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Informativo 651/STJ Comentado

Olá, pessoal, tudo bom?

Meu nome é Lucas Evangelinos, professor aqui no Estratégia Carreiras Jurídicas, e abaixo segue o Informativo nº 651/STJ COMENTADO, com um pouco de informalidade para ajudar na memorização…

Aliás, vejam alguns questionamentos interessantes a serem respondidos pelo informativo:

(a) tá pipocando um PAD de conduta equiparada a crime, qual o prazo prescricional?

(b) aquele loteamento ilegal que surgiu na sua cidade, será que o município é obrigado a regularizar aquela pândega?

(c) concessionária de telefonia sem vergonha me cobrou indevidamente, quanto tempo posso ficar dormindo até requer judicialmente o valor de volta?

(d) sucessão híbrida (quê?!)… o que é isso? Há quota mínima para a companheira/cônjuge sobrevivente?

(e) a construtora – para variar – atrasou a entrega do meu apartamento…e aí, como fica?

(f) o condomínio pode privar aquele vizinho inadimplente (e “mala”) de usar a quadra, salão de festas etc.?

(g) a ERB (“antena” para os íntimos) é estabelecimento empresarial? Cabe ação renovatória?

(h) decisão de natureza complexa, qual recurso cabível?

(i) revista pessoal por agente particular, pode isso Arnaldo?

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Se quiser, também pode ler por aqui, só antecipo minhas desculpas em razão de a formatação do WordPress não cooperar com a do Word, além de não permitir fluxogramas e imagens.

Sumário

Sumário. 1

DIREITO ADMINISTRATIVO. 5

1.    Infrações disciplinares e prazo prescricional. 5

1.1.    Situação fática. 5

1.2.    Análise Estratégica. 6

1.2.1.  Questão em debate. 7

1.2.2.  E qual foi o desfecho? 7

1.2.3.  Placar final. 8

1.3.    Questões objetivas. 8

1.4.    Gabarito. 9

2.    Regularização de loteamentos, poder-dever do município? 9

2.1.    Situação fática. 9

2.2.    Análise Estratégica. 10

2.2.1.  Questão em debate. 10

2.2.2.  Evolução jurisprudencial 11

2.2.3.  Por que o STJ restringiu o dever-poder do município? 12

2.3.    Questões objetivas. 15

2.4.    Gabarito. 15

DIREITO CIVIL 15

3.    Cláusula penal compensatória em contratos de aquisição imobiliária. 15

3.1.    Situação fática. 15

3.2.    Análise Estratégica. 16

3.2.1.  Questão em debate. 16

3.2.2.  Aplica-se a Lei nº 13.786/18 ao caso? 17

3.2.3.  O que é cláusula penal? 17

3.2.4.  Nos contratos de aquisição imobiliária, em regra, temos cláusula penal moratória expressamente prevista no instrumento. Será que podemos cumular seu valor com lucros cessantes? 20

3.2.5.  “(…) e, em regra, estabelecida (a cláusula penal moratória) em valor equivalente ao locativo (…)”, o que isso quer dizer? 21

3.2.6.  Esse entendimento limitando a indenização à valor da cláusula penal moratória é absoluto?  21

3.2.7.  O precedente revela um novo entendimento do STJ? 22

3.2.8.  Placar final. 22

3.2.9.  Trechos relevantes dos votos divergentes publicados. 23

3.3.    Questões objetivas. 23

3.4.    Gabarito. 24

3.5.    Bibliografia. 24

4.    Prescrição e ação de repetição de indébito. 24

4.1.    Situação fática. 24

4.2.    Análise Estratégica. 26

4.2.1.  Por que não se aplica o art. 206, § 3º, inciso IV, do CC? 26

4.2.2.  Placar final. 27

4.3.    Questões objetivas. 27

4.4.    Gabarito. 27

5.    Sucessão híbrida e quota hereditária do cônjuge (ou companheiro) sobrevivente. 28

5.1.    Situação fática. 28

5.2.    Análise Estratégica. 29

5.2.1.  Questão em debate. 29

5.2.2.  O MP/RS teve razão ao requerer a aplicação do art. 1.790 do CC? 30

5.2.3.  Um adendo antes de prosseguirmos, qual foi a interpretação dada pelo STJ à parte final do art. 1.829, inciso I, do CC (“ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;”)? 31

5.2.4.  Análise do art. 1.832 do CC. 32

5.3.    Questões objetivas. 35

5.4.    Gabarito. 35

DIREITO DO CONSUMIDOR. 35

6.    Dação em pagamento e árvores de reflorestamento. 35

6.1.    Situação fática. 35

6.2.    Análise Estratégica. 36

6.2.1.  Questão em debate. 36

6.2.2.  Ausente na escritura pública da dação em pagamento do imóvel qualquer cláusula referente à transferência das árvores de reflorestamento, pode-se presumir que foram também transferidas ao credor? 37

6.3.    Questões objetivas. 38

6.4.    Gabarito. 38

7.    “Inversão” da cláusula penal em contratos de aquisição imobiliária. 38

7.1.    Situação fática. 38

7.2.    Análise Estratégica. 39

7.2.1.  Questão em debate. 39

7.2.2.  Aplica-se a Lei nº 13.786/18 ao caso? 40

7.2.3.  O que é cláusula penal? 41

7.2.4.  Se o contrato de aquisição imobiliária prever cláusula penal apenas em favor do vendedor, é possível estendê-la em favor do comprador? 43

7.2.5.  Placar final. 46

7.2.6.  Trechos relevantes dos votos divergentes publicados. 46

7.3.    Questões objetivas. 47

7.4.    Gabarito. 47

7.5.    Bibliografia. 48

8.    Prazo decadencial convencional para utilização de serviço. 48

8.1.    Situação fática. 48

8.2.    Análise Estratégica. 49

8.2.1.  Questão em debate. 49

8.2.2.  Há relação de consumo entre os demandantes? 49

8.2.3.  O CDC prevê alguma vedação para convenção de prazo decadencial para utilização de bem ou serviço? 50

8.3.    Questões objetivas. 51

8.4.    Gabarito. 51

9.    Condômino inadimplente e áreas comuns do edifício. 51

9.1.    Situação fática. 51

9.2.    Análise Estratégica. 52

9.2.1.  Questão em debate. 52

9.2.2.  Microssistema condominial. 52

9.2.3.  Diante desse cenário, a convenção poderia prever a proibição do uso de determinadas áreas comuns pelo condômino inadimplente? 53

9.3.    Questões objetivas. 55

9.4.    Gabarito. 56

DIREITO EMPRESARIAL 56

10.     ERB é estabelecimento empresarial. 56

10.1.   Situação fática. 56

10.2.   Análise Estratégica. 57

10.2.1.   Questão em debate. 57

10.2.2.   Ação renovatória. 57

10.2.3.   O que é um estabelecimento empresarial? 57

10.2.4.   Ação renovatória e estabelecimento empresarial. 58

10.2.5.   Ação renovatória como óbice ao enriquecimento sem causa do locador. 58

10.2.6.   A ERB é um estabelecimento empresarial? 59

10.3.   Questões objetivas. 60

10.4.   Gabarito. 60

11.     Plano de recuperação judicial: TR e Juros. 60

11.1.   Situação fática. 61

11.2.   Análise Estratégica. 61

11.2.1.   Questão em debate. 61

11.2.1.   O Poder Judiciário pode exercer controle sobre o disposto no plano de recuperação judicial? 62

11.2.1.   TR. 62

11.2.1.   Juros de 1% a.a. 63

11.2.2.   Homologação do plano de recuperação judicial e protesto. 64

11.3.   Questões objetivas. 65

11.4.   Gabarito. 65

12.     Crédito em moeda estrangeira e Direito Intertemporal. 65

12.1.   Situação fática. 66

12.2.   Análise Estratégica. 67

12.2.1.   Questão em debate. 67

12.2.2.   Direito intertemporal. 67

12.3.   Questões objetivas. 70

12.4.   Gabarito. 70

DIREITO PROCESSUAL CIVIL 71

13.     Critérios para identificação do cabimento de recurso em decisão de duplo conteúdo (natureza complexa). 71

13.1.   Situação fática. 71

13.2.   Análise Estratégica. 72

13.2.1.   Questão em debate. 72

13.2.2.   Critérios para identificação do cabimento de recurso em decisão de duplo conteúdo (natureza complexa). 72

13.3.   Questões objetivas. 74

13.4.   Gabarito. 75

DIREITO PROCESSUAL PENAL 75

14.     Revista pessoal por agente de segurança privada. 75

14.1.   Situação fática. 75

14.2.   Análise Estratégica. 76

14.2.1.   Questão em debate. 76

14.2.2.   Busca pessoal (revista pessoal) e busca domiciliar. 76

14.2.3.   E se o réu estivesse com a droga nas mãos? 78

14.3.   Questões objetivas. 78

14.4.   Gabarito. 78

14.1.   Bibliografia. 78

DIREITO ADMINISTRATIVO

1.   Infrações disciplinares e prazo prescricional.

MANDADO DE SEGURANÇA (MS)

O prazo prescricional previsto na lei penal se aplica às infrações disciplinares também capituladas como crime independentemente da apuração criminal da conduta do servidor. (STJ, MS 20857/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. Acd. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 12/06/2019)

Resultado: Mandado de segurança denegado.

1.1.            Situação fática.

LUIZA impetrou mandado de segurança contra decisão do MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, consubstanciada na Portaria nº 5/2014, oriunda de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado em 2008, que converteu a exoneração da impetrante em destituição de cargo.

Em resumo, no início do PAD instaurado em 2008, a impetrante pediu exoneração do seu cargo em comissão. Ocorre que, ao final do PAD, constatou-se, no âmbito administrativo, a prática dos delitos previstos nos arts. 299, 312 e 317 do CP por parte da impetrante.

Por conta disso, o MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE converteu a então exoneração da impetrante em destituição (penalidade disciplinar), nos termos dos art. 132, incisos I, e arts. 135 e 142, inciso I, da Lei nº 8.112/90:

Art. 135 da Lei nº 8.112/90. A destituição de cargo em comissão exercido por não ocupante de cargo efetivo será aplicada nos casos de infração sujeita às penalidades de suspensão e de demissão. (…).”

Art. 132 da Lei nº 8.112/90. A demissão será aplicada nos seguintes casos: I – crime contra a administração pública;”

Art. 142 da Lei nº 8.112/90. A ação disciplinar prescreverá:

I – em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;”

A impetrante, por sua vez, sustentou a prescrição intercorrente[1] de sua penalidade disciplinar, com base nos arts. 152 e 167 da Lei nº 8.112/90, já que seu PAD foi encerrado após 5 (cinco) anos de instauração.

A autoridade coatora, por outro lado, defendeu a inexistência de prescrição intercorrente, já que deveriam ser aplicados os prazos prescricionais penais, nos termos do art. 142, § 2º, da Lei nº 8.112/90.

Art. 142 da Lei nº 8.112/90. A ação disciplinar prescreverá:

I – em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

II – em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

III – em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.

§ 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

§ 2º Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.

§ 3º A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.

§ 4º Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção.”

Em réplica, no entanto, a impetrante afirmou não ser possível aplicar o art. 142, § 2º, da Lei nº 8.112/90, já que não existia apuração criminal de sua conduta.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Mandado de segurança denegado.

1.2.            Análise Estratégica.

1.2.1.              Questão em debate

O ponto nodal da discussão reside na aplicação ou não do art. 142, § 2º, da Lei nº 8.112/90, quando inexistir apuração criminal em andamento sobre os fatos imputados ao servidor no PAD:

Art. 142 da Lei nº 8.112/90. A ação disciplinar prescreverá:

I – em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

II – em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

III – em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.

(…) § 2º Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime. (…).”

1.2.2.              E qual foi o desfecho?

R: O prazo prescricional previsto na lei penal se aplica às infrações disciplinares também capituladas como crime, independentemente de existir (ou não) apuração criminal da conduta do servidor.

“E como pensa o STF?” De acordo com o Min. OG FERNANDES, o STF caminha no mesmo sentido:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Ou seja, tanto para o STF quanto para o STJ, a fim de que seja aplicável o art. 142, § 2º, da Lei n. 8.112/1990, não é necessário demonstrar a existência da apuração criminal da conduta do servidor. Isso porque o lapso prescricional não pode variar ao talante da existência ou não de apuração criminal, justamente pelo fato de a prescrição estar relacionada à segurança jurídica. Assim, o critério para fixação do prazo prescricional deve ser o mais objetivo possível – justamente o previsto no dispositivo legal referido –, e não oscilar de forma a gerar instabilidade e insegurança jurídica para todo o sistema.” (STJ, MS 20857/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. Acd. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 12/06/2019)

E se estivéssemos falando de uma ACP contra servidor por prática de improbidade administrativa, cujo ato também representasse infração penal, poderíamos aplicar o mesmo entendimento acima?

Ou seja, o prazo prescricional previsto na lei penal aplicar-se-ia, independentemente de existir (ou não) apuração criminal da conduta improba do servidor?

Sim, como lembrou o Min. GURGEL DE FARIA em seu Voto-Vista:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Recentemente, entretanto, esta Seção, em processo de minha relatoria [EDv nos EREsp 1656383/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/06/2018, DJe 05/09/2018], manifestou-se no sentido de que ‘a prescrição da improbidade administrativa deveria ser contada de acordo com a pena em concreto, uma vez que tal lapso prescricional não poderia ficar condicionado à existência ou não da ação penal’.” (STJ, MS 20857/DF, Voto-Vista, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 12/06/2019)

Em resumo, praticada uma infração disciplinar por servidor público ou um ato de improbidade administrativa que sejam também infrações penais, aplica-se o prazo prescricional penal, independentemente de existir (ou não) apuração da conduta no âmbito criminal.

1.2.3.              Placar final.

OG FERNANDES, ASSUSETE MAGALHÃES, SÉRGIO KUKINA, GURGEL DE FARIA, FRANCISCO FALCÃO e HERMAN BENJAMIN NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
Diante da independência das esferas administrativa e criminal, não se pode entender que a existência de apuração criminal é pré-requisito para a utilização do prazo prescricional penal. Ou seja, a aplicação do prazo prescricional previsto na lei penal NÃO exige demonstração da existência de apuração criminal da conduta do servidor público. A aplicação do prazo prescricional previsto na lei penal exige demonstração da existência de apuração criminal da conduta do servidor público.
6 1

1.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. O prazo prescricional previsto na lei penal se aplica às infrações disciplinares também capituladas como crime independentemente da apuração criminal da conduta do servidor, entendimento que não se aplica quando estivermos diante de atos de improbidade administrativa que também sejam capitulados como crime.

1.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

2.   Regularização de loteamentos, poder-dever do município?

RECURSO ESPECIAL (REsp)

O poder-dever do Município de regularizar loteamentos ilegais (clandestinos ou irregulares) é restrito à realização de obras essenciais em conformidade com a legislação urbanística local, sem prejuízo também do seu poder-dever de cobrar dos responsáveis os custos em que incorrer nessa sua atuação saneadora. (STJ, REsp 1164893/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 01/07/2019)

Resultado: Recurso especial parcialmente provido.

Tribunal de Origem: TJSE.

2.1.            Situação fática.

O MINISTÉRIO PÚBLICO/SE ajuizou uma ACP em face do município de ARACAJÚ e do loteador ROBSON, para que ambos fossem condenados a regularizar loteamento irregular.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou procedente a pretensão, condenando ambos os réus a executar todas as obras de infraestrutura necessárias à urbanização total do loteamento irregular

Em recurso de apelação, o município de ARACAJÚ defendeu a improcedência da demanda.

Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso

Em recurso especial, o município de ARACAJÚ alegou haver violação ao art. 40 da Lei nº 6.766/79.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu parcial provimento ao recurso para restringir a obrigação do Município de executar as obras de infraestrutura somente àquelas essenciais nos termos da legislação urbanística local, compreendendo, no mínimo, ruas, esgoto e iluminação pública

2.2.            Análise Estratégica.

2.2.1.              Questão em debate.

Discute-se qual a interpretação que deve ser dada ao art. 40, caput, da Lei nº 6.766/79.

Art. 40, caput, da Lei nº 6.766/79. A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, se desatendida pelo loteador a notificação, PODERÁ REGULARIZAR loteamento ou desmembramento não autorizado ou executado sem observância das determinações do ato administrativo de licença, para evitar lesão aos seus padrões de desenvolvimento urbano e na defesa dos direitos dos adquirentes de lotes.”

(i) A regularização de loteamento ilegal de solo urbano é uma faculdade ou poder-dever do município?

“Pera, o que é loteamento?” Opa, me adiantei. O parcelamento é a divisão do solo, que pode ser realizado por meio de loteamento ou desmembramento:

Art. 2º, caput, da Lei nº 6.766/79. O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante LOTEAMENTO ou DESMEMBRAMENTO, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais pertinentes.”

(ii) Sendo um poder-dever, qual sua extensão?

“Certo, e qual a diferença entre loteamento e desmembramento?” Ambas essas formas de parcelamento de solo têm conceito legal:

LOTEAMENTO PARCELAMENTO
Art. 2º, § 1º, da Lei nº 6.766/79. Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes.” Art. 2º, § 2º, da Lei nº 6.766/79. Considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.”

“Mais uma, o que se entende por loteamento ilegal?” Nas palavras de JOSÉ AFONSO DA SILVA:

“Esses loteamentos (sentido amplo) ilegais são de duas espécies: (a) os clandestinos, que são aqueles que não foram aprovados pela Prefeitura Municipal; (b) os irregulares, que são aqueles aprovados pela Prefeitura mas que não foram inscritos, ou o foram mas são executados em conformidade com o plano e as plantas aprovadas.” (José Afonso da Silva)

Voltando à questão em debate, havendo um loteamento ilegal, o município:

(i) tem a faculdade ou poder-dever de regularizá-lo?

(ii) se tem um poder-dever, qual sua extensão?

2.2.2.              Evolução jurisprudencial

E aí, o que se extrai do art. 40, caput, da Lei nº 6.766/79?

Art. 40, caput, da Lei nº 6.766/79. A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, se desatendida pelo loteador a notificação, PODERÁ REGULARIZAR loteamento ou desmembramento não autorizado ou executado sem observância das determinações do ato administrativo de licença, para evitar lesão aos seus padrões de desenvolvimento urbano e na defesa dos direitos dos adquirentes de lotes.”

Com base nesse dispositivo, o Min. HERMAN BENJAMIN aponta, no início do seu voto, para evolução jurisprudencial a respeito da interpretação dada ao art. 40 da Lei nº 6.766/79 na Primeira e Segunda Turmas do STJ, até o presente acórdão, que consolidou o entendimento dessas duas turmas na 1ª Seção:

Precedentes antigos Precedentes recentes Precedentes mais recentes Precedente atual (1ª SEÇÃO)
PODER-DEVER FACULDADE FACULDADE e PODER-DEVER PODER-DEVER RESTRITO
O art. 40 da Lei nº 6.766/79 prevê um poder-dever do município de promover obras de infraestrutura em loteamento ilegal, ou seja, um ato vinculado da municipalidade. STJ, REsp 1.113.789/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/06/2009, DJe 29/06/2009 O art. 40 da Lei nº 6.766/79 confere ao município a faculdade de promover obras de infraestrutura em loteamento ilegal, sob seu o critério de oportunidade e conveniência. STJ, REsp 859.905/RS, Rel. p/ Acórdão Ministro CESAR ASFOR ROCHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe 16/03/2012 A princípio, o art. 40 da Lei nº 6.766/79 confere ao município a faculdade de promover obras de infraestrutura em loteamento ilegal. Contudo, não mais sendo possível exigir a regularização do loteador, a municipalidade passa a ter um poder-dever de regularizar o parcelamento irregular. STJ, REsp 1394701/AC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/09/2015, DJe 28/09/2015 O art. 40 da Lei nº 6.766/79, realçado pelo art. 30, inciso VIII, da CF, prevê um poder-dever do município de promover obras de infraestrutura em loteamento ilegal, sendo tal poder-dever, no entanto, restrito à realização de obras essenciais a serem implantadas em conformidade com a legislação urbanística local (art. 40, § 5º, da Lei nº 6.766/79), como, por exemplo, ruas, esgoto, energia e iluminação pública. Isso sem prejuízo também do poder-dever do município de cobrar dos responsáveis os custos em que incorrer nessa sua atuação saneadora. STJ, REsp 1164893/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 01/07/2019

2.2.3.              Por que o STJ restringiu o dever-poder do município?

R: Imagine que, em uma cidade de 3 mil habitantes, um loteador implemente o loteamento ilegal X de alto padrão. A maior parte da cidade mal tem malha urbana, ou seja, ruas, esgoto, energia e iluminação pública.

Aí, o Ministério Público propõe uma ACP em face do município, sendo este condenado a realizar obras de infraestrutura no loteamento ilegal X, como ruas, esgoto, energia e iluminação pública.

Nessa situação, seria justo aos demais munícipes que a inércia do loteador beneficiasse, estruturalmente, uma pequena área da cidade e um pequeno número de pessoas, tudo arcado pelo município de pequeno porte? Não! Jamais!

Vejam o que disse o Min. HERMAN BENJAMIN:

“[Trecho do corpo do acórdão:] A omissão do loteador não gera, por si só, prioridade absoluta e automática no confronto com outras demandas preexistentes relativas à malha urbana e a outros aspectos associados à regularidade urbanístico-ambiental. A interpretação da lei federal não pode implicar um ‘fura-fila’ no atendimento das carências sociais, sobretudo se, para solucionar as eventualmente judicializadas, acabar-se por desamparar os mais pobres, com igual precisão urbanístico-ambiental. O governo local deve promover, sim, as melhorias necessárias para aqueles que moram nesses loteamentos, mas direcionadas a todos os habitantes da cidade. Nesse ponto, tenho dúvida quanto aos limites desse dever municipal, especialmente em casos de loteamentos clandestinos, ou seja, aqueles realizados sem a aprovação do Poder Público.

Exemplifico com incontáveis loteamentos clandestinos e irregulares que implementam condomínios de veraneio suntuosos em áreas de beleza natural privilegiadas. Muito comumente, esses empreendimentos formam ilhas de luxo encravadas e muradas em regiões que, em contraste, não oferecem aos moradores permanentes condições adequadas de saneamento, mobilidade urbana, segurança etc. Incabível impor ao Município o asfaltamento, por exemplo, de um condomínio de veraneio ou de classe média se as ruas da cidade, que servem diariamente os moradores permanentes ou os em pobreza extrema, não possuem esse melhoramento. Inviável ainda obrigá-lo a implantar calçadas e vias em um condomínio de luxo, apenas porque o loteamento não foi completado, se o restante da cidade, onde moram os menos afortunados, não conta com iluminação pública ou esgotamento sanitário. Seria verdadeira inversão absurda de prioridades, ou distribuição invertida de riqueza, dos mais necessitados para os mais afortunados.” (STJ, REsp 1164893/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 01/07/2019)

O que o município deve fazer então diante de um loteamento ilegal?

“[Trecho do corpo do acórdão:] Mesmo na hipótese de loteamentos irregulares (aprovados, mas não inscritos ou executados adequadamente), a obrigação do Poder Público restringe-se à infraestrutura necessária para sua inserção na malha urbana, como ruas, esgoto, iluminação pública etc., de modo a atender aos moradores já instalados, sem prejuízo do também dever-poder da Administração de cobrar dos responsáveis os custos em que incorrer na sua atuação saneadora. Não teria cabimento exigir que o Município realize obras não essenciais, inexistentes no restante da cidade (como fiação subterrânea, calçamento especial, iluminação pública diferenciada etc.), ou que atendam a lotes ainda não comercializados e ocupados, apenas porque constavam do plano aprovado pelo loteador inadimplente. Isso ampliaria indevidamente a atuação Municipal, tal qual fixado no art. 40, caput, da Lei Lehmann (‘evitar lesão aos seus padrões de desenvolvimento urbano e na defesa dos direitos dos adquirentes de lotes’).” (STJ, REsp 1164893/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 01/07/2019)

“Infraestrutura necessária, obras essenciais…meio genérico, né?” Sim, por isso que o Min. HERMAN BENJAMIN destacou que compete ao Poder Judiciário especificar quais obras essenciais devem ser realizadas:

“[Trecho do corpo do acórdão:] (…) mas registro que apontei o entendimento de que o correto seria as instâncias ordinárias apontarem quais são as obras a serem realizadas.” (STJ, REsp 1164893/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 01/07/2019)

“Entendi. O município sempre terá esse poder-dever, ainda que mínimo/restrito, certo?” Nem sempre, como destacado pelo Min. HERMAN BENJAMIN:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Evidentemente, ao Poder Judiciário não compete, pois seria um despropósito, determinar a regularização de loteamentos clandestinos (não aprovados pelo Município) em terrenos que ofereçam perigo imediato para os moradores lá instalados, assim como os que estejam em Áreas de Preservação Permanente, de proteção de mananciais de abastecimento público, ou mesmo fora do limite de expansão urbana fixada nos termos dos padrões de desenvolvimento local. A intervenção judicial, nessas circunstâncias, faz-se na linha de exigir do Poder Público a remoção das pessoas alojadas nesses lugares insalubres, impróprios ou inóspitos, assegurando-lhes habitação digna e segura – o verdadeiro direito à cidade.” (STJ, REsp 1164893/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 01/07/2019)

Sistematizando:

LOTEAMENTO IRREGULAR LOTEAMENTO CLANDESTINO em terrenos que ofereçam perigo imediato para os moradores lá instalados, que estejam em APP, área de proteção de mananciais de abastecimento público ou fora do limite de expansão urbana
A obrigação do município restringe-se à infraestrutura necessária para sua inserção na malha urbana. O município não tem obrigação de promover obras de infraestrutura e a intervenção judicial, nessas circunstâncias, faz-se na linha de exigir do Poder Público a remoção das pessoas alojadas nesses lugares insalubres, impróprios ou inóspitos, assegurando-lhes habitação digna e segura.

2.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. O poder-dever do Município de regularizar loteamentos ilegais (clandestinos ou irregulares) é restrito à realização de obras essenciais em conformidade com a legislação urbanística local.

2.4.            Gabarito.

Q1º. VERDADEIRA.

DIREITO CIVIL

3.   Cláusula penal compensatória em contratos de aquisição imobiliária.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

Nos contratos de aquisição imobiliária, havendo atraso na entrega de imóvel em construção, objeto de contrato ou promessa de compra e venda, a cláusula penal moratória prevista na avença tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida (a cláusula penal moratória) em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes. (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Resultado: Recurso especial desprovido.

Tribunal de Origem: TJDFT.

3.1.            Situação fática.

KARLA ajuizou ação em face de MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A, sob a alegação de mora na entrega de imóvel objeto de Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda firmado entre as partes. Em breve síntese, a autora alegou que, de acordo com o contrato, o imóvel deveria ser entregue em 30.04.2010, mas só foi entregue em 11.01.2012. E, mais, a avença a que aderiu a autor prevê que, se transcorrido o prazo de tolerância para a entrega do imóvel, cabe multa de 1% sobre o valor do contrato por mês de atraso.

Dessa forma, pugnou pela condenação da ré ao pagamento da multa contratual de 1% (cláusula penal moratória) MAIS lucros cessantes, desde 30.04.2010 até a entrega em 11.01.2012.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou procedente a pretensão.

Em apelação, a MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A requereu a reforma da sentença.

Instância Desfecho
2º Grau Deu provimento ao recurso para afastar a indenização por lucros cessantes, mantendo apenas a multa contratual.

Em recurso especial, KARLA pugnou pela reforma do Acórdão.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Negou provimento ao recurso.

3.2.            Análise Estratégica.

3.2.1.              Questão em debate

A questão controvertida consiste em saber se é possível a cumulação de indenização por lucros cessantes com a cláusula penal MORATÓRIA, nos casos de inadimplemento relativo do vendedor, em virtude do atraso na entrega de imóvel em construção objeto de contrato ou promessa de compra e venda.

3.2.2.              Aplica-se a Lei nº 13.786/18 ao caso?

R: Antes de ingressar no julgamento do mérito, a SEGUNDA SEÇÃO debateu a possibilidade de incidência da Lei nº 13.786/18 aos contratos anteriores à sua vigência.

A Lei nº 13.786/18, de 27 de dezembro de 2018, alterou as Leis nº 4.591/64 e 6.766/79, para disciplinar questões acerca do inadimplemento (parcial ou absoluto) em contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária ou de loteamento.

E a novel legislação dispõe, expressamente, a respeito da consequência da mora na entrega do imóvel:

Art. 43-A, § 2º, da Lei nº 13.786/18. Na hipótese de a entrega do imóvel estender-se por prazo superior àquele previsto no caput deste artigo, e não se tratar de resolução do contrato, será devida ao adquirente adimplente, por ocasião da entrega da unidade, indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, pro rata die , corrigido monetariamente conforme índice estipulado em contrato.”

Ou seja, em caso de mora parcial, incide apenas cláusula penal moratória.

