Para contextualizar nossas ponderações e focar o objeto deste breve e pontual ‘artigo’, partiremos de uma premissa legal e inquestionável: a Lei 13.964/2019 estabeleceu o juízo da execução penal como competente para executar o acordo de não persecução penal – ANPP. Podemos até não concordar, mas essa foi a opção da lei, expressa, com todas as letras, no § 6º do art. 28-A do CPP:
§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal.
A Lei também esclarece que, em caso de cumprimento do ANPP, a consequência (idêntica na suspensão condicional do processo e na transação), é a extinção da punibilidade:
§ 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade.
“Não estamos diante de um simples comunicado, mas de verdadeiro requerimento ministerial para que o juiz julgue rescindida a avença. A decisão judicial, inclusive, tem natureza constitutiva negativa (e não meramente declaratória)” e deve ser submetida a contraditório e ampla defesa perante o investigado. Apenas o descumprimento injustificado é que deverá gerar a rescisão. (Cunha, 2020).
Em caso de descumprimento, assimilando a atribuição de fiscalização para o parquet, estabelece a lei que o Ministério Público tem a incumbência/obrigação de comunicar ao juízo (melhor seria requerer a rescisão), para que este possa rescindir o ANPP. Havendo a rescisão, passo seguinte, caberia o oferecimento da denúncia.
§ 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia.
Diante das últimas disposições pode surgir a seguinte dúvida: qual juízo é o competente para extinguir a punibilidade ou, de outra sorte, rescindir o ANPP?
Eis a questão, objeto central das nossas reflexões.
Rogério Sanches Cunha, embora critique a escolha legal, reconhece que o “juízo competente, na linha da opção do legislador na Lei 13.964/19, é o da execução penal”, inclusive dizendo cabível agravo em execução para os casos em que o juiz indefere o pedido de rescisão do ANPP. (Cunha, 2020)
Renato Brasileiro de Lima sustenta que embora a execução seja feita perante o juízo da execução penal, “a rescisão do acordo é da competência do juízo competente para a homologação” (Lima, 2020).
No último sentido, também o Enunciado 28 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais CNPG/GNCCRIM: Caberá ao juízo competente para a homologação rescindir o acordo de não persecução penal, a requerimento do Ministério Público, por eventual descumprimento das condições pactuadas, e decretar a extinção da punibilidade em razão do cumprimento integral do acordo de não persecução penal.
Tema controvertido! Vamos lá…
A maioria dos manuais não toca na questão. Rodrigo Cabral, em obra dedicada ao tema, consigna:
[…] o legislador optou por tomar uma decisão muito mais pragmática, no sentido de aproveitar as estruturas das Varas de Execuções Penais, como forma de concretizar de modo mais célere a fiscalização sobre o cumprimento do acordo. O legislador, pelo jeito, não se preocupou muito com a nomenclatura da Vara, o que, de certa maneira, também faz sentido.
Sobre o tema da competência, ademais, é importante frisar que nas comarcas ou seções judiciárias em que há uma divisão funcional da execução penal, a competência será sempre do juiz que ordinariamente fiscaliza o cumprimento de penas […] por razões de lógica, estrutura e expertise […]. (Cabral, 2020)
Referido autor vai mais longe para esclarecer que a execução do ANPP na Vara de Execuções Penais (VEP) deve tomar como parâmetro disposições da Lei de Execução Penal – LEP sobre prestação de serviços (arts. 149 e 150) e interdição temporária de direitos (arts. 154 e 155), quando for o caso.
Sustenta que a extinção da punibilidade (em caso de cumprimento) ou mesmo a rescisão do ANPP (em caso de descumprimento) devem ser postuladas perante o juízo da execução, esclarecendo que, logo em seguida, deverá o agente do Ministério Público requerer a devolução dos autos (quando tiverem sido encaminhados) “à Vara de Origem para posterior oferecimento de denúncia”. Afirma que o recurso cabível para as decisões do juiz que extinguem a punibilidade ou rescindem o acordo, no silêncio do CPP, é o agravo em execução, previsto no art. 197 da LEP (Cabral, 2020).
Concordamos com os percucientes apontamentos. Acrescentamos.
O mesmo juízo que promove a execução do ANPP, evidentemente, tem competência funcional para avaliar sobre o completo cumprimento das condições, declarando a extinção da punibilidade, ou o descumprimento e possíveis escusas do investigado, decretando, se for o caso, a rescisão do acordo. Não faria sentido pensar diferente e querer sustentar que uma Vara cuida e fiscaliza a execução, mas daí, se for para reconhecer o cumprimento ou o descumprimento das condições (ou mesmo avaliar justificativas do investigado), é outro juízo que deve atuar.
Nesse sentido, a Orientação Conjunta nº 03/2018 (revisada em março de 2020), das 2ª, 4ª e 5ª Câmaras de Coordenação e Revisão do MPF, item 21: Após o cumprimento das condições acordadas, e sua certificação nos autos pelo serventuário da justiça, o membro oficiante requererá a extinção da punibilidade perante o juízo de execução.
Suponha que o investigado descumpra alguma condição, mas apresente uma justificativa. Ao pensar diferente, deveríamos sustentar que os autos retornariam ao juiz que homologou o ANPP para análise do caso. Suponha (e isso é muito comum) que este juízo acolha as justificativas, deverá determinar a volta do procedimento para o juízo da execução para continuidade do cumprimento… Não tem lógica e praticidade isso! O procedimento (sim, é um procedimento, com regras aplicáveis, com autos próprios) ficaria indo e voltando de uma Vara para outra, conforme os incidentes executivos.
Lembre-se que não é o Ministério Público mas sim o juízo da execução penal que indica o local de cumprimento dos serviços à comunidade (inc. III do art. 28-A); é também o juízo da execução que define a entidade pública ou de interesse social destinatária da prestação pecuniária (inc. IV do art. 28-A), tudo isso, claro, realizando convênios e protocolos de controle e fiscalização. Como se atribuir a outro juízo a avaliação do cumprimento das condições, magistrado que pode não ter acesso ou conhecimento sobre essa necessária burocracia?
Quem pode o mais – executar – pode o menos: avaliar o cumprimento das condições; e, como mera consequência legal, declarar a extinção da punibilidade ou rescindir o ANPP. Sem idas e vindas, com racionalidade e economia de tempo e dinheiro para todos os envolvidos. Buscando a eficiência na Jurisdição, nos termos do art. 37 da Constituição Federal.
Lembre-se, ainda, que não se descarta a ‘novação’ no ANPP, como por exemplo, extensão do período para cumprimento integral das condições diante de justificativa do investigado.
A novação no ANPP parece possível. Trata-se de operação jurídica típica do Direito das obrigações, criando uma nova obrigação, substituindo e extinguindo a obrigação anterior e originária. A novação pode evitar a rescisão. Por óbvio, sua eficácia dependerá de homologação judicial, nos termos dos §§ 4º e ss. (Cunha, 2020)
Enfim, a execução do ANPP pode ter muitas intercorrências e não se justifica que, em cada uma delas, os autos fiquem ‘perambulando’ de um juízo para outro.
Conclusão: a Vara de Execução Penal tem competência funcional para executar e também, o mesmo juízo, extinguir a punibilidade do agente ou rescindir o acordo de não persecução penal.
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