Olá pessoal,
O Tribunal da Contas da União (TCU) apreciou ontem (17/6/2015) o parecer prévio acerca das contas da Presidente da República relativas ao exercício de 2014 e, numa decisão inédita na história recente do país, deu sinais de que poderia apresentar parecer pela reprovação das contas.
O motivo: distorções da ordem de R$ 280 bilhões nas contas do governo, entre as quais se incluem as chamadas “pedaladas fiscais” – atrasos no repasse de recursos aos bancos públicos para quitar compromissos de programas governamentais – e outras afrontas à Lei de Responsabilidade Fiscal.
A emissão do parecer prévio sobre as contas anuais do Presidente da República constitui uma das principais funções do TCU, prevista no art. 71, I da CF, mas ainda não é a palavra final, pois o julgamento definitivo cabe ao Congresso Nacional, por força do art. 49, IX da CF.
Portanto, quem efetivamente irá julgar as contas da Presidente será o Congresso, tendo como base o parecer prévio emitido pelo TCU. Pelo menos é isso que se espera, haja vista que desde 2002 os congressistas não votam as contas do governo, embora o TCU envie seu parecer todos os anos. A Constituição define prazo para o TCU emitir o parecer prévio (60 dias a contar do recebimento das contas), mas não estipula prazo para o Congresso efetuar o julgamento.
Ressalte-se que, embora o parecer prévio constitua importante subsídio técnico para o julgamento, o Congresso não precisa, necessariamente, seguir o parecer, ou seja, poderá decidir diferente do recomendado pelo TCU. O julgamento do Congresso possui caráter político.
Entretanto, o fato de o parecer prévio não possuir força deliberativa não exonera o TCU do dever de observar o devido processo legal quando de sua emissão, em especial a necessidade de garantir o direito de defesa aos possíveis prejudicados pela decisão da Corte de Contas.
Esse, aliás, foi o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal na SS 1197/CE, quando afirmou que a “circunstância de o Tribunal de Contas exercer atribuições desvestidas de caráter deliberativo não exonera essa essencial instituição de controle – mesmo tratando-se da apreciação simplesmente opinativa das contas anuais prestadas pelo Governador do Estado – do dever de observar a cláusula constitucional que assegura o direito de defesa e as demais prerrogativas inerentes ao due process of law aos que possam,ainda que em sede de procedimento administrativo, eventualmente expor-se aos riscos de uma sanção jurídica“. Nesse processo, o STF estava julgando ação contra parecer prévio do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco que rejeitava as contas do Governador sem o contraditório.
Assim, o TCU entendeu que não poderia concluir o processo de emissão do parecer prévio das contas de 2014 sem antes observar a garantia do contraditório e da ampla defesa assegurada à Presidente da República. Por isso, concedeu 30 dias para a Presidente explicar as irregularidades encontradas. Apenas após a análise da defesa é que o TCU irá emitir seu parecer prévio e envia-lo ao Congresso.
É importante observar que a concessão do referido prazo de defesa não possui previsão expressa na Lei Orgânica nem no Regimento Interno do TCU, mas foi adotado em razão das garantias individuais previstas diretamente na Constituição da República.
Enfim, como afirmei no início, trata-se de uma decisão inédita, pois indica que o TCU poderá emitir parecer pela reprovação das contas da Presidente da República. Por isso, tal decisão é do interesse não só daqueles que estão estudando para o concurso do TCU, mas de toda a sociedade. A responsabilidade fiscal e a confiabilidade das contas públicas são pilares que devem ser preservados. Afinal, trata-se da gestão do nosso dinheiro! Só assim poderemos – quem sabe um dia – atingir o status de nação desenvolvida, com serviços públicos de qualidade e justiça social.
Grande abraço!
Erick Alves
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Professor, esse prazo dado pelo TCU não extrapola o prazo de 60 dias da emissão do parecer? Quais as possíveis consequências dessa dilatação do prazo?
Extrapola sim. Como disse, estamos diante de uma situação inédita. O normal é o TCU recomendar a aprovação das contas ou, no máximo, a aprovação com ressalvas. Tanto é verdade que as normas do Tribunal não dizem o que tem de ser feito em caso de irregularidades; não há prazo previsto para apresentação de defesa. Tudo é normatizado considerando a aprovação. O correto, a meu ver, seria que esse prazo de defesa fosse concedido dentro do prazo constitucional de 60 dias. Mas, diante da peculiaridade das contas de 2014 e da ausência de previsão normativa, acabou ocorrendo esse atraso. Penso que o Tribunal deve rever a regulamentação do procedimento daqui pra frente. Quanto às possíveis consequências, também não há previsão. No limite, o Congresso poderia julgar as contas sem o parecer, mas acho isso improvável, diante do atual cenário político.
