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Informativo STJ 615 | Informativo Estratégico

Olá, pessoal!

Hoje gostaria de divulgar o Informativo STJ 615 como parte do projeto Informativo Estratégico. Desta vez, temos  súmulas de Direito Penal e julgados de Direito Penal, Direito Civil, Direito do Consumidor e Direito Processual Civil com comentários dos nossos professores.

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1 Súmulas

1.1 Direito Penal

1.1.1 – Princípio da insignificância X Administração Pública

SÚMULA N. 599

O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública. Corte Especial, aprovada em 20/11/2017, DJe 27/11/2017.

Comentários pelo Prof. Michael Procópio Avelar

a) Apresentação resumida do caso

O princípio da insignificância, também chamado de bagatela, preconiza que Direito Penal não deve se preocupar com bagatelas, isto é, a configuração de uma infração penal exige que haja uma ofensa de alguma gravidade ao bem jurídico protegido.

Tem sua origem apontada no Direito Romano, em que se falava que de minima non curat praetor. Nos termos atuais, seria como dizer que o Poder Judiciário não deve se ocupar de coisas mínimas. No campo do Direito Penal, credita-se a Claus Roxin, jurista alemão, sua introdução, o que teria ocorrido em 1964.

A insignificância afasta a tipicidade da conduta, que passa a ser vista sob o âmbito formal e material. Na tipicidade formal, analisa-se se o fato ocorrido se amolda à norma penal, que funciona como uma forma-padrão para que se analise se o fato é típico ou não.

Essa é uma análise de encaixe, como se fossem a norma e o fato duas peças do brinquedo Lego. Já a tipicidade material exige, além de que a conduta se encaixe na norma, que haja relevância da lesão ou da ameaça de lesão ao bem jurídico. Se a lesão ou ameaça de lesão forem ínfimas, não haverá tipicidade material, por incidência do princípio da insignificância.

Podemos exemplificar com a subtração de um clipe ordinário. Se analisarmos sob o âmbito da tipicidade formal, haverá a adequação do fato à norma que tipifica o crime de furto.

Mas, no campo da tipicidade material, perceberemos que a mera subtração de um clipe, por ser insignificante, não enseja lesão de alguma relevância ao patrimônio da vítima. Conclui-se, portanto, que tal fato não é típico, por não passar pela barreira da tipicidade material. Portanto, a insignificância afasta a tipicidade material.

Tipicidade formal: subsunção do fato à norma.

Tipicidade material: relevância da lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 116.242 (17/09/2013), no âmbito de sua Primeira Turma, estabeleceu requisitos que vêm sendo, desde então, adotados para se aferir a incidência ou não do princípio da insignificância.

Esses requisitos, para o fim de memorização, podem ser relembrados pelo acróstico “MARI”, conforme destaque das primeiras letras:

Mínima ofensividade da conduta do agente;

Ausência de periculosidade social da ação;

Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento;

Inexpressividade da lesão jurídica causada.

Assim, analisando-se os requisitos do STF, surge a controvérsia sobre a possibilidade de aplicação do princípio aos crimes praticados contra a Administração Pública.

b) Conteúdo teórico pertinente

Com a edição dessa nova súmula, entende-se que, sempre que o delito for praticado contra a Administração Pública, não haverá incidência do princípio da insignificância. Podemos pensar, de imediato, em delitos envolvendo o patrimônio público, em período histórico em que o combate à corrupção é tema em pauta.

Ocorre que, sobre o tema, mostra-se importante analisar se o Supremo Tribunal Federal tem decidido neste mesmo sentido. Há um precedente da Segunda Turma da Corte Suprema que reconheceu a bagatela de um delito praticado contra a Administração Pública:

AÇÃO PENAL. Delito de peculato-furto. Apropriação, por carcereiro, de farol de milha que guarnecia motocicleta apreendida. Coisa estimada em treze reais. Res furtiva de valor insignificante. Periculosidade não considerável do agente. Circunstâncias relevantes. Crime de bagatela. Caracterização. Dano à probidade da administração. Irrelevância no caso. Aplicação do princípio da insignificância. Atipicidade reconhecida. Absolvição decretada. HC concedido para esse fim. Voto vencido. Verificada a objetiva insignificância jurídica do ato tido por delituoso, à luz das suas circunstâncias, deve o réu, em recurso ou habeas corpus, ser absolvido por atipicidade do comportamento.

HC 112.388/SP, Rel. p/ acórdão Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, Julgamento: 21/08/2012.

Verifica-se, portanto, que ainda que não demonstre uma jurisprudência consolidada, referido precedente demonstra não haver, de início, concordância entre as Cortes Superiores sobre o tema.

O que deve também ser refletido, aqui, é que o próprio STJ já possuía jurisprudência consolidada acerca da possibilidade de se aplicar o princípio em estudo ao crime de descaminho. Esta infração penal está localizada, no Código Penal, no Título XI, denominado “Dos Crimes contra a Administração Pública”, mais precisamente no Capítulo II, “Dos Crimes Praticados pelo Particular contra a Administração em Geral”. Quanto ao crime de descaminho, o STF também tem admitido o reconhecimento do chamado delito de bagatela.

Vejamos um julgado de cada um dos tribunais, os quais representam esse entendimento:

EMENTA HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL E DIREITO PENAL. DESCAMINHO. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INADMISSIBILIDADE DO WRIT. VALOR INFERIOR AO ESTIPULADO PELO ART. 20 DA LEI 10.522/2002. PORTARIAS 75 E 130/2012 DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. 1. Há óbice ao conhecimento de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática do Superior Tribunal de Justiça, cuja jurisdição não se esgotou. Precedentes. 2. A pertinência do princípio da insignificância deve ser avaliada considerando-se todos os aspectos relevantes da conduta imputada. 3. Para crimes de descaminho, considera-se, para a avaliação da insignificância, o patamar previsto no art. 20 da Lei 10.522/2002, com a atualização das Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda. Precedentes. 4. Descaminho envolvendo elisão de tributos federais em quantia pouco superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais) enseja o reconhecimento da atipicidade material do delito dada a aplicação do princípio da insignificância. 5. Habeas corpus extinto sem resolução de mérito. Ordem concedida de ofício para reconhecer a atipicidade da conduta imputada à paciente, com o consequente trancamento da ação penal na origem.

HC 121717/PR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, Julgamento: 03/06/2014.

RECURSO ESPECIAL. PROPOSTA DE AFETAÇÃO PARA FINS DE REVISÃO DO TEMA N. 157. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AOS CRIMES TRIBUTÁRIOS FEDERAIS E DE DESCAMINHO, CUJO DÉBITO NÃO EXCEDA R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). ART. 20 DA LEI N. 10.522/2002. ENTENDIMENTO QUE DESTOA DA ORIENTAÇÃO CONSOLIDADA NO STF, QUE TEM RECONHECIDO A ATIPICIDADE MATERIAL COM BASE NO PARÂMETRO FIXADO NAS PORTARIAS N. 75 E 130/MF – R$ 20.000,00 (VINTE MIL REAIS). AFETADO O RECURSO PARA FINS DE ADEQUAÇÃO DO ENTENDIMENTO. Considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, nos termos do art. 927, § 4º, do Código de Processo Civil, afetou-se recurso especial para fins de revisão da tese fixada no REsp n. 1.112.748/TO (representativo da controvérsia) – Tema 157 (Relator Ministro Felix Fischer, DJe 13/10/2009), a fim de adequá-la ao entendimento externado pela Suprema Corte, o qual tem considerado o parâmetro fixado nas Portarias n. 75 e 130/MF – R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para aplicação do princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho.

ProAfF no REsp 1688878/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Jr., Terceira Seção, DJe 01/12/2017.

Como este entendimento, de aplicação da insignificância ao delito de descaminho, já estava consolidado no âmbito do próprio Superior Tribunal de Justiça, é possível que este tribunal reconheça exceções à aplicação da sua nova súmula, como no caso do delito de descaminho. De todo modo, deve-se acompanhar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça após a elaboração do enunciado para se verificar como o tema será tratado.

c) Questão de prova

(CESPE/STF/Analista Judiciário – Área Judiciária/2008) É cabível a aplicação do princípio da insignificância para fins de trancamento de ação penal em que se imputa ao acusado a prática de crime de descaminho.

( ) Certo ( ) Errado

Resolução: a alternativa está correta, isto porque a jurisprudência do STF e a do STJ têm se orientado quanto à aplicação do princípio da insignificância ao referido delito. Deve-se lembrar que o referido princípio leva à atipicidade material da conta. Sendo atípico o fato, cabível o trancamento do processo penal. Note-se que o delito de descaminho, por sua localização no Código de Processo Penal, é um dos crimes contra a Administração Pública. Por conta disso, o novo enunciado da Súmula do STJ implicaria em se considerar a questão como errada, mas se deve ter em mente que a jurisprudência do próprio STJ tem admitido, de forma copiosa e reiterada, o reconhecimento da bagatela para este crime.

1.1.2 – Inexigibilidade da coabitação para configuração da violência doméstica

SÚMULA N. 600

Para a configuração da violência doméstica e familiar prevista no artigo 5º da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) não se exige a coabitação entre autor e vítima. Terceira Seção, aprovada em 22/11/2017, DJe 27/11/2017.

Comentários pelo Prof. Michael Procópio Avelar

a) Apresentação resumida do caso

A Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, que, nos termos do seu preâmbulo, cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; dentre outras providências.

Busca a combater a violência pratica contra a mulher, devido a sua maior fragilidade, decorrente de anos de tratamento desigual e de sua própria condição físico-biológica, que muitas vezes a deixa em situação de vulnerabilidade na sociedade. Prova disso é o número de mulheres assassinadas ou agredidas em seus próprios lares, local que deveria ser seu refúgio e local de paz.

Dentre as hipóteses de configuração da violência doméstica e familiar contra a mulher, há a prática de conduta, omissiva ou comissiva, baseada no gênero, que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, desde que ocorra no âmbito da unidade doméstica, no âmbito da família ou envolva qualquer relação íntima de afeto.

Apesar da abrangência das situações configuradoras da violência doméstica e familiar contra a mulher, surgiu a discussão a respeito da necessidade ou não de coabitação entre agente e vítima para incidência da Lei 11.340/2006.

b) Conteúdo teórico pertinente

A Lei 11.340/2006, em seu artigo 5º, traz as circunstâncias que caracterizam a denominada violência doméstica e familiar contra a mulher, o que atrai a incidência de seus regramentos:

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.

Sobre o tema, surgiu a controvérsia sobre a necessidade ou não de coabitação do agente e da vítima para incidência da Lei Maria da Penha. Pacificando o tema em seus órgãos, o Superior Tribunal de Justiça elaborou o seguinte enunciado, de número 600:

“Para configuração da violência doméstica e familiar prevista no artigo 5º da Lei 11.340/2006, Lei Maria da Penha, não se exige a coabitação entre autor e vítima.”

