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Gabarito CGE CE Direito Administrativo – recursos

[Gabarito CGE CE Direito Administrativo] Olá, pessoal! Estou passando para comentar duas questões do concurso da CGE CE que, a meu ver, são passíveis de recurso.

Eu fiz o comentário do gabarito extraoficial neste vídeo disponível no canal do Youtube do Estratégia Concursos: https://youtu.be/zQ_HJOsjbgQ?t=6667

Porém, notamos que, em duas questões, o gabarito do Cespe não bateu com o nosso. Foram justamente nas duas questões em que já havíamos comentado sobre a possibilidade de recursos.

Só uma observação. Não copie e cole os meus comentários. Faça o seu próprio recurso, adotando os posicionamentos abaixo como referência. O Cespe desconsidera recursos repetidos, com o mesmo teor.

Então, vamos lá!

47. (Cespe – Auditor de Controle Interno/CGE CE/2019)

Assinale a opção que apresenta exemplo de prestação direta de serviço público.
a) serviços de distribuição de gás natural
b) coleta seletiva de lixo
c) execução de obra pública
d) serviço postal
e) serviços de radiodifusão

Comentário: no comentário do gabarito extraoficial eu já havia comentado que a questão seria passível de recurso. A questão não define qual é o sentido de “prestação direta” e também de “serviço público”. As duas expressões possuem sentido bastante diverso na doutrina.

O termo serviço público possui vários sentidos, mas para facilitar vamos empregar o conceito de José dos Santos Carvalho Filho, que define serviço público como: “toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade“.

Por esse conceito, todas as atividades mencionadas na questão, com exceção da obra pública, são consideradas serviços públicos. A obra pública, por si só, não é serviço público porque, sozinha, ela não atende a uma necessidade essencial e secundária da sociedade. É preciso algo a mais, um serviço, como a manutenção de uma rodovia ou outra forma de prestação de utilidades para a população.

Agora, vamos ao conceito de prestação direta. Para Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, a execução direta é aquela realizada pela administração pública, seja pela administração direta ou pela administração indireta. Assim, tanto a prestação centralizada como a descentralizada, quando executada pela administração indireta, são formas de prestação direta. 

Por outro lado, a prestação indireta ocorre invariavelmente por descentralização, mas somente quando prestada por meio de delegação. Nesse caso, a prestação indireta é aquela realizada mediante concessão ou permissão.

Contribui com esse posicionamento o texto constitucional, que dispõe que: “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos” (CF, art. 175).

Agora, vamos tratar de cada alternativa:

a) segundo a CF, “cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado”. Logo, segundo o sentido formal, a distribuição de gás é um serviço público, que pode ser prestado direta ou indiretamente – ERRADA;

b) a coleta seletiva de lixo é um serviço público de interesse local, que pode ser explorado pelas prefeituras ou por meio de delegação (inclusive, a maioria dos municípios delega o serviço de recolhimento de lixo a empresas privadas) – ERRADA (mas foi o gabarito da banca);

c)  a execução de obra não é serviço público – ERRADA;

d) o serviço postal é de competência da União, na forma do art. 22, X, da CF. Tal serviço é prestado diretamente, por intermédio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – no meu ponto de vista, este é o gabarito.

e) dispõe a CF que compete à União: “explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: a) os serviços de radiodifusão sonora, e de sons e imagens” (CF, art. 25, II). Portanto, este serviço também pode ser explorado de forma direta ou indireta – ERRADA.

Logo, não há como discutir, a letra B está INCORRETA e não pode ser o gabarito da questão. Por isso, sugiro a interposição de recurso com o objetivo de alterar o gabarito para letra D.

Também é possível recorrer simplesmente para anular a questão.

Seguindo o entendimento de José dos Santos Carvalho Filho, a prestação direta é aquela:

[…] através da qual o próprio Estado presta diretamente os serviços públicos. Acumula, pois, as situações de titular e prestador do serviço. As competências para essa função são distribuídas entre os diversos órgãos que compõem a estrutura administrativa da pessoa prestadora.

O Estado deve ser entendido aqui no sentido de pessoa federativa. Assim, pode-se dizer que a execução direta dos serviços públicos está a cargo da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal através dos órgãos integrantes de suas respectivas estruturas.

Logo, a execução direta é aquela realizada pela administração direta ou centralizada.

Por outro lado, o autor diz que a execução indireta é aquela em que os serviços “são prestados por entidades diversas das pessoas federativas”. Nesse caso, a prestação indireta é aquela realizada por descentralização, que pode ocorrer por meio da “delegação legal” ou da “delegação negocial“. No primeiro caso temos a criação de entidades administrativas, no segundo temos a delegação mediante permissão ou concessão.

No conceito de Carvalho Filho, nenhuma alternativa estaria correta, já que todos os casos podem ser prestados de forma direta ou indireta.

Gabarito preliminar: letra B (recurso para anular ou alterar para D).

Fontes:

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 31ª Edição. São Paulo: Atlas, 2017 (pp. 359-360).

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. São Paulo: Método, 2017 (p. 836-837).