E o que o STJ decidiu? O STJ entendeu que a Lei nº 13.786/18 somente se aplica a contratos posteriores à sua vigência:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Destarte, penso que não se pode cogitar de aplicação simples e direta da nova Lei n. 13.786/18 para a solução de casos anteriores ao advento do mencionado Diploma legal (retroatividade da lei, com consequente modificação jurisprudencial, com ou sem modulação).” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

3.2.3.              O que é cláusula penal?

R: De acordo com m Min. LUIS FELIPE SALOMÃO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] (…) a cláusula penal constitui pacto secundário acessório – uma condição – por meio do qual as partes determinam previamente uma multa (geralmente em pecúnia), consubstanciando indenização para o caso de inadimplemento absoluto ou de cláusula especial, hipótese em que se denomina cláusula penal compensatória. Ou mesmo, como no presente caso, a cláusula penal pode ser estabelecida para prefixação de indenização por inadimplemento relativo (quando se mostrar útil o adimplemento, ainda que tardio; isto é, defeituoso), recebendo, assim, a denominação de cláusula penal moratória.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Vamos fazer uma tabela para ficar mais fácil:

CLÁUSULA PENAL (PENA CONVENCIONAL ou MULTA CONTRATUAL)
Art. 409 CC. A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se [i] à inexecução completa da obrigação, [ii] à [inexecução] de alguma cláusula especial ou simplesmente [iii] à mora [inadimplemento relativo].” “A cláusula penal pode ser conceituada como sendo a penalidade, de natureza civil, imposta pela inexecução parcial ou total de um dever patrimonial assumido.” (Flávio Tartuce)
FUNÇÕES
“De acordo com a melhor doutrina, a cláusula penal tem basicamente duas funções. Primeiramente, a multa funciona como uma coerção, para intimidar o devedor a cumprir a obrigação principal, sob pena de ter que arcar com essa obrigação acessória (meio de coerção, com caráter punitivo). Além disso, tem função de ressarcimento, prefixando as perdas e danos no caso de inadimplemento absoluto da obrigação (caráter de estimação).” (Flávio Tartuce)
ESPÉCIES/MODALIDAES
“A cláusula penal pode dirigir-se a inexecução completa da obrigação (inadimplemento absoluto), ao descumprimento de uma ou mais cláusulas do contrato ou ao inadimplemento parcial, ou simples mora.” (Sílvio de Salvo Venosa)
Cláusula penal por mora (cláusula penal moratória) Cláusula penal por inadimplemento (cláusula penal compensatória)
Art. 411 CC. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em segurança especial de outra cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal.” Art. 410 CC. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor.”
Prevista para os casos de inadimplemento relativo (mora), sendo admitida sua cumulação com a obrigação principal. Ou seja, a Cláusula penal moratória + obrigação principal. Prevista para os casos de inadimplemento absoluto, permite ao credor exigir diretamente seu valor. Ou seja, a Cláusula penal compensatória.
“Como, neste caso, o valor da pena convencional costuma ser reduzido, o credor pode cobrá-la, cumulativamente, com a prestação não satisfeita.” (Carlos Roberto Gonçalves) “O dispositivo [art. 410 CC] proíbe a cumulação de pedidos. A alternativa que se abre para o credor é: a) pleitear a pena compensatória [cláusula penal compensatória], correspondente à fixação antecipada dos eventuais prejuízos; ou b) postular o ressarcimento das per- das e danos, arcando com o ônus de provar o prejuízo; ou, ainda, c) exigir o cumprimento da prestação. Não pode haver cumulação porque, em qual- quer desses casos, o credor obtém integral ressarcimento, sem que ocorra o bis in idem.” (Carlos Roberto Gonçalves)

“Tá, mas como diferencio uma da outra?” Não é tarefa fácil, como aponta CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA:

“Não é fácil dizer, em tese, ou genericamente, quando é compensatória ou moratória a cláusula penal. Mandam uns que se confronte o seu valor com o da obrigação principal, e, se ressaltar sua patente inferioridade, é moratória, mas outros desprestigiam este processo comparativo, para concluir que o critério não é absoluto; obviamente, a pena se despe de todo caráter compensatório, mesmo equivalendo à obrigação principal, quando se estipula (o que é lícito) venha a consistir em prestação a um terceiro, como seja um estabelecimento beneficente. Em conclusão, caberá ao juiz valer-se de todos os meios, a começar da perquirição da vontade, para, das circunstâncias, inferir e proclamar, nos casos duvidosos, a natureza moratória ou compensatória da multa.” (Caio Mario da Silva Pereira)

Por fim, para piorar, o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO lembrou que o estabelecimento de cláusula penal dispensa inclusive qualquer referência a suas expressões tradicionais:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Observa-se, por oportuno, que a natureza da cláusula penal não exige, para o seu estabelecimento, o emprego das expressões tradicionais (cláusula penal, pena convencional ou multa). Ela existe e produz seus efeitos, desde que os interessados se sirvam desses e de outros termos equivalentes.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

3.2.4.              Nos contratos de aquisição imobiliária, em regra, temos cláusula penal moratória expressamente prevista no instrumento. Será que podemos cumular seu valor com lucros cessantes?

R: Negativo! O STJ concluiu ser incabível sua cumulação com lucros cessantes:

“A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Mas por que isso? Apesar do brilhante voto do Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, a questão foi respondida pela Min. MARIA ISABEL GALLOTTI em seu voto-vista. De acordo coma a ministra, embora se trate, sim, de cláusula moratória, sua função é compensatória:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Aqui, portanto, ao meu sentir, o caráter compensatório, não da obrigação de entregar o imóvel, evidentemente, mas do prejuízo mensal causado pelo retardamento da entrega. Partindo dessas premissas, a cláusula penal seria moratória, se encarada em referência ao contrato global (obrigação de entregar o apartamento no prazo), mas teria também função compensatória, no tocante ao descumprimento de cláusula específica, a definidora do prazo de entrega. (…) Dessa forma, a circunstância de a cláusula penal ser moratória implica seja ela cumulativa com a pretensão à prestação principal, o que não impede, todavia, tenha por escopo não apenas punir, mas também ressarcir o prejuízo sofrido pelo credor com a mora. Isso não se confunde com a função da cláusula compensatória, de compensar a inexecução absoluta e definitiva do contrato, sendo, portanto, inacumulável com a obrigação originalmente pactuada e com perdas e danos.”

E quanto ao dano emergente, dá para cumular? TAMBÉM não como destacou o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Ante esse quadro, havendo cláusula penal (moratória ou compensatória, a depender de cada caso) no sentido de prefixar, em patamar razoável, a indenização, não cabe a cumulação posterior com danos emergentes ou lucros cessantes.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

3.2.5.              “(…) e, em regra, estabelecida (a cláusula penal moratória) em valor equivalente ao locativo (…)”, o que isso quer dizer?

R: O que essa parte da ementa do informativo quer dizer? O Min. LUIS FELIPE SALOMÃO pontuou que a cláusula penal moratória nos contratos de incorporação imobiliária, em regra, estabelecem percentual compatível com o valor mensal de locação de um imóvel semelhante ao adquirido:

“[Trecho do corpo do acórdão:] De fato, como é notório e bem exposto em audiência pública pelo jurista Sylvio Capanema de Souza, habitualmente, nos contratos de promessa de compra e venda, há cláusula estabelecendo multa que varia de 0,5% a 1% do valor total do imóvel a cada mês de atraso, pois representa o aluguel que o imóvel alugado, normalmente, produziria ao locador.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

3.2.6.              Esse entendimento limitando a indenização à valor da cláusula penal moratória é absoluto?

R: Para quem já notou o “em regra” da ementa, fica fácil. O entendimento não é absoluto, podendo ser flexibilizado caso demonstrada, efetivamente, a insuficiência da cláusula penal moratória na reparação do dano:

“[Trecho do corpo do acórdão:] No entanto, diferente seria a hipótese em que uma cláusula penal moratória, que, por ser condição a disciplinar a mora da incorporadora, se mostrasse objetivamente insuficiente, em vista do tempo em que veio a perdurar o descumprimento contratual, a atrair a incidência do princípio da reparação integral, insculpido no art. 944[2] do CC.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Ou também, como apontado pela Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, na situação em que a cláusula penal moratória for fixada em patamar único, sem incidência mensal:

“Aqui também se põe a mesma observação: a definição da tese há de levar em consideração a natureza da cláusula penal e não apenas o rótulo a ela dado no contrato. Se a cláusula penal incide todos meses, tendo como base de cálculo o valor do total do contrato, vale dizer, o valor do imóvel, é certo que se destina a coibir a mora da empresa na entrega do imóvel, mas também compensa o prejuízo sofrido mensalmente com a privação do uso imóvel, cujo valor locatício, como é notório, não ultrapassa no mercado, em regra, de 0,5% a 1% ao mês do valor do bem. Diversa é a situação de multa moratória incidindo sobre o valor total do bem, mas apenas uma única vez, quando, então, naturalmente, não compensará a despesa (ou a perda da fruição) mensal do consumidor em decorrência do não cumprimento do prazo de entrega.” (Estudo apresentado em palestra proferida no auditório do STJ, em 25/4/2018)

3.2.7.              O precedente revela um novo entendimento do STJ?

R: Opa, com certeza! A Min. NANCY ANDRIGHI, em voto-vencido, acrescentou que, desde 2009, a Corte tem entendido ser possível cumular a cláusula penal moratória com os lucros cessantes.

“[Trecho do corpo do acórdão:] Acerca da questão controvertida, pesquisa no sistema eletrônico de jurisprudência desta Corte revela que o entendimento do STJ se encontra consolidado, desde ao menos o ano de 2009, no sentido da possibilidade de cumulação da cláusula penal moratória com lucros cessantes.” (STJ, REsp 1498484/DF, Voto-Vencido, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Logo, cuidado com as novas e antigas questões objetivas!

3.2.8.              Placar final.

LUÍS FELIPE SALOMÃO, RAUL ARAÚJO, MARIA ISABEL GALLOTTI, ANTONIO CARLOS FERREIRA, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, MARCO AURÉLIO BELLIZZE E MOURA RIBEIRO NANCY ANDRIGHI e MARCO BUZZI
A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes. É possível a cumulação de cláusula penal moratória com indenização pelos lucros cessantes decorrentes da não fruição do bem nas hipóteses de descumprimento do prazo de entrega do imóvel pela promitente vendedora.
7 2

3.2.9.              Trechos relevantes dos votos divergentes publicados.

Ministro(a) Posição
Min. NANCY ANDRIGHI “Nesse passo, por não vislumbrar a presença de qualquer imperativo de justiça apto a justificar e conduzir à alteração do entendimento até então pacificado neste Tribunal, mantenho minha posição, manifestada em diversos julgados, no sentido de admitir a cumulação da cláusula penal moratória com lucros cessantes no caso de atraso na entrega do imóvel pela incorporadora, uma vez que ‘a cláusula penal moratória, ao contrário do que ocorre em relação à pena compensatória, restringe-se a punir o retardo ou imperfeição na satisfação da obrigação, não funcionando como pré-fixação de perdas e danos’.” (REsp 1.665.550/BA, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 16/05/2017).”

3.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Em qualquer contrato, havendo atraso, a cláusula penal moratória impede sua cumulação com lucros cessantes.

Q2º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Nos contratos de aquisição imobiliária, havendo atraso na entrega de imóvel em construção, objeto de contrato ou promessa de compra e venda, a cláusula penal moratória prevista na avença tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes.

3.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

Q2º. VERDADEIRA.

3.5.            Bibliografia.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: teoria das obrigações. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. vol. 2.

PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil: teoria geral das obrigações. Revisto e atualizado por Guilherme Calmon Nogueira da Gama.. 28. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2016. vol. 2.

TARTUCE, Flavio. Manual de direito civil. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2017.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2017. vol. 2.

4.   Prescrição e ação de repetição de indébito.

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM REsp (EAREsp)

A ação de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados de telefonia fixa tem prazo prescricional de 10 (dez) anos. (STJ, EAREsp 738991/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, por maioria, julgado em 20/02/2019, DJe 11/06/2019)

Resultado: Embargos de divergência providos.

4.1.            Situação fática.

Tratando-se de embargos de divergência[3], vejamos a divergência existente entre a SEGUNDA e TERCEIRA Seções do STJ.

QUAL O PRAZO PRESCRICIONAL DA AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO[4] POR COBRANÇA INDEVIDA DE VALORES REFERENTES A SERVIÇOS NÃO CONTRATADOS DE TELEFONIA FIXA?
PRIMEIRA SEÇÃO SEGUNDA SEÇÃO
10 (dez) anos 3 (três) anos
Por quê? Por quê?
I. Como não há norma específica sobre o prazo prescricional nessa situação, aplica-se o art. 205 do CC; II. Além disso, incabível ação com base em alegação de enriquecimento sem causa[5], pois há causa jurídica (prévio contrato de prestação de serviços) e ação específica (ação de repetição de indébito); III. E deve-se observar o mesmo entendimento da Súmula nº 412[6]/STJ em razão de também se tratar de relação de consumo envolvendo prestação de serviços; IV. Já há precedente da Corte Especial do STJ adotando o prazo decenal (EAREsp 758.676/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/05/2016, DJe 15/06/2016). A pretensão de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia, configura enriquecimento sem causa e, portanto, está abrangida pelo prazo fixado no art. 206, § 3º, inciso IV, do CC. Ademais, há que se observar que o Código Civil de 2002 segue a tendência dos ordenamentos jurídicos modernos que adotam prazos prescricionais mais reduzidos que os de legislações anteriores, em harmonia com a realidade social hodierna, marcada pelas facilidades de acesso a informações e conhecimento de direitos, com a consequente ampliação dos meios de defesa destes, em sua configuração individual, coletiva e difusa. O art. 884 do CC adotou a teoria da divisão a respeito do enriquecimento sem causa, sendo, portanto, irrelevante se há ou não causa jurídica entre as partes para o locupletamento indevido.
ENTENDIMENTO VENCEDOR! ENTENDIMENTO PERDEDOR

4.2.            Análise Estratégica.

4.2.1.              Por que não se aplica o art. 206, § 3º, inciso IV, do CC?

R: Vejamos o dispositivo:

Art. 206 CC. Prescreve:

§ 3º Em três anos:

IV – a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;”

Pois bem, de acordo com o Min. OG FERNANDES, ações ajuizadas com base em enriquecimento sem causa (ação in rem verso) tem natureza subsidiária e dependem dos seguintes requisitos:

(a) Enriquecimento de alguém;

(b) Empobrecimento correspondente de outrem;

(c) Relação de causalidade entre ambos;

(d) Ausência de causa jurídica;

(e) Inexistência de ação específica.

E o que está faltando? Segundo o Min. OG FERNANDES: há causa jurídica (prévio contrato de prestação de serviços) e ação específica (ação de repetição de indébito):

“[Trecho do corpo do acórdão:] A discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica.” (STJ, EAREsp 738991/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, por maioria, julgado em 20/02/2019, DJe 11/06/2019)

4.2.2.              Placar final.

OG FERNANDES, MAURO CAMPBELL MARQUES, HERMAN BENJAMIN, FELIX FISCHER, NANCY ANDRIGHI, LAURITA VAZ, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO e JORGE MUSSI RAUL ARAÚJO
A ação de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados de telefonia fixa tem prazo prescricional de 10 (dez) anos. A ação de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados de telefonia fixa tem prazo prescricional de 3 (três) anos.
8 1

4.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. A ação de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados de telefonia fixa tem prazo prescricional de 3 (três) anos.

Q2º. Estratégia Carreiras Jurídicas. A ação de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados de telefonia fixa tem prazo prescricional de 10 (dez) anos em razão de se tratar de situação de locupletamento indevido.

4.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

Q2º. FALSA.

5.   Sucessão híbrida e quota hereditária do cônjuge (ou companheiro) sobrevivente.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

A reserva da quarta parte (1/4) da herança, prevista no art. 1.832 do Código Civil, não se aplica à hipótese de concorrência sucessória híbrida. (STJ, REsp 1617650/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019)

Resultado: Recurso especial parcialmente provido.

Tribunal de Origem: TJRS.

5.1.            Situação fática.

O MINISTÉRIO PÚBLICO/RS interpôs agravo de instrumento em ação de inventário de MARLON contra decisão que fixou o quinhão hereditário da companheira do falecido, JÉSSICA, na fração de ¼ (um quarto), observando-se o art. 1.832 do CC, apesar da existência de 1 (um) filho comum e outros 6 (seis) exclusivos do de cujus. Constatou-se também que o regime do casal era de comunhão parcial.

Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso

Em recurso especial, MINISTÉRIO PÚBLICO/RS pugnou pela reforma do Acórdão, com incidência do art. 1.790 do CC.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu provimento parcial ao recurso.

5.2.            Análise Estratégica.

5.2.1.              Questão em debate

O ponto central do recurso especial situa-se em torno do quinhão hereditário a que faz jus a(o) companheira(o) do(a) falecido(a) quando concorrer com filho(s) comum(ns) e, ainda, filho(s) exclusivo(s) do autor da herança, o que se conhece como sucessão híbrida (concorrência híbrida), segundo GISELDA HIRONAKA.

