Por Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes (Defensor Público do Estado de São Paulo)
Atualmente, um dos temas em evidência na sociedade refere-se ao combate à corrupção. Conforme observado, a Defensoria Pública é expressão e instrumento do Estado de opção democrática (art. 134, CF). Por seu turno, a corrupção corrói os pilares do Estado Democrático de Direito, prejudicando, notadamente, a população em situação de vulnerabilidade econômica e social.
Por seu turno, a Defensoria Pública deverá adotar todos os meios necessários para a efetiva tutela dos necessitados (art. 4º, VII, VIII e XI, LC n. 80/94), o que abrange, evidentemente, a atuação no combate à corrupção.
Quando a Instituição defende a probidade administrativa, consequentemente, estará atuando de acordo com sua vocação legal e constitucional. Apenas de forma exemplificativa, a Medida Provisória n. 966/2020 (apelidada de MP da Irresponsabilidade Fiscal), dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19, no nosso ponto de vista, fere princípios republicamos, democráticos e a ideia de probidade administrativa, o que justificaria eventual atuação institucional para minimizar os impactos dessa MP. De fato, a referida Medida Provisória facilita sobremaneira a corrupção e a impunidade, notadamente em um período excepcional de pandemia.
Dentre os meios que podem ser utilizados pela Defensoria Pública, destacamos:
a) Atuações Extrajudiciais:
– termos de ajustamento de conduta;
– inquérito civil ou outro procedimento instrutório;
– recomendações;
– educação em direitos.
b) Atuações Judiciais:
– ação civil pública;
– ações de obrigação de fazer;
– ação de improbidade administrativa.
A relação entre Direitos Humanos e Corrupção foi recentemente confirmada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que publicou a Resolução n. 01/2018. A resolução, em seu primeiro considerando, destaca a que corrupção é um fenômeno complexo, que afeta os direitos humanos em sua integralidade – direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais -, assim como o direito ao desenvolvimento. Demonstrando a consequência aos mais pobres, sublinha que a corrupção enfraquece a governabilidade e as instituições democráticas, fomenta a impunidade, mina o Estado de Direito e exacerba a desigualdade. Vejamos:
Resolução n. 01 – Comissão Interamericana de Direitos Humanos: “Destacando que la corrupción tiene un impacto grave y diferenciado en el goce y ejercicio de los derechos humanos por parte de grupos históri-camente discriminados, tales como las personas en situación de pobreza, las mujeres, los pueblos indígenas, los afrodescendientes, personas mi-grantes y las personas privadas de libertad y afecta de forma especialmente profunda a quie-nes son objeto de trata y tráfico de personas como los migrantes, niñas, niños y mujeres” .
Ainda no cenário internacional de proteção dos Direitos Humanos, destaca-se a Convenção Interamericana contra a Corrupção. De forma inovadora, o tratado estabelece não somente medidas demandistas, mas também formas de prevenir a corrupção, reforçando a cidadania e empoderando a população, em especial aquela marginalizada, na defesa de seus direitos. Tais medidas preventivas, de forma cristalina, poderiam ser adotadas pela Defensoria Pública.
No mesmo sentido, destacando que a corrupção aumenta o abismo social e afeta diretamente a população vulnerável, vale trazer trecho de recente relatório do FMI, ressaltando que a corrupção: “distorce os gastos do governo ao promover projetos grandiosos e perdulários que geram propinas, em detrimento de investimentos em áreas como saúde e educação, que geram um impacto socioeconômico positivo. E como os pobres dependem mais dos serviços do governo, essas distorções os afetam desproporcionalmente e limitam suas oportunidades econômicas”.
Indubitavelmente, portanto, estamos diante de mais um tema que abrange Direitos Humanos e Defensoria Pública, sendo certo que a Instituição deverá adequar sua atuação nos termos do delineamento constitucional e internacional apresentado, buscando tutelar de forma efetiva a população vulnerável.
As críticas que ocorrem à atuação da Defensoria Pública no combate à corrupção se resumem em duas: a) dificuldades orçamentárias; b) desvirtuamento das funções institucionais.
No que tange a primeira crítica, ressalta-se que as dificuldades orçamentárias sempre irão servir como um verdadeiro “Cavalo de Tróia” para impedir toda e qualquer evolução nas atribuições institucionais. Caberá a instituição elevar determinados temas à prioridade institucional e organizar seu orçamento e elaborar os devidos projetos institucionais para que concretize essa atribuição institucional. Basta imaginar que, há alguns anos, notadamente durante a Constituinte, a atuação da Defensoria Pública na tutela coletiva era algo extremamente incipiente, pois prevalecia uma atuação notadamente individual. Porém, passados alguns anos, olhamos para trás e vimos como avançamos nessa nova função. Da mesma forma, para que a Defensoria Pública atuasse em audiências de custódia, era extremamente importante um novo direcionamento orçamentário para a concretização dessa atuação. Nota-se que é extremamente importante que se tenha vontade de Constituição e vontade de Defensoria. Pior do que esse argumento, somente aqueles com viés políticos e ideológicos. Argumentam que a Defensoria Pública iria desvirtuar suas finalidades institucionais e atuar conforme um novo Ministério Público. Se fosse pensar assim, a Defensoria Pública não atuaria em tutela coletiva, pois teríamos o Ministério Público. Indo ao absurdo, não precisaríamos de Defensoria Pública, pois teríamos a advocacia. O que o aluno deve ter em mente é que a Defensoria Pública possui a sua forma de atuação, o seu viés, a sua finalidade institucional. Assim, criou-se a Defensoria Pública com vocações e objetivos definidos. Por óbvio, sua atuação seria de acordo com seus objetivos, vocações e finalidades, não existindo qualquer sobreposição indesejável com o mister do Ministério Público. Apenas de forma exemplificativa, enquanto o Ministério Público atua mais no caráter repressivo e punitivo, a Defensoria Pública poderia atuar na raiz do problema, com viés preventivo, com base na educação em direitos e outras atividades tipicamente institucionais. Espera-se que, daqui a alguns anos, a gente olhe para trás e pensamos o quão absurdo foi a demora em se elevar, institucionalmente, a importância da atuação no combate à corrupção como prioridade institucional.
Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes
Entusiasta da Defensoria Pública
Professor do Estratégia Carreiras Jurídicas
Instagram: @marcoslopesgomes
Telegram: t.me/marcoslopesgomes
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