53. (Cespe – Auditor de Controle Interno/CGE CE/2019)

Acerca das entidades paraestatais e do terceiro setor, assinale a opção correta.
a) As organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP) que firmem termo de parceria com a União devem contratar mediante processo licitatório.
b) A outorga de qualificação como organização social é vinculada, desde que sejam atendidos os requisitos legais.
c) Os serviços sociais autônomos executam essencialmente serviços públicos.
d) Os serviços sociais autônomos são custeados pelas contribuições de seus associados, incidindo impostos sobre esses serviços.
e) Os serviços sociais autônomos são criados por meio de decreto.

Comentário: no gabarito extraoficial, eu fui bastante enfático ao afirmar que não existia gabarito correto nesta questão. Então, eu já havia afirmado que a questão seria passível de recurso.

Porém, como era para “chutar” uma resposta, eu falei que acreditava que seria a letra C.

No entanto, reconheço que eu fiz uma pequena confusão entre Oscip e serviço social autônomo. Não notei que a letra A tratava de entidade distinta das alternatvas C, D e E. Mesmo assim, continuo defendendo que cabe recurso, pois a alternativa indicada pela banca está incorreta.

Vamos então justificar o erro da letra A da questão da prova da CGE. 

Segundo a Lei 9.790/1999 (Lei das Oscips):

Art. 14. A organização parceira fará publicar, no prazo máximo de trinta dias, contado da assinatura do Termo de Parceria, regulamento próprio contendo os procedimentos que adotará para a contratação de obras e serviços, bem como para compras com emprego de recursos provenientes do Poder Público, observados os princípios estabelecidos no inciso I do art. 4o desta Lei.

Logo, expressamente, as Oscips não seguem a Lei de Licitações. Portanto, elas não licitam, mas apenas promovem um procedimento de contratação, com base em seu regulamento próprio.

Já houve entendimento no TCU de que as Oscips deveriam licitar. O entendimento era amparado nas disposições do Decreto 5.504/2005, que expressamente determinava a realização de licitação por parte das OS e Oscips, quando: “relativamente aos recursos por elas administrados oriundos de repasses da União, em face dos respectivos contratos de gestão ou termos de parceria”.

O dispositivo, entretanto, foi REVOGADO pelo Decreto 9.190/2017. Com efeito, podemos ainda utilizar o julgamento da ADI 1.923, no âmbito do STF. O objeto da mencionada ADI era a Lei das Organizações Sociais, mas o entendimento lá exarado nos dá uma boa ideia do regime a ser aplicado às Oscips. Segundo o STF, as organizações sociais não realizam licitação, pois a Lei de Licitações destina-se apenas aos órgãos e entidades da administração pública. Assim, as OS devem promover suas contratações, quando utilizarem recursos públicos, por procedimento “conduzido de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública” (STF, ADI 1923, julgada em 16/4/2015).

A mesma lógica poderia ser levada às Oscips, pois elas também são entidades privadas sem fins lucrativos. Digo mais: no regime jurídico das Oscips é ainda mais claro que tais entidades não devem licitar, diante da previsão expressa do art. 14 da Lei 9.790/1999.

Por fim, no âmbito do TCU o antigo entendimento sobre a necessidade de promover licitações também foi superado:

Acórdão 1.777/2005-TCU/Plenário: […] as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – Oscips, contratadas pela Administração Pública Federal, por intermédio de Termos de Parceria, submetem-se ao Regulamento Próprio de contratação de obras e serviços, bem como para compras com emprego de recursos provenientes do Poder Público, observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e da eficiência, nos termos do art. 14, c/c o art. 4º, inciso I, todos da Lei 9.790/99.

Portanto, a letra A está nitidamente incorreta.

No gabarito extraoficial, eu indiquei que nenhuma alternativa estaria correta, mas disse que, na prova, eu marcaria a letra C, por ser “a menos errada”.

Porém, ainda assim, a alternativa merece reparos. Segundo Maria Di Pietro, os serviços sociais autônomos “não prestam serviço público delegado pelo Estado, mas atividade de interesse público”. Acredito que esse trecho já seja suficiente para considerar a opção também como errada.

Dessa forma, todas as alternativas estão incorretas, motivo pelo qual a questão merece ser anulada. 

Observação: recentemente, vem surgindo um novo tipo de entidades denominadas serviços sociais autônomos. São entidades criadas mediante autorização em lei, mas instituídas pelo próprio Poder Executivo. Elas recebem dotações diretamente do orçamento e não compõem formalmente a administração pública indireta. Há bastante crítica na doutrina quanto à criação dessas entidades, pois elas são instituídas pelo poder público, dependem do orçamento público para a realização de suas atividades e, simplesmente, não compõem a administração pública.

Esse grupo mais recente de serviços sociais autônomos realiza serviços de natureza pública, semelhante às atividades das entidades da administração indireta. Porém, o sentido das atividades dessas entidades é bastante genérico, sendo difícil enquadrar (ou não) no conceito de serviço público, já que novamente teríamos que nos deparar com o sentido da expressão “serviço público”. Por isso, mesmo nesse novo conceito, entendo que a letra C também estaria errada.

Gabarito preliminar: letra A (proposta de recurso para anulação).

Por enquanto, é isso pessoal! Espero que o artigo acima ajude na compreensão do tema e também na formulação dos recursos.

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Um grande abraço e até a próxima!

Herbert Almeida

Gabarito CGE CE Direito Administrativo

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