Aliás, como apontou o Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, não há previsão legal para a situação de concorrência híbrida (sucessão híbrida):

“[Trecho do corpo do acórdão:] Feitos estes registros, destaco que a questão se mostrava controvertida na doutrina, especialmente porque a lei não previu expressamente esta situação, limitando-se a regular os efeitos da concorrência do companheiro com os seus descendentes ou apenas os descendentes do de cujus, e não com ambos.” (STJ, REsp 1617650/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019)

Bora ver o que foi costurado então!

5.2.2.              O MP/RS teve razão ao requerer a aplicação do art. 1.790 do CC?

Art. 1.790 CC. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.”

R: Negativo! Além de não prever, expressamente, a hipótese da concorrência híbrida, o art. 1.790 do CC foi declarado, incidentalmente, inconstitucional pelo STF, quando do julgamento do RE nº 878.694, sendo determinada ao regime sucessório na união estável a aplicação do quanto disposto no art. 1.829 do CC:

Art. 1.829 CC. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.”

“Como devo ler esse dispositivo então?” Assim oh!:

Art. 1.829 CC. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente [ou com o COMPANHEIRO SOBREVIVENTE], salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge [ou com COMPANHEIRO SOBREVIVENTE];

III – ao cônjuge sobrevivente [ou ao COMPANHEIRO SOBREVIVENTE] e;

IV – aos colaterais.”

Mas, calma, pois tem mais! Ao estender o art. 1.829 do CC ao regime sucessório da união estável, devemos observar também o art. 1.832 do CC, como destacado pelo Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO:

Art. 1.832 CC. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge [ou ao COMPANHEIRO SOBREVIVENTE] quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à QUARTA PARTE da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.”

“Mas, espera, esse artigo também não prevê o que acontece no caso de sucessão híbrida, já que a parte final dispõe: ‘se for [cônjuge ou companheira sobrevivente] ascendente dos herdeiros com que concorrer’.” Exato, por isso o voto de 34 páginas do Relator.

Pergunta-se, então, JÉSSICA terá direito a essa quota mínima de ¼? “Quem é Jéssica mesmo?” A companheira do de cujus.

5.2.3.              Um adendo antes de prosseguirmos, qual foi a interpretação dada pelo STJ à parte final do art. 1.829, inciso I, do CC (“ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;”)?

R: “Ah, tá fácil…a literal, certo?” Vamos isolar a parte que interessa:

“A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente

[ou com o COMPANHEIRO
SOBREVIVENTE
]

se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;”

Nessa situação, o cônjuge sobrevivente (ou companheiro sobrevivente) concorre nos bens particulares? Ou concorre em todos os bens desde que o falecido tenha deixado pelo menos um particular? Ou concorre em todos os bens, desde que o falecido não tenha deixado bens particulares?

Parabéns ao redator do dispositivo! Satisfação! De todo modo, o STJ decidiu que a concorrência do cônjuge e, agora, do companheiro, no regime da comunhão parcial (que é o regime da união estável), com os descendentes somente ocorrerá quando o falecido tenha deixado bens particulares e, ainda, sobre os referidos bens particulares (STJ, REsp 1368123/SP, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/04/2015, DJe 08/06/2015).

Isto é:

5.2.4.              Análise do art. 1.832 do CC.

Já conseguimos perceber que o problema do artigo se refere à situação de sucessão híbrida; do contrário, temos o seguinte cenário:

HÁ APENAS DESCENDENTES EXCLUSIVOS HÁ APENAS HERDEIROS COMUNS
A cônjuge (ou companheira) sobrevivente NÃO tem garantia de quinhão de ¼. A cônjuge (ou companheira) sobrevivente TEM um quinhão garantido de, pelo menos[7], ¼. Exemplo: se concorrer com 5 (cinco) filhos comuns, terá garantido ¼ dos bens particulares do de cujus, sendo os ¾ restantes divididos entre o resto da prole.

E se tivermos concorrência híbrida, como fica? Aí mora o perigo, como destacou o Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] No entanto, quando a concorrência do cônjuge ou companheiro se estabelece entre herdeiros comuns e exclusivos, é bastante controvertida na doutrina a aplicação da parte final do art. 1.832 do CCB. A problemática, destaco, apenas tem fundamento quando há quatro ou mais descendentes a concorrem com o consorte supérstite, pois apenas nesta hipótese seria necessária a reserva de 1/4 da herança ao companheiro(a), já que, em concorrendo com três ou menos descendentes, todos os herdeiros restarão com no mínimo 1/4 da herança.” (STJ, REsp 1617650/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019)

Vejamos a singela (sqn) divergência doutrinária a partir do quadro elaborado pelo Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO:

HAVENDO SUCESSÃO HÍBRIDA, OBSERVA-SE A RESERVA MÍNIMA DE ¼ AO CÔNJUGE (OU COMPANHEIRO) SOBREVIVENTE?
CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, MARIA HELENA DINIZ, MARIO DELGADO, FLÁVIO TARTUCE, ZENO VELOSO, MARIA BERENICE DIAS e Enunciado nº 527 da V Jornada de Direito Civil (prevalece) FRANCISCO JOSÉ CAHALI, JOSÉ FERNANDO SIMÃO e SÍLVIO SALVO VENOSA EDUARDO OLIVEIRA LEITE GISELDA HIRONAKA FLÁVIO AUGUSTO MONTEIRO DE BARROS
NÃO SIM Passo 1: divisão da herança de forma igualitária entre todos os filhos. Passo 2: Fracionamento da herança em blocos; Bloco dos filhos comuns e Bloco dos filhos exclusivos. Passo 3: reserva da quarta parte do bloco dos filhos comuns; Passo 4: partilha do restante entre os filhos do bloco comum. Passo 1: Divisão da herança entre todos os filhos; Passo 2: criação de 2 sub-heranças, uma dos filhos comuns e outra dos filhos exclusivos. Passo 3: Divide-se a sub-herança dos filhos exclusivos entre os filhos pertencentes ao grupo e o consorte. Passo 4: Divide-se a sub-herança dos filhos comuns entre os filhos comuns e o consorte. Passo 5: O quinhão do cônjuge será a soma das duas quotas que a ele pertine em cada um dos grupos. Passo 1: Divisão da herança entre todos os filhos e o cônjuge/companheiro. Passo 2: Apura-se qual seria o montante da reserva ao cônjuge, excluindo a parte dos filhos exclusivos. Passo 3: Subtrai-se da herança a parte do cônjuge, dividindo o resultado pelo número de filhos (comuns e exclusivos).

Como é reconfortante estudar para concurso, né?! Bom, lembre-se que há divergência, mas vamos ao que interessa, a posição que prevaleceu no STJ:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Analisadas, pois, as várias teses e posicionamentos doutrinários, concluo que a solução alvitrada pela maioria da doutrina brasileira há de ser endossada por esta Corte.” (STJ, REsp 1617650/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019)

Em conclusão, segundo o STJ, na sucessão do cônjuge (ou companheiro) sobrevivente com descendência híbrida deve, simplesmente, ser aplicado o princípio da igualdade entre todos os herdeiros, destinando a mesma quota para cada um deles, sem reserva de cota mínima para o cônjuge (ou companheiro) sobrevivente:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Em resumo, conclui-se que a reserva de no mínimo 1/4 da herança em favor do consorte do falecido ocorrerá apenas quando concorra com seus próprios descendentes (e eles superem o número de 3). Em qualquer outra hipótese de concurso com filhos exclusivos, ou comuns e exclusivos, não haverá a reserva de 1/4 da herança ao cônjuge ou companheiro sobrevivente.” (STJ, REsp 1617650/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019)

Exemplificando a partir do exemplo dado pelo próprio Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, pois não sou bom de conta:

“[Trecho do corpo do acórdão:] De modo a melhor visualizarmos as proposições doutrinárias, é importante aplicá-las a um exemplo que, em parte, espelha o presente caso concreto: Herança (bens particulares): R$ 800.000,00 (valor hipotético); Herdeiros: companheira; 1 filho comum; 6 filhos exclusivos; Tese 1: Divide-se a herança por igual entre os herdeiros, tratando-se todos os filhos como exclusivos. Atribui-se a cada um dos filhos e à companheira R$ 100.000,00 (não há reserva de 1/4 da herança para a consorte supérstite).” (STJ, REsp 1617650/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019)

5.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. A reserva da quinta parte (1/5) da herança, prevista no art. 1.832 do Código Civil, não se aplica à hipótese de concorrência sucessória híbrida.

Q2º. Estratégia Carreiras Jurídicas. A reserva da quarta parte (1/4) da herança, prevista no art. 1.832 do Código Civil, não se aplica à hipótese de concorrência sucessória híbrida.

5.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

Q2º. VERDADEIRA.

DIREITO DO CONSUMIDOR

6.   Dação em pagamento e árvores de reflorestamento.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

Na dação em pagamento de imóvel sem cláusula que disponha sobre a propriedade das árvores de reflorestamento, a transferência do imóvel inclui a plantação. (STJ, REsp 1567479/PR, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 18/06/2019)

Resultado: Recurso especial desprovido.

Tribunal de Origem: TJPR.

6.1.            Situação fática.

O caso aqui é um bom confuso, por isso vou tentar simplificar bastante, até porque o desfecho é simples.

Em 1970, a sociedade REFLORIL REFLORESTAMENTO LTDA realizou o reflorestamento da área YYY.

Em 1983, REFLORIL REFLORESTAMENTO LTDA realizou dação em pagamento do imóvel da área YYY a CRISTINA SANTOS, sem existir nenhuma menção às árvores do reflorestamento na escritura pública da dação em pagamento.

Em 1989, CRISTINA SANTOS vendeu o imóvel da área YYY a KLABIN S/A.

Por fim, em 2004, REFLORIL REFLORESTAMENTO LTDA cedeu os direitos sobre as árvores do reflorestamento da área YYY a IJK ENGENHARIA S/A.

Ocorre que, em 2011, IJK ENGENHARIA S/A tomou ciência da exploração das árvores do reflorestamento pela sociedade KLABIN S/A, de modo que ajuizou ação indenizatória para ser ressarcida pela exploração da vegetação de que é cessionária.

A ré, por sua vez, defendeu que era proprietária das árvores do reflorestamento, pois é dona do imóvel que, anteriormente, havia sido dado em pagamento para CRISTINA SANTOS, o que incluiu as próprias árvores do reflorestamento.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou improcedente a pretensão.
Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso, mantendo a improcedência da pretensão
Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Negou provimento ao recurso para manter a improcedência da pretensão

6.2.            Análise Estratégica.

6.2.1.              Questão em debate.

Cinge-se a controvérsia em definir se, na dação em pagamento de imóvel sem cláusula que disponha sobre a propriedade das árvores de reflorestamento, a transferência do imóvel inclui a plantação.

6.2.2.              Ausente na escritura pública da dação em pagamento do imóvel qualquer cláusula referente à transferência das árvores de reflorestamento, pode-se presumir que foram também transferidas ao credor?

R: Sim, como ponderou o Min. MAURO BUZZI ao reconhecer: (a) a qualidade acessão artificial das árvores (art. 1.248, V, CC); (b) a natureza jurídica de bem imóvel às árvores (art. 79 CC) e; (c) que as árvores (bem acessório – art. 92 CC) seguem a transferência do principal (área YYY), independentemente de expressa previsão nesse sentido.

“[Trecho do corpo do acórdão:] A acessão é um modo originário de aquisição da propriedade, em virtude do qual fica pertencendo ao titular tudo quanto se une ou se incorpora ao bem, o que pode ocorrer em duas modalidades: a natural, que se dá quando a união ou incorporação advém de acontecimento da natureza, como a formação de ilhas, o aluvião, a avulsão e o abandono de álveo; e a [acessão] artificial, resultante do trabalho do homem, como no caso das construções e plantações, hipótese dos autos.

(…) Acerca da questão, tem-se que, nos termos do artigo 79 do Código Civil/2002, ‘são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente’. Em virtude disso, em regra, a acessão artificial operada no caso (plantação de árvores) receberia a mesma classificação/natureza jurídica do terreno, sendo considerada, portanto, bem imóvel, ainda que acessório do principal, nos termos do artigo 92 do Código Civil, por se tratar de bem reciprocamente considerado.

(…) Tendo isso em evidência, repisa-se, conforme artigo 79 do Código Civil, as árvores incorporadas ao solo mantêm a característica de bem imóvel salvo expressa manifestação em contrário, que não ocorreu na hipótese.

(…) Desta forma, em que pese seja viável conceber a natureza jurídica da cobertura vegetal lenhosa destinada ao corte, a depender da vontade das partes, também como bem móvel por antecipação, no caso, essa classificação não salvaguarda a pretensão da autora, pois, iniludivelmente, em virtude da ausência de anotação/observação acerca das árvores plantadas sobre o terreno, diante da presunção legal de que o acessório segue o principal, essas foram transferidas com a dação em pagamento realizada em favor de [CRISTINA SANTOS].” (STJ, REsp 1567479/PR, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/06/2019, DJe 18/06/2019)

6.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Na dação em pagamento de imóvel sem cláusula que disponha sobre a propriedade das árvores de reflorestamento, a transferência do imóvel não inclui a plantação.

6.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

7.   “Inversão” da cláusula penal em contratos de aquisição imobiliária.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela [cláusula penal para o inadimplemento do adquirente] ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial. (STJ, REsp 1631485/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Resultado: Recurso especial parcialmente provido.

Tribunal de Origem: TJDFT.

7.1.            Situação fática.

EDER ajuizou ação indenizatória em face de BROOKFIELD MB EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S/A, sustentando que celebrou contrato de promessa de compra e venda de apartamento. Alegou que as partes pactuaram a entrega do imóvel para até 30.09.2013, com prazo de tolerância de 180 dias, mas, apesar de ter cumprido com suas obrigações contratuais, a requerida atrasou a conclusão das obras por 10 (dez) meses.

Nesse contexto, requereu: (a) a rescisão contratual; (b) a condenação da requerida à restituição integral dos valores pagos; e (c) a condenação da requerida ao pagamento de multa compensatória (cláusula penal compensatória), na exata forma que lhe seria (ao autor) imputada caso desse ensejo à resolução contratual, isto é, o autor requer a “inversão” da cláusula penal compensatória.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou procedente em parte a pretensão para determinar a restituição integral dos valores pagos e para condenar a ré a pagar ao autor alugueres mensais referentes ao período de atraso, a título de multa compensatória.

Em recurso de apelação, EDER irresignou-se quanto o valor da multa compensatória, reiterando sua pretensão de fixação na exata forma que lhe seria (ao autor) imputada caso desse ensejo à resolução contratual:

Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso.

Em recurso especial, EDER irresignou-se, novamente, quanto o valor da multa compensatória, reiterando sua pretensão de fixação na exata forma que lhe seria (ao autor) imputada caso desse ensejo à resolução contratual:

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu parcial provimento ao recurso.

7.2.            Análise Estratégica.

7.2.1.              Questão em debate

A principal questão controvertida consiste em saber a possibilidade ou não de inversão da cláusula penal estipulada exclusivamente para o adquirente (consumidor), nos casos de inadimplemento da construtora em virtude de atraso na entrega de imóvel em construção objeto do contrato de compra e venda, a ensejar resolução contratual.

Isso porque, no caso, o instrumento contratual a que aderiu o autor, ora recorrente, previu cláusula penal apenas para o caso de resolução contratual por inadimplemento do promitente comprador.