Desta forma, o entendimento hoje consolidado no STJ é de que a coabitação entre o sujeito passivo e o sujeito ativo da violência doméstica e familiar contra a mulher é desnecessária para a sua configuração, incidindo o regramento da Lei 11.340/2006 independentemente de habitarem ou não no mesmo local.

c) Questão de prova

(PUC-PR/TJ-PR/Analista Judiciário – Psicologia/2017) Conhecida como Lei Maria da Penha, a Lei 11.340/2006 criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Sobre o tema, assinale a alternativa CORRETA.

a) Para evitar represálias, em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, a autoridade policial está expressamente proibida de ouvir o agressor e as testemunhas.

b) A violência doméstica prevista na Lei Maria da Penha é unicamente a violência física, na qual o homem faz uso da força para subjugar a esposa.

c) Para preservar a integridade física e psicológica da mulher em situação de violência doméstica, o juiz poderá assegurar, quando necessário, o afastamento da mulher do local de trabalho, por até seis meses.

d) As relações pessoais que podem configurar atos de violência doméstica são necessariamente aquelas derivadas da relação entre homem e mulher, não se podendo aplicá-las a eventuais relações homoafetivas entre duas mulheres.

e) A configuração de atos de violência doméstica depende necessariamente de haver coabitação entre cônjuges.

Resolução: a autoridade policial não está proibida de ouvir o agressor e as testemunhas. A violência doméstica, como visto, não se limita à violência física, abrangendo também a psicológica e a sexual. O artigo 9º, em seu parágrafo segundo, inciso II, da Lei 11.340/06, prevê que o juiz assegurará à mulher, na situação de violência tratada por referida lei, a manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. O parágrafo único do artigo 5º da Lei Maria da Penha dispõe expressamente sobre a aplicação da legislação independentemente de orientação sexual dos envolvidos, não se limitando às relações heterossexuais, ou seja, entre homem e mulher. Como agora já sumulou o STJ, não há necessidade de coabitação entre agente e vítima para configuração da violência doméstica e familiar contra a mulher. Logo, a alternativa correta é a C.

2 Destaques do Informativo

2.1 Direito Civil

2.1.1 – REsp 1.364.668-MG

RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. IMÓVEL URBANO RESIDENCIAL. DENÚNCIA VAZIA. ART. 46 DA LEI Nº 8.245/1991. ACCESSIO TEMPORIS. CONTAGEM DOS PRAZOS DE PRORROGAÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. ART. 47, V, DA LEI DO INQUILINATO. TEMPO DE PRORROGAÇÃO. CÔMPUTO. CABIMENTO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Ação de despejo proposta pelo locador objetivando a retomada do imóvel com base em denúncia vazia do contrato (art. 46 da Lei nº 8.245/1991).
3. Acórdão recorrido que mantém a procedência do pedido para declarar extinto o contrato de locação e determinar a imissão na posse do imóvel.
4. A controvérsia consiste em definir o cabimento da denúncia vazia quando o prazo de 30 (trinta) meses, exigido pelo art. 46 da Lei nº 8.245/1991, é atingido com as sucessivas prorrogações do contrato de locação de imóvel residencial urbano.
5. O art. 46 da Lei nº 8.245/1991 somente admite a denúncia vazia se um único instrumento escrito de locação estipular o prazo igual ou superior a 30 (trinta) meses, não sendo possível contar as sucessivas prorrogações dos períodos locatícios (accessio temporis).
6. Para contrato de locação inicial com duração inferior a 30 (trinta) meses, o art. 47, V, da Lei nº 8.245/1991 somente autoriza a denúncia pelo locador se a soma dos períodos de prorrogações ininterruptas ultrapassar o lapso de 5 (cinco) anos.
7. Recurso especial provido.
(REsp 1364668/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 17/11/2017).

Comentários pelo Prof. Paulo Sousa

a) Apresentação resumida do caso

Uma pessoa (A) alugou seu imóvel a outra (B). O contrato foi fixado por 6 meses. Depois desse período, foi o contrato renovado por outro período e depois por mais outro período. Passados 30 meses, A notificou B a respeito de sua intenção de não mais alugar o imóvel.

B, por sua vez, contra-argumentou dizendo que não deixaria o imóvel, já que A não apresentou nenhuma das justificativas legais para tanto (denúncia cheia); ao contrário, apenas requisitou o imóvel, sem fundamentar o pedido em alguma das hipóteses legais (denúncia vazia). A disse que não precisava apresentar motivo, já que a locação havia ultrapassado 30 meses e a lei lhe permitia apresentar mera denúncia vazia.

E aí, cabe ou não cabe denúncia vazia?

b) Conteúdo teórico pertinente

As questões envolvidas na extinção do contrato são riquíssimas. Compreender tecnicamente os institutos é fundamental. Trata-se, no caso, de resilição unilateral do locador, que pretende desfazer o vínculo contratual por ato de vontade.

São duas as possibilidades: a extinção motivada e a imotivada. Em regra, a lei não proíbe a extinção imotivada. Mesmo quando ela é potencialmente danosa, o CC/2002 não a veda, mas determina que o contratante que extingue o vínculo indenize o outro pelas perdas e danos, como prevê o art. 473, parágrafo único.

Trata-se de evidente assunção de fundamental premissa liberal adotada pelo Código. Libera-se o contratante para se afastar do vínculo, mas junto com essa liberdade vem a responsabilidade.

Na legislação especial, porém, o legislador não é tão liberal assim, eis que, por vezes, se envolve um hipossuficiente. É o caso do CDC, que vincula um dos contratantes mesmo quando ainda estão na fase das tratativas preliminares. Nesse sentido, o art. 40, §2º do CDC torna obrigatória a contratação a partir do valor orçado previamente pelo fornecedor, em resumo.

Uma situação bastante peculiar é a da Lei de Locações. Por envolver um direito fundamental de elevada relevância, o direito à moradia, a liberdade de contratar precisa passar por um filtro. Esse filtro é, precisamente, o controle de motivações pelo Poder Judiciário.

Pode o locador desfazer o vínculo contratual ante tempus? Em regra, não. E se o contrato for por prazo indeterminado, derivado de uma prorrogação automática? Aí, depende. Se ele tiver sido contratado por escrito por prazo inferior a 30 meses, ou verbalmente, não pode o locador desfazer o vínculo sem motivação legalmente prevista (como nos casos de dispensa com justa causa do obreiro).

Ao contrário, se a locação tiver sido contratada por escrito por prazo igual ou superior a 30 meses, pode o locador desfazer o vínculo sem qualquer motivação, contrariamente. Trata-se de certo dirigismo contratual operado, de modo a “induzir” o locador a fazer contratos de locação residencial por prazo mais elastecido. Assim, evita-se maior oneração do locatário.

Se a locação é de prazo mais reduzido – geralmente de interesse do locador –, o ônus é a vedação à resilição unilateral imotivada (denúncia vazia) quando da prorrogação do pacto. A grande questão é: esse prazo de 30 meses é relativo a um único contrato ou pode ser contado o tempo de contratos anteriores?

O STJ decidiu de maneira acertada, a meu ver. E a solução está na lógica que ilumina a lei. Qual é? Exatamente o que eu disse dois parágrafos acima: “Trata-se de certo dirigismo contratual operado, de modo a “induzir” o locador a fazer contratos de locação residencial por prazo mais elastecido. Assim, evita-se maior oneração do locatário”.

Ora, se faço eu cinco contratos sucessivos de 6 meses (ou seja, 30 meses, no total), estou eu cumprindo o escopo do legislador de pactuar contratos de maior duração? Evidente que não. Por isso, parece adequado considerar as renovações/prorrogações? Evidente que não. Ou “o um” contrato tem mais de 30 meses, ou não tem. Ponto.

Contraprova dessa mens legis está no art. 47, inc. V, que permite ao locador despejar o locatário, mesmo tendo sido contratada a locação por escrito por prazo inferior a 30 meses, ou verbalmente, se ultrapassados 5 anos. Esse é um caso que admite desfazimento do vínculo sem motivação legalmente prevista (denúncia vazia).

A lógica do dispositivo também é patente. Mesmo tentando proteger o locatário, geralmente o elo mais fraco dessa cadeia, não posso obrigar o locador a se vincular àquele locatário para toda a eternidade. Lembre-se que a resilição não se liga ao descumprimento, mas à vontade, pelo que se o locatário cumprisse com seus deveres, o locador estaria virtualmente impedido de extinguir o vínculo pela eternidade.

c) Questão de prova

Assinale a alternativa incorreta:

a. Prorrogando-se sucessivas locações residenciais verbais por prazo superior a 30 meses, pode o locador realizar a denúncia vazia.

b. A locação residencial verbal por prazo superior a 30 meses pode ser resilida unilateralmente pelo locador sem qualquer motivação.

c. Se a locação residencial de prazo igual ou superior a 30 meses for ajustada por escrito, o contrato se resolve automaticamente, findo o prazo.

d. Independe de qualquer notificação do locador a extinção do contrato locatício residencial por prazo de 30 meses, desde que tenha sido fixado ele por escrito.

Incorreta a assertiva A.

2.1.2 – REsp 1.465.679-SP

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. INCLUSÃO DOS VALORES PERCEBIDOS PELO DEVEDOR A TÍTULO DE PARTICIPAÇÃO EM LUCROS E RESULTADOS NOS ALIMENTOS DEVIDOS À ALIMENTADA. IMPOSSIBILIDADE E DESNECESSIDADE.
1- Ação distribuída em 11/8/2008. Recurso especial interposto em 06/3/2013 e atribuído à Relatora em 25/8/2016.
2- O propósito recursal é definir se deve ser incorporado à prestação alimentar devida à alimentada o valor percebido pelo alimentante a título de participação nos lucros e resultados.
3- O ordenamento jurídico reiteradamente desvincula a participação nos lucros e resultados da empresa do salário ou da remuneração habitualmente recebida, tipificando-a como uma bonificação de natureza indenizatória, eventual e dependente do desenvolvimento e do sucesso profissional no cumprimento das metas estabelecidas.
Inteligência do art. 7º, XI, da Constituição Federal e do art. 3º da Lei nº 10.101/2000. Precedentes do Tribunal Superior do Trabalho.
4- A percepção, pelo alimentante, de valores adicionais e eventuais não impacta, em regra, na redefinição do valor dos alimentos a serem prestados, ressalvadas as situações em que as necessidades do alimentado não foram inicialmente satisfeitas ou sofreram alterações supervenientes que justificam a readequação do valor.
5- Supridas as necessidades do alimentado pelo valor regularmente fixado, não há motivo para que o aumento dos rendimentos do alimentante reflita-se imediata e diretamente no valor destinado aos alimentos, sobretudo quando os acréscimos são eventuais e originados exclusivamente do desenvolvimento e do cumprimento de metas profissionais.
6. Recurso especial provido.
(REsp 1465679/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/11/2017, DJe 17/11/2017)

Comentários pelo Prof. Paulo Sousa

a) Apresentação resumida do caso

Mais uma boa e velha discussão a respeito de: alimentos! Esse é um dos temas mais controvertidos do STJ e, inclusive, a primeira Súmula da Corte trata de questão correlata.

