Informativo nº 1059 do STF COMENTADO. Fique ligado aqui no Estratégia Carreiras Jurídicas!
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
A requisição administrativa “para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias” — prevista na Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (Lei 8.080/1990) — não recai sobre bens e/ou serviços públicos de outro ente federativo.
ADI 3454-DF julgado em 20/06/2022 (Info 1059)
O STF recebeu a ADI 3454 em que o PFL (Partido da Frente Liberal) pede liminar para suspender dispositivo legal que embasou a intervenção decretada pelo governo federal em hospitais do Rio de Janeiro. Segundo o partido, a iniciativa desrespeitou o “pacto federativo” porque foram ocupados os hospitais Souza Aguiar e Miguel Couto, que são municipais.
O dispositivo supostamente inconstitucional é o inciso XIII do artigo 15 da Lei nº 8.080, que em setembro de 1990 regulamentou o SUS (Sistema Único de Saúde). Ele permite que a União, os Estados e os Municípios requisitem bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas em caso de perigo iminente, calamidade pública ou epidemias. Segundo o PFL, o inciso deixa em aberto a interpretação sobre quais pessoas jurídicas ficam sujeitas à requisição, permitindo que bens e serviços públicos e privados sejam alvo da norma.
CF/1988: “Art. 5º (…) XXV – no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;”
Lei 8.080/1990: “Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições: (…) XIII – para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente
R: Nooops!!!!
O permissivo constitucional para a requisição administrativa de bens PARTICULARES, em caso de iminente perigo público, tem aplicação nas relações entre Poder Público e patrimônio privado, não sendo possível estender a hipótese às relações entre as unidades da Federação.
Nos termos da jurisprudência desta Corte, ofende o princípio federativo a requisição de bens e serviços de um ente federado por outro, o que somente se admitiria excepcionalmente à União durante a vigência de estado de defesa (CF/1988, art. 136, § 1º, II) e estado de sítio (CF/1988, art. 139, VII).
Entre os entes federados não há hierarquia, sendo-lhes assegurado tratamento isonômico, ressalvadas apenas as distinções porventura constantes na própria CF/1988. Portanto, como as relações entre eles se caracterizam pela cooperação e horizontalidade, tal requisição, ainda que a pretexto de acudir situação fática de extrema necessidade, importa ferimento da autonomia daquele cujos bens ou serviços públicos são requisitados, acarretando-lhe incontestável desorganização.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para atribuir interpretação conforme a Constituição ao art. 15, XIII, da Lei 8.080/1990, excluindo a possibilidade de requisição administrativa de bens e serviços públicos de titularidade de outros entes federativos.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
É constitucional a Resolução 184/2013 do CNJ no que determina aos tribunais de justiça estaduais o encaminhamento, para eventual elaboração de nota técnica, de cópia dos anteprojetos de lei de criação de cargos, funções comissionadas e unidades judiciárias.
ADI 5119-DF, julgado em 20/06/2022 (Info 1059)
A Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) ajuizou a ADI 5119 no STF, contra o parágrafo 3º do artigo 1º da Resolução 184/2013, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Esse dispositivo impõe aos Tribunais de Justiça dos estados o dever de encaminhar ao CNJ cópia dos anteprojetos de lei que tratam da criação de cargos de magistrados e servidores, cargos em comissão, funções comissionadas e unidades judiciárias no âmbito desses tribunais.
Conforme a ADI, a Resolução 184/2013 do CNJ – ao estabelecer critérios para criação de cargos, funções e unidades judiciárias no âmbito do Poder Judiciário, exceto no STF – contém normas que se aplicam indistintamente a todos os segmentos do Judiciário. Porém, há norma específica, contida em seu artigo 1º, parágrafo 3º, aplicável apenas aos Tribunais de Justiça estaduais, o que, no entender da entidade, configura diferença de tratamento.
R: Segue o jogo!!!!
A referida Resolução foi editada em consideração à Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias quanto à geração de novas despesas públicas, visando à execução orçamentária de forma responsável e equilibrada, nos termos do art. 167 da CF/1988. Insere-se, portanto, na perspectiva de uma gestão do Poder Judiciário com responsabilidade, planejamento, avaliação, controle, limite e transparência, a fim de fomentar o uso racional dos recursos públicos mediante análise prévia de anteprojetos de lei.