7.2.2.              Aplica-se a Lei nº 13.786/18 ao caso?

R: Antes de ingressar no julgamento do mérito, a SEGUNDA SEÇÃO debateu a possibilidade de incidência da Lei nº 13.786/18 aos contratos anteriores à sua vigência.

A Lei nº 13.786/18, de 27 de dezembro de 2018, alterou as Leis nº 4.591/64 e 6.766/79, para disciplinar questões acerca do inadimplemento (parcial ou absoluto) em contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária ou de loteamento.

E a novel legislação dispõe, expressamente, a respeito da consequência da resolução do contrato por inadimplemento do incorporador:

Art. 43-A da Lei nº 13.786/18. A entrega do imóvel em até 180 (cento e oitenta) dias corridos da data estipulada contratualmente como data prevista para conclusão do empreendimento, desde que expressamente pactuado, de forma clara e destacada, não dará causa à resolução do contrato por parte do adquirente nem ensejará o pagamento de qualquer penalidade pelo incorporador.

§ 1º Se a entrega do imóvel ultrapassar o prazo estabelecido no caput deste artigo, desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá ser promovida por este a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos E da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do § 8º do art. 67-A desta Lei.

§ 2º Na hipótese de a entrega do imóvel estender-se por prazo superior àquele previsto no caput deste artigo, e não se tratar de resolução do contrato, será devida ao adquirente adimplente, por ocasião da entrega da unidade, indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, pro rata die , corrigido monetariamente conforme índice estipulado em contrato.

§ 3º A multa prevista no § 2º deste artigo, referente a mora no cumprimento da obrigação, em hipótese alguma poderá ser cumulada com a multa estabelecida no § 1º deste artigo, que trata da inexecução total da obrigação.”

E o que o STJ decidiu? O STJ entendeu que a Lei nº 13.786/18 somente se aplica a contratos posteriores à sua vigência.

7.2.3.              O que é cláusula penal?

R: De acordo com m Min. LUIS FELIPE SALOMÃO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] (…) a cláusula penal constitui pacto secundário acessório – uma condição – por meio do qual as partes determinam previamente uma multa (geralmente em pecúnia), consubstanciando indenização para o caso de inadimplemento absoluto ou de cláusula especial, hipótese em que se denomina cláusula penal compensatória. Ou mesmo, como no presente caso, a cláusula penal pode ser estabelecida para prefixação de indenização por inadimplemento relativo (quando se mostrar útil o adimplemento, ainda que tardio; isto é, defeituoso), recebendo, assim, a denominação de cláusula penal moratória.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

Vamos fazer uma tabela para ficar mais fácil:

CLÁUSULA PENAL (PENA CONVENCIONAL ou MULTA CONTRATUAL)
Art. 409 CC. A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se [i] à inexecução completa da obrigação, [ii] à [inexecução] de alguma cláusula especial ou simplesmente [iii] à mora [inadimplemento relativo].” “A cláusula penal pode ser conceituada como sendo a penalidade, de natureza civil, imposta pela inexecução parcial ou total de um dever patrimonial assumido.” (Flávio Tartuce)
FUNÇÕES
“De acordo com a melhor doutrina, a cláusula penal tem basicamente duas funções. Primeiramente, a multa funciona como uma coerção, para intimidar o devedor a cumprir a obrigação principal, sob pena de ter que arcar com essa obrigação acessória (meio de coerção, com caráter punitivo). Além disso, tem função de ressarcimento, prefixando as perdas e danos no caso de inadimplemento absoluto da obrigação (caráter de estimação).” (Flávio Tartuce)
ESPÉCIES/MODALIDAES
“A cláusula penal pode dirigir-se a inexecução completa da obrigação (inadimplemento absoluto), ao descumprimento de uma ou mais cláusulas do contrato ou ao inadimplemento parcial, ou simples mora.” (Sílvio de Salvo Venosa)
Cláusula penal por mora (cláusula penal moratória) Cláusula penal por inadimplemento (cláusula penal compensatória)
Art. 411 CC. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em segurança especial de outra cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal.” Art. 410 CC. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor.”
Prevista para os casos de inadimplemento relativo (mora), sendo admitida sua cumulação com a obrigação principal. Ou seja, a Cláusula penal moratória + obrigação principal. Prevista para os casos de inadimplemento absoluto, permite ao credor exigir diretamente seu valor. Ou seja, a Cláusula penal compensatória.
“Como, neste caso, o valor da pena convencional costuma ser reduzido, o credor pode cobrá-la, cumulativamente, com a prestação não satisfeita.” (Carlos Roberto Gonçalves) “O dispositivo [art. 410 CC] proíbe a cumulação de pedidos. A alternativa que se abre para o credor é: a) pleitear a pena compensatória [cláusula penal compensatória], correspondente à fixação antecipada dos eventuais prejuízos; ou b) postular o ressarcimento das per- das e danos, arcando com o ônus de provar o prejuízo; ou, ainda, c) exigir o cumprimento da prestação. Não pode haver cumulação porque, em qual- quer desses casos, o credor obtém integral ressarcimento, sem que ocorra o bis in idem.” (Carlos Roberto Gonçalves)

“Tá, mas como diferencio uma da outra?” Não é tarefa fácil, como aponta CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA:

“Não é fácil dizer, em tese, ou genericamente, quando é compensatória ou moratória a cláusula penal. Mandam uns que se confronte o seu valor com o da obrigação principal, e, se ressaltar sua patente inferioridade, é moratória, mas outros desprestigiam este processo comparativo, para concluir que o critério não é absoluto; obviamente, a pena se despe de todo caráter compensatório, mesmo equivalendo à obrigação principal, quando se estipula (o que é lícito) venha a consistir em prestação a um terceiro, como seja um estabelecimento beneficente. Em conclusão, caberá ao juiz valer-se de todos os meios, a começar da perquirição da vontade, para, das circunstâncias, inferir e proclamar, nos casos duvidosos, a natureza moratória ou compensatória da multa.” (Caio Mario da Silva Pereira)

Por fim, para piorar, o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO lembrou que o estabelecimento de cláusula penal dispensa inclusive qualquer referência a suas expressões tradicionais:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Observa-se, por oportuno, que a natureza da cláusula penal não exige, para o seu estabelecimento, o emprego das expressões tradicionais (cláusula penal, pena convencional ou multa). Ela existe e produz seus efeitos, desde que os interessados se sirvam desses e de outros termos equivalentes.” (STJ, REsp 1498484/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

7.2.4.              Se o contrato de aquisição imobiliária prever cláusula penal apenas em favor do vendedor, é possível estendê-la em favor do comprador?

R: Sim, conforme concluiu o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO após examinar os precedentes do próprio STJ:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Desse modo, consoante iterativa jurisprudência do STJ, na mesma linha do precedente paradigma da Terceira Turma, em caso de inadimplemento (ABSOLUTO OU RELATIVO), se houver omissão do contrato, cabe, por imperativo de equidade, inverter a cláusula contratual penal (MORATÓRIA OU COMPENSATÓRIA), que prevê multa exclusivamente em benefício da promitente vendedora do imóvel.

(…) Destarte, prevendo o contrato a incidência de multa para o caso de inadimplemento por parte do consumidor, ela também deverá ser considerada para o arbitramento da indenização devida pelo fornecedor, caso seja deste a mora ou o inadimplemento absoluto.” (STJ, REsp 1631485/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

E quais são os argumentos utilizados para essa extensão/inversão? Vejamos:

(a) Equilíbrio da base contratual para a adequada reparação do dano (art. 4º, III, CDC);

(b) Direito do consumidor de igualdade nas contraprestações (art. 6º, II, CDC);

(c) Equidade nas relações de consumo (art. 7º CDC) e;

(d) As cláusulas abusivas previstas no art. 51 do CDC deixam claro que deve haver reciprocidade nos direitos entre fornecedores e consumidores.

“Tá, mas o que quer dizer aquela parte final da ementa sobre obrigações heterogêneas?”

Aqui está a “pegadinha”! O Min. LUIS FELIPE SALOMÃO ponderou que, em certos casos, a simples inversão em favor do consumidor representa equívoco:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Deveras, conforme assegurado pelos expositores na audiência pública, verificando-se em algumas decisões prolatadas no âmbito das instâncias ordinárias, constitui equívoco frequente simplesmente inverter, sem observar a técnica própria, a multa contratual referente à obrigação do adquirente de dar (pagar), para então incidir em obrigação de fazer, resultando em indenização pelo inadimplemento contratual em montante exorbitante, desproporcional, a ensejar desequilíbrio contratual e enriquecimento sem causa, em indevido benefício do promitente comprador.” (STJ, REsp 1631485/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

“Como?” O Min. LUIS FELIPE SALOMÃO quis dizer o seguinte:

OBRIGAÇÕES HETEROGÊNEAS
OBRIGAÇAO DE DAR (PAGAR) DO CONSUMIDOR (COMPRADOR) OBRIGAÇÃO DE FAZER DO FORNECEDOR
Descumprimento Descumprimento
Incidência de cláusula penal (multa contratual) Constitui equívoco simplesmente aplicar a multa contratual imposta pelo descumprimento da obrigação do adquirente (consumidor) de dar (pagar) ao inadimplemento da obrigação de fazer do fornecedor.

Por exemplo, imagine a situação que temos uma cláusula penal moratória de 10% sobre o valor da parcela (OBRIGAÇÃO DE PAGAR) não paga, por mês de atraso. A parcela, por sua vez, tem o valor de R$10.000,00. Logo, o consumidor inadimplente deverá arcar com a multa contratual de R$1.000,00, além de juros moratórios e correção monetária até o pagamento.

Agora, pense no fornecedor que deve entregar (OBRIGAÇÃO DE FAZER) um apartamento de R$800.000,00 no dia 30.09.2013. O que ocorre se simplesmente invertermos/estendermos a cláusula penal prevista para o inadimplemento da obrigação de pagar?

Valor da cláusula penal aplicada ao inadimplemento da obrigação de dar Valor da cláusula penal aplicada ao inadimplemento da obrigação de fazer
10% de R$10.000,00 = R$1.000,00 10% de R$800.000,00 = R$80.000,00
R$1.000,00 por mês de atraso R$80.000,00 por mês de atraso

“Ahmmm… desproporcional. O consumidor sairia ganhando! Aliás, em 10 (dez) meses de atraso teria o valor integral do apartamento.” Exato, por isso, o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO registrou:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Consequentemente, penso que a inversão, para determinar a incidência do mesmo percentual sobre o preço total do imóvel, incidindo a cada mês de atraso, NÃO constitui, em verdade, simples ‘inversão da multa moratória’, podendo, isto sim, representar valor divorciado da realidade de mercado, a ensejar enriquecimento sem causa.

Portanto, a obrigação da incorporadora é de FAZER (prestação contratual, consistente na entrega do imóvel pronto para uso e gozo), já a do adquirente é de DAR (pagar o valor remanescente do preço do imóvel, por ocasião da entrega). E só haverá adequada simetria para inversão da cláusula penal contratual se houver observância de sua natureza, isto é, de prefixação da indenização em dinheiro pelo período da mora.” (STJ, REsp 1631485/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

O que deve ser feito para evitar essa desproporção? De acordo com o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, antes de aplicar a cláusula penal, a obrigação de fazer do fornecedor deve ser convertida em dinheiro em procedimento de LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Como é cediço, nos casos de obrigações de natureza heterogênea (por exemplo, obrigação de fazer e obrigação de dar), impõe-se sua conversão em dinheiro, apurando-se valor adequado e razoável para arbitramento da indenização pelo período de mora, vedada sua cumulação com lucros cessantes. Feita essa redução, geralmente obtida por meio de arbitramento, é que, então, seria possível a aplicação/utilização como parâmetro objetivo, para manutenção do equilíbrio da avença, em desfavor daquele que redigiu a cláusula.” (STJ, REsp 1631485/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 22/05/2019, DJe 25/06/2019)

7.2.5.              Placar final.

LUÍS FELIPE SALOMÃO, RAUL ARAÚJO, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, MARCO BUZZI, MARCO AURÉLIO BELLIZZE, MOURA RIBEIRO e NANCY ANDRIGHI MARIA ISABEL GALLOTTI e ANTONIO CARLOS FERREIRA
No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela

[cláusula penal para o inadimplemento do adquirente]

ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor

Não é possível a inversão da cláusula penal estabelecida em desfavor do adquirente para o pagamento das prestações com sua aplicação ao descumprimento pela construtora no prazo de entrega de imóvel em construção prometido à venda.

7

2

7.2.6.              Trechos relevantes dos votos divergentes publicados.

Ministro(a) Posição
Min. MARIA ISABEL GALLOTTI “Quanto à pretendida inversão de tal multa – acessória à obrigação de pagar as prestações – em desfavor do fornecedor que atrasa a entrega do imóvel, cumpre fazer algumas considerações. Cuida-se, de um lado, de obrigação de dar – pagamento das prestações – e, de outro lado, de obrigação de fazer – construção e entrega do imóvel prometido à venda. A diversidade de tratamento espelha, justamente, as diferentes obrigações assumidas pelas partes no desempenho de sua função dentro do contrato. Anoto que a possibilidade de conversão de obrigações de natureza heterogênea, com sua mensuração em pecúnia, não traduz, data vênia, equidade em aplicação, face à diversidade de propósito para o qual concebida a cláusula penal no contexto próprio da relação contratual. Não há falar-se em simetria na aplicação de penalidade, impondo-a a um dos contratantes, se não há obrigação correspondente. Nesses casos, não se trata de inversão, mas de criação de uma nova obrigação, o que não é admitido. A legislação não permite a criação de cláusula penal – sempre produto da autorregulamentação dos contratantes -; somente apresenta mecanismos ao julgador para sua dosimetria. Em caso de detecção de abusividade na imposição de penalidade a uma das partes sem obrigação contrária correspondente, a solução não é a criação de uma nova penalidade, mas, sim, a declaração de sua nulidade, nos termos do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor.”

7.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor.

Q2º. Estratégia Carreiras Jurídicas. No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, ela deverá ser simplesmente invertida em favor do consumidor em caso de inadimplemento do vendedor.

7.4.            Gabarito.

Q1º. VERDADEIRA.

Q2º. FALSA.

7.5.            Bibliografia.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: teoria das obrigações. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. vol. 2.

PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil: teoria geral das obrigações. Revisto e atualizado por Guilherme Calmon Nogueira da Gama.. 28. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2016. vol. 2.

TARTUCE, Flavio. Manual de direito civil. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2017.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2017. vol. 2.

8.   Prazo decadencial convencional para utilização de serviço.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

É possível a convenção de prazo decadencial para a utilização de diárias adquiridas em clube de turismo. (STJ, REsp 1778574/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 28/06/2019)

Resultado: Recurso especial desprovido.

Tribunal de Origem: TJRS.

8.1.            Situação fática.

IZAIAS ajuizou, contra CLUBE DE TURISMO, entidade associativa, ação declaratória de nulidade de cláusula contratual que prevê prazo decadencial para utilização de diárias de hotéis.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou improcedente a pretensão

Em apelação, IZAIAS sustentou que a cláusula é nula a partir da análise da relação de consumo existente entre os litigantes.

Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso

Em recurso especial, IZAIAS pugnou, novamente, pelo reconhecimento da nulidade da cláusula.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Negou provimento ao recurso

8.2.            Análise Estratégica.

8.2.1.              Questão em debate.

O cerne do recurso é verificar se é juridicamente possível a previsão de prazo para utilização de serviço contratado, sob pena da perda do direito de utilização.

