Hoje, vamos conhecer a respeito da novidade na Lei Maria da Penha trazida pela Lei nº 14.550/23, a qual introduziu o art. 40-A.
Vamos lá.
O art. 40-A da Lei nº 11.340/06, introduzido pela Lei n° 14.550/23, trouxe mais uma novidade na Lei Maria da Penha. Vejamos:
Art. 40-A – Esta Lei será aplicada a todas as situações previstas no seu art. 5º, independentemente da causa ou da motivação dos atos de violência e da condição do ofensor ou da ofendida. |
Antes de adentrarmos na novidade da Lei Maria da Penha, é importante recordarmos as hipóteses de aplicação da lei.
A Lei Maria da Penha traz, em seu art. 5º, as hipóteses em que restaria configurada a violência doméstica e familiar contra a mulher. Nesse sentido:
Art. 5º – Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: |
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; |
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; |
III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. |
Ademais, o art. 7º da lei menciona, exemplificativamente, quais são formas de violência doméstica e familiar contra a mulher. Vejamos:
Art. 7º – São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: |
I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; |
II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018) |
III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; |
IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; |
V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. |
Prosseguindo no exame da novidade na Lei Maria da Penha, vejamos – a seguir – o novo art. 40-A introduzido pela Lei n° 14.550/23.
Essa novidade legislativa trata a respeito do âmbito de aplicação da Lei Maria da Penha. No caso, ocorreu uma ampliação da aplicação da Lei Maria da Penha, sendo descabida, para sua aplicação, a investigação a respeito da:
A novidade na Lei Maria da Penha, de acordo com Simone Tebet (no Projeto nº 1.604/22, que deu origem à Lei nº 14.550/23), tem como finalidade:
“explicitar o espírito da Lei Maria da Penha: TODAS as formas de violência contra as mulheres no contexto das relações domésticas, familiares e íntimas de afeto são manifestações de violência baseada no gênero, que invocam e legitimam a proteção diferenciada para as mulheres”. |
Ora, com a tradição da cultura patriarcal construída ao longo de muitos anos na História, a superioridade do homem em relação à mulher se encontra – inconscientemente – arraigada socialmente.
OBS.: O termo “patriarcado”, historicamente, significava a direção autocrática do chefe de uma família, que se concentrava, outrora, somente na figura do homem.
Embora, em alguns países, a mulher venha ganhando cada vez mais espaço e se igualando em direitos em relação ao homem, a cultura machista inconsciente ainda torna frágil o sexo feminino em face da figura masculina.
Basta pensar, por exemplo, nas diversas situações de violência que um homem pratica contra uma mulher e que, caso estivesse frente a outro homem, provavelmente não tomaria a mesma atitude em circunstâncias semelhantes.
O art. 5º da Lei Maria da Penha prevê que: “configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no GÊNERO (…)”.
OBS.: Violência de gênero, no contexto da Lei Maria da Penha, é toda agressão, menosprezo ou discriminação à mulher por ela ser – simplesmente – MULHER.
Com base no dispositivo legal supracitado, parcela da doutrina e da jurisprudência entendia que a aplicação da Lei Maria da Penha ficaria restrita aos casos em que houvesse, CONCRETAMENTE, violência baseada no gênero feminino.
Todavia, a novidade legislativa inovou ao prever que, para a aplicação da Lei, pouco importa a causa ou motivação dos atos de violência, isto é, independe se houve ou não violência motivada pelo gênero.
Seguindo essa linha de entendimento, assim já julgou o STJ-2022:
1. A aplicação da Lei Maria da Penha não reclama considerações sobre a motivação da conduta do agressor, mas tão somente que a vítima seja mulher e que a violência seja cometida em ambiente doméstico, familiar ou em relação de intimidade ou afeto entre agressor e agredida. (STJ, T6, REsp 1977124 / SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, DJe em 22/04/2022). |
Notamos que a novidade legislativa, em uma análise literal da lei, dispensa QUALQUER motivação ou causa da violência. Contudo, a doutrina apresenta questionamentos a respeito desse assunto, entendendo que houve uma presunção de violência de gênero trazida pelo novo dispositivo legal.
Quanto a essa presunção, a doutrina também diverge a respeito de sua natureza, vale dizer, discutem se há uma presunção absoluta ou relativa de violência baseada no gênero. Vejamos:
Os adeptos dessa corrente justificam seu posicionamento com base no atual contexto social, o qual tem como nota marcante a existência de relações assimétricas de poder baseadas exclusivamente no gênero.
Sustentam que a presunção absoluta, nesses casos, poderia causar muitas injustiças, especialmente porque a Lei Maria da Penha tem reflexos no âmbito penal. Além disso, ao se admitir a presunção absoluta, haveria uma superlotação das varas judiciais especializadas de proteção à mulher, o que causaria mais morosidade e ineficiência da justiça.
Corroborando essa corrente, vejamos o seguinte exemplo citado por Rogério Sanches Cunha:
Imagine que uma filha, mediante fraude, simule o seu próprio sequestro para que o resgate seja pago por seus genitores. Nesse caso, mesmo a mãe sendo uma das vítimas, não se pode afirmar que existe violência baseada no gênero, já que a ação da filha não se digiriu à mãe pelo fato de ela ser simplesmente mulher. Ao revés, a conduta da agressora se voltou indistintamente ao pai e à mãe. |
Demonstrada essa divergência, só nos resta aguardar, agora, o posicionamento dos Tribunais Superiores a respeito do tema.
Seguindo no estudo da novidade trazida no art. 40-A, também ficou consignado que, para a aplicação da Lei Maria da Penha, pouco importa a condição do ofensor ou da ofendida.
Significa dizer que: não se analisa mais se a mulher, no caso concreto, é vulnerável ou não. Assim, é desnecessária a configuração da subjugação feminina.
Dessa forma, como ressaltado por Bruna M. A. Dutra, “fatores como a existência de conflitos patrimoniais, problemas com álcool ou drogas ou mesmo a vulnerabilidade decorrente da idade da vítima” não são mais condições – inerentes ao ofensor ou à vítima – aptas a afastar a aplicação da Lei Maria da Penha no caso concreto.
Aliás, o STJ entende que a vulnerabilidade é presumida nas hipóteses prescritas na Lei Maria da Penha. Nesse sentido:
Jurisprudência em Teses nº 209/23 (STJ) – 6) A vulnerabilidade, hipossuficiência ou fragilidade da mulher têm-se como presumida nas circunstâncias descritas na Lei nº 11.340/2006. |
Visto isso, encerramos, por ora, a análise acerca da novidade trazida pela Lei nº 14.550/23 à Lei Maria da Penha.
Hoje, vimos um pouco a respeito do novo art. 40-A da Lei Maria da Penha, introduzido pela Lei nº 14.550/23, em especial acerca de sua extensão e características principais.
Finalizamos, assim, mais um tema empolgante para os que almejam a sonhada carreira jurídica.
Advertimos que esse artigo, juntamente com as questões do Sistema de Questões do Estratégia Concursos, serve como complemento ao estudo do tema proposto, devendo-se priorizar o material teórico, em PDF ou videoaula, do curso.
Até a próxima!
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Artigo esclarecedor! Tema importantíssimo. Faço votos.