Olá, pessoal! Estamos vivendo um excelente momento de concursos da Área Fiscal. Como é de se esperar, os certames de alto nível dessa área exigem que o aluno vá além da literalidade, se aprofundando em jurisprudências de diversos temas, em especial sobre Direito Tributário. Para isso, e aproveitando a proximidade de provas importantes como a da SEFAZ-MT, trataremos neste artigo sobre o histórico jurisprudencial acerca da cobrança do ICMS nas transferências interestaduais da mesma empresa.
Nesse sentido, iniciaremos explicando o conceito básico do imposto, partindo para as principais decisões da Suprema Corte sobre a sua cobrança nas transferências. Vamos nessa?
O ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) é um tributo estadual que incide sobre a movimentação de bens e serviços, sendo uma das principais fontes de receita dos estados brasileiros. A sua cobrança é regulamentada pela Constituição Federal e por leis estaduais, e é objeto de diversas discussões jurídicas, principalmente no que diz respeito à sua incidência na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, localizados em estados diferentes.
A partir de agora, vamos analisar o histórico da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias de um estado para o outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte, desde a sua origem até os dias atuais.
A controvérsia sobre a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa teve origem com a edição da Lei Complementar nº 87/96, conhecida como Lei Kandir, que estabeleceu as regras para a cobrança do imposto. De acordo com a supracitada lei, o ICMS é devido ainda que a saída da mercadoria se dê para outro estabelecimento do mesmo titular. Vejamos:
Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;
§ 4º Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo do imposto é:
I – o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;
II – o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;
III – tratando-se de mercadorias não industrializadas, o seu preço corrente no mercado atacadista do estabelecimento remetente.
No entanto, em casos de transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, não há como afirmar que houve a circulação jurídica da mercadoria, que pressupõe a troca de sua titularidade ou posse, o que levou à discussão sobre a incidência do imposto nessas situações.
De um lado, os estados defendem que o ICMS deve ser cobrado na operação interestadual de transferência, ainda que ela ocorra entre estabelecimentos de uma mesma empresa. De outro, as empresas alegam que a cobrança do imposto deve ocorrer somente na operação interestadual entre estabelecimentos de contribuintes distintos, por não considerarem a transferência entre filiais e matriz como fato gerador do imposto.
A controvérsia sobre a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa foi levada ao STF em diversos processos, que resultaram em muitos entendimentos ao longo dos anos. A seguir, vamos analisar os principais julgamentos do tribunal sobre o assunto, com foco na decisão mais recente.
Recurso Extraordinário (RE) 194.694/MG – julgamento em 1999
Em 1999, o STF julgou o Recurso Extraordinário (RE) nº 194.694, que tratava da cobrança de ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, localizados em estados diferentes. Na época, a controvérsia sobre a incidência do imposto nessas situações era objeto de diversas discussões jurídicas, e o caso foi de grande importância para a definição do entendimento do STF sobre o tema.
No caso concreto, a empresa Marajó Agroindustrial Ltda. interpôs um recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que havia determinado a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias entre seus estabelecimentos em Minas Gerais e São Paulo. A empresa alegou que não deveria ser obrigada a recolher o imposto na operação, já que se tratava de uma mera transferência de bens, sem configuração de circulação jurídica de mercadorias.
Ao julgar o recurso, o STF entendeu que a transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa não configura circulação de mercadoria, mas sim mera transferência de bens, o que não justifica a cobrança do ICMS. Por unanimidade, os ministros decidiram que o imposto é devido no estado de destino da mercadoria, ou seja, onde ela será consumida ou utilizada após a transferência, e não na origem da operação, como defendiam alguns estados.
A decisão do STF no RE 194.694/MG teve grande importância na definição do entendimento do Tribunal sobre a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, e se consolidou como um precedente relevante para outros casos semelhantes. A partir desse julgamento, o STF passou a entender que a transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma empresa não configura circulação de mercadoria, e que, portanto, não justifica a cobrança do ICMS na origem da operação.
Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1255885 – julgamento em 2020
O Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1255885 foi um processo julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020, que tratava da cobrança de ICMS no deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, localizados em estados diferentes.