8.2.2.              Há relação de consumo entre os demandantes?

R: De plano, o Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE fez questão de registrar que não há relação de consumo entre as partes, já que o objeto social da associação requerida se limita à prestação de serviços a seus associados, não havendo, portanto, fornecimento de bens e/ou serviços no mercado de consumo:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Mesmo nos casos em que a realização do objeto social do ente associativo envolve a prestação de serviços pela associação aos associados, falta a essa relação o elemento essencial das relações de consumo, qual seja, o fornecimento de bens e serviços em mercado de consumo (art. 3º, § 2º, do CDC). Tanto é assim que o fornecimento de seus serviços é destinado exclusivamente aos associados, podendo a associação recusar o fornecimento do mesmo serviço a terceiros, o que não é assegurado aos fornecedores de serviços ao mercado, conforme expressa vedação do art. 39, IX, do CDC: ‘Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: IX – recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais;’.” (STJ, REsp 1778574/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 28/06/2019)

“Caramba, achei que tinha relação de consumo!” Somos dois. De todo modo, o Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE passou a analisar a questão sob a ótica do CDC, por cautela.

8.2.3.              O CDC prevê alguma vedação para convenção de prazo decadencial para utilização de bem ou serviço?

R: Cuidado antes de apontar o art. 26 do CDC, pois se trata de norma referente a prazo decadencial para reclamar de vícios aparentes ou de fácil constatação, e não de prazo decadencial para utilização de bem ou serviço.

Nessa linha, o Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE destacou que:

“[Trecho do corpo do acórdão:] (…) o Código de Defesa do Consumidor não se dedicou ao estabelecimento de regras específicas acerca da estipulação de prazos decadenciais às relações de consumo, de modo que se mantêm plenamente eficazes as regras de direito civil, que, por sua vez, admitem a convenção da decadência (art. 211, CC/2002).” (STJ, REsp 1778574/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 28/06/2019)

“Blz, quer dizer que pode fixar prazo e nunca será nula a respectiva cláusula?” Não, também não é assim. Imagine que o fornecedor fixasse um prazo de 30 minutos para a utilização de diárias. Nessa situação, a cláusula seria, claramente, abusiva (art. 51, IV, CDC). Por isso, o próprio Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE pontuou que:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Nesse contexto, não há dúvida de que é possível a convenção do prazo para utilização das diárias adquiridas, restando tão somente verificar se esta convenção violaria o art. 51 do CDC.” (STJ, REsp 1778574/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 28/06/2019)

Em conclusão, é possível a convenção de prazo decadencial para a utilização de diárias adquiridas em clube de turismo, incida ou não o CDC, salvo nas hipóteses de abusividade.

8.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Independentemente da duração, é possível a convenção de prazo decadencial para a utilização de diárias adquiridas em clube de turismo.

8.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

9.   Condômino inadimplente e áreas comuns do edifício.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

É ilícita a disposição condominial que proíbe a utilização de áreas comuns do edifício por condômino inadimplente e seus familiares como medida coercitiva para obrigar o adimplemento das taxas condominiais. (STJ, REsp 1699022/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 28/05/2019, DJe 01/07/2019)

Resultado: Recurso especial provido.

Tribunal de Origem: TJSP.

9.1.            Situação fática.

EDSON estava devendo R$2.500.000,00 ao CONDOMÍNIO TARTARUGA em razão de taxas condominiais atrasadas. Em razão do alto valor do débito e sem êxito no recebimento do montante, o condomínio alterou sua convenção, passando a proibir que condôminos (e seus familiares) em mora pudessem usar áreas comuns do edifício (quadra, salão de festas, academia, piscina etc.). Muito (muito, mais muito p#$&!), EDSON ajuizou ação declaratória de nulidade dessa cláusula proibitiva.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou improcedente a pretensão.
Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso, mantendo a improcedência da pretensão.
Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu provimento ao recurso para anular a cláusula convencional proibitiva.

9.2.            Análise Estratégica.

9.2.1.              Questão em debate.

A controvérsia dos autos está em definir se é possível a convenção condominial – devidamente aprovado em Assembleia – proibir o uso das áreas comuns do edifício aos condôminos inadimplentes.

9.2.2.              Microssistema condominial.

De acordo com o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] O ‘microssistema condominial’ – CONVENÇÃO de condomínio, regimento interno, regulamentos, entre outras regras internas – tem como objetivo precípuo definir tanto as normas de regência para a organização e a administração do condomínio como o norte a guiar os condôminos em seus direitos e deveres (arts. 1.335 e 1.336), (…).” (STJ, REsp 1699022/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 28/05/2019, DJe 01/07/2019)

Nessa linha, ao estabelecer um regramento mínimo (arts. 1.332 e 1.334 CC), o Código Civil determinou que a convenção deverá definir, entre outras cláusulas, “as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores” (art. 1.334, IV, CC), em razão do descumprimento dos seus deveres previstos no art. 1.336 do mesmo diploma, entre os quais: contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais.

Art. 1.336 CC. São deveres do condômino:

I – contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;

II – não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;

III – não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;

IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

§ 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

§ 2º O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembleia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.”

“Bom, então deveria dar para proibir o inadimplente de usar as áreas comuns, certo?” Vamos ver.

9.2.3.              Diante desse cenário, a convenção poderia prever a proibição do uso de determinadas áreas comuns pelo condômino inadimplente?

R: Embora o desfecho dado pelo STJ seja negativo, vejamos a divergência doutrinária, pois, onde há doutrina, há divergência:

A CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO PODE PROIBIR O USO DE DETERMINADAS ÁREAS COMUNS PELO CONDÔMINO INADIMPLENTE?
JOÃO NASCIMENTO FRANCO e NISSKE GONDO FÁBIO ULHOA COELHO (prevalece)
SIM NÃO
Ultrapassado certo limite de tolerância (um trimestre vencido, por exemplo), torna-se injusto impor ao condomínio a obrigação de financiar a quota do condômino relapso, em um estímulo para que ele continue a utilizar-se normalmente de todos os serviços e instalações, para só pagar ao fim de uma demorada e onerosa cobrança judicial. Não é possível afastar, em razão de dívida condominial, o direito ao uso de área comum, ainda que se trate de área voltada ao lazer.

“Que blz então! O cara deve mais de 2 milhões de reais, mas pode continuar usando a sauna, spa, piscina etc…é mole?!” Para justificar esse entendimento o Min. LUIS FELIPE SALOMÃO usou 5 (cinco) linhas de raciocínio:

(a) viola a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, notadamente o princípio da dignidade da pessoa humana (o nosso conhecido coringa do Direito…);

“Realmente, a autonomia privada da assembleia geral, quando da tipificação de sanções condominiais, por se tratar de punição imputada por conduta contrária ao direito, na esteira da visão civil-constitucional do sistema, deve receber a incidência imediata dos princípios que protegem a pessoa humana nas relações entre particulares, a reconhecida eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que também deve refletir nas relações condominiais para assegurar a moradia, a propriedade, a função social, o lazer, o sossego, a harmonia, entre outros direitos. Por certo, buscando concretizar a dignidade da pessoa humana nas relações privadas, a Constituição Federal, como vértice axiológico de todo o ordenamento, irradiou a incidência dos direitos fundamentais também nas relações particulares, emprestando máximo efeito aos valores constitucionais.” (STJ, REsp 1699022/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 28/05/2019, DJe 01/07/2019)

“Tá…mas a convenção não proibiu o cara de usar elevador, garagem, portaria etc., mas sim áreas comuns de lazer, como: sauna, piscina, SPA, salão de festas.” De fato, o tema é bastante polêmico. Não é à toa que foi mantida a improcedência na primeira e segunda entrância.

(b) há abuso de direito na elaboração das cláusulas da convenção do condomínio;

“[Trecho do corpo do acórdão:] No entanto, penso ser ilícita a prática de privar o condômino inadimplente do uso de áreas comuns do edifício, incorrendo em abuso de direito a disposição condominial que determina a proibição da utilização como medida coercitiva para obrigar o adimplemento das taxas condominiais.” (STJ, REsp 1699022/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 28/05/2019, DJe 01/07/2019)

(c) o inadimplente já está submetido a diversas outras sanções:

I. Encargos moratórios diferenciados (arts. 1.336, § 1º, e 1.337, caput, CC);

II. O direito de participação e voto do devedor nas decisões relativas aos interesses do condomínio poderá ser restringido (art. 1335, III, CC);

III. Possibilidade de perda do imóvel, por ser exceção expressa à impenhorabilidade do bem de família (art. 3º, IV, da Lei nº 8.009/90).

(d) o art. 1.335 do CC já prevê situação de restrição do direito do condômino inadimplente (art. 1.335, III, CC) e, tratando-se de norma que restringe direitos, não aceita interpretação ampliativa para abarcar possibilidade de proibição de uso de áreas comuns;

(e) a Terceira Turma do STJ, em recente julgamento, apresentou o mesmo raciocínio.

“(…) 1. O direito do condômino ao uso das partes comuns, seja qual for a destinação a elas atribuídas, não decorre da situação (circunstancial) de adimplência das despesas condominiais, mas sim do fato de que, por lei, a unidade imobiliária abrange, como parte inseparável, não apenas uma fração ideal no solo (representado pela própria unidade), bem como nas outras partes comuns que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio (§ 3º do art. 1.331 do Código Civil). Ou seja, a propriedade da unidade imobiliária abrange a correspondente fração ideal de todas as partes comuns. A sanção que obsta o condômino em mora de ter acesso a uma área comum (seja qual for a sua destinação), por si só, desnatura o próprio instituto do condomínio, limitando, indevidamente, o correlato direito de propriedade. (…) 4. A vedação de acesso e de utilização de qualquer área comum pelo condômino e de seus familiares, independentemente de sua destinação (se de uso essencial, recreativo, social, lazer, etc), com o único e ilegítimo propósito de expor ostensivamente a condição de inadimplência perante o meio social em que residem, desborda dos ditames do princípio da dignidade humana. 5. Recurso especial improvido.” (STJ, REsp 1564030/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 19/08/2016)

9.3.            Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. É lícita a disposição condominial que proíbe a utilização de áreas comuns do edifício por condômino inadimplente e seus familiares como medida coercitiva para obrigar o adimplemento das taxas condominiais.

9.4.            Gabarito.

Q1º. FALSA.

DIREITO EMPRESARIAL

10.      ERB é estabelecimento empresarial.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

A ‘estação rádio base’ (ERB) instalada em imóvel locado caracteriza fundo de comércio de empresa de telefonia móvel celular, a conferir-lhe o interesse processual no manejo de ação renovatória fundada no art. 51 da Lei n. 8.245/91. (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

Resultado: Recurso especial provido.

Tribunal de Origem: TJSP.

10.1.        Situação fática.

CLARO S/A ajuizou ação renovatória em face de JUSSARA para obter a renovação do seu contrato de locação de espaço em que instalado uma de suas ERB (vulgo “Antena”).

Instância Desfecho
1º Grau Julgou extinta a demanda por falta de interesse processual, ao não reconhecer a ERB como estabelecimento empresarial

Em recurso de apelação, a CLARO S/A sustentou que tem, sim, interesse processual já que sua ERB é estabelecimento empresarial.

Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso

Em recurso especial, CLARO S/A pugnou pela reforma do Acórdão.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu provimento ao recurso

10.2.        Análise Estratégica.

10.2.1.           Questão em debate.

O propósito recursal é dizer se a “estação rádio base” (ERB) instalada em imóvel locado caracteriza fundo de comércio (estabelecimento empresarial) da atividade de telefonia móvel celular, a conferir ao empresário interesse processual no manejo de ação renovatória fundada no art. 51 da Lei 8.245/91.

10.2.2.           Ação renovatória

A ação renovatória está prevista nos arts. 51/57 da Lei nº 8.245/91 e, em resumo, confere ao locatário-empresário, nas locações de imóveis destinados à atividade empresarial, o direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que cumpridas certas condições, mantendo-se, dessa forma, a locação do espaço em que instalado o seu estabelecimento empresarial (fundo de comércio).

10.2.3.           O que é um estabelecimento empresarial?

R: Nada melhor que termos um conceito legal:

Art. 1.142 CC. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.”

Ah, e, como lembra a Min. NANCY ANDRIGHI, trata-se, segundo a doutrina majoritária, de uma universalidade de fato:

“[Trecho do corpo do acórdão:] O fundo de comércio ou estabelecimento empresarial constitui-se, segundo majoritária doutrina, em uma universalidade de fato (…).” (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

10.2.4.           Ação renovatória e estabelecimento empresarial.

No que tange à ação renovatória, a Min. NANCY ANDRIGHI destacou sua justificativa:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Por sua relevância econômica e social para o desenvolvimento da atividade empresarial, e, em consequência, para a expansão do mercado interno, o fundo de comércio mereceu especial proteção do legislador, ao instituir, para os contratos de locação não residencial por prazo determinado, a ação renovatória, como medida tendente a preservar a empresa da retomada injustificada pelo locador do imóvel onde está instalada (art. 51 da lei 8.245/91). (…) Oportuno ressaltar que compõem o fundo de comércio bens corpóreos e incorpóreos, e todos eles, considerados em sua totalidade, são objeto da proteção legislativa.” (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

10.2.5.           Ação renovatória como óbice ao enriquecimento sem causa do locador.

“Quê!?” Seleta como poucas… ou melhor, como nenhuma outra, a disciplina de Direito Empresarial busca preservar os princípios básicos do campo jurídico, como a impossibilidade de enriquecimento sem causa.

“Claro, claro…” Vejam, um dos elementos incorpóreos do estabelecimento empresarial é o ponto empresarial, que consiste no espaço em que instalado o estabelecimento empresarial, agregando valor ao imóvel desse local:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Dentre os bens incorpóreos destaca-se o ponto empresarial, como o espaço físico eleito pelo empresário para exercer sua atividade, que se vincula a um imóvel, próprio ou locado, mas com este não se confunde. Em verdade, embora o ponto empresarial se destaque da propriedade a que se vincula, a exploração da atividade econômica organizada no local agrega valor ao imóvel.” (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

Nessa linha, se o locador pudesse, de forma discricionária, recuperar o imóvel locado, despejando o empresário (e seu estabelecimento), locupletar-se-ia com o valor agregado ao seu imóvel. Por isso entra em cena a ação renovatória:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Nessa toada, se, de um lado, a ação renovatória constitui o mais poderoso instrumento de proteção do fundo empresarial, como citado alhures; de outro lado, concretiza a intenção do legislador de evitar o locupletamento do locador, inibindo o intento de se aproveitar da valorização do imóvel resultante dos esforços empreendidos pelo locatário no exercício da atividade empresarial.” (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

10.2.6.           A ERB é um estabelecimento empresarial?

R: De nada serve a ação renovatória se não tiver como objeto um estabelecimento empresarial. Logo, ao dar provimento ao REsp, o STJ concluiu que a ERB, popularmente conhecida como “antenas”, é, de fato, um fundo de comércio:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Nessa toada, conclui-se que a locação de imóvel por empresa prestadora de serviço de telefonia celular para a instalação das ERBs está sujeita à ação renovatória.” (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

Por fim, a Min. NANCY ANDRIGHI registrou outra questão importante, ao concluir que a ação renovatória não está relacionada apenas a imóveis para onde dirijam-se à clientela, mas para todos os imóveis locados com o fim de promover o pleno desenvolvimento da atividade empresarial.

