Este artigo se destina a explicar as garantias e privilégios do crédito tributário em todas as suas respectivas formas. A relação jurídico-tributária é a relação entre o ente estatal e o contribuinte, surgida em função da ocorrência do fato gerador.
O fato gerador, por sua vez, é a concretização, no mundo real, de uma hipótese de incidência prevista em lei, que descreve uma circunstância que, uma vez ocorrida no mundo dos fatos, leva também ao surgimento da obrigação tributária principal – a obrigação de recolher determinado montante a título de tributo, que quem realiza o fato gerador deve pagar (o contribuinte ou responsável – sujeitos passivos) ao ente estatal competente para exigir o seu cumprimento (o ente estatal, nessa relação o sujeito ativo).
Com o procedimento administrativo vinculado e obrigatório denominado lançamento, essa obrigação tributária é convertida em crédito tributário – líquido (quanto ao valor) e certo (quanto à exigibilidade). E esta relação persiste entre o sujeito ativo e o sujeito passivo até a sua respectiva extinção, que se dá predominantemente com o seu pagamento. Entretanto, nem sempre essa relação jurídico-tributária é pacífica ou voluntária entre as partes. Há situações em que o sujeito passivo ou o responsável não arcam com suas devidas obrigações.
Desta forma, o direito tributário atribui ao ente estatal poderes especiais para possibilitar que o fisco consiga receber o tributo devido – a despeito da vontade contrária do contribuinte. São garantias e privilégios do crédito tributário para fazer valer o seu mister, sua função essencial, a de arrecadar seus respectivos tributos junto aos contribuintes.
Tais prerrogativas especiais do crédito tributário não suplantam os direitos e garantias individuais das pessoas contidos na Constituição Federal de 1988 (CF/88) – mas delineiam uma área na qual são garantidos ao fisco poderes especiais para que prevaleçam os benefícios à coletividade, decorrente da atividade tributária. Estes privilégios e garantias do fisco estão disseminados pela lei n. 5.172/1966, o Código Tributário Nacional (CTN), no Capítulo VI – Garantias e Privilégios do Crédito Tributário, do art. 183 ao art. 193.
O tema da natureza das garantias e privilégios é muito importante para o fisco. Em regra, não há comunicabilidade entre a natureza das garantias e a natureza do crédito tributário. Conforme o art. 183, parág. Único: “A natureza das garantias atribuídas ao crédito tributário não altera a natureza deste nem a da obrigação tributária a que corresponda.” Isso quer dizer o seguinte: se um contribuinte devedor oferece uma hipoteca como forma de garantia do crédito tributário não muda sua natureza jurídica nem transforma o crédito tributário em crédito imobiliário – persistindo, portanto, sua feição tributária.
Dentro da relação jurídico-tributária há um desequilíbrio de poderes. Esse desequilíbrio é demonstrado pelo contribuinte, que responde por seus respectivos interesses, contraposto ao fisco, que representa a coletividade. O art. 184 expõe essa preponderância do Estado perante o contribuinte: “Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento do crédito tributário a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa falida, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declare absolutamente impenhoráveis.”
Por esse dispositivo o CTN declara que os bens e rendas do sujeito passivo estão à mercê do fisco na liquidação do crédito tributário, exceto aqueles que a lei declare absolutamente impenhoráveis. Em decorrência das garantias e privilégios do crédito tributário, ocorre que a incidência patrimonial do crédito é deveras abrangente, atingindo tanto o plano material como o plano pessoal.
No plano material o crédito alcança todos os bens e rendas, de qualquer natureza ou origem, incluindo os bens gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, sem que se releve a data de constituição do ônus ou da cláusula.
No plano pessoal o patrimônio do devedor é atingido, bem como seu espólio ou massa falida.
A fraude à execução fiscal é o ato do sujeito passivo que indica ao fisco que ele não irá pagar o crédito tributário. Quando ela é caracterizada, tem-se que o sujeito passivo começa a dilapidar seu patrimônio, com o intuito de não deixar bens suficientes para pagar o crédito tributário.
O momento que indica essa presunção de fraude à execução fiscal se dá quando ocorre a inscrição em dívida ativa do crédito tributário – providência efetuada pela fazenda pública para assegurar a cobrança de seus créditos por ação judicial e execução fiscal. No momento em que ocorre a inscrição, a presunção passa de relativa à absoluta. Se após a inscrição em dívida ativa o devedor se desfaz de seu patrimônio, tal ato pode ser considerado fraudulento perante o fisco – este é mais um exemplo de garantias e privilégios do crédito tributário.