Caso de sempre: fulano deve alimentos a beltrano. Fulano é assalariado, pelo que os alimentos são descontados sobre seus vencimentos. Tem que descontar do 13º também? Tem. Tem que descontar do terço de férias? Tem. Tem de que descontar das verbas rescisórias. Não. Tem que descontar do auxílio-combustível? Não. Tem que descontar da participação nos lucros e resultados??? A rigor, esse julgado repetirá a resposta já dada em outra ocasião pela Corte…

b) Conteúdo teórico pertinente

O STJ vem firmando nos últimos tempos jurisprudência a respeito de quais verbas integram e quais não integram os alimentos devidos. Cá estamos a falar das parcelas determinadas judicialmente, ou das que não integraram eventual acordo. O que está acordado, acordado está. Ponto.

O alimentando, nesse caso, pretendia fazer jus a parte dos lucros e resultados recebidos pelo alimentante. Como a Corte se posicionou? Do mesmo jeito que sempre. Para isso, estabeleceu um profícuo diálogo com o Direito do Trabalho. A norma trabalhista e os precedentes do TST desdobram as verbas recebidas pelo trabalhador em duas: verbas remuneratórias e verbas indenizatórias.

O STJ, dialogando com essa distinção, estabelece, em linhas gerais, a regra de as verbas remuneratórias integram os alimentos (entendeu por que 13º e terço de férias integra?), mas não as indenizatórias (entendeu por que auxílio-combustível e verbas rescisórias lato sensu não?).

Como a participação nos lucros e resultados é reputada indenizatória, não integram, portanto, o cálculo dos alimentos ordinários. Podem, porém, vir a compor? Sim, desde que as necessidades do alimentado não sejam inicialmente satisfeitas ou sofreram alterações supervenientes que justificam a readequação do valor; ou seja, apenas excepcionalmente…

c) Questão de prova

“A participação nos lucros e resultados percebida pelo alimentante não o obriga a prestar alimentos relativos a tais verbas ao alimentando, dada sua natureza indenizatória, conforme reconheceu o STJ na esteira da jurisprudência do TST, mas excepcionalmente pode ele ser obrigado a partilhar tais valores, se as necessidades do alimentante o exigirem, a partir de alteração superveniente”, constitui assertiva correta.

2.2  Direito do Consumidor

2.2.1 – REsp 1.573.859-SP

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SAQUE INDEVIDO DE NUMERÁRIO NA CONTA CORRENTE DO AUTOR. RESSARCIMENTO DOS VALORES PELA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. AUSÊNCIA DE DANO MORAL IN RE IPSA. TRIBUNAL DE ORIGEM QUE, DIANTE DAS PECULIARIDADES DO CASO, AFASTOU A OCORRÊNCIA DE DANO EXTRAPATRIMONIAL. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO DESPROVIDO.
1. O saque indevido de numerário em conta corrente não configura dano moral in re ipsa (presumido), podendo, contudo, observadas as particularidades do caso, ficar caracterizado o respectivo dano se demonstrada a ocorrência de violação significativa a algum direito da personalidade do correntista.
2. Na hipótese, o Tribunal de origem consignou, diante do conjunto fático-probatório dos autos, que o autor não demonstrou qualquer excepcionalidade a justificar a compensação por danos morais, razão pela qual nada há a ser modificado no acórdão recorrido.
3. Recurso especial desprovido.
(REsp 1573859/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 13/11/2017)

Comentários pelo Prof. Igor Maciel

a) Apresentação resumida do caso

Trata-se, inicialmente, de ação de indenização ajuizada por um consumidor que verificou 04 (quatro) saques indevidos em sua conta corrente. Estes somados totalizavam R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais).

Com base na sua fundamentação e requerimento de indenização por dano moral, em 1ª instância houve a procedência parcial de seu pedido, sendo condenada a instituição bancária ao pagamento dos danos materiais e morais sofridos.

Após a decisão, o banco recorreu, alegando e fundamentando que o ressarcimento dos valores indevidamente sacados foi feito em tempo razoável, inexistindo, assim, dano moral. O recurso foi procedente, reformando a sentença e a ação foi julgada improcedente:

Contrato bancário – Indenização – Conta corrente – Saques não reconhecidos pelo correntista – Ressarcimento feito pelo banco em tempo razoável – Dano moral não caracterizado – Improcedência – Apelação provida.

Após isso, houve embargos por parte do consumidor, os quais foram rejeitados e, posteriormente, o recurso especial ora julgado.

b) Conteúdo teórico pertinente

Regra geral, para a verificação da ocorrência de dano moral é necessário o “preenchimento” dos seguintes requisitos: conduta, dano e nexo causal (entre a conduta e o dano).

Antes de adentrar esse tema, é importante destacar o julgado trazido como fundamento do recurso especial (o consumidor, em suas razões recursais, argumentou que o acórdão estava contrariando o entendimento do STJ):

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL.INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VALORES INDEVIDAMENTE SACADOS DE CONTACORRENTE, VIA INTERNET, DE FORMA FRAUDULENTA POR TERCEIRO. DEFEITONA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. FALHA NA SEGURANÇA LEGITIMAMENTE ESPERADAPELO CORRENTISTA. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. DANO MORAL IN RE IPSA.PRECEDENTES. PENA PRIVADA. INAPLICÁVEL. REPETIÇÃO NA FORMA SIMPLES.ENGANO JUSTIFICÁVEL. ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
(STJ – AgRg no REsp: 1138861 RS 2009/0086572-0, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 03/05/2012, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/05/2012)

Interessante observar que, conforme indica o julgado acima, a tese que deveria ser aplicada (na visão do consumidor) seria a do dano moral in re ipsa, ou seja, dano moral presumido.

O caso em questão, no entanto, traz algumas variáveis que foram levadas em consideração para a improcedência do recurso especial: tempo de resposta para resolução do problema por parte do banco, valor “irrisório” indevidamente sacado, repercussões do saque indevido, etc.

Com isso, o STJ reafirmou o entendimento do acórdão de forma a afastar o dano moral, tomando por base principalmente a ausência de dano (ou ao menos não comprovou o autor a ocorrência deste), relembrando-se: conduta, dano e nexo causal.

A conduta é inegável, ainda que por omissão. O banco é objetivamente responsável por qualquer falha na prestação do serviço (art. 12 do CDC, observando-se o art. 14, §3º, inciso II).

Já o dano não poderá ser presumido e, por tal motivo, também não poderá ser presumido o dano moral. Ora, o consumidor, no caso, não comprovou de que forma os saques indevidos efetivamente causaram um prejuízo à sua imagem e moral.

Um bom exemplo disso seria o caso do recorrente ter comprovado, ainda na fase instrutória do processo, que necessitou realizar um empréstimo bancário para evitar que seu nome fosse negativado perante o cadastro de credores ou mesmo que os saques indevidos resultaram em cobranças de cheque especial ou efetiva negativação cadastral.

Dessa forma, não sendo verificado dano, também não houve êxito na verificação do nexo causal, restando improcedente o recurso.

Segundo o STJ:

O saque indevido de numerário em conta corrente não configura dano moral in re ipsa (presumido), podendo, contudo, observadas as particularidades do caso, ficar caracterizado o respectivo dano se demonstrada a ocorrência de violação significativa a algum direito da personalidade do correntista.

c) Questão de prova

CESPE – MPE/RR – 2017 – ADAPTADA

Acerca dos bancos de dados e cadastros de consumidores, assinale a opção correta à luz do entendimento doutrinário a respeito do tema e da jurisprudência do STJ.

  1. Por restringirem a privacidade dos consumidores, os bancos de dados de proteção ao crédito não estão em conformidade com a ordem constitucional.
  2. Os cadastros de consumidores são constituídos por informações repassadas pelos fornecedores, as quais têm como destino final o mercado.
  3. A conduta do fornecedor de não comunicar ao consumidor da inscrição de seu nome em cadastro de proteção ao crédito caracteriza dano moral, ainda que exista regular inscrição pretérita.
  4. As instituições financeiras responderão subjetivamente pelos danos que forem perpetrados por fraudadores contra seus clientes.
  5. A conduta de responsabilidade do fornecedor que forçar o consumidor a contrair empréstimo para, ainda que temporariamente, evitar a inscrição de seu nome nos cadastros de inadimplentes é passível de indenização por dano moral.

Comentários

Gabarito, letra A.

a) ERRADO: A proteção à ordem econômica é prevista constitucionalmente. Portanto, apesar da hipossuficiência do consumidor, não deve ser favorecido aquele que não cumprir com seus deveres, aquele que pode ser considerado “desonesto”.

De certa forma, a proteção à ordem econômica também visa proteger os consumidores de forma geral, visto que a “conta do consumidor insolvente será paga, certamente, pelos demais consumidores”.

Um exemplo disso é a taxa de juros, a qual pode variar até mesmo entre consumidores mas que tende a aumentar em relação direta ao aumento da inadimplência dos devedores.

b) ERRADO: As informações podem ser repassadas pelos consumidores, podendo ser, inclusive, solicitadas por eles. Vide art. 43, §2º do CDC:

Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
(…)
§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.

c) ERRADO: Quando já há alguma inscrição anterior devidamente fundamentada e comprovada, não caberá dano moral, conforme súmula 385 do STJ:

“Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.”

d) ERRADO: Vide súmula 479 do STJ:

As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”

e) CERTO: É a exata situação ora debatido na qual, caso restasse comprovado tal exemplo, o consumidor lograria êxito em seu recurso.

2.3 Direito Processual Civil

2.3.1 – REsp 1.666.321-RS

DIREITO INTERTEMPORAL PROCESSUAL. IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. INCIDENTE INSTAURADO EM AUTOS APARTADOS NA VIGÊNCIA DOS ARTS. 4º, 7º E 17 DA LEI 1.060/50. DECISÃO DA IMPUGNAÇÃO PROLATADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. PRINCÍPIO DO “TEMPUS REGIT ACTUM”. TEORIA DO ISOLAMENTO DOS ATOS PROCESSUAIS. RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
1. O propósito recursal consiste em definir o recurso cabível contra o provimento jurisdicional que, após a entrada em vigor do CPC/2015, acolhe incidente de impugnação à gratuidade de justiça instaurado, em autos apartados, na vigência do regramento anterior (arts. 4º, 7º e 17 da Lei 1.060/50).
2. A sucessão de leis processuais no tempo subordina-se ao princípio geral do “tempus regit actum”, no qual se fundamenta a teoria do isolamento dos atos processuais.
3. De acordo com essa teoria – atualmente positivada no art. 14 do CPC/2015 – a lei processual nova tem aplicação imediata aos processos em desenvolvimento, resguardando-se, contudo, a eficácia dos atos processuais já realizados na forma da legislação anterior, bem como as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.
4. Em homenagem ao referido princípio, esta Corte consolidou o entendimento de que “a lei a reger o recurso cabível e a forma de sua interposição é aquela vigente à data da publicação da decisão impugnada, ocasião em que o sucumbente tem a ciência da exata compreensão dos fundamentos do provimento jurisdicional que pretende combater” (AgInt nos EDcl no AREsp 949.997/AM, 3ª Turma, DJe de 21/09/2017).
5. Na espécie, em que pese a autuação do incidente de impugnação à gratuidade de justiça em autos apartados, segundo o procedimento vigente à época, o provimento jurisdicional que revogou o benefício foi prolatado já na vigência do CPC/2015, que prevê o cabimento do recurso de agravo de instrumento. 6. A via recursal eleita pelo recorrente, portanto, mostra-se adequada, impondo-se a devolução dos autos ao Tribunal de origem para que prossiga no julgamento do agravo de instrumento.
7. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1666321/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 13/11/2017)

Comentários pelo Prof. Ricardo Torques

a) Apresentação resumida do caso

Temos, neste precedente, questão interessante e recorrente nessa transição de diplomas processuais distintos.