“[Trecho do corpo do acórdão:] É dizer, o cabimento da ação renovatória não está adstrito ao imóvel para onde converge a clientela, mas se irradia para todos os imóveis locados com o fim de promover o pleno desenvolvimento da atividade empresarial, porque, ao fim e ao cabo, contribuem para a manutenção ou crescimento da clientela.” (STJ, REsp 1790074/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019)

“Então, a ação renovatória poderia ser ajuizada para renovar o contrato de locação de um depósito do empresário, cujo estabelecimento frequentado por clientes, na verdade, fica a quilômetros de distância?” Perfeito!

10.3.        Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. A ‘estação rádio base’ (ERB) instalada em imóvel locado caracteriza fundo de comércio de empresa de telefonia móvel celular, a conferir-lhe o interesse processual no manejo de ação renovatória fundada no art. 51 da Lei n. 8.245/91.

Q2º. Estratégia Carreiras Jurídicas. A ação renovatória pode ser ajuizada para renovar o contrato de locação de um depósito do empresário, cujo estabelecimento frequentado por clientes, na verdade, fica a quilômetros de distância do referido depósito.

10.4.        Gabarito.

Q1º. VERDADEIRA.

Q2º. VERDADEIRA.

11.      Plano de recuperação judicial: TR e Juros.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

(I) É válida a cláusula no plano de recuperação judicial que determina a TR como índice de correção monetária e a fixação da taxa de juros em 1% ao ano. (STJ, REsp 1630932/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

(II) No plano de recuperação judicial é possível suspender tão somente o protesto contra a recuperanda e manter ativo o protesto tirado contra o coobrigado. (STJ, REsp 1630932/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

Resultado: Recurso especial parcialmente provido.

Tribunal de Origem: TJSP.

11.1.        Situação fática.

BRAGANÇA INDÚSTRIA LTDA agravou da decisão que concedeu a recuperação judicial da sociedade PIT STOP AÇO LTDA. Em síntese, a agravante contestou a validade das seguintes cláusulas do plano de recuperação judicial:

(a) previsão de TR como índice de correção monetária e a fixação da taxa de juros em 1% ao ano sobre os débitos;

(b) suspensão do protesto dos coobrigados.

Instância Desfecho
2º Grau Deu provimento ao recurso para (i) substituir a TR pela Tabela Prática de atualização monetária adotada pela Corte; (ii) revisar também a periodicidade dos juros, passando-a de 1% ao ano para 1% ao mês; e (iii) afastar a suspensão do protesto dos coobrigados.

Em recurso especial, outra credora, ATIBAIA TRANSPORTE LTDA pugnou pela reforma do Acórdão, com a manutenção dos termos do plano de recuperação judicial.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu parcial provimento ao recurso

11.2.        Análise Estratégica.

11.2.1.           Questão em debate

A controvérsia diz respeito à validade de um plano de recuperação judicial, na parte em que prevê:

(a) a atualização do saldo devedor por meio de TR + 1% ao ano e;

(b) a suspensão dos protestos dos coobrigados.

11.2.1.           O Poder Judiciário pode exercer controle sobre o disposto no plano de recuperação judicial?

R: Sim, mas o controle judicial sobre o plano de recuperação judicial limita-se a 2 (dois) aspectos: (i) legalidade do procedimento e (ii) licitude do conteúdo, sendo vedado ao julgador imiscuir-se no conteúdo econômico das suas cláusulas (STJ, AgInt no AREsp 1.325.791/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 29/10/2018, DJe 05/11/2018 e STJ, REsp 1.359.311/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 09/09/2014, DJe 30/09/2014).

Nessa linha, questiona-se: a utilização da TR como índice de correção monetária e a fixação da taxa de juros em 1% ao ano constituem ilegalidades?

“O que é TR?” Prevista na Lei nº 8.177/91, a TR é um índice prefixado que tem como objetivo recompor o capital atingido pela inflação, embora nos últimos anos tenha permanecido próximo a zero.

11.2.1.           TR

Em princípio, a utilização da TR como indexador, por si só, não configura ilegalidade, pois o próprio STJ possui diversas súmulas no sentido da validade da TR como indexador: nº 295/STJ, 454/STJ, 459/STJ.

Ocorre – e aqui mora o perigo – que alguns contratos não permitem sua utilização, já que a TR não expressa, efetivamente, qualquer recomposição do capital, como pode ser visto em seus índices próximos a zero nos últimos anos:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Há CONTRATOS, no entanto, cuja natureza jurídica, ou cuja lei de regência, exigem a utilização de um índice que efetivamente expresse o fenômeno inflacionário. Para esses tipos de contato, a jurisprudência desta Corte Superior orienta-se no sentido da invalidade da pactuação da TR, pois esse índice não é apto para refletir o fenômeno inflacionário. Observe-se, por exemplo, que TR permaneceu em 0% (zero por cento) – exatamente isso, ‘0%’ – ao longo de todo o ano de 2018, conforme divulgado pelo Banco Central do Brasil (www.bcb.gov.br, acesso em 31/01/2019), fato que corrobora a tese de que a TR não é indicador do fenômeno inflacionário. Nessa linha de intelecção, esta Corte Superior entendeu pela invalidade da utilização da TR como índice de atualização de benefícios de previdência privada (…).” (STJ, REsp 1630932/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

Primeira pergunta: o plano de recuperação judicial é um contrato? Positiva a resposta, pois se trata de um contrato plurilateral:

“[Trecho do corpo do acórdão:] O plano de recuperação judicial, diversamente, teria natureza jurídica de um negócio jurídico plurilateral, na medida em que se forma a partir da manifestação de vontade dos diversos credores reunidos em assembleia, orientados por um presumível interesse comum (a recuperação da empresa em crise), a par do interesse individual de satisfação dos respectivos créditos.” (STJ, REsp 1630932/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

Segunda pergunta: sabendo que o plano de recuperação judicial é um contrato e que a TR está próxima a zero, será a TR um indexador válido para o plano de recuperação judicial? Sim, como foi destacado pelo Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Nessa ordem de ideias, não seria inválida a cláusula do plano de recuperação que suprimisse a correção monetária sobre os créditos habilitados, ou que adotasse um índice que não reflita o fenômeno inflacionário (como a TR, no caso dos autos), pois tal disposição de direitos se insere no âmbito da autonomia que a assembleia de credores possui para dispor de direitos em prol da recuperação da empresa em crise financeira.” (STJ, REsp 1630932/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

11.2.1.           Juros de 1% a.a

Como apontado pelo Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, não existe no ordenamento jurídico nenhuma limitação mínima ao percentual dos juros, de modo que inexiste ilegalidade na previsão de 1% a.a.:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Nesta senda, iniciando pelos abordagem do juros, observa-se não há norma geral no ordenamento jurídico pátrio que estabeleça um limite mínimo, um piso, para a taxa de juros (quer moratórios, quer remuneratórios), como também não há norma que proscreva a periodicidade anual. As normas do Código Civil a respeito da taxa de juros, ou possuem caráter meramente supletivo [art. 406 CC], ou estabelecem um teto [art. 591 CC], conforme se verifica, respectivamente, no enunciado dos arts. 406 e 591 (…).

(…) Conclui-se, portanto, relativamente à taxa e periodicidade dos juros, que não há ilegalidade no conteúdo do plano de recuperação judicial, devendo-se prestigiar a soberania da assembleia geral de credores, que aprovou a taxa de 1% ao ano.” (STJ, REsp 1630932/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

11.2.2.           Homologação do plano de recuperação judicial e protesto.

Aprovado o plano de recuperação judicial e sendo esta homologado pelo Juízo, temos a novação dos créditos anteriores ao pedido (art. 59 da Lei nº 11.101/05):

Art. 59, caput, da Lei nº 11.101/05. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei.”

Agora, qual são os efeitos dessa novação sobre os protestos decorrentes de dívidas da recuperanda e coobrigados:

NOVAÇÃO + PROTESTOS DA RECUPERANDA NOVAÇÃO + PROTESTOS DOS COOBRIGADOS DA RECUPERANDA
Uma vez efetivada a novação dos créditos prevista no art. 59 da Lei 11.101/05, não há falar em inadimplemento por parte da empresa recuperanda, sendo cabível, portanto, o cancelamento (ou suspensão) dos protestos tirados em face desta, sob a condição resolutiva do cumprimento do plano de recuperação (STJ, REsp 1260301/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 21/08/2012) Mesmo efetivada a novação dos créditos prevista no art. 59 da Lei 11.101/05, não há falar-se em desobrigação dos coobrigados da recuperanda, pois “[o]s credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.” (art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/05). Portanto, ainda que exista novação dos créditos da recuperanda, os protestos contra seus coobrigados permanecem. No mesmo sentido: “A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória.” (Súmula nº 581/STJ)

Nesse sentido, a Min. NANCY ANDRIGHI manifestou-se em Voto-Vista:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Ou, em outros termos: como a razão jurídica que justifica a suspensão dos protestos em face da devedora – a novação dos créditos ocorrida em razão da aprovação do plano de soerguimento – não incide nas relações existentes entre os credores da recuperanda e seus coobrigados, a manutenção dos protestos em face destes é medida impositiva.” (STJ, REsp 1630932/SP, Voto-Vista, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 01/07/2019)

11.3.        Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Não é válida a cláusula no plano de recuperação judicial que determina a TR como índice de correção monetária e a fixação da taxa de juros em 1% ao ano, devendo o julgador realizar controle judicial dessas cláusulas.

11.4.        Gabarito.

Q1º. FALSA.

12.      Crédito em moeda estrangeira e Direito Intertemporal.

RECURSO ESPECIAL (REsp)

Crédito em moeda estrangeira que deveria ter sido ou foi habilitado em concordata preventiva (Decreto-Lei n. 7.661/45) que posteriormente vem a migrar para a recuperação judicial (Lei n. 11.101/05) deve ser convertido em moeda nacional pelo câmbio do dia em que foi processada a concordata preventiva. (STJ, REsp 1319085/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 21/05/2019, DJe 25/06/2019)

Resultado: Recurso especial não provido.

Tribunal de Origem: TJSP.

12.1.        Situação fática.

Em 2004, PARMALAT DO BRASIL LTDA submetia-se à concordata preventiva conforme Decreto-Lei nº 7.661/45. Com o advento da Lei nº 11.101/05, PARMALAT DO BRASIL LTDA apresentou pedido de recuperação judicial, que teve seu processamento deferido.

Contudo, ERST BANK, um dos credores da recuperanda, suscitou incidente de impugnação ao quadro geral de credores (QGC) na recuperação judicial da PARMALAT DO BRASIL LTDA, buscando ver seu crédito de US$1.000.000,00 incluído, com conservação de sua variação cambial.

Instância Desfecho
1º Grau Acolheu o incidente para inclusão do crédito, mas determinou que a inclusão ocorresse considerando o valor do crédito em real (R$) na data de processamento da concordata preventiva
Instância Desfecho
2º Grau Negou provimento ao recurso de agravo de instrumento, mantendo o valor do crédito em real (R$) na data de processamento da concordata preventiva
Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Negou provimento ao recurso

12.2.        Análise Estratégica.

12.2.1.           Questão em debate.

A controvérsia dos autos está em definir, diante das regras de direito intertemporal, qual norma deve reger a habilitação de crédito em moeda estrangeira, porquanto houve anterior processamento de concordata preventiva da devedora, com subsequente migração para recuperação judicial, pretendendo a credora a conservação da variação cambial como parâmetro de pagamento do seu crédito, na linha do art. 50, § 2º, da Lei nº 11.101/05:

Art. 50, § 2º, da Lei nº 11.101/05. Nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial.”

12.2.2.           Direito intertemporal.

O Decreto-Lei nº 7.661/45 previa a variação cambial como parâmetro de indexação? Não, e aí está problema. Vejamos a mudança:

Decreto-Lei nº 7.661/45 Lei nº 11.101/05
Art. 213 do Decreto-Lei nº 7.661/45. Os créditos em moeda estrangeira serão convertidos em moeda do país, pelo câmbio do dia em que for declarada a falência ou mandada processar a concordata preventiva, e só pelo valor assim estabelecido serão considerados para todos os efeitos desta lei.” Art. 50, § 2º, da Lei nº 11.101/05. Nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial.”

“Ah, mas a Lei nº 11.101/05 é mais benéfica?” Com certeza, só dar uma olhada no câmbio do dia. Desde e o Plano Real, o dólar jamais perdeu em valorização para nossa moeda. Havendo opção, nenhum credor quer correr o risco de vincular seu crédito a uma moeda mais fraca.

E como resolvemos essa questão temporal, já que o crédito existe desde a concordada preventiva? A princípio, devemos observar o art. 192 da Lei nº 11.101/05 para resolver esses impasses temporais:

“Art. 192 da Lei nº 11.101/05. Esta Lei não se aplica aos processos de falência ou de concordata ajuizados anteriormente ao início de sua vigência, que serão concluídos nos termos do Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945.

§ 1º Fica vedada a concessão de concordata suspensiva nos processos de falência em curso, podendo ser promovida a alienação dos bens da massa falida assim que concluída sua arrecadação, independentemente da formação do quadro-geral de credores e da conclusão do inquérito judicial.

§ 2º A existência de pedido de concordata anterior à vigência desta Lei não obsta o pedido de recuperação judicial pelo devedor que não houver descumprido obrigação no âmbito da concordata, vedado, contudo, o pedido baseado no plano especial de recuperação judicial para microempresas e empresas de pequeno porte a que se refere a Seção V do Capítulo III desta Lei.

§ 3º No caso do § 2º deste artigo, se deferido o processamento da recuperação judicial, o processo de concordata será extinto e os créditos submetidos à concordata serão inscritos por seu valor original na recuperação judicial, deduzidas as parcelas pagas pelo concordatário.

§ 4º Esta Lei aplica-se às falências decretadas em sua vigência resultantes de convolação de concordatas ou de pedidos de falência anteriores, às quais se aplica, até a decretação, o Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945, observado, na decisão que decretar a falência, o disposto no art. 99 desta Lei.

§ 5º O juiz poderá autorizar a locação ou arrendamento de bens imóveis ou móveis a fim de evitar a sua deterioração, cujos resultados reverterão em favor da massa.”

E, ainda, a interpretação que lhe foi dada pelo STJ:

“(…) 2. A interpretação da Lei n. 11.101/2005 conduz às seguintes conclusões:

(A) falência ajuizada e decretada antes da sua vigência: aplica-se o antigo Decreto-Lei n. 7.661/1945, em decorrência da interpretação pura e simples do art. 192, caput;

(B) falência ajuizada e decretada após a sua vigência: obviamente, aplica-se a Lei n. 11.101/2005, em virtude do entendimento a contrário sensu do art. 192, caput; e

(C) falência requerida antes, mas decretada após a sua vigência: aplica-se o Decreto-Lei n. 7.661/1945 até a sentença, e a Lei n. 11.101/2005 a partir desse momento, em consequência da exegese do art. 192, § 4º. (…).” (STJ, REsp 1105176/MG, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 06/12/2011, DJe 13/12/2011)

Sem esquecer destas questões pontuais:

Situação STJ
No caso da decisão que soluciona habilitação de crédito em falência sob a égide do Decreto-Lei n° 7.661/45, cabe apelação, pois não há como aplicar sem dano a regra da incidência imediata das normas processuais, sob pena de colidência frontal com a segurança jurídica dos demais credores, bem como a da empresa falida. REsp 1.248.836/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 21/06/2016, DJe 29/08/2016
Em falência decretada sob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/45, deverá ser esse o normativo a definir a classificação do crédito tributário REsp 1.096.674/MG, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 13/12/2011, DJe 01/02/2012
A norma instituidora da ordem de pagamento dos créditos no processo falimentar (art. 102 do Decreto-Lei n. 7.661/1945 e art. 83 da Lei n. 11.101/2005) não possui nenhum viés processual. “É norma de direito material, de modo que alterações legislativas que possam atingir os direitos nela previstos devem sofrer a contenção legal e constitucional que garanta a higidez do direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada” REsp 1.284.736/GO, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 04/12/2012, DJe 15/03/2013
A decretação da falência, ainda que o pedido tenha sido formulado sob a sistemática do Decreto-Lei n° 7.661/1945, deve observar o valor mínimo exigido pelo art. 94 da Lei n° 11.101/2005, privilegiando-se o princípio da preservação da empresa REsp 1.023.172/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 19/04/2012, DJe 15/05/2012

“Tá, mas e aí, como ficamos com o crédito de US$1.000.000,00?” Pois é, qual normativo deverá reger a habilitação dos créditos em moeda estrangeira, tendo em conta a peculiaridade do caso em julgamento, na qual houve a migração da concordata preventiva para a recuperação judicial, nos termos do art. 192, § 3º, da Lei n° 11.101/05.