Difícil mesmo é ouvir jornalistas renomados como Carlos Alberto Aardenberg dando a notícia: "O TCU está no processo de JULGAR as contas do Presidente"
Professor,
caso o Congresso Nacional decida julgar as contas, ele pode fazer isso somente do exercício de 2014 ou terá que rever de todos os exercícios que não julgou?
Apesar de parecer meio estranho, desconheço algum óbice legal que impeça o Congresso de julgar as contas de 2014 enquanto as anteriores ainda estejam pendentes. Ou seja, ele poderia sim julgar apenas as contas de 2014 agora e julgar as demais depois. Tudo vai depender de vontade política.
Excelente. Obrigado pela dica.
Grande explanação professor! Obrigado.
Professor, poderia detalhar, numa visão mais ampla, o que são as “pedaladas fiscais” ? E o senhor acredita que possa ser tema da parte discursiva do concurso?
Obrigado e parabéns pelo trabalho no Estratégia.
Fala Lennilson!
As "pedaladas fiscais", num rápido resumo, consistiram em atrasos consistentes, sistemáticos e permanentes de desembolsos financeiros obrigatórios da União, postergando pagamentos para o período seguinte a fim de melhorar o resultado fiscal do Governo no período presente.
Os principais atrasos ocorreram nos pagamentos de compromissos da União com bancos públicos (Caixa Econômica, Banco do Brasil e BNDES), que precisaram utilizar elevado volume de recursos próprios para pagar beneficiários de despesas do governo, como os programas Bolsa Família, Seguro Desemprego e Abono Salarial. É como se o Governo entrasse no "cheque especial" com os bancos públicos: na data do pagamento dos benefícios sociais, a União não repassava o recurso correspondente para os bancos pagarem os beneficiários, e os bancos quitavam a obrigação com recursos próprios, ficando com um crédito perante a União. Fazendo isso, a União ficava com recurso em caixa melhorando artificialmente seu resultado primário.
De acordo com o relatório do TCU, o levantamento desses recursos junto aos bancos públicos configura uma operação de crédito, proibida pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). De acordo com essa norma (art. 36, caput), instituições financeiras estatais e o ente da Federação que as controla não podem estabelecer operação de crédito entre si.
Quanto à cobrança em prova, não acho que a banca vá cobrar o tema em si, para vc explicar o que aconteceu; mas acho que o assunto poderá ser utilizado como pano de fundo para cobrar algum conhecimento de AFO, Contabilidade ou Controle Externo.
Professor, tendo uma dúvida mais ou menos relacionada a isso também. Vamos supor que o TCU emita parecer pela rejeição das contas. Suporemos também que o Congresso vote por sua rejeição (sei que é uma possibilidade bem remota, mas não impossível). Nesse caso o que aconteceria daí pra frente? Quais seriam as atuações do TCU nesse caso? Incluiria no nome da presidente na lista de gestores com contas irregulares para posterior apreciação do TSE quanto a inelegibilidade?
Boa pergunta, Vinicius. A partir da emissão do parecer prévio, o TCU não possui mais nenhum papel em relação às contas do(a) Presidente da República. Tudo passa a se desenrolar no campo político e, eventualmente, no Judiciário.
Algumas consequências que podem advir da eventual reprovação das contas pelo Congresso Nacional são a abertura de processo de impeachment (CF, art. 25), a inelegibilidade da Presidente (LC 64/1990) e a abertura de processo por improbidade administrativa (Lei 1.079/50). Todavia, nenhuma dessas sanções é imposta pelo Tribunal de Contas.
Também não há previsão de envio do nome da Presidente à Justiça Eleitoral pelo TCU. Primeiro porque quem irá julgar as contas será o Congresso Nacional. Segundo porque, numa eventual reprovação das contas da Presidente, o fato se tornaria sabido e notório, de modo que o MP Eleitoral poderia tomar as providências a seu alcance independentemente do encaminhamento de alguma lista. Com efeito, a finalidade da lista é racionalizar o procedimento. No ano passado, a lista enviada pelo TCU continha cerca de seis mil nomes. Seria totalmente improdutivo se o MP Eleitoral tivesse que ficar pesquisando a jurisprudência do TCU para saber quem teve contas julgadas irregulares. Por isso há a previsão de o próprio TCU encaminhar os nomes desses gestores. No caso do(a) Presidente não precisaria, afinal ele(a) é um(a) só.
Mais uma excelente e oportuna explanação, Prof. Erick. Muito obrigado!
Boa tarde, pessoal.
Por que meu comentário não foi aprovado?
Obrigado.
Fala Lennilson!
Foi aprovado sim, até já respondi! É que demora um pouco mesmo...rsrs
Abraço!
Obrigado pela aula!