No caso concreto, o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul entendeu que a movimentação de gado bovino de um Estado para outro, ainda que permaneça com um mesmo proprietário, constitui fato gerador do ICMS, conforme previsto no Código Tributário Estadual, agasalhado pelas disposições do Decreto -Lei nº 406/68 (artigos 1º, I; 2º, § 1º), conforme o permissivo da Constituição da República (artigo 155, II, § 2° XII) e, em especial, no artigo 12 da Lei Complementar nº 87/96.
Ao julgar o recurso, o STF entendeu que a cobrança do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa é inconstitucional. Por maioria de votos, os ministros decidiram que a transferência de mercadorias nesses casos não gera a obrigação de pagamento do ICMS, uma vez que não há uma operação de compra e venda e nem transferência de titularidade da mercadoria.
A decisão do STF no ARE 1255885 reforçou o entendimento de que a transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma empresa não configura uma operação sujeita à incidência do ICMS. Fixou-se nessa oportunidade a seguinte tese:
“Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia.“
Cabe destacar que as decisões apresentadas até então tiveram efeito vinculante somente em relação aos órgãos do Poder Judiciário (art. 927, CPC), não havendo até o momento decisões emanadas do STF em controle concentrado de constitucionalidade. Apesar de consolidada a jurisprudência, permanecia vigente a previsão da Lei Kandir que, de maneira genérica, exigia o ICMS em operações dessa natureza e os contribuintes que pretendessem contestar essa exigência deveriam buscar o Poder Judiciário.
A decisão final na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49
A Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49 foi proposta pelo Governador do Estado do Rio Grande do Norte em 2017 no Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de declarar a constitucionalidade de artigos da Lei Kandir que estabelecem a obrigatoriedade da cobrança do ICMS nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, localizados em diferentes estados.
O Governador do Rio Grande do Norte argumentou que a cobrança do ICMS nas transferências interestaduais entre estabelecimentos de uma mesma empresa é constitucional, por conta de diversos motivos, destacando principalmente a autonomia dada aos estados pela Constituição Federal, que prevê a competência dos mesmos para instituir e arrecadar o imposto sobre circulação de mercadorias e serviços.
Além disso, o Governador afirmou que a cobrança do ICMS nas transferências interestaduais é uma forma de evitar a guerra fiscal entre os estados, já que a isenção do imposto nessas operações poderia incentivar a concentração de empresas em determinados estados produtores, prejudicando a livre concorrência e a economia como um todo.
Em 2021, o STF julgou a ADC nº 49 e declarou a inconstitucionalidade de dispositivo da Lei Kandir (Lei Complementar 87/1996) que possibilita a cobrança do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica. No entanto, os efeitos da decisão ficaram suspensos até 2023, após pedido de embargos de declaração.
Finalmente, em abril de 2023, o Tribunal, por um placar de 6×5, julgou procedentes os embargos para modular os efeitos da decisão a fim de que tenha eficácia a partir do exercício financeiro de 2024.
Foi feito, ainda, um esclarecimento pontual do acórdão de mérito para afirmar a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do artigo 11, parágrafo 3º, inciso II, da Lei Complementar 87/1996, excluindo do seu âmbito de incidência apenas a cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular. O trecho da lei supracitado assim prevê:
Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
[…]
§ 3º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado, ainda, o seguinte:
[…]
II – é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular;
Dessa forma, pelo entendimento atual, essa autonomia dos estabelecimentos do mesmo contribuinte não tem validade para fins de cobrança de ICMS nas operações de transferências. Esse é uma importante interpretação da decisão e é válido que vocês levem isso para a prova e para a vida de “concurseiros”.
A questão dos créditos gerados na entrada da mercadoria do estabelecimento remetente
Outra polêmica dentro do tema foi o destino a ser dado aos créditos registrados pela entrada das mercadorias transferidas nos estabelecimentos remetentes. Na mesma decisão, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os créditos tributários do ICMS podem ser transferidos entre filiais de uma empresa, em estados diferentes, a partir de 2024, modulando a decisão da mesma forma como o fez para a não-incidência do ICMS nas operações de transferência.
Pessoal, espero que essas informações sejam úteis para vocês, de forma que consigam assimilar as jurisprudências apresentadas, aprimorando o estudo para os concursos que estão por vir. Lembrem-se sempre da importância do domínio das jurisprudências nos concursos de alto nível e levem isso em consideração nos estudos de vocês.
Um forte abraço e ótimos estudos!
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