Sob a vigência do CPC73, em relação ao benefício da gratuidade da justiça, aplicávamos a Lei 1.050/1950, inclusive, quanto ao procedimento lá descrito. Naquele diploma, tínhamos um expediente próprio para impugnação da decisão judicial que acolhesse ou rejeitasse o requerimento.

Com o NCPC, o procedimento a ser adotado é do próprio Código que, combinando o art. 98 a 102, do NCPC, prevê, em alguns casos a possibilidade de agravo de instrumento e em outros casos a irresignação deverá ocorrer em preliminar do recurso de apelação, se for o caso.

Ao analisar o tema, o STJ manifestou-se no sentido de que, diante do princípio do tempus regit actum, aplica-se a legislação vigente à época da decisão, pelo que se aplica o NCPC frente a Lei 1.050/1950, mesmo que ajuizada a demanda na vigência do código anterior.

Vamos aprofundar um pouco mais?!

b) Conteúdo teórico pertinente

A gratuidade constitui benefício que visa garantir, na prática, o acesso à Justiça. Sabemos que o ingresso no Poder Judiciário é custoso. Por mais que a parte tenha razão no processo, necessitará fazer frente a adiantamentos pecuniário, para que possa entrar em juízo ou defender-se.

Diante disso, de acordo com o art. 98, do NCPC, toda pessoa que se encontrar em situação de insuficiência de recursos para pagar custas, despesas processuais e honorários terá direito à gratuidade de Justiça, de acordo com as regras definidas em legislação específica. Atualmente, essa norma é a Lei nº 1.050/1950, que estabelece regras para a concessão de assistência judiciária aos necessitados.

Esse benefício pode ser concedido tanto à pessoa natural como à pessoa jurídica e abrange as despesas processuais (taxas, selos, despesas com publicação, honorários de sucumbência, emolumentos etc.).

Concedido, o benefício a parte permanecerá responsável, mas a exigibilidade ficará suspensa até que a parte tenha condições financeiras de arcar com as despesas do processo.

Assim, no momento em que ela passar a ter condições, deverá arcar com tais custos. Esse efeito suspensivo não é eterno, prevê o §3º do art. 98 que a exigibilidade ficará suspensa pelo prazo de 5 anos. Passado esse período, o crédito deixa de ser exigível, prescreve.

E em relação às multas aplicadas, não há suspensão da exigibilidade. A multa será exigível de imediato, a partir da decisão judicial.

No que diz respeito ao requerimento, quando envolver pessoa natural, é desnecessário qualquer comprovação para solicitar a gratuidade. Em nome da lealdade e da boa-fé objetiva que informa o processo civil, acredita-se que a parte está manifestando-se de forma verdadeira.

Quando o pedido envolver, entretanto, pessoa jurídica, a parte deverá informar a realidade financeira da empresa nos Autos.

A presunção de veracidade em face da alegação da pessoa natural não é absoluta. Trata-se de presunção relativa. A parte contrária poderá impugnar a alegação e o magistrado, à luz de provas ou de elementos produzidos nos Autos, poderá indeferir o requerimento.

Após análise e deferimento do requerimento de gratuidade da Justiça, a parte contrária terá prazo de 15 dias para apresentar impugnação. Essa impugnação deve ser ofertada:

  • nas contrarrazões, se o requerimento constar da petição inicial (formulado pela parte autora);
  • na réplica, se o requerimento constar das contrarrazões (formulado pelo réu);
  • nas contrarrazões de recurso, se o requerimento constar do recurso (por qualquer das partes); e
  • por petição simples, se se tratar de incapacidade superveniente ou de terceiro.

O art. 101, por sua vez, estabelece que, contra a decisão que indeferir a gratuidade de justiça, ou que acolher a impugnação, revogando-a, caberá agravo de instrumento, exceto se a matéria for decidida em sentença, caso em que será cabível apelação.

No caso de deferimento do benefício, não caberá agravo de instrumento. A parte contrária, independentemente de a decisão interlocutória poderá apenas requerer a revogação do benefício em preliminar de contestação.

Na Lei 1.051/1950, como havia previsão do incidente específico para impugnação ao benefício concedido, da decisão o recurso cabível era a apelação.

Logo, a dúvida que estabeleceu é a seguinte, se houve formação do incidente, dado que à época vigia o CPC73 combinado com a Lei 1.050/1950, mas a decisão se deu à luz do NCPC, que prevê o agravo de instrumento contra decisão que revoga o benefício, qual a espécie recursal correta?

O STJ entendeu, por aplicação do princípio do tempus regit actum que o recurso de agravo de instrumento é o cabível.

c) Questão de prova

Veja como o assunto poderia ser cobrado em provas:

Eventual incidente formulado para impugnar a concessão da gratuidade de justifica ajuizado à luz do Código de Processo Civil de 1973, cuja decisão foi prolatada sob a vigência do Código de Processo Civil de 2015, fica sujeito ao recurso de agravo de instrumento em razão do princípio do tempus regit actum.

Correta a assertiva.

2.3.2 – REsp 1.691.748-PR

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. SÚMULA Nº 284/STF. ASTREINTES. VALOR. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESCUMPRIMENTO. JUSTA CAUSA. VERIFICAÇÃO. NECESSIDADE. MULTA DO ART. 475-J DO CPC/1973. INAPLICABILIDADE. TÍTULO JUDICIAL ILÍQUIDO. PENHORA. SEGURO GARANTIA JUDICIAL. INDICAÇÃO. POSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A DINHEIRO. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE PARA O DEVEDOR E PRINCÍPIO DA MÁXIMA EFICÁCIA DA EXECUÇÃO PARA O CREDOR. COMPATIBILIZAÇÃO. PROTEÇÃO ÀS DUAS PARTES DO PROCESSO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. A alegação genérica da suposta violação do art. 1.022, II, do CPC/2015, sem especificação das teses que teriam restado omissas pelo acórdão recorrido, atrai a incidência da Súmula nº 284/STF.
3. A decisão que arbitra astreintes, instrumento de coerção indireta ao cumprimento do julgado, não faz coisa julgada material, podendo, por isso mesmo, ser modificada, a requerimento da parte ou de ofício, seja para aumentar ou diminuir o valor da multa ou, ainda, para suprimi-la. Precedentes.
4. Nos termos do art. 537 do CPC/2015, a alteração do valor da multa cominatória pode ser dar quando se revelar insuficiente ou excessivo para compelir o devedor a cumprir o julgado, ou caso se demonstrar o cumprimento parcial superveniente da obrigação ou a justa causa para o seu descumprimento. Necessidade, na hipótese, de o magistrado de primeiro grau apreciar a alegação de impossibilidade de cumprimento da obrigação de fazer conforme o comando judicial antes de ser feito novo cálculo pela Contadoria Judicial.
5. Não há como aplicar, na fase de cumprimento de sentença, a multa de 10% (dez por cento) prevista no art. 475-J do CPC/1973 (atual art. 523, § 1º, do CPC/2015) se a condenação não se revestir da liquidez necessária ao seu cumprimento espontâneo.
6. Configurada a iliquidez do título judicial exequendo (perdas e danos e astreintes), revela-se prematura a imposição da multa do art. 475-J do CPC/1973, sendo de rigor o seu afastamento.
7. O CPC/2015 (art. 835, § 2º) equiparou, para fins de substituição da penhora, a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial da execução, acrescido de 30% (trinta por cento).
8. O seguro garantia judicial, espécie de seguro de danos, garante o pagamento de valor correspondente aos depósitos judiciais que o tomador (potencial devedor) necessite realizar no trâmite de processos judiciais, incluídas multas e indenizações. A cobertura terá efeito depois de transitada em julgado a decisão ou o acordo judicial favorável ao segurado (potencial credor de obrigação pecuniária sub judice) e sua vigência deverá vigorar até a extinção das obrigações do tomador (Circular SUSEP nº 477/2013). A renovação da apólice, a princípio automática, somente não ocorrerá se não houver mais risco a ser coberto ou se apresentada nova garantia.
9. No cumprimento de sentença, a fiança bancária e o seguro garantia judicial são as opções mais eficientes sob o prisma da análise econômica do direito, visto que reduzem os efeitos prejudiciais da penhora ao desonerar os ativos de sociedades empresárias submetidas ao processo de execução, além de assegurar, com eficiência equiparada ao dinheiro, que o exequente receberá a soma pretendida quando obter êxito ao final da demanda.
10. Dentro do sistema de execução, a fiança bancária e o seguro garantia judicial produzem os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro para fins de garantir o juízo, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida.
11. Por serem automaticamente conversíveis em dinheiro ao final do feito executivo, a fiança bancária e o seguro garantia judicial acarretam a harmonização entre o princípio da máxima eficácia da execução para o credor e o princípio da menor onerosidade para o executado, a aprimorar consideravelmente as bases do sistema de penhora judicial e a ordem de gradação legal de bens penhoráveis, conferindo maior proporcionalidade aos meios de satisfação do crédito ao exequente.
12. No caso, após a definição dos valores a serem pagos a título de perdas e danos e de astreintes, nova penhora poderá ser feita, devendo ser autorizado, nesse instante, o oferecimento de seguro garantia judicial pelo devedor, desde que cubra a integralidade do débito e contenha o acréscimo de 30% (trinta por cento), pois, com a entrada em vigor do CPC/2015, equiparou-se a dinheiro.
13. Não evidenciado o caráter protelatório dos embargos de declaração, impõe-se a inaplicabilidade da multa prevista no § 2º do art. 1.026 do CPC/2015. Incidência da Súmula nº 98/STJ.
14. Recurso especial provido.
(REsp 1691748/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 17/11/2017)

Comentários pelo Prof. Ricardo Torques

a) Apresentação resumida do caso

Neste precedente são discutidas duas questões processuais interessantes.

A primeira delas envolve a natureza da multa coercitiva (astreintes) aplicada. A decisão que fixa as astreintes transita em julgado? É possível fixá-la a partir de sentença ilíquida? Veremos que ambos os questionamentos devem ser respondidos de forma negativa.

A outra questão envolve a possibilidade de utilização da fiança bancária e do seguro garantia para fins de substituição de penhora em procedimentos executivos.

A fiança bancária é uma espécie de contrato por intermédio do qual o banco, na qualidade de fiador, garante o cumprimento de uma obrigação do seu cliente, o afiançado.

O seguro garantia judicial é modalidade de contrato de seguro, por intermédio do qual o potencial devedor contrata serviço a fim de garantir o pagamento dos valores necessários no trâmite de determinado processo judicial.

Diante disso, questionou-se se a fiança bancária e o seguro garantia judicial poderiam ser utilizados para substituir dinheiro em penhoras judiciais. O entendimento da terceira turma do STJ admitiu a substituição.

b) Conteúdo teórico pertinente

O Novo CPC, no cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer, de não fazer ou de entregar coisa, prevê expressamente a possibilidade de fixação de multa coercitiva como forma de compelir o devedor a satisfazer o crédito do exequente. Trata-se de pressão psicológica para que o devedor cumpra a prestação específica.