E anteriormente à inscrição? Também pode ser considerada fraudulenta – mas neste caso a presunção é relativa, cabendo à fazenda o ônus da prova.
Todavia, a questão da presunção absoluta, mesmo depois da inscrição em dívida ativa, pode ser afastada – basta que o devedor reserve bens suficientes ao pagamento do crédito tributário.
Após a inscrição em dívida ativa ocorre a execução fiscal, caso o devedor tributário não promova o pagamento. E na ação de execução fiscal se inicia um rito no qual o devedor é citado para pagar ou apresentar bens à penhora, com o objetivo de liquidar sua dívida tributária. O juiz procede conforme especificado no art. 185-A: “Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial.
§ 1o A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite.
§ 2o Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido.”
Por esse artigo, é possível notar que o juiz promove uma busca por ativos do devedor, no sentido de garantir a liquidação do crédito tributário. São procurados registros em cartórios de imóveis, bens móveis como automóveis, conta corrente, conta de investimento e outros ativos que possam ser penhorados para satisfazer a exigência da execução fiscal.
E se os bens forem de R$ 1 milhão, com dívida de R$ 500 mil? Serão penhorados os bens até o limite da dívida, deixando livre o restante. E se forem bens de R$ 500 mil com dívida de R$ 1 milhão? Bem, todo o patrimônio encontrado será penhorado, nesse caso, em mais um exemplo de como funcionam as garantias e privilégios do crédito tributário.
As preferências ou privilégios do crédito tributário são estabelecidas no CTN. Logo no início desta parte, no art. 186, é exposta a preponderância do crédito tributário a quaisquer outros, excetuados apenas os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente do trabalho. Aqui é demonstrada a primazia do crédito tributário em condições normais, ressalvando-se dessa primazia os créditos do trabalhador – já considerado hipossuficiente nas relações de trabalho.
Depois, existem as considerações relativas à falência, condição especial de vulnerabilidade da empresa, na qual ela geralmente não possui fundos suficientes para arcar com suas dívidas. Aqui o crédito tributário não possui a mesma primazia, não preferindo aos créditos extraconcursais (surgidos no curso da falência) ou às importâncias passíveis de restituição, nos termos da lei falimentar, nem aos créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado.
Isso quer dizer que na falência o crédito tributário não possui primazia sobre esses créditos. Por exemplo, sobre os honorários do administrador judicial, sobre uma hipoteca de um imóvel da empresa, ou mesmo créditos tributários surgidos na época da falência.
Por outro lado, no caso da falência, o CTN prevê que a lei pode estabelecer limites e condições para os créditos decorrentes da legislação do trabalho – o que a lei de falência efetivamente faz, determinando a quantia de 150 salários-mínimos como esse limite. Acima desse limite tais créditos trabalhistas são considerados quirografários – não possuem a mesma natureza salarial protegida pela lei.
Nesta seção, também é definida a preferência da multa tributária, que prefere apenas aos créditos subordinados – créditos previstos em lei ou contrato, bem como os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício. Este dispositivo busca não penalizar indevidamente empregados pelas infrações cometidas pela empresa.
Nesta seção também fica claro que a cobrança judicial do crédito tributário não se sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, recuperação judicial, concordata, inventário ou arrolamento. Só se admite preferência entre pessoas jurídicas de direito público, na seguinte ordem: União; Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pró-rata; e Municípios, conjuntamente e pró-rata.
São pagos preferencialmente a quaisquer créditos habilitados em inventário ou arrolamento, ou a outros encargos do monte, os créditos tributários vencidos ou vincendos, a cargo do de cujus ou de seu espólio, exigíveis no decurso do processo de inventário ou arrolamento. Contestado o crédito tributário, o juiz mandará reservar bens suficientes à extinção total do crédito, ouvido, quanto à natureza e valor dos bens reservados, o representante do fisco.
São também pagos preferencialmente a quaisquer outros os créditos tributários vencidos ou vincendos, a cargo de pessoas jurídicas de direito privado em liquidação judicial ou voluntária, exigíveis no decurso da liquidação. A extinção das obrigações do falido requer prova de quitação de todos os tributos.
A concessão de recuperação judicial depende da apresentação da prova de quitação de todos os tributos. Nenhuma sentença de julgamento de partilha ou adjudicação será proferida sem prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio, ou às suas rendas.
Por último, salvo quando expressamente autorizado por lei, ente federativo não poderá celebrar contrato ou aceitar proposta em concorrência pública sem que o contratante ou proponente esteja em dia com todos os tributos devidos, relativos à atividade em cujo exercício contrata ou concorre, desta forma demonstrando mais uma vez as garantias e privilégios do crédito tributário.