Pessoal, já deu para perceber que o desfecho aqui depende da interpretação do § 3º do art. 192 da Lei nº 11.101/05, mais especificamente à expressão: “valor original”.

“Art. 50, § 3º, da Lei nº 11.101/05. No caso do § 2º deste artigo, se deferido o processamento da recuperação judicial, o processo de concordata será extinto e os créditos submetidos à concordata serão inscritos por seu VALOR ORIGINAL na recuperação judicial, deduzidas as parcelas pagas pelo concordatário.”

“Lucas, odeio Direito Empresarial, qual foi o desfecho para sairmos disso logo?” [momento de tensão] O STJ acabou com a expectativa do credor, pois determinou que fosse considerado não o crédito em dólar, mas o seu valor em real quando do processamento da concordata preventiva, nos termos do art. 213 do Decreto-Lei nº 7.661/75:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Diante desse quadro, penso que o valor original do crédito a ser inscrito na recuperação judicial deve ser entendido, nos termos de sua própria redação, como o montante primitivo e de acordo com a legislação de regência da época [art. 213 do Decreto-Lei nº 7.661/45], o que, por óbvio, inclui o momento de sua conversão em moeda nacional. Logo, o crédito habilitado (ou que deveria ter sido) na data do processamento da concordata deve ser o adotado para fins de inclusão na recuperação judicial, notadamente porque seu respectivo valor terá influência direta na sua participação e no seu direito de voto nas assembleias de credores.

(…) Assim, como já existia concordata preventiva processada regendo o crédito da recorrente, ainda que tenha havido sua migração para a recuperação judicial, não há como afastar o normativo de regência da época (art. 213 do Dec. Lei n° 7.661/1945), devendo a conversão do seu crédito em moeda estrangeira para moeda do país ocorrer pelo câmbio do dia em que processada a concordata preventiva, nos termos dos §§ 2° e 3° [do art. 193] da LRF.” (STJ, REsp 1319085/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 21/05/2019, DJe 25/06/2019)

Que beleza, em! Um dólar em 2005 era lá por R$2,60 e hoje já estamos em R$4,00. Credor deve ter ficado muito contente com o entendimento do STJ! Satisfação!

12.3.        Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Crédito em moeda estrangeira que deveria ter sido ou foi habilitado em concordata preventiva que posteriormente vem a migrar para a recuperação judicial não deve ser convertido em moeda nacional, haja vista expressa disposição em contrário da nova LRF.

12.4.        Gabarito.

Q1º. FALSA.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

13.      Critérios para identificação do cabimento de recurso em decisão de duplo conteúdo (natureza complexa).

RECURSO ESPECIAL (REsp)

Em se tratando de decisão interlocutória com duplo conteúdo é possível estabelecer como critérios para a identificação do cabimento do recurso: (i) o exame do elemento que prepondera na decisão; (ii) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões prejudiciais e de questões prejudicadas; (iii) o exame do conteúdo das razões recursais apresentadas pela parte irresignada. (STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 21/06/2019)

Resultado: Recurso especial provido.

Tribunal de Origem: TJPR.

13.1.        Situação fática.

Em demanda sobre responsabilidade obrigacional securitária, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL manifestou interesse em integrar a lide, tendo Juízo Estadual, portanto, declinado sua competência para Justiça Federal, nos termos do art. 109, inciso I, da CF.

Enfurecido, FLÁVIO agravou da decisão, pugnando pela exclusão da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e manutenção da competência com o Juízo Estadual:

Instância Desfecho
2º Grau Não conheceu do recurso por ausência de previsão da hipótese mencionada no rol do art. 1.015 do NCPC

Em recurso especial, FLÁVIO pugnou pela reforma do Acórdão em razão de violação ao art. 1.015, inciso IX, do NCPC.

Art. 1.015 NCPC. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

(…) IX – admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;”

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Deu provimento ao recurso

13.2.        Análise Estratégica.

13.2.1.           Questão em debate.

A questão controvertida está na hipótese de um pronunciamento judicial de natureza complexa, que, acolhendo ou rejeitando a intervenção do terceiro, também se pronuncia sobre a necessidade, ou não, de modificação da competência em virtude da referida intervenção.

E aqui está a razão da ementa em forma de pontos:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Dada a ausência de doutrina que tenha tratado especificamente desse tema, é preciso construir e estabelecer critérios decisórios para a solução da questão, tendo como fundamento, sobretudo, o conteúdo de cada pronunciamento judicial.” (STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 21/06/2019)

Isso mesmo! Você que jamais achou que fosse chegar o dia em que a doutrina se silenciasse…está aí.

De todo modo pessoal, em razão da falta de construção acadêmica, a Min. NANCY ANDRIGHI procurou fornecer todos os nortes da análise.

13.2.2.           Critérios para identificação do cabimento de recurso em decisão de duplo conteúdo (natureza complexa).

De acordo com a Min. NANCY ANDRIGHI são 3 (três) critério: (1º) preponderância da carga decisória; (2º) antecedente-consequente e questões prejudiciais e prejudicada; (3º) foco da irresignação das razões recursais.

CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DO CABIMENTO DE RECURSO EM DECISÃO DE DUPLO CONTEÚDO (NATUREZA COMPLEXA)
Ordem Critério
“[Trecho do corpo do acórdão:] O primeiro critério que se pode fixar diz respeito a preponderância de carga decisória, ou seja, qual dos elementos que compõem o pronunciamento judicial é mais relevante (…).” (STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 21/06/2019)
“[Trecho do corpo do acórdão:] calcado na lógica do antecedente-consequente e na ideia das questões prejudiciais e das questões prejudicadas que se pode emprestar da própria ciência processual, em que se verifica se a primeira matéria – intervenção de terceiro – influencia o modo de se decidir a segunda matéria – competência.” (STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 21/06/2019)
“[Trecho do corpo do acórdão:] É também relevante examinar, nesse contexto, o foco da irresignação da parte agravante em suas razões recursais para que se conclua pela incidência do art. 1.015, IX, do CPC/15, ou seja, se a impugnação se dirige precipuamente para a questão da intervenção de terceiro ou para a questão da competência.” (STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 21/06/2019)

Aplicando esses critérios à situação descrita nos autos, temos o seguinte desfecho:

CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DO CABIMENTO DE RECURSO EM DECISÃO DE DUPLO CONTEÚDO (NATUREZA COMPLEXA)
Ordem Critério
A intervenção de terceiro exerce relação de dominância sobre a competência, sobretudo porque, na hipótese, somente se pode cogitar de uma alteração de competência do órgão julgador se – e apenas se – houver a admissão ou inadmissão do terceiro apto a provocar essa modificação.
A intervenção de terceiro é o antecedente que leva, consequentemente, ao exame da competência, induzindo a um determinado resultado – se deferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá alteração da competência para a Justiça Federal; se indeferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá manutenção da competência na Justiça Estadual.
Na hipótese em exame, verifica-se que a decisão interlocutória afirma que a Caixa Econômica Federal manifestou interesse em integrar a demanda e que esse é o motivo pelo qual se conclui pela incompetência do Juízo Estadual.
Resultado AGRAVO DE INSTURMENTO (art. 1.015, X, NCPC)
Base legal Art. 1.015 NCPC. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (…) IX – admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;”

Em conclusão, a Min. NANCY ANDRIGHI asseverou que:

“[Trecho do corpo do acórdão:] Em síntese, por qualquer ângulo que se examine a controvérsia, conclui-se que a decisão que versa sobre a admissão ou inadmissão de terceiro é recorrível de imediato por agravo de instrumento fundado no art. 1.015, IX, do CPC/15, ainda que da intervenção resulte modificação ou não da competência, que, nesse contexto, é uma decorrência lógica, evidente e automática do exame da questão principal.” (STJ, REsp 1797991/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/06/2019, DJe 21/06/2019)

13.3.        Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. Em se tratando de decisão interlocutória com duplo conteúdo é possível estabelecer como critérios para a identificação do cabimento do recurso: (i) o exame do elemento que prepondera na decisão; (ii) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões prejudiciais e de questões prejudicadas; (iii) o exame do conteúdo das razões recursais apresentadas pela parte irresignada.

13.4.        Gabarito.

Q1º. VERDADEIRA.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

14.      Revista pessoal por agente de segurança privada.

HABEAS CORPUS (HC)

É ilícita a revista pessoal realizada por agente de segurança privada e todas as provas decorrentes desta. (STJ, HC 470937/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 04/06/2019, DJe 17/06/2019)

Resultado: Ordem concedida.

Tribunal de Origem: TJSP.

14.1.        Situação fática.

PAULO estava aguardando na estação de trem quando agentes de segurança privada do local resolveram abordá-lo, pois achavam que era um vendedor ambulante.

Realizada a revista pessoal em sua mochila, os agentes de segurança privada localizaram 500g de maconha e, por conseguinte, prenderam-no em flagrante.

Na unidade policial, o Delegado de Polícia indiciou PAULO por tráfico de drogas, tendo o MINISTÉRIO PÚBLICO o denunciado pelo mesmo delito.

Instância Desfecho
1º Grau Julgou improcedente a ação penal por reconhecer a ilicitude na busca e apreensão realizada por agentes particulares.

Em recurso de apelação, o MINISTÉRIO PÚBLICO defendeu que o crime de tráfico é permanente e que qualquer um do povo pode realizar prisão em flagrante (art. 301 CPP).

Instância Desfecho
2º Grau Deu provimento ao recurso para condenar PAULO nos termos da denúncia.

Em habeas corpus, a defesa sustentou a ilicitude da busca e apreensão feita por agentes particulares.

Instância Desfecho
Superior Tribunal de Justiça Ordem concedida para absolver o réu

14.2.        Análise Estratégica.

14.2.1.           Questão em debate.

Discute-se nos autos a validade da revista pessoal realizada por agente de segurança privada.

14.2.2.           Busca pessoal (revista pessoal) e busca domiciliar.

O julgamento não foi complexo, mas merece cuidado. A revista pessoal foi considerada ilícita, porque:

CONDUZIDA POR AGENTES PARTICULARES

Não foi considerada ilícita por falta de mandado judicial! Isso porque, caso os agentes fossem policiais e houvesse fundadas suspeitas, eles poderiam realizar a busca pessoal (revista pessoal), independentemente de mandado judicial:

Art. 240 CPP. A busca será domiciliar ou pessoal.

(…) § 2º Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior.”

Art. 244 CPP. A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.”

Logo, havendo fundada suspeita, a revista pessoal (busca pessoal) seria lícita caso, independentemente de mandado judicial:

CONDUZIDA POR AGENTES POLICIAIS

“Tá, mas onde está escrito que o cidadão não pode realizar busca pessoal?” Nessa questão, o Min. JOEL ILAN PACIORNIK utilizou 2 (dois) argumentos:

(a) art. 144 da CF. A segurança pública é exercida pelo Estado por meio da polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros militares.

“Outro aspecto importante, é que o referido diploma [CPP] prevê tanto a busca pessoal quando a busca domiciliar involuntárias como ações exclusivamente estatais, a serem realizadas através das autoridades judiciárias ou policiais. E as forças policiais são unicamente aquelas que constam do art. 144 da Constituição Federal.” (Rômulo Gabriel Moraes Lunelli)

(b) art. 5º, inciso II, da CF. O réu não precisaria ter se submetido à revista pessoal, pois:

Art. 5º, II, CF. Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;”

Por outro lado, quando se trata de busca domiciliar, além da condição de agentes policiais, deve-se ter também ordem judicial:

Art. 241 CPP. Quando a própria autoridade policial ou judiciária não a realizar pessoalmente, a busca domiciliar deverá ser precedida da expedição de mandado.”

“Ah, mas essa parte inicial do artigo dá a entender que a autoridade policial pode realizar a busca domiciliar independentemente de ordem judicial.” Sim, mas essa parte não foi recebida pela Constituição Federal:

241.1. Busca e mandado judicial: Eis aqui mais uma prova definitiva da superação história de nosso Código de Processo Penal. Não se concebe mais a busca domiciliar sem ordem judicial, daí por que revogado – ou não recebido – nessa parte a alusão feita à autoridade policial (ver art. 5º, X, CF). Somente a busca pessoal pode ser realizada sem autorização judicial, diante da necessidade da atuação do poder público, devidamente justificada por situações de emergência e riscos bem definidos em Lei.” (Eugênio Pacelli e Douglas Fischer)

14.2.3.           E se o réu estivesse com a droga nas mãos?

R: Aí, sim, qualquer do povo poderia realizar a prisão, nos termos do art. 301 do CPP:

Art. 301 CPP. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.”

14.3.        Questões objetivas.

Q1º. Estratégia Carreiras Jurídicas. É ilícita a revista pessoal realizada por agente de segurança privada e todas as provas decorrentes desta.

14.4.        Gabarito.

Q1º. VERDADEIRA.

14.1.        Bibliografia.

OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de; FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2015.

Https://jus.com.br/artigos/24655/a-busca-pessoal-revista-feita-por-agente-de-seguranca-privada. Acessado em: 16.08.2019.


[1] De acordo com STF, a prescrição intercorrente inicia-se no curso do PAD, caso não seja finalizado em até 140 (cento e quarenta) dias de sua instauração, em aplicação analógica à soma dos prazos dos arts. arts. 152 e 167 da Lei nº 8.112/90. Vide: STJ, REsp 1191346/CE, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/10/2010, DJe 15/10/2010.

[2]Art. 944 CC. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.”

[3] Art. 1.043 NCPC. É embargável o acórdão de órgão fracionário que: I – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo os acórdãos, embargado e paradigma, de mérito; II – Revogado; III – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo um acórdão de mérito e outro que não tenha conhecido do recurso, embora tenha apreciado a controvérsia; IV – Revogado. (…).”

[4] A ação de repetição de indébito tem a finalidade de recuperar o valor pago indevidamente.

[5] Outras denominações de enriquecimento ilícito segundo a Min. NANCY ANDRIGHI: enriquecimento sem causa, enriquecimento indevido e locupletamento indevido.

[6] “A ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto sujeita-se ao prazo prescricional estabelecido no Código Civil.” (Súmula nº 412/STJ)

[7] Pelo menos, pois se ela (cônjuge ou companheira sobrevivente) concorrer com 1 (um) ou 2 (dois) descendentes, seu quinhão será maior: ½ ou 1/3.

Lucas de Abreu Evangelinos

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