termo final, deve ser considerado o período máximo de 3 anos de duração da medida de internação para o cálculo do prazo prescricional da pretensão socioeducativa, e não o tempo da medida, que poderá efetivamente ser cumprida até que o envolvido complete 21 anos de idade.
Na aplicação da medida socioeducativa sem termo final, faz-se o cálculo do prazo prescricional da pretensão punitiva tendo por parâmetro o limite máximo de 3 anos.
HABEAS CORPUS
É válida a extinção de medida socioeducativa de internação quando o juízo da execução, ante a superveniência de processo-crime após a maioridade penal, entende que não restam objetivos pedagógicos em sua execução.
HC 551.319-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020
Creidson tinha de cumprir medida de internação (por crimezinho básico: roubo qualificado), mas estava foragido (com mandado de busca aguardando cumprimento). Aí ele foi preso por crime de furto cometido na maioridade. Solto, foi informada a Vara da Infância. Só que, surpreendentemente, não só Creidson não foi internado como o processo de medida socioeducativa de internação foi extinto porque, segundo o juiz, não restam razões pedagógicas para sua execução. É isso mesmo?
R: Estamos no Brasil, amigos e amigas: EXTINGUE (segundo o STJ).
Segundo o STJ, cabe destacar que a Lei n. 12.594/2012, que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE, estabelece no art. 46, § 1º, o seguinte: “no caso de o maior de 18 (dezoito) anos, em cumprimento de medida socioeducativa, responder a processo-crime, caberá à autoridade judiciária decidir sobre eventual extinção da execução, cientificando da decisão o juízo criminal competente”.
No caso, o juízo da infância fundamentou a extinção da medida no fato de o adolescente ter alcançado a maioridade penal e na existência de novo fato delituoso enquanto estava em liberdade, entendendo o magistrado que não restam objetivos pedagógicos na presente execução de medida socioeducativa.
NÃO se verifica manifesta ilegalidade na decisão, visto que a extinção da medida socioeducativa pela superveniência de processo-crime após adolescente completar 18 anos de idade constitui uma FACULDADE, devendo o julgador fundamentar sua decisão, nos termos do art. 46, §1º, da Lei n. 12.594/2012.
Desse modo, o juízo da execução da medida de internação fundamentou validamente a desnecessidade dessa medida, porque já NÃO mais cumpre a finalidade socioeducativa, pois o paciente com 20 anos de idade continua praticando delitos e encontra-se preso preventivamente.
Ademais, a FINALIDADE das medidas previstas no Estatuto da Criança e Adolescente é distinta da pena por prática criminosa, pois enquanto aquela visa educar e socializar o adolescente, esta visa retribuir e reprimir condutas delituosas.
MEDIDA SOCIOEDUCATIVA | PENA |
Educar e Socializar | Retribuir e Reprimir |
Adolescência | Maioridade |
No caso de execução pendente da medida de internação, derivada Ato de infracional equiparado ao delito de roubo qualificado, atingida a maioridade e havendo a superveniência de crime, é viável a extinção da medida socioeducativa.
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