A multa que pode ser fixada de ofício pelo juiz ou a requerimento da parte em valor suficiente e compatível com a obrigação. Uma vez fixada, a multa poderá ser reduzida, caso excessiva ou aumentada, caso insuficiente. Além disso, é admissível a exclusão na hipótese de cumprimento superveniente, ainda que parcial, ou justa causa. Em relação ao cumprimento parcial, a doutrina refere que o mais correto é readequar o valor da multa, não exclusão total da multa propriamente.

Portanto, devido à natureza da multa coercitiva, que assumirá variações a depender do fluxo da execução, ela não transita em julgado. Não há se falar em imutabilidade da multa fixada.

Além disso, é pressuposto para aplicação da multa coercitiva a liquidez configurando-se prematura a aplicação de multa caso ilíquido o título judicial exequendo.

Além disso, discute-se a possibilidade de substituição de penhora de dinheiro por fiança bancária ou seguro garantia judicial.

Primeiramente cumpre destacar que, à luz do NCPC, a previsão é legal:

§ 2o Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor NÃO inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.

Note, entretanto, que há uma exigência adicional. Tanto no caso de fiança bancária como no caso de seguro garantia judicial o valor dos respectivos títulos deve superar em 30% o montante global devido. Por exemplo, se o débito é de R$ 100.000,00 esses contratos devem superar os R$ 130.000,00.

Além disso, de acordo com a terceira turma da Corte Superior, a fiança bancária e o seguro garantia judicial constituem opções eficientes sob o prisma da análise econômica do direito, de modo reduzir eventuais efeitos prejudiciais da penhora, na medida em que desonera os ativos de sociedades empresárias que estejam submetidas à execução.

Por outro lado, a substituição não altera a condição do credor, dado que a eficácia tanto da fiança bancária como do seguro garantia judicial é equivalente ao dinheiro, de modo que o exequente receberá a soma pretendida. Segundo o STJ, “por serem automaticamente conversíveis em dinheiro ao final do feito executivo, a fiança bancária e o seguro garantia judicial acarretam a harmonização entre o princípio da máxima eficácia da execução para o credor e o princípio da menor onerosidade para o executado”.

c) Questão de prova

Em provas, seria perfeitamente factível a seguinte assertiva:

De acordo com o STJ, por serem automaticamente conversíveis em dinheiro ao final do feito executivo, a fiança bancária e o seguro garantia judicial acarretam a harmonização entre o princípio da máxima eficácia da execução para o credor e o princípio da menor onerosidade para o executado.

2.3.3 – REsp 1.279.586-PR

RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PETIÇÃO INICIAL INEPTA. PEDIDO GENÉRICO. EMENDA APÓS A CONSTATAÇÃO. AÇÕES INDIVIDUAIS. JURISPRUDÊNCIA VACILANTE. AÇÕES COLETIVAS. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE. INSTRUMENTO DE ELIMINAÇÃO DA LITIGIOSIDADE DE MASSA.
1. Não há falar em ofensa ao art. 535 do CPC/1973, se a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente.
2. No que se refere às ações individuais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça diverge sobre a possibilidade de, após a contestação, emendar-se a petição inicial, quando detectados defeitos e irregularidades relacionados ao pedido, num momento entendendo pela extinção do processo, sem julgamento do mérito (REsp 650.936/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/3/2006, DJ 10/5/2006) em outro, afirmando a possibilidade da determinação judicial de emenda à inicial, mesmo após a contestação do réu (REsp 1229296/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 10/11/2016, DJe 18/11/2016).
3. A ação civil pública é instrumento processual de ordem constitucional, destinado à defesa de interesses transindividuais, difusos, coletivos ou individuais homogêneos e a relevância dos interesses tutelados, de natureza social, imprime ao direito processual civil, na tutela destes bens, a adoção de princípios distintos dos adotados pelo Código de Processo Civil, tais como o da efetividade.
4. O princípio da efetividade está intimamente ligado ao valor social e deve ser utilizado pelo juiz da causa para abrandar os rigores da intelecção vinculada exclusivamente ao Código de Processo Civil – desconsiderando as especificidades do microssistema regente das ações civis -, dado seu escopo de servir à solução de litígios de caráter individual.
5. Deveras, a ação civil constitui instrumento de eliminação da litigiosidade de massa, capaz de dissipar infindos processos individuais, evitando, ademais, a existência de diversidade de entendimentos sobre o mesmo caso, possuindo, ademais, expressivo papel no aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, diante de sua vocação inata de proteger um número elevado de pessoas mediante um único processo.
6. A orientação que recomenda o suprimento de eventual irregularidade na instrução da exordial por meio de diligência consistente em sua emenda, prestigia a função instrumental do processo, segundo a qual a forma deve servir ao processo e a consecução de seu fim. A técnica processual deve ser observada não como um fim em si mesmo, mas para possibilitar que os objetivos, em função dos quais ela se justifica, sejam alcançados.
7. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1279586/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 03/10/2017, DJe 17/11/2017)

Comentários pelo Prof. Ricardo Torques

a) Apresentação resumida do caso

Neste precedente, o STJ discute tema relevante para o estudo do Direito Processual Civil atual.

Em um primeiro retrata-se momento retrata-se a divergência da Corte em relação à possibilidade de emenda da petição inicial, pelo não preenchimento dos requisitos exigidos, após a contestação. Afinal, é caso de extinção do processo sem resolução do mérito ou seria admissível a emenda mesmo após apresentação da defesa pela parte contrária?

Não obstante a divergência, neste precedente a Corte se posicionou no sentido de prestigiar a finalidade instrumental do processo e, portanto, permitiu à parte retificar o defeito processual.

Diante disso, vamos explorar alguns conceitos importantes para concurso público dentro dos temas citados.

b) Conteúdo teórico pertinente

O art. 321 do NCPC prevê:

Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.

Os arts. 319 e 320, ambos do NCPC, arrolam os requisitos da petição inicial, que devem ser observados pela parte demandante. Não preenchidos de forma adequada esses requisitos, o juiz deverá facultar à parte a possibilidade de sanar os defeitos e irregularidades que possam dificultar o julgamento da ação.

Diante disso, a ordem natural do procedimento é a apresentação da inicial, com eventuais emendas provocadas pelo juiz. Após, cita-se o réu para participar da audiência de conciliação e de mediação, como regra. Em seguida, infrutífera a audiência, temos a intimação do réu para que apresente a contestação e, eventualmente, a reconvenção. Após a contestação, adoção das providências preliminares, temos o saneamento do processo.

E se eventualmente com a contestação o réu apontar algum defeito ou irregularidade no procedimento? Que atitude deverá tomar o magistrado?

A jurisprudência do STJ é divergente.

No REsp 650.936/RJ, a 2ª Turma pela impossibilidade de emenda à inicial. Confira a ementa do precedente:

PROCESSO CIVIL – PETIÇÃO INICIAL DEFEITUOSA – EMENDA À INICIAL – POSSIBILIDADE.
1. A petição inicial foi formulada sem dela constar pedido certo e causa de pedir clara e precisa, defeito reconhecido pela própria recorrente 2. Controvérsia na interpretação do art. 284 do CPC no sentido de permitir-se a emenda à inicial a qualquer tempo, até em sede de recurso.
3. Corrente majoritária no sentido de só admitir a emenda até a contestação, exclusive.
4. Recurso especial conhecido e improvido.
(REsp 650.936/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2006, DJ 10/05/2006, p. 174)

Logo, admitir-se-ia a emenda até apresentação da contestação, após, necessário o julgamento sem resolução do mérito.

No REsp 1.229.296/SP, a 4ª Turma entendeu que a emenda à inicial após a contestação é admissível:

RECURSO ESPECIAL – AÇÃO MONITÓRIA – PROCEDÊNCIA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA – EXTINÇÃO POR INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL PELO TRIBUNAL A QUO – AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO AUTOR PARA SUPRIR A FALTA DOCUMENTAL – OFENSA À NORMA PROCESSUAL VERIFICADA – RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
Hipótese: Cinge-se a controvérsia a decidir se o acórdão que reforma a sentença – que julgou procedente a ação monitória – para extinguir o processo por inépcia da inicial, sem intimar o autor para suprir a falta de documentos, ofende a legislação processual.
1. Para o acolhimento do apelo extremo, no sentido de afirmar se são suficientes os documentos que instruíram a ação monitória, seria imprescindível derruir a afirmação contida no decisum atacado, o que, forçosamente, enseja em rediscussão da matéria fática-probatória, atraindo o óbice da Súmula 7 do STJ.
Inconformismo, nesta parte, não acolhido.
2. Ofende o art. 284 do CPC/1973 (art. 321, CPC/2015), o acórdão que reforma sentença de procedência da ação e declara extinto o processo, por inépcia da petição inicial, sem intimar o autor e lhe conferir a oportunidade para suprir a falha.
3. O fato de a emenda à inicial ter se dado após a contestação do feito, por si só, não inviabiliza a adoção da diligência corretiva prevista no art. 284 do CPC/1973. (AgRg no AREsp 196.345/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, DJe 04/02/2014).
4. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 1229296/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 10/11/2016, DJe 18/11/2016)

O segundo entendimento, prevaleceu neste precedente. Esse é o entendimento a prevalecer, uma vez que, prestigia a função instrumental do processo, dado que o processo não é um fim em si mesmo, mas técnica para resolução de conflitos de direito material.

c) Questão de prova

Em provas podemos ter a seguinte assertiva:

A fim de atender à instrumentalidade do processo, mesmo após a contestação da parte ré, admite-se a emenda à petição inicial, segundo entendimento do STJ.

Correta a assertiva.

3 Informativo STJ 615

3.1 – Recursos Repetitivos

3.1.1 – Direito Administrativo

REsp 1.487.139-PR

PROCESSO

REsp 1.487.139-PR, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 08/11/2017, DJe 21/11/2017

RAMO DO DIREITO

DIREITO ADMINISTRATIVO

TEMA

Ação indenizatória. Curso normal superior. Programa Especial de Capacitação de Docentes. Credenciamento. Entes federados. Atribuição. Expedição de diploma aos alunos. Ausência. Responsabilidade civil e administrativa da União e do Estado do Paraná.

DESTAQUE

Havendo o Conselho Nacional de Educação expedido parecer público e direcionado ao Conselho Estadual de Educação do Paraná sobre a regularidade do Programa Especial de Capacitação de Docentes, executado pela Fundação Faculdade Vizinhança Vale do Iguaçu, a sua desconstituição ou revogação pelo próprio Conselho Nacional de Educação ou mesmo a sua não homologação pelo Ministério da Educação autorizam a tese de que a União é responsável, civil e administrativamente, e de forma exclusiva, pelo registro dos diplomas e pela consequente indenização aos alunos que detinham vínculo formal como professores perante instituição pública ou privada, diante dos danos causados.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O objeto do debate diz respeito à responsabilidade solidária, civil e administrativa, da União e do Estado do Paraná, pela ausência de credenciamento de instituição de ensino superior como condição para expedição de diploma a estudantes de curso normal superior, na modalidade semipresencial, em três situações distintas, quais sejam: a) a dos professores que concluíram o curso e que detinham vínculo formal com instituição pública ou privada; b) a dos professores que perfizeram o curso, mas que não tinham vínculo formal com instituição pública ou privada, enquadrando-se como voluntários ou detentores de vínculos precários de trabalho; e c) a dos denominados “estagiários”. No que concerne à primeira situação fática, deve-se ressaltar, de início, que a Lei n. 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB), em seu art. 62, estabeleceu a necessidade de nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, na formação de docentes para atuar na educação básica de ensino. O art. 80 da referida legislação, por sua vez, dispôs que “o Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada“, ressaltando, nos §§ 1º e 2º, que a União seria responsável pelo credenciamento das instituições prestadoras da educação a distância, bem como pela regulamentação dos respectivos exames e registro de diplomas. Como regra de transição, a LDB dispôs no art. 87, § 3º, III, que os entes federativos deveriam realizar programas de capacitação para todos os professores em exercício, inclusive utilizando os recursos do ensino à distância. Vale ressaltar que, além de não restringir o universo dos destinatários da norma de transição (p.ex., ‘professores com vínculo empregatício devidamente comprovado’), o dispositivo não referiu à necessidade de autorização federal para as modalidades não presenciais. E era razoável que assim não o fizesse à época, haja vista a urgência na qualificação de um número significativo de profissionais em todo o território nacional, até o final da ‘Década da Educação’, cujas metas foram delineadas pela Lei n. 10.172/2001 – conhecida como Plano Nacional de Educação. Nesse contexto, é perfeitamente defensável a tese de que o art. 87 da Lei n. 9.394/1996 atribuiu competência ao Estado do Paraná (e a União, apenas supletivamente) – ainda que em caráter transitório e com fim específico – para credenciar instituições de ensino para realização de programas de capacitação de docentes (e não um curso de formação regular e permanente), inclusive na modalidade semipresencial, em consonância com as metas estabelecidas pela Lei n. 10.172/2001. Ante o panorama legal traçado, mostra-se temerária a conduta adotada pelo Conselho Nacional de Educação, que, em um curto espaço de tempo (de 1º/02/2006 a 11/04/2007) e já próximo do exaurimento da eficácia da norma transitória do art. 87 da LDB, emitiu três pareceres distintos, ora admitindo a regularidade ora reconhecendo a irregularidade do Programa Especial de Capacitação de Docentes executado pela faculdade recorrida (Pareceres CNE/CES n.ºs 14/2006, 290/2006 e 193/2007), com repercussão extremamente negativa para uma gama imensa de alunos e instituições envolvidas. Dessa forma – e considerando tratar-se de caso típico a se invocar a aplicabilidade do princípio da confiança, traduzido na boa-fé que os administrados e outros destinatários depositam nos atos praticados pelos agentes públicos – não há falar-se em ato ilícito por parte da instituição credenciada, tampouco do referido Estado da Federação – o que culmina na responsabilidade exclusiva da União para a hipótese analisada.

PROCESSO

REsp 1.487.139-PR, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 08/11/2017, DJe 21/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO ADMINISTRATIVO

TEMA

Ação indenizatória. Curso normal superior. Programa especial de capacitação de docentes. Credenciamento. Entes federados. Atribuição. Expedição de diploma aos alunos. Ausência. Responsabilidade civil e administrativa da União e do Estado do Paraná.

DESTAQUE

Havendo o Conselho Nacional de Educação expedido parecer público sobre a regularidade do Programa Especial de Capacitação de Docentes executado pela Fundação Faculdade Vizinhança Vale do Iguaçu e direcionado ao Conselho Estadual de Educação do Paraná, o qual já havia possibilitado o ingresso anterior dos alunos sem vínculo formal como professor de instituição pública ou privada (Portaria n. 93/2002 do Conselho Estadual de Educação do Paraná), a sua desconstituição e/ou revogação posterior, pelo próprio Conselho Nacional de Educação, ou mesmo a sua não homologação, pelo Ministério da Educação ou, ainda, pelo Parecer n. 193/2007 do Conselho Estadual de Educação do Paraná, autorizam a tese de que a União e o Estado do Paraná são responsáveis, civil e administrativamente, e de forma solidária, pelo registro dos diplomas e pela consequente indenização aos alunos que detinham vínculo apenas precário perante instituição pública ou privada, diante dos danos causados.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O objeto do debate diz respeito à responsabilidade solidária, civil e administrativa, da União e do Estado do Paraná, pela ausência de credenciamento de instituição de ensino superior como condição para expedição de diploma a estudantes de curso normal superior, na modalidade semipresencial, em três situações distintas, quais sejam: a) a dos professores que concluíram o curso e que detinham vínculo formal com instituição pública ou privada; b) a dos professores que perfizeram o curso, mas que não tinham vínculo formal com instituição pública ou privada, enquadrando-se como voluntários ou detentores de vínculos precários de trabalho; e c) a dos denominados “estagiários”. Quanto à segunda situação fática – além da incidência dos fundamentos apresentados na primeira nota informativa – cabe acrescentar que o art. 87, § 3º, III, da Lei n. 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB), ao dispor acerca da realização dos programas de capacitação, apenas explicita a expressão “professores em exercício”, não exigindo que se trate de educadores com vínculo formal com instituição pública ou privada. Nesse sentido, correta a interpretação dada ao dispositivo legal pelo Tribunal de origem, segundo a qual: “a expressão legal ‘professores em exercício’ não comporta a restrição que a União e o Estado do Paraná pretendem estabelecer (existência de vínculo empregatício formal entre o professor e a escola). Além disso, não é crível supor que, em toda a extensão do território estadual, inclusive nas localidades mais distantes (zona rural), todas as escolas – incluídas as de menor porte – mantêm em seus quadros somente profissionais contratados formalmente, com os pesados encargos legais daí decorrentes. Se, de fato, havia docentes contratados precariamente, eles também devem ser considerados ‘professores em exercício’, para os fins da Lei”. Dessa forma, no caso específico dos professores que não detinham vínculo formal com instituição pública ou privada, a responsabilidade pelo ato ilícito decorre de condutas praticadas, tanto pela União, quanto pelo Estado do Paraná, em decorrência da edição (posterior, violadora do princípio da boa-fé e da confiança) do Parecer n. 193/2007, pelo Conselho Estadual de Educação.

PROCESSO

REsp 1.487.139-PR, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 08/11/2017, DJe 21/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO ADMINISTRATIVO

TEMA

Ação indenizatória. Curso normal superior. Programa especial de capacitação de docentes. Credenciamento. Entes federados. Atribuição. Expedição de diploma aos alunos. Ausência. Responsabilidade civil e administrativa da União e do Estado do Paraná.

DESTAQUE

Inexistindo ato regulamentar, seja do Conselho Nacional de Educação, seja do Conselho Estadual de Educação do Paraná, sobre a regularidade do Programa Especial de Capacitação de Docentes executado pela Fundação Faculdade Vizinhança Vale do Iguaçu relativamente a alunos estagiários, descabe falar em condenação da União e do Estado do Paraná, devendo a parte que entender prejudicada postular a indenização em face, tão somente, da instituição de ensino.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O objeto do debate diz respeito à responsabilidade solidária, civil e administrativa, da União e do Estado do Paraná, pela ausência de credenciamento de instituição de ensino superior como condição para expedição de diploma a estudantes de curso normal superior, na modalidade semipresencial, em três situações distintas, quais sejam: a) a dos professores que concluíram o curso e que detinham vínculo formal com instituição pública ou privada; b) a dos professores que perfizeram o curso, mas que não tinham vínculo formal com instituição pública ou privada, enquadrando-se como voluntários ou detentores de vínculos precários de trabalho; e c) a dos denominados “estagiários”. Em relação ao terceiro ponto controvertido, no que diz respeito à responsabilidade exclusiva da instituição de ensino quanto aos estagiários, não existiu qualquer ato regulamentar expedido, seja pelo Conselho Nacional de Educação (ou outro órgão da União), seja pelo Conselho Estadual de Educação do Estado do Paraná, autorizando que o curso funcionasse e permitisse a matrícula de “alunos denominados estagiários”. Dessa forma, nessa situação, descabe falar em conduta ilícita dos entes estatais, sendo certo que houve atuação de ambos, vedando que tal prática assim ocorresse. Em havendo algum discente que se sinta prejudicado, terá que promover a demanda, exclusivamente, em face da instituição de ensino que, eventualmente, tenha permitido a matrícula, ao arrepio de qualquer autorização emitida pelos órgãos públicos, mesmo que de forma minimamente precária.

REsp 1.602.106-PR

PROCESSO

REsp 1.602.106-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 25/10/2017, DJe 22/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO AMBIENTAL

TEMA

Responsabilidade civil ambiental. Ação indenizatória. Danos extrapatrimoniais. Acidente ambiental. Explosão do navio Vicuña. Porto de Paranaguá. Pescadores profissionais. Proibição temporária de pesca. Empresas adquirentes da carga transportada. Ausência de responsabilidade. Nexo de causalidade não configurado.

DESTAQUE

As empresas adquirentes da carga transportada pelo navio Vicunã no momento de sua explosão, no Porto de Paranaguá/PR, em 15/11/2004, não respondem pela reparação dos danos alegadamente suportados por pescadores da região atingida, haja vista a ausência de nexo causal a ligar tais prejuízos (decorrentes da proibição temporária da pesca) à conduta por elas perpetrada (mera aquisição pretérita do metanol transportado).

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O cerne da controvérsia é definir se as empresas adquirentes da carga do navio Vicuña podem ser consideradas responsáveis pelo dano ambiental e, consequentemente, por danos extrapatrimoniais alegadamente suportados por terceiros (pescadores profissionais que se viram impedidos temporariamente de exercer seu labor), em decorrência da explosão da referida embarcação na baía de Paranaguá em 15/11/04. De pronto, cumpre destacar a remansosa jurisprudência desta Corte no sentido de que, em que pese a responsabilidade por dano ambiental ser objetiva (e lastreada pela teoria do risco integral), faz-se imprescindível, para a configuração do dever de indenizar, a demonstração do nexo causal a vincular o resultado lesivo à conduta efetivamente perpetrada por seu suposto causador. Nesse ponto, em apertada síntese, constata-se que as empresas requeridas são meras adquirentes do metanol transportado pelo navio Vicuña, não respondendo, assim, pela reparação de prejuízos (de ordem material e moral) alegadamente suportados por pescadores profissionais em virtude da proibição temporária da pesca na região atingida pela contaminação ambiental decorrente da explosão, em 15/11/04, da referida embarcação. Isso porque, não sendo as adquirentes da carga do referido navio responsáveis diretas pelo acidente ocorrido, só haveria falar em sua responsabilização – na condição de indiretamente responsável pelo dano ambiental – caso restasse demonstrada (i) a existência de comportamento omissivo de sua parte; (ii) que o risco de acidentes no transporte marítimo fosse ínsito à sua atividade ou (iii) que estivesse a seu encargo, e não a encargo da empresa vendedora, a contratação do transporte da carga que lhe seria destinada. Sendo certo que nenhuma das mencionadas situações se verificou, afasta-se o dever de indenizar, por ausência do nexo causal imprescindível à sua configuração.

3.2 – 1ª Seção

3.2.1 – Direito Administrativo

MS 21.750-DF

PROCESSO

MS 21.750-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, por unanimidade, julgado em 25/10/2017, DJe 07/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO ADMINISTRATIVO

TEMA

Mandado de segurança. Penalidade aplicada com base na Lei n. 10.520/2002. Divulgação no Portal da Transparência gerenciado pela CGU. Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas – CEIS. Caráter informativo.

DESTAQUE

A divulgação do Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas – CEIS pela CGU tem mero caráter informativo, não sendo determinante para que os entes federativos impeçam a participação, em licitações, das empresas ali constantes.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Trata-se de mandando de segurança impetrado com o intuito de suspender o registro no Portal de Transparência da CGU de penalidade administrativa aplicada a empresa com base no art. 7º da Lei n. 10.520/2002. Alega a impetrante que a publicação da penalidade a impediria de participar de processos licitatórios em qualquer órgão da administração pública, ao invés de limitar-se ao âmbito da unidade federativa em que aplicada a sanção. Inicialmente, verifica-se que, com base no Decreto n. 5.482/2005, cabe à Controladoria-Geral da União a gerência exclusiva do Portal da Transparência e, juntamente com o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a determinação de qual o conteúdo mínimo de sua página. Dentro dessas atribuições, foi editada pelo Ministro de Estado do Controle e da Transparência, a Portaria 516/2010, que instituiu o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas-CEIS, prevendo, em seu art. 6º, a divulgação do cadastro por meio do sítio do Portal da Transparência e, em seu art. 7º, a possibilidade de celebrar termos de cooperação com órgãos públicos. Assim, a inclusão do nome da impetrante no Portal da Transparência e no Cadastro de Empresas Inidôneas e Suspensas-CEIS, apenas viabiliza o acesso às informações, não sendo suficiente para causar, de per si, qualquer dano, pois o impedimento de contratar e licitar decorre da própria punição e não da publicidade. Por fim, ressalta-se que caso a parte impetrante esteja sendo indevidamente excluída de certames por outros Entes cuja decisão não se aplica, deverá topicamente buscar a tutela ao Judiciário, contra quem de direito, não tendo a mera divulgação qualquer influência.

3.3 – 3ª Seção

3.3.1 – Direito Ambiental

CC 139.197-RS

PROCESSO

CC 139.197-RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, por unanimidade, julgado em 25/10/2017, DJe 09/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO AMBIENTAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL

TEMA

Art. 54, § 2º, V da Lei n. 9.605/98. Poluição. Deságue de esgoto em nascentes localizadas em área de proteção ambiental. Programa habitacional popular. Fiscalização da aplicação dos recursos públicos pela Caixa Econômica Federal (CEF). Atuação como mero agente financeiro. Contrato que isenta a CEF de responsabilidade pela higidez da obra. Competência da Justiça estadual.

DESTAQUE

Compete à Justiça estadual o julgamento de crime ambiental decorrente de construção de moradias de programa habitacional popular, nas hipóteses em que a Caixa Econômica Federal atue, tão somente, na qualidade de agente financiador da obra.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Discute-se se a atribuição à CEF da conduta típica descrita no art. 54 da Lei n. 9.605/1998 – no que concerne à sua responsabilização criminal por danos ambientais causados por construções de moradias realizadas na esfera do Programa Minha Casa Minha Vida – atrai a competência da Justiça Federal para julgamento do caso. Observe-se que a CEF figurou como ré em ação civil pública baseada no mesmo delito e participou de acordo homologado para reparação do dano ambiental na esfera cível, contudo, no entender do Juízo Federal, há de se observar uma diferenciação na responsabilidade civil e criminal da referida instituição financeira. Nesse contexto, diante da reconhecida orientação jurisprudencial das Cortes Superiores sobre a possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica por dano ambiental, e considerando que o crime descrito no art. 54, § 1º, da Lei n. 9.605/1998 prevê a modalidade culposa da prática delitiva, seria possível a responsabilização criminal da CEF a depender de sua atuação na execução da obra. Quanto a esta, o STF já decidiu que, no âmbito do programa habitacional mencionado, a Caixa Econômica Federal pode atuar como agente executor de políticas públicas federais de promoção à moradia ou como agente financeiro em sentido estrito, na qualidade de responsável pela liberação de recursos financeiros para a aquisição de imóvel já edificado. Na primeira situação, a CEF possui responsabilidade solidária com a construtora pela solidez e segurança da obra, tendo em vista sua atuação fiscalizadora sobre a aplicação dos recursos públicos destinados ao financiamento imobiliário. Já na segunda hipótese, a CEF atua apenas na qualidade de mutuante, disponibilizando os valores necessários à aquisição do imóvel, não fiscalizando a construção – entendimento também compartilhado por esta Corte Superior. No caso em análise, o fato de o imóvel não estar edificado não implica, por si só, a responsabilização da CEF por danos causados na obra, sendo imprescindível a análise contratual e riscos por ela assumidos. Dessa forma, é de se concluir que o fato de a CEF atuar como financiadora da obra não tem o condão de atrair a competência da Justiça Federal. Isto porque para sua responsabilização não basta que figure como financeira, sendo imprescindível sua atuação na elaboração do projeto, ou seja, deve ter atuado na qualidade de fiscalizadora da segurança e higidez da obra. Uma vez não configuradas as referidas premissas no contrato entabulado com a construtora, deve-se reconhecer a competência da Justiça estadual para julgamento da questão.

3.4 – 3ª Turma

3.4.1 – Direito Civil

REsp 1.364.668-MG

PROCESSO

REsp 1.364.668-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 07/11/2017, DJe 17/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO CIVIL

TEMA

Locação. Imóvel urbano residencial. Denúncia vazia. Art. 46 da Lei n. 8.245/1991. Accessio temporis. Contagem dos prazos de prorrogações. Impossibilidade.

DESTAQUE

Não é cabível a denúncia vazia quando o prazo de 30 (trinta) meses, exigido pelo art. 46 da Lei n. 8.245/1991, é atingido com as sucessivas prorrogações do contrato de locação de imóvel residencial urbano.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Na origem, trata-se de ação de despejo, na qual se postula a desocupação do imóvel e a entrega das chaves, após notificação extrajudicial em que o locador manifesta o desinteresse na renovação do contrato, que já havia sido objeto de prorrogação por escrito mediante dois aditivos, totalizando 30 (trinta) meses. De início, cumpre salientar que a denúncia vazia é a possiblidade de o locador solicitar a retomada do imóvel sem a necessidade de apresentar justificativas. Em contrapartida, a denúncia cheia exige que sejam indicadas as motivações expressas em lei. Ocorrendo qualquer das duas situações, o contrato de locação será extinto. Nesse sentido, o caput do art. 46 da Lei do Inquilinato assenta a hipótese em que se operará a cessação do contrato, sem a exigência de notificação ou aviso. Ou seja, encerra-se o negócio jurídico com o mero decurso do prazo. No entanto, se o locatário prosseguir na posse do imóvel por período superior a 30 (trinta) dias, prorroga-se o contrato por prazo indeterminado e a denúncia só poderá ser feita mediante notificação. Importante ressaltar que o artigo supra traz a expressão “por prazo igual ou superior a trinta meses”, sem permitir explicitamente a contagem de múltiplos instrumentos negociais, ainda que haja apenas a prorrogação dos períodos locatícios, sem a alteração das condições originalmente pactuadas. Assim, a lei é clara quanto à imprescindibilidade do requisito temporal em um único pacto, cujo objetivo é garantir a estabilidade contratual em favor do locatário.

REsp 1.465.679-SP

PROCESSO

REsp 1.465.679-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 09/11/2017, DJe 17/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO CIVIL

TEMA

Família. Alimentos. Inclusão dos valores percebidos pelo devedor a título de participação em lucros e resultados. Impossibilidade e desnecessidade.

DESTAQUE

Os valores recebidos a título de participação nos lucros e resultados não se incorporam à verba alimentar devida ao menor.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Inicialmente, cumpre observar que, no tocante à possibilidade de incorporação da participação nos lucros e resultados aos alimentos devidos à menor, deve-se considerar, em primeiro lugar, o exame da natureza jurídica da referida verba, tendo em vista que, se porventura constatado que o valor percebido possui natureza salarial, deverá, em regra, ser incorporado ao percentual equivalente nos alimentos regularmente prestados ao credor. Isso porque o art. 7º, XI, da Constituição Federal, expressamente desvincula a participação nos lucros e resultados da remuneração percebida pelo trabalhador. Além disso, anote-se que o Tribunal Superior do Trabalho fixou o entendimento de que o valor pago a título de participação em lucros e resultados tem natureza indenizatória e, ainda que paga em periodicidade diversa daquela estipulada na legislação de regência, não se transmuda em salário ou remuneração. Ademais, o próprio art. 3º da Lei n. 10.101/2000 estabelece, em sintonia com o texto constitucional, que a participação nos lucros e resultados da empresa não substitui ou complementa a remuneração devida ao trabalhador, não se configura em fator de incidência de quaisquer encargos trabalhistas e não tem caráter habitual. Dessa forma, em se tratando de parcela que não se relaciona com o salário ou com a remuneração percebida pelo alimentante, não há que se falar em incorporação automática desta bonificação aos alimentos prestados à menor, sobretudo porque nada indica, na espécie, que seja o valor estipulado insuficiente tendo como base os vencimentos líquidos e regulares do alimentando.

3.4.2 – Direito do Consumidor

REsp 1.573.859-SP

PROCESSO

REsp 1.573.859-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 07/11/2017, DJe 13/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR

TEMA

Ação de indenização por danos morais. Saque indevido de numerário na conta corrente do autor. Ressarcimento dos valores pela instituição bancária. Ausência de dano moral in re ipsa.

DESTAQUE

O saque indevido de numerário em conta corrente, reconhecido e devolvido pela instituição financeira dias após a prática do ilícito, não configura, por si só, dano moral in re ipsa.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

De início, não se olvida que a Terceira Turma desta Corte tem precedente no sentido de considerar que o saque indevido em conta corrente, por si só, acarreta dano moral. Observe-se que, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.197.929/PR, a Segunda Seção desta Corte fixou a tese de que as instituições bancárias respondem de forma objetiva pelos danos causados aos correntistas, decorrentes de fraudes praticadas por terceiros, caracterizando-se como fortuito interno. Cabe ainda ressaltar que no referido julgado foi reconhecido o dano moral presumido em decorrência da inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, razão pela qual não se confunde com o caso ora em análise. Assim, na linha do que ficou decidido no recurso especial representativo da controvérsia citado alhures, os valores sacados de forma fraudulenta na conta corrente do consumidor, tal como ocorrido na espécie, devem ser integralmente ressarcidos pela instituição bancária. Logo, nessas hipóteses, o consumidor não terá qualquer prejuízo material em decorrência do defeito na prestação do serviço oferecido pelo banco. Embora não se tenha dúvida de que o saque indevido acarreta dissabores ao consumidor, para fins de constatação de ocorrência de dano moral é preciso analisar as particularidades de cada caso concreto, a fim de verificar se o fato extrapolou o mero aborrecimento, atingindo de forma significativa algum direito da personalidade do correntista (bem extrapatrimonial). Circunstâncias, por exemplo, como o valor total sacado indevidamente, o tempo levado pela instituição bancária para ressarcir os valores descontados e as repercussões daí advindas, dentre outras, deverão ser levadas em conta para fins de reconhecimento do dano moral e sua respectiva quantificação. Não seria razoável que o saque indevido de pequena quantia, considerada irrisória se comparada ao saldo que o correntista dispunha por ocasião da ocorrência da fraude, sem maiores repercussões, possa, por si só, acarretar compensação por dano moral. Dessa forma, o saque indevido em conta corrente não configura, por si só, dano moral, podendo, contudo, observadas as particularidades do caso, ficar caracterizado o respectivo dano se demonstrada a ocorrência de violação significativa a algum direito da personalidade do correntista.

3.4.3 – Direito Processual Civil

REsp 1.666.321-RS

PROCESSO

REsp 1.666.321-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 07/11/2017, DJe 13/11/2017

RAMO

DO DIREITO

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TEMA

Assistência judiciária gratuita. Incidente instaurado em autos apartados na vigência dos arts. 4º, 7º e 17 da Lei n. 1.060/50. Decisão de impugnação prolatada na vigência do CPC/2015. Princípio do “tempus regit actum“. Teoria do isolamento dos atos processuais. Recurso cabível. Agravo de instrumento.

DESTAQUE

Cabe agravo de instrumento contra o provimento jurisdicional que, após a entrada em vigor do CPC/2015, acolhe ou rejeita incidente de impugnação à gratuidade de justiça instaurado, em autos apartados, na vigência do regramento anterior.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A fim de averiguar o recurso cabível na hipótese, convém salientar, primeiramente, que a sucessão de leis processuais no tempo é subordinada, consoante a pacífica jurisprudência desta Corte, ao princípio geral do “tempus regit actum“, no qual se fundamenta a teoria do isolamento dos atos processuais. De acordo com essa teoria – atualmente positivada no art. 14 do CPC/2015 – a lei processual nova tem aplicação imediata aos processos em desenvolvimento, resguardando-se, contudo, a eficácia dos atos processuais já realizados na forma da legislação anterior, bem como as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Nesse diapasão, importa salientar que, de acordo com o regramento anterior, e independente de a concessão do benefício ser requerida na petição inicial ou durante o curso do processo, havia a formação de autos apartados – razão pela qual o art. 17 da Lei n. 1.060/50 (com a redação dada pela Lei n. 6.014/73) previa o cabimento do recurso de apelação contra as decisões relativas ao benefício da justiça gratuita – o que suscitava intensa crítica na doutrina, já que o pedido de gratuidade constitui questão incidental no processo, cuja solução se dá por meio de decisão interlocutória, e não sentença. Importa ressaltar que o art. 1.072 do CPC/2015 expressamente revogou os arts. 4º, 6º, 7º e 17 da Lei n. 1.060/50, dentre outros. Além disso, os arts. 99 e 100 do novo Codex disciplinam que não há mais a exigência de autuação em separado para o requerimento do benefício durante o curso do processo ou para a impugnação. Dessa forma, tanto o pedido do interessado como a objeção da parte adversa são decididos incidentalmente nos próprios autos principais, via de regra por meio de decisão interlocutória (ressalvada a possibilidade de a questão ser decidida em capítulo da sentença). Nesse contexto, prescreve o NCPC, de forma explícita, o cabimento do recurso de agravo de instrumento contra a decisão que indeferir a gratuidade ou acolher pedido de sua revogação (arts. 101 e 1.015, V, do Código), salvo se a questão for decidida na sentença, contra a qual caberá apelação, segundo a regra geral do sistema recursal (art. 1.009, caput).

REsp 1.691.748-PR

PROCESSO

REsp 1.691.748-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 07/11/2017, DJe 17/11/2017

RAMO DO DIREITO

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TEMA

Impugnação ao cumprimento de sentença. Penhora. Seguro garantia judicial. Indicação. Possibilidade. Equiparação a dinheiro.

DESTAQUE

Na fase de cumprimento de sentença, é incabível a rejeição do seguro garantia judicial pelo exequente, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia, entre outras questões, a saber se o seguro garantia judicial oferecido no cumprimento de sentença é apto a garantir o juízo, mesmo havendo discordância do exequente. De início, cumpre salientar que a jurisprudência deste Tribunal Superior, formada sob a égide do CPC/1973, foi construída no sentido de que a penhora em dinheiro, preferencialmente na ordem de gradação legal, não pode ser substituída por seguro garantia judicial ou fiança bancária sem haver excepcional motivo, tendo em vista o princípio da maior eficácia da execução e de satisfação do credor, bem como a observância à regra da menor onerosidade para o devedor. Com a edição do CPC/2015, o tema controvertido merece nova reflexão. De fato, o seguro garantia judicial, espécie de seguro de danos disciplinado pela Circular SUSEP n. 477/2013, garante o pagamento de valor correspondente aos depósitos judiciais que o tomador (potencial devedor) necessite realizar no trâmite de processos judiciais, incluídas multas e indenizações. Depreende-se que o seguro garantia judicial oferece forte proteção às duas partes do processo, sendo instrumento sólido e hábil a garantir a satisfação de eventual crédito controvertido, tanto que foi equipado ao dinheiro para fins de penhora. Com efeito, no cumprimento de sentença, a fiança bancária e o seguro garantia judicial são as opções mais eficientes sob o prisma da análise econômica do direito, visto que reduzem os efeitos prejudiciais da penhora ao desonerar os ativos de sociedades empresárias submetidas ao processo de execução, além de assegurar, com eficiência equiparada ao dinheiro, que o exequente receberá a soma pretendida quando obter êxito ao final da demanda. Nesse contexto, acarretam a harmonização entre o princípio da máxima eficácia da execução para o credor e o princípio da menor onerosidade para o executado, a aprimorar consideravelmente as bases do sistema de penhora judicial e a ordem de gradação legal de bens penhoráveis, conferindo maior proporcionalidade aos meios de satisfação do crédito ao exequente. Assim, dentro do sistema de execução, a fiança bancária e o seguro garantia judicial produzem os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro para fins de garantir o juízo, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida.

3.5 – 4ª Turma

3.5.1 – Direito Processual Civil

REsp 1.279.586-PR

PROCESSO

REsp 1.279.586-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por maioria, julgado em 03/10/2017, DJe 17/11/2017

RAMO DO DIREITO

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TEMA

Ação civil pública. Petição inicial inepta. Pedido genérico. Emenda após a contestação. Possibilidade.

DESTAQUE

Admite-se emenda à inicial de ação civil pública, em face da existência de pedido genérico, ainda que já tenha sido apresentada a contestação.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O propósito recursal consiste em definir se, mesmo após a apresentação de contestação, quando se tratar de ação civil pública, pode o julgador determinar a emenda da petição inicial, sempre que detectados defeitos e irregularidades relacionados ao pedido. De início, convém anotar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao menos quando cuida de ações individuais, diverge sobre o tema. No que concerne às ações civis públicas, estas são instrumentos processuais de ordem constitucional, dotados de natureza jurídica de ação pública de caráter civil lato sensu, estando sujeitas, enquanto tal, às garantias e pressupostos processuais inerentes a toda ação, tendo por mote a defesa de interesses metaindividuais, com relevância social. De fato, a relevância social do bem envolvido, de natureza social, imprime ao direito processual civil, na tutela destes bens, a adoção de princípios distintos dos adotados pelo CPC. Neste contexto, releva-se o princípio da efetividade, previsto no art. 83, caput, da Lei n. 8.078/1990 (CDC) – inteiramente aplicável à tutela dos interesses difusos e coletivos, por expressa imposição do art. 21 da Lei n. 7.347/1985 -, que deve ser utilizado pelo juiz da causa para abrandar os rigores da intelecção vinculada exclusivamente ao CPC – desconsiderando as especificidades do micro sistema regente das ações civis -, pois aquele tem como escopo servir de instrumento para a solução de litígios de caráter individual. A espécie não revela processo diferenciado, mas, em verdade, é expressão de um conjunto de princípios que devem necessariamente ser adaptados, a partir do processo civil comum, para viabilizar a defesa de interesses que extrapolam os simplesmente individuais. Nessa linha de raciocínio, devem ser interpretadas as disposições do código processual acerca da petição inicial e das hipóteses de extinção por inépcia da peça vestibular. Aliás, sobre tais institutos, interessa mencionar que o Novo Código de Processo Civil traz regulamentação atinente à petição inicial, seus requisitos e a sistemática de seu recebimento, muito próximas ao que antes previsto pelo diploma processual de 1973. Desse modo, em consonância com a Lei n. 13.105/2015, se o juiz verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320, ou que “apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito”, assim como ocorria no CPC de 1973 (art. 284) deverá intimar o autor para que emende a inicial ou a complete, sob pena de indeferimento, conforme previsão do art. 321, mas, agora, num prazo maior, 15 dias – o que sinaliza verdadeiro compromisso com o aproveitamento dos atos processuais e os princípios da efetividade e economia processuais.

3.6 – 5ª Turma

3.6.1 – Direito Processual Penal

RHC 79.834-RJ

PROCESSO

RHC 79.834-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, por unanimidade, julgado em 07/11/2017, DJe 10/11/2017

RAMO DO DIREITO

DIREITO PROCESSUAL PENAL

TEMA

Incidente de falsidade. Indeferimento. Documento juntado há mais de dez anos. Impugnação após a sentença. Preclusão.

DESTAQUE

Não há nulidade na decisão que indefere pedido de incidente de falsidade referente à prova juntada aos autos há mais de 10 anos e contra a qual a defesa se insurge somente após a prolação da sentença penal condenatória, uma vez que a pretensão está preclusa.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Na origem, trata-se de habeas corpus em que se alega cerceamento de defesa em razão do indeferimento de pedido de instauração de incidente de falsidade e a realização de perícia em mídia que contém arquivos de interceptação telefônica. Com efeito, embora não exista prazo definido em lei para que se possa requerer a instauração do incidente de falsidade documental previsto no art. 145 e seguintes do Código de Processo Penal, o fato é que o ofício expedido pela Polícia Federal que deferiu a citada diligência, acompanhado do respectivo CD, foi juntado aos autos há mais de dez anos, de forma que a defesa quedou-se inerte por todo esse período, deixando para impugná-lo somente após a prolação da sentença condenatória, quando já encerrada a instrução processual. Nesse contexto, a permissão do comportamento em análise representaria violação aos princípios da segurança jurídica, da razoabilidade, da lealdade processual e da boa-fé objetiva, diante da reabertura da fase de produção de provas mesmo diante da inércia da parte. Outrossim, tem-se que o deferimento de diligências é ato que se inclui na esfera de discricionariedade regrada do Magistrado processante, que poderá indeferi-las de forma fundamentada, quando as julgar protelatórias ou desnecessárias e sem pertinência com a instrução do processo, não caracterizando, tal ato, cerceamento de defesa, como ocorreu no caso. Finalmente, vale ressaltar ser pacífica a jurisprudência das Cortes Superiores no sentido de que a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullite sans grief, consagrado no art. 563 do CPP – o que não fora demonstrado na presente hipótese.

Confira abaixo o PDF completo do Informativo STJ 615

Ricardo Torques

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