Nesse contexto, inexiste qualquer tratamento normativo anti-isonômico, pois a adoção da nota técnica, no que couber, quanto aos estados-membros e respectivos tribunais de justiça prestigia (i) o cumprimento da missão constitucional do CNJ para realizar o controle financeiro em relação a toda a magistratura nacional, bem como (ii) o respeito ao federalismo, à autonomia dos entes federativos quanto à programação financeiro-orçamentária (CF/1988, art. 24, I), e ao AUTOGOVERNO dos tribunais de justiça quanto à gestão de recursos humanos (CF/1988, art. 96, I).
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente a ação.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
A atribuição de iniciativa privativa ao Governador do Estado para leis que disponham sobre a organização do Ministério Público estadual contraria o modelo delineado pela Constituição Federal nos arts. 61, § 1º, II, d, e 128, § 5º.
ADI 400/ES, julgamento em 20/06/2022 (Info 1059)
Trata-se de ADI ajuizada pelo PGR para obter a declaração de inconstitucionalidade do artigo 63, parágrafo único, V, da Constituição do Espírito Santo, que estabelece ser de iniciativa privativa do governador do estado o ajuizamento de ADI contra lei que disponha sobre a organização do Ministério Público, da Procuradoria-Geral do estado e da Defensoria Pública.
Alegou a PGR, ante representação do presidente da Associação Espírito-Santense do Ministério Público, que essa norma viola os artigos 25, caput, e 128, parágrafo 5º, da Constituição, além de violar a limitação do artigo 11 do ADCT.
CF/1988:
Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1º Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. (…) § 3º Decorrido o prazo de quinze dias, o silêncio do Presidente da República importará sanção. § 4º O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores.
Art. 128 (…) § 5º Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:
R: Nooops!!!!
É inconstitucional a atribuição de iniciativa privativa a governador de estado para leis que disponham sobre a organização do Ministério Público estadual.
Nos estados, os Ministérios Públicos poderão estabelecer regras sobre sua organização, atribuições de seus membros e seu estatuto por meio de lei complementar de iniciativa do respectivo Procurador-Geral de Justiça.
Assim, na esfera estadual, coexistem DOIS regimes de organização: (i) a Lei Orgânica Nacional (Lei 8.625/1993); e (ii) a Lei Orgânica do estado-membro, que delimita as regras acima referidas e que, como visto, se dá através de lei complementar de iniciativa do Procurador-Geral de Justiça.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da expressão “do Ministério Público”, contida no art. 63, parágrafo único, V, da Constituição do Estado do Espírito Santo.
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL
O poder de veto previsto no art. 66, § 1º, da Constituição não pode ser exercido após o decurso do prazo constitucional de 15 (quinze) dias.
ADPF 893-DF, julgamento em 20/06/2022 (Info 1059)
O Presidente Jair Bolsonaro realizou veto de trecho de lei após o prazo de quinze dias constitucionalmente previsto para tanto. Ao tomar ciência do veto extemporâneo, o Partido Solidariedade ajuizou a ADPF 893 na qual apontou lesão ao preceito fundamental da separação de Poderes diante do veto do presidente da República ao artigo 8º da Lei 14.183/2021, divulgado na edição extra do Diário Oficial da União (DOU) do dia 15/07/2021, sendo que o prazo para tanto expirou em 14/07/2021.
A divulgação do veto, explicou o partido, foi feita horas depois da promulgação e publicação da norma, resultado da sanção do Projeto de Lei de Conversão (PLV) 12/2021.
CF/1988:
Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1º Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. (…) § 3º Decorrido o prazo de quinze dias, o silêncio do Presidente da República importará sanção. § 4º O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores.
R: Mas é claro!!!!
A prerrogativa do poder de veto presidencial somente pode ser exercida dentro do prazo expressamente previsto na Constituição, não se admitindo exercê-la após a sua expiração.
No caso, apenas no dia imediatamente seguinte à expiração do prazo, a Presidência da República providenciou a publicação de edição extra do Diário Oficial da União para a divulgação de novo texto legal com a aposição adicional de veto a dispositivo que havia sido sancionado anteriormente.
Esse tipo de procedimento não se coaduna com a Constituição Federal, de modo que, ultrapassado o período do art. 66, § 1º, da CF/1988, o texto do projeto de lei é, necessariamente, sancionado (art. 66, § 3º) e o poder de veto não pode mais ser exercido.
Ademais, a manutenção de veto extemporâneo na forma do art. 66, § 4º, da CF/1988 não retira a sua inconstitucionalidade, pois o ato apreciado pelo Congresso Nacional sequer poderia ter sido praticado. Nessa hipótese, caso o Legislativo deseje encerrar a vigência de dispositivo legal por ele aprovado, deve retirá-lo da ordem jurídica por meio da sua revogação.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do veto adicional publicado na edição extra do Diário Oficial da União de 15.7.2021 e, assim, restabelecer a vigência do art. 8º da Lei 14.183/2021.