As garantias e privilégios do crédito tributário também foram moldados pela jurisprudência. Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) é célebre a decisão sobre os limites e prerrogativas da fiscalização tributária. Como decorrência lógica da sofisticação da atividade criminal, a Lei Complementar n. 105/2001 foi elaborada para garantir maior poder fiscalizatório para a Receita Federal do Brasil no sentido de investigar crimes tributários que envolvam lavagem de dinheiro.
Com a globalização da circulação de recursos financeiros, a atividade criminosa e terrorista passou a depender cada vez mais da movimentação financeira por todo o mundo. Os fluxos financeiros aumentaram significativamente, exigindo mais capacidade de fiscalização dos órgãos tributários. A Lei Complementar n. 105/2001 veio para dar mais poderes para a fiscalização tributária.
Por outro lado, pessoas físicas e jurídicas começaram a alegar, em ações judiciais, que suas informações estavam sendo invadidas pelo órgão, constituindo assim uma real violação de privacidade. Nesse caso, o que deveria prevalecer? O direito individual à privacidade, ou o poder fiscalizatório do estado?
O STF enfrentou esse julgado em 2016, com uma decisão que referendou o poder fiscalizatório estatal, conforme consta neste artigo sobre a questão do direito ao sigilo e o direito do fisco, desde que haja um processo administrativo instaurado – para que o poder estatal não possa ser utilizado indevidamente para perseguir quaisquer pessoas.
Outra decisão foi sobre o rito procedimental da execução fiscal, em súmula aprovada pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula STJ-560: “A decretação da indisponibilidade de bens e direitos, na forma do art. 185-A do CTN, pressupõe o exaurimento das diligências na busca por bens penhoráveis, o qual fica caracterizado quando infrutíferos o pedido de constrição sobre ativos financeiros e a expedição de ofícios aos registros públicos do domicílio do executado, ao Denatran ou Detran.”
Neste artigo buscou-se recapitular a relação jurídico-tributária, trazida pela obrigação tributária, que, por sua vez, surge com a ocorrência do fato gerador. Esta relação possui alguns aspectos, a saber: o aspecto material, definido pelo acontecimento que constitui o fato gerador; o aspecto espacial, onde ocorre tal fato gerador; o aspecto temporal, quando se considera ocorrido o fato gerador; o aspecto quantitativo, ou seja, a respectiva base de cálculo e alíquota; e o aspecto subjetivo, que define quem são os sujeitos ativo e passivo.
Nesta relação jurídico-tributária, temos o sujeito passivo, que é contribuinte ou responsável, que deverá adimplir com sua respectiva obrigação tributária. Do outro lado, temos o sujeito ativo, que representa o ente estatal que é competente para exigir este tributo. O ente estatal na verdade representa a coletividade: ele representa a personificação da sociedade, através de uma unidade administrativa, incumbida de cuidar do bem estar da sociedade.
Entre os direitos individuais do contribuinte e os direitos da coletividade como um todo há um desequilíbrio, pois o bem-estar da sociedade se sobrepõe ao bem-estar individual, por isso o ente estatal possui poderes maiores que os do contribuinte, para fazer cumprir as obrigações tributárias. Desta forma, este é dos motivos pelos quais o crédito tributário possui garantias e privilégios que asseguram à fazenda pública maior efetividade na cobrança do crédito tributário.
Uma dessas garantias e privilégios caracteriza a oneração de bens e rendas do sujeito passivo como fraudulenta após a inscrição de seu débito em dívida ativa. Esta é uma presunção absoluta, que encontra ressalva quando o devedor deixe reservados fundos suficientes para cumprir com o pagamento de sua dívida.
Outras dessas garantias e privilégios exige a quitação de tributos que o sujeito passivo obtenha sentença de adjudicação e partilha em seus processos de inventário e arrolamento. Ou até mesmo a quitação de tributos para a concessão de recuperação judicial.
Outra forma de se verificar essas garantias e privilégios é a que a primazia de que o crédito tributário goza é de tal maneira que ele sua cobrança judicial não se sujeita a concurso de preferências entre credores – ressalvando-se apenas alguns tipos de créditos na falência. E outros créditos extraconcursais (surgidos durante o processo de falência ou recuperação judicial).
A preferência entre credores, em regra, somente é admitida entre pessoas jurídicas de direito público: União; Estados, Distrito Federal e Territórios, conjuntamente e pró-rata; e Municípios, conjuntamente e pró-rata.
Ricardo Pereira de Oliveira
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