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL
À luz da EC 53/2006, é incompatível com a ordem constitucional vigente a adoção, para fins de repartição das quotas estaduais e municipais referentes ao salário-educação, do critério legal de unidade federada em que realizada a arrecadação desse tributo, devendo-se observar unicamente o parâmetro quantitativo de alunos matriculados no sistema de educação básica.
ADPF 188-DF, julgamento em 15/06/2022 (Info 1059)
Governadores dos nove Estados nordestinos ajuizaram a ADPF 188 no STF. Na ação, os autores alegam afronta ao preceito fundamental do direito à educação, contido nos artigos 212, parágrafo 6º, e 149, da Constituição Federal de 1988.
Eles contestam o conjunto normativo composto pelo artigo 15, parágrafo 1º, Lei federal nº 9.424/96, e pelo artigo 2º, da Lei federal 9.766/98, ambos alterados pela Lei 10.832/03. De acordo com a ação, esses dispositivos têm sido interpretados pela Fundação Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) de modo que a distribuição das cotas estaduais, relativas à cobrança do salário-educação, leva em consideração não só o critério constitucional do número de alunos matriculados, mas também o da origem da fonte de arrecadação.
Tal fato violaria o preceito constitucional do direito à educação, que estabelece como critério único e exclusivo para a distribuição dos valores relativos ao salário-educação o número de alunos matriculados nas escolas.
CF/1988:
Art. 212 (…) § 6º as cotas estaduais e municipais da arrecadação da contribuição social do salário-educação serão distribuídas proporcionalmente ao número de alunos matriculados na educação básica nas respectivas redes públicas de ensino.
Lei 9.424/1996:
Art 15. O Salário-Educação, previsto no art. 212, § 5º, da Constituição Federal e devido pelas empresas, na forma em que vier a ser disposto em regulamento, é calculado com base na alíquota de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o total de remunerações pagas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, assim definidos no art. 12, inciso I, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. § 1o O montante da arrecadação do Salário-Educação, após a dedução de 1% (um por cento) em favor do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, calculado sobre o valor por ele arrecadado, será distribuído pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, observada, em 90% (noventa por cento) de seu valor, a arrecadação realizada em cada Estado e no Distrito Federal, em quotas, da seguinte forma:
R: Nooops!!!!
O salário-educação é uma contribuição social cobrada sobre o total das remunerações pagas ou creditadas pelas empresas, a qualquer título, aos segurados empregados, destinando-se à manutenção de programas, projetos e ações voltados para o financiamento da educação básica pública.
A partir da EC 53/2006, que incluiu o § 6º ao art. 212 da CF/1988, as cotas do salário-educação destinadas aos estados e municípios têm o número de alunos matriculados nas redes públicas de ensino como único critério de distribuição da arrecadação.
A regra prevista no § 1º do art. 15 da Lei 9.424/1996, com a redação dada pela Lei 10.832/2003, se tornou incompatível com a CF/1988 após o advento da referida emenda. Isso porque a literalidade do texto constitucional evidencia exatamente que as cotas destinadas aos estados e municípios (2/3 do montante arrecadado) devem ser distribuídas nacionalmente de acordo com o número de alunos matriculados nas redes de ensino, já que não há qualquer referência à lei e tampouco à proporcionalidade quanto ao valor arrecadado em cada estado.
Nesse contexto, critério de distribuição com base na proporcionalidade do local de arrecadação não atende ao objetivo da República de reduzir as desigualdades regionais, pois contribui para aumentar a discrepância entre os valores dispensados com o financiamento de cada aluno no Brasil. Por exemplo, em 2021, a distribuição ao Maranhão foi de R$ 55,94 por matrícula, enquanto São Paulo recebeu R$ 816,05.
A repartição igualitária da arrecadação da contribuição social em referência é uma forma de concretização do princípio federativo, com ênfase na cooperação fiscal entre os diversos centros de governo para a progressiva realização da igualdade das condições sociais de vida em todo o território nacional.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para dar interpretação conforme ao conjunto normativo compreendido pelo art. 15, § 1º, da Lei federal 9.424/1996, e pelo art. 2º da Lei federal 9.766/1998, ambas alteradas pela Lei 10.832/2003, de modo a determinar que as cotas estaduais e municipais cabíveis, a título de salário-educação, sejam integralmente distribuídas, observando-se tão somente a proporcionalidade do número de alunos matriculados de forma linear. Por fim, o Tribunal, por unanimidade, modulou os efeitos da decisão, para que produza efeitos somente a partir de 1º.